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PROJETO NURC-RJ

RECONTATO:
Inquérito 164 (masculino / 53 anos)
Tema: Sindicato e cooperativas
LOCAL/DATA: Rio de Janeiro, 14 de maio de 1992
TIPO DE INQUÉRITO: Diálogo entre informante e documentador
DOCUMENTADOR: M A


Clique aqui e ouça a narração do texto 


DOC. -
LOC. - ( inint. ) É os sindicatos têm sua origem no século dezenove quando a revolução industrial projetou no mundo a idéia do capitalismo. Então, houve a tentativa do trabalhador de se defender da opressão do patrão e começaram então a surgir as primeiras associações de operários. Eh, o nome sindicalismo vem de um inglês ( inint. ) que lançou a idéia básica do sindicato. A partir daí houve então sempre uma luta entre o sindicato de trabalhadores com os patrões. Cada país organiza, a seu nível, os sindicatos. No Brasil eles são organizados muito mais a nível municipal do que a nível nacional, talvez pelo próprio tamanho do Brasil, é difícil fazer alguma coisa nacional aqui, e com o passar dos tempos em diversos países, se organizaram centrais sindicais pra melhor encaminhar a luta. O Brasil passou da famosa CGT da década de sessenta, cinqüenta, setenta, perdão, cassada duramente, destruída a pau, para as atuais CGT, CUT, aquela outra, fala o nome do ... É mais a direita um pouco, esqueci o nome dela agora. Também gosto muito. Então, esse pessoal consegue até hoje fazer um trabalho de, de, de tentativa de defesa do trabalho. Algumas são muito radicais, muito radicais mesmo, podiam pensar um pouquinho mais. Fazem greve pela greve e eu acho que greve é a arma de trabalhador pra gente usar na hora certa, no momento exato, senão a gente se desgasta. Ah, o caso dos professores e médicos, tantas greves foram feitas no serviço público que desmoralizou a palavra greve, a categoria acabou desmotivada, desmoralizada, que teoricamente sendo do serviço público não seriam demitidos, não sofriam qualquer restrição. Agora, os empregadores descobriram que podem descontar e vão descontar. O governador Brizola que se diz líder socialista descontou durante dois meses o pessoal de greve. O Moreira Franco no governo anterior reteve pagamento por um ou dois meses, quer dizer, fazem o que querem e os argumentos do Brizola chega a ser ridículo, eh, o direito de greve no serviço público não está regulamentado, quer dizer, exatamente o que ele condenava nos outros governos, Sarney e companhia. Mas o sindicato é muito bonito, é uma luta bonita se for bem encarada a, a, a ... Eu acho a nossa legislação trabalhista, até interessante ... A dificuldade é que os nossos sindicatos, só agora estão tendo autonomia, quer dizer, a qualquer momento o sindicato podia sofrer intervenção do governo, acabou. Foi assim que o Lula foi preso, tirado do sindicato dos trabalhadores, etcetera.
DOC. - Eh, na época da di, ditadura já havia o sindicato ( sup. )
LOC. - ( sup. ) Já. O sindicato surgiu no Brasil depois ... Primeiro, os primeiros no Brasil não eram chamados sindicatos. As primeiras associações começam a surgir na república velha. A primeira greve do país foi em mil novecentos e dezessete em São Paulo, a primeira greve séria, duramente reprimida. Era um momento importante no mundo, porque você vê, acontecera a revolução russa e teoricamente foi a primeira grande vitória do trabalhador. E isso repercutiu no mundo trabalhista assim uma coisa maravilhosa, os trabalhadores conseguiram derrubar o governo. Então aquela imagem foi passando de país a país. Ora, era época da guerra mundial, final de guerra. E no Brasil se passava por um processo novo, a instalação das chamadas indústrias de substituição, quer dizer, como a, a, os produtos não vinham por causa da guerra, montou-se às pressas algumas indústrias de alimento, de roupas, de calçados pra substituir esse produto que a, a, a classe brasileira importava. Então, esses operários foram trabalhando e explorados violentamente por esses patrões. Ora, as fábricas se localizavam em São Paulo e até interessantemente os, eh, operários eram de um modo geral descendentes de imigrantes italianos que aí iam trabalhar nas fazendas de café depois de mil oitocentos e setenta. Então era gente que trazia no sangue o germe do protesto, do anarquismo italiano e é o movimento anarquista que lidera o movimento anarquista brasileiro nesta primeira fase. Mas foi um ( inint. ) muito grande porque aí gerou todo um espírito nacionalista que veio casar em mil novecentos e vinte e dois com o centenário da independência do Brasil. Então, o Brasil deu um grito de nacionalidade com uma série de acontecimentos, veja bem, criaram-se em mil novecentos e vinte ou vinte e um, agora me falha a data, a Universidade do Brasil que é o embrião da atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, eh, em mil novecentos e vinte e dois, o centenário da independência, nesse mesmo ano se realiza a semana de arte moderna, ainda nesse ano a, a, esse primeiro grupo tenentino que é a revolta do Forte Copacabana, então é todo um momento histórico muito importante no qual se cria o partido comunista brasileiro no mesmo ano que vai assumir a luta trabalhista. Aí a coisa vai crescendo, vão se organizando os sindicatos, associações de trabalhadores e começa a luta traba... trabalhista que vai ter assim um coroamento brilhante com a CLT de Getúlio em mil novecentos e quarenta e três. É muito gostoso a gente analisar isso, é muito bonito.
DOC. - ( inint. ) Eh, na ditadura a gente já tinha o sindicato ( sup. )
LOC. - ( sup. ) Já tinha ( sup. )
DOC. - ( sup. ) Qual era ( inint. / sup. )
LOC. - ( sup. ) Ah, não havia qualquer chance. No momento atual ( sup. )
DOC. - ( sup. / inint. ) A atuação do sindicato naquela época ( sup. )
LOC. - ( sup. ) Olha, veja bem, Getúlio, inteligentíssimo que ele era, ele manobrou os sindicatos. Quando ele determinou que o Estado podia intervir nos sindicatos, ele, eh, acabou gerando um líder sindical submisso ao governo que nós chamamos de pelego. Pelego é aquela pele de, de carneiro que gaúcho bota entre a cela e o lombo do cavalo, ele ... Então, é pelego que fica no atrito do patrão com o empr... com o governo, do empregado com o governo, perdão, e com isso, eh, os lid ... , alguns líderes de sindicatos da época eram na verdade muito mais ligados ao governo do que outra coisa. Vários se tornaram juízes classistas, vários foram agraciados com benefícios, títulos, até hoje alguns, ainda restam ... O Ari Campista morreu não faz muito tempo, o tipo ... E Getúlio ... Os, os líderes sindicais eram mais ou menos manobráveis, alguns tentaram aparecer ao tempo de Juscelino mas sem aquela empolgação de antes. Quando a coisa cresce muito, eh, na década de sessenta com a inflação brasileira, já era Jango no poder como ministro do trabalho, depois como presidente da república, vice-presidente e presidente da república, aquelas situações todas que vieram acontecendo, os sindicatos voltaram a atuar muito forte quando surgiu essa CGT, que eu falei, forte, agitando os trabalhadores com greves quase diárias no país. Quando há o movimento militar em mil novecentos e sessenta e quatro, a repressão em cima deles é maior ( sup. )
DOC. - ( sup. / inint. )
LOC. - ( sup. ) Realmente violento porque as lideranças foram cassadas, sumidas, desaparecidas, a repressão foi violentíssima principalmente no período de sessenta e quatro até setenta e quatro. Foi violentíssima realmente, o ápice talvez tenha sido quando você falou essa tal época da entrevista, setenta e um, governo Médici, onde não havia qualquer chance de movimento sindical. O governo criou um acordo salarial com índices, pré-determinados que davam, eh, o aumento que você teria direito, não havia mais briga. Você tinha periodicamente aquele mesmo dissídio, a inflação é tanta, os aumentos são tantos, tudo oficial e aquela repressão violenta, um mascaramento dos índices que levou a dar uma inflação em mil novecentos e setenta e três de vinte e dois por cento, de treze por cento, perdão, oficial no país. Ah, nem parecia Brasil, treze por cento no ano, né, coisa que você vê em oitenta e cinco ... Quando o Collor assumiu estava dando oitenta e cinco ao mês, é isso, sempre em índices oficiais, né, os índices reais, como vê, são muito mais altos, né? Com isso a, a, o sindicato não fazia nada. Quando começou o governo Geisel, um governo fortíssimo em termos de poder pessoal do Presidente, esse homem ... Geisel era realmente um todo poderoso presidente da república. Demitiu ministros militares, prendeu outros, não deu bola pra ninguém, pra ninguém, mas verdade se diga: conseguiu debelar a tortura, tendo coragem de demitir o comandante do segundo exército e liberou a censura. Então, aos pouquinhos foi mudando o relacionamento patrão e empregado e o empregado, achatado durante tantos anos, começou a assistir a, o surgimento de algumas lideranças novas onde entra em cena, eu acho que a melhor liderança do país nessa época, que é o Lula, melhor que você sabe que não é um cara de grande estudo, ele nunca conseguiu concluir o primário, mas um cara de uma inteligência muito grande, dá pra sentir isso, e uma coragem fabulosa na minha opinião porque timidez não faz parte do vocabulário dele e conseguiu fazer a partir de setenta e oito, setenta e sete, um movimento operário muito sério no ABC paulista. Eles conseguiram em setenta e nove, botar naquele estádio ( inint. ) sessenta mil trabalhadores, que realmente é uma coisa fantástica, né, a nossa assembléia dos professores quando reuniu três, quatro mil mas não é um negócio a glória, a glória realmente, não é? Ele então se tornou um líder político a ponto de criar um partido. Agora, como é que eu vou te dizer, a partir daí começa a luta sindical. Aí volta a se organizar a, a central geral dos trabalhadores, a CUT que é a central unificada, aquela ... Tem uma outra que esqueci o nome, aquela do, que ( inint. ) é tão ruim que eu esqueço e, eh, que o pessoal sabe que é financiado pela ( inint. ) americana... Então há todo um trabalho de novidade hoje. Agora, surgiu muito bem duas figuras interessantes, né, um cara mais direita que é o Medeiros, que faz o que eles chamam de sindicalismo de resultados ( inint. ) e outro que apareceu agora esse ano, né, do PT, que é o Vicentinho, né, está impressionando maravilhosamente bem a todos, ele é inteligente, ( inint. ) que é outro Menegheli, mas não é não, o cara é muito coerente, tem uma liderança mesmo. Eu estou achando interessante isso, vamos ver. Eu sempre achei a luta, a chamada luta de classe, muito bonita. Eu sou sindicalizado há quase trinta anos e embora eu nunca tenha feito parte da militância, eu acho que não dá porque, ah, você se apaixona por essas coisas, você não vai ter mais emprego, se trabalhar como eu penso, mais emprego ... a família vai ser negligenciada, tudo isso ( sup. )
DOC. - ( sup. ) Tem que se doar muito ( sup. )
LOC. - ( sup. ) Muito. Agora mesmo estava vendo o, eh, o Vicentinho já se separou da mulher, não agüentou o tranco, a mulher não agüenta essa vida, sem contar as pressões, né, militares e outras coisas ( inint. / sup. )
DOC. - ( sup. / inint. )
LOC. - ( sup. / inint. ) É uma das poucas ... Eh, veja bem, eu comecei a trabalhar em vestibular, mas naquela época vestibular não tinha férias, não era cada universidade, cada faculdade fazia seu exame. Então, você emendava uma na outra. Se você quisesse, digamos, eh, ter férias, você ou tiraria férias, não receberia. Eu casei, vieram meus filhos, eu queria pelo menos curtir meus filhos porque, de vez em quando: quem é esse cara aí? Eu chegava eles estavam dormindo; eu saía eles estavam dormindo. Aí eu larguei os vestibulares e fiquei cinco anos sem trabalhar. Quando voltei em setenta e oito, nós tínhamos montado um curso e voltamos a trabalhar. Mas aí já estava regulamentado, eh, a partir ... No início não estava não, em setenta e três começou a haver Cesgranrio com ... acabando em dezembro, você já tinha um pouco. Então, parei e voltei agora. Voltei agora porque preciso de dinheiro, o achatamento da sociedade brasileira e principalmente da categoria dos professores é violentíssimo. Você vê, e, eh, eu sou professor também aposentado do município em final de carreira no Estado e o meu salário hoje ( inint. ) trezentos e noventa mil cruzeiros (pausa). Não conta as vantagens, agora vem aumento de quarenta por cento, dá quinhentos e pouco ( sup. )
DOC. - ( sup. ) E o aumento sindical do professor, como é que o senhor vê? O, o senhor acha que ele age certo?
LOC. - Até certo ponto. Na luta salarial não é ruim não, mas só pensam no lado salarial. E eu já pedi a eles: olha, nós somos uma categoria que não temos um plano de saúde, um plano de, de aposentadoria, sequer um vale refeição, a única coisa que você tem é aquele ticket passagem, se você quiser, que você paga e não interessa pra gente, que você paga seis por cento do que você ganha, é mais caro que a passagem. O pessoal que ganha um pouquinho mais não se interessa por esses tickets. Então se inicia com um problema, você está se formando em Letras, se você vai ser professora hoje, começando a trabalhar, se você se formasse agora e começasse esse mês a trabalhar e fosse trabalhar, Deus lhe ajude, quarenta horas por semana como qualquer trabalhador normal seriam cento e sessenta, cento e oitenta horas por mês, o seu salário hoje, hoje, seria aproximadamente setecentos mil cruzeiros, só. Dois, não chega a três salários mínimos, três salários mínimos. É muito difícil conseguir uma carga de quarenta horas, você sabe disso, te obriga a ir a vários colégios, deslocamento, passagem ( sup. )
DOC. - ( sup. ) Quarenta horas em sala, né? ( sup. )
LOC. - ( sup. ) Em sala, em sala ( sup. )
DOC. - ( sup. ) E cento e vinte em casa ( sup. )
LOC. - ( sup. ) E se eu estivesse fora de coordenação não poderia estar conversando com você, que hoje por acaso é um dia mais suave, eu não dou a maioria, só seis aulas, segundo grau dou aula, e coordeno vinte e quatro, eh, mas tem dia que dentro de sala é isso, basta faltar um colega que eu vou lá. Se é terceiro ... Às vezes eu não vou dar minha aula pra não encher o cara de história. Então preparo exame de matemática, como eu gosto de certas cadeiras, e a gente que nesta vida, trinta anos, trinta e quatro, como eu estou dizendo a você, acaba aprendendo alguma coisa, o que o cara está dando, ah, é progressão, eu não conheço progressão e você está dando em biologia, é o quê? Reprodução, tem aqui, vamos lá. Eu tenho uma série de livros, depois monto alguma coisa e passo. Terça-feira um colega de química faltou seis aulas, duas em cada turma. Teve seis exercícios montados, dois para cada matéria: matemática, história ... Eu, por acaso, o colega fala a, a, o que você está dando? Pa, vamos montar isso, vamos lá ( inint. ) Você tem que estar preparado para uma eventualidade dessa, né? Só agora é que a informática está chegando às escolas, os boletins estão saindo pelo computador, e nós estamos bolando umas fichas de questões pra ver se conseguimos fazer um banco de questões como tem a Cesgranrio.
DOC. - ( inint. )
LOC. - É, você um dia poderia. Está faltando o primeiro professor, a matéria dele é essa, eu quero tais e tais questões. E na questão do assunto haverá na ficha o assunto, o objetivo ( sup. )
DOC. - ( sup. ) É aquele negócio que a gente aprende na faculdade de educação, o aluno ... Aquela caixinha que o professor botava lá no fundo da sala, o aluno terminou a matéria vai lá e busca uma fichinha ( inint. / sup. )
LOC. - ( sup. ) É. Pra você ver as fichinhas de educ... No outro dia brinquei com uma, uma ( interrupção) Tinha conversado com a menina que faz estágio, quer dizer, eu brinquei com ela, digo: olha, há muita coisa que tem que mudar na faculdade que não tem nada a ver com educação. Porque eu não entendo escola com um setor que possa isolar ( inint. ) Eu acho que o profissional que está aí lutando tem que aprender a se virar inicialmente na parte de supervisão, coordenação e no dia a dia da escola. Primeiro porque todo mundo tem comodismo ( inint. ) Você não vai poder, trabalhar em escola e administrar bem se não for dar aula, quer saber um pouco ... E o mal é esse. Você vê jovens que sai de, de sala e vão dirigir colégios por aí porque herdaram, etcetera e tal. O nosso diretor trabalhou com a gente, deu aula e entrou com um grupo de dez para abrir um curso vestibular. Arrendaram uma escola e começaram, dez. Era o mais jovem talvez, na época ele tinha o quê? Vinte e seis, vinte e sete anos, trabalhava no antigo EDN, aí desses dez, o pessoal, ah, professor de inglês, garoto novo, mas ele sentiu que, poxa era o único ali novo, casado, recém-casado, praticamente, alguns mais velhos já com outras definições e ele tinha que ir à luta. Se atirou de peito aberto, houve algumas di... Bom, primeiro ficou sozinho, conseguiu, como ele diz, ele deu sorte, comprou esse colégio, tinha um outro prédio ( inint. ) Agora gramou, comeu giz, só no GTS dez anos, fora os outros ( sup. )
DOC. - ( sup. / inint. )
LOC. - ( sup. ) É. Não falei? Então ele comeu giz dez anos e dirigiu uma escola, foi isso mesmo, tudo bem. A filha dele entrou pra faculdade de Letras na UERJ. Faz um favor pra mim, meu irmão. Ensina a ela o que você puder, digo, eh, botar no meu lugar um dia que precis... Não, não no teu, no meu. Antes do teu, ela vai no meu. Mas daqui a algum tempo quando ela se formar vai dar aula também. Ela tem que comer giz, porque eu acho... Não, eu sei, por enquanto não vai. Ela saiu da escola no ano passado, quer dizer, é colega dos outros ainda, até o nível de respeito é diminuído, é claro? Não queremos que ela tenha ( inint. ) mas já ajuda um bocado.
Você conhece o professor José Ricardo da UERJ ( sup. )
DOC. - ( sup. ) Não. Não estudei na UERJ.
LOC. - Você é federal. Nunca ouviu falar nele?
DOC. - Não.
LOC. - Que é o diretor de letras, da faculdade de letras da UERJ ( sup. )
DOC. - Não.
LOC. - Ele trabalha com a gente aqui ( inint. ) de ensino e ele está agora liderando um projeto que ele chamou projeto excelência, tipo de programa com testes, funções, trabalhos, entendeu? E nesse trabalho todo ele ( interrupção). Ele aturou um ano, agora não agüenta ( sup. )
DOC. - ( sup. ) Mas voltando um pouquinho, eh, aos sindicatos. Falou um pouco do movimento sindicato dos professores ... E a greve? O senhor não acha que a, a greve está um pouco desgastada ( sup. )
LOC. - Ah, eu acho, eu acho. Tanto que esse ano não houve greve, não se conta. Eu não sei se o instrumento da greve está desgastado. Eu acho que como a greve está sendo feita está desgastada. As greves hoje, elas não têm nenhum impacto. Veja, os médicos acordaram mais cedo, estão evitando greves. Como eles estavam desgastados, a categoria ficou desgastada, que a televisão que é empresarial sempre só vai mostrar a falha. Ah, porque aqui morreu um doente porque o médico em greve não atendeu. O cara podia até ser doente terminal, Deus que perdoe, eu não sei se é ou não, mas o fato de não ter sido atendido, ou não ter nem chegado lá às vezes exagera a questão. E com os professores públicos eu acho que está acontecendo isso. Você vê passou-se no município um período, o estado ficou só um mês em greve, entrou e saiu sem qualquer definição. A greve, o professor, já não tem ... Sério, sinceramente, eu não sei se é porque é ( inint. ) Não sei bem, você vê, a categoria do professor vem sendo aí usada e abusada, não é? Eh, os meios de comunicação, o aluno já não tem o mesmo respeito pelo professor. Há pouco tempo eu li uma revista, uma, uma pesquisa e colocava o magistério como benquisto, muito bem, ah, acreditado junto à população. A igreja e o magistério, são os mais acreditados. Mas eu não sei se a pesquisa hoje terá o mesmo efeito, entende? Eh, é um momento muito complicado, a profissão está acabando. Então você não tem ... Você vê. Esse plano que o prefeito anuncia hoje está, na minha opinião, privilegiando a professora primária, e eu acho que tem que ser assim. Eu acho o trabalho mais difícil em termos de educação do primário. Porque um primário bem feito, tudo fica mais fácil, não é? Eh, a nossa escola já aumentou a nossa carga de primário porque a gente acha que a criança tem que ficar um pouco mais na escola. Não pode ser uma escola particular ( inint. ) CIEP inteiro não dá condições disso. Mas, eh, você vê há uns vinte anos atrás, talvez mais, né, as jovens de bom preparo, de boa família eram atraídas para a profissão de professora primária. Eram razoavelmente pagas, havia, havia a condição de ter um horizonte, havia chances e hoje o que que elas têm? O salário de uma professora primária do estado não chega a um salário mínimo. Então se você tem alguma condição, você não está querendo ser professora ( inint. ) Trabalha em casa e na escola. Tem ene profissões menos desgastantes e ganho melhor. Então você vê, está sendo atraído para a profissão um pessoal muito pouco interessado em alguma coisa. As escolas normais estão realmente com nível muito baixo, não é/ Não é que os professores sejam ... Se você cobrar um pouquinho a mais ( inint. ) baixo, é obrigado a nivelar por baixo e deve estar acontecendo no ensino superior. Ó, física, você não tem professor de física ( inint . ) Raríssimo ( sup. )
DOC. - ( sup. ) Geografia está um caos também ( sup. )
LOC. - Geografia há muitos anos. Física, ( inint. ) há uma explicação. É o problema da área tecnológica. Você ter qualquer profissão da área tecnológica te paga melhor que o magistério. Então, eh eu me lembro, são dois, eh, eh, eh, dois momentos muito, delicados. Eu tenho um comentário de um professor do século dezesseis que visitou o século vinte. Ele ficou doido em ver tudo mudado: Esse país, esse mundo está louco, o que que é isso? Até que ele entrou numa sala de aula, foi a única coisa que não mudou. O aluno sentado, escutando o professor falando. E um outro um, um comentário, comentário, no Dia, de Carlos Eduardo Novaes sobre a última professora. No ano dois mil, ta-ta-ta, se achou-se uma mandíbula de uma professora e que ela teimava em dar aula, morreu na ( inint. ) Gozadíssimo isso, eu tenho em casa. Guardei agora domingo alguns materiais, achei isso aí e guardei de novo. Belíssimo. Novaes é um gozador ... e que realmente você não encontra... O governo não tem nenhum interesse. Pra que educar uma população para reclamar depois. Enquanto ela ignorar, não reclama. Quer dizer, um governo que se diz que apoia a sua plataforma política em educação, paga um salário mínimo aos professores. ele agora deu um aumento de cem por cento em três vezes, eh, ao final de três meses, vou colocar uma inflação de vinte por cento, vinte sobre vinte sobre vinte, você já não tem aumento. (pausa) Você não tem realmente nenhum compromisso com o magistério, perdão, com a educação, nenhum ( inint. ) A senhora secretária de educação do estado, professora da sua universidade, era uma mulher que eu tinha profunda admiração, Maria Ieda Linhares, que foi perseguida, cassada, exilada na França, era assim pra eu, pra mim, que sou de História, um símbolo. Ela voltou e foi guindada pelo seu Brizola , duas vezes, secretária de educação. Olha, eu assisti um debate dela, Deus me livre, não parecia Maria Ieda, parecia uma mulher atacada, agredida, reagindo contra feras. Falava com professores. Depois reclama do professor que vaia o governador. ( pausa ) É baixo? É. ( inint. ) Agora eu já não posso mais criticar mais ninguém. É um governador que aconselha jogar pedras e vaiar o Sarney como ele disse que era bom fazer. Colocar ( inint. ) de vez que sai de uma assembléia vaiado e no ano seguinte se recusa a participar. Me lembro de outra vez, ele entrou numa, numa, numa assembléia nossa de professores, essa eu estava presente, sob vaia e saiu terminantemente aplaudido. Mas este é o político, esse é o líder que entra e ganha a situação. Esse é o professor que entra numa turma preocupado, porque ele às vezes, vai ter que fazer um trabalho numa turma difícil e sai garantido.
DOC. - ( sup. / inint. )
LOC. - É muito difícil isso. Então não é greve, quer dizer, é todo o processo educativo ( sup. )
DOC. - O senhor acredita que possa existir outros instrumentos além da greve? Outros pra forçar, pedir ( inint. / sup. )
LOC. - ( sup. ) A greve pra mim é em última instância. Ela só deve se deflagrar quando não houver mais recurso nenhum. Mas é um recurso válido que se usa. Desde da época que eu falei para você, há duzentos anos.
DOC. - ( sup. ) Não. Está desgastada, está demais, quer dizer, ela não está desgastada, está se usando demais a greve ( sup. )
DOC. - ( sup. ) Tudo que se usa demais ( sup. )
LOC. - ( sup. ) É.