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PROJETO NURC-RJ

DIÁLOGOS ENTRE INFORMANTE E DOCUMENTADOR (DID):

Tema: "Dinheiro e finanças"
Inquérito 0047
Locutor 0056 - Sexo feminino, 34 anos de idade, pais não-cariocas, professora de psicologia. Zona residencial: Norte
Data do registro: 13 de abril de 1972
Duração: 40 minutos


Som Clique aqui e ouça a narração do texto


DOC. -  Dinheiro e suas dificuldades de consegui-lo e usá-lo no cotidiano. Fale sobre essas dificuldades.
LOC. -  Você quer repetir por favor, porque eu não ouvi bem a pergunta.
DOC. -  Queria saber sua opinião sobre o assunto dinheiro e suas dificuldades de consegui-lo (inint.) usá-lo no cotidiano.
LOC. -  No cotidiano? O dinheiro no cotidiano? Bom, o dinheiro a dificuldade pra consegui-lo eu acho que todos nós sabemos, né, qual é, né? Eu acho que hoje em dia todo mundo luta um bocado pra obter o dinheiro. Agora a utilidade do dinheiro, aí eu acho que vai muito da personalidade de cada um e a própria obtenção do dinheiro também eu creio que esteja muito ligada à própria maneira de uma pessoa encarar a vida. Por exemplo, pode haver uma pessoa que encare o dinheiro como sendo algo assim que lhe proporciona, eh, meios para viagens culturais, pra obter melhores livros e para o sustento. Outras pessoas já encaram o dinheiro assim como sendo o principal na vida, mas num sentido assim de ... É, eu acho que esse barulhinho aí ...
DOC. -  (inint.) não, está muito bem, está muito bem (falas à parte/sup.)
LOC. -  (sup.) É, porque senão pode dar, ficar muito estridente, né?
DOC. -  Ham, ham.
LOC. -  Bom, eu dizia que outras pessoas já encaram o dinheiro como sendo algo de muito importante, porque eles acreditam que, eh, todos os valores, vamos dizer assim, pra essas pessoas, giram em torno de ter mais, ter mais no sentido assim de ter melhor carro, melhor casa, melhor televisão, tudo mais moderno possível. Então são pessoas que realmente fazem o culto do material. Então essas pessoas são capazes de lutar e de inclusive abandonar todos os outros valores para lutar pelo dinheiro e inclusive nós temos observado muito assim os filhos de famílias muito abastadas que se revoltam quanto a essa maneira de encarar dos pais, quer dizer, eles já não aceitam mais essa forma de encarar dos pais, eles prefeririam talvez ter mais os pais junto a si, dialogar mais com os pais, viver mais ao lado dos pais do que ter tanta comodidade, tanto dinheiro, tanto recurso, tanta coisa que na realidade pra eles não é o mais importante, né? E nós às vezes observamos isso de uma forma assim um pouco, eh, triste até porque nós vemos jovens que estão procurando constantemente, né, psicólogos, psicanalistas, psiquiatras, etc. e eu então quando faço palestras pra pais, eu costumo dizer que se eles ganhassem menos dinheiro, eles também gastariam menos dinheiro dando psicanalistas e psicólogos pra seus filhos, porque enquanto eles estão lutando tremendamente ou excessivamente por obter mais dinheiro, mais recursos, mais conforto, eles estão deixando seus filhos sem qualquer atenção, sem qualquer diálogo e isso evidentemente é quase mortal prum adolescente, prum jovem.
DOC. -  Parece que (sup./inint.)
LOC. -  (sup.) É, parece que há uma outra parte (sup.)
DOC. -  (sup./inint.) possibilidade de você obter dinheiro. Se você não tem dinheiro, o que que você pode fazer para obter dinheiro? Quais os meios que são usados?
LOC. -  Quais os meios? Bom, os meios usados são a profissão, o roubo, (riso) o desvio de verbas, não é, eu acho que há tantas formas assim. Olha, sinceramente dinheiro é uma coisa que não me faz pensar muito não, talvez por isso não tenha assim muita resposta.
DOC. -  (inint.) se você fosse patrão, de que forma pagaria seus funcionários? Se você fosse funcionário, como pagaria, gostaria de receber?
LOC. -  Bom, se eu fosse patr... Bom, eu como ... Eu sou patroa apenas de empregadas domésticas e eu emprego o seguinte forma: cada vez que meu marido ou eu somos aumentados as empregadas automaticamente têm um aumento também. Eu acredito que de um modo geral ... Vamos passar isso assim pra um terreno de empresa. Eu acho que na realidade as coisas estão muito mal divididas. Eu acredito que se os patrões tivessem um pouco menos e os seus empregados tivessem um pouco mais, haveria muito mais justiça, haveria muito mais tranqüilidade, haveria mais assim talvez até da parte do empregador mesmo uma, mais talvez um repouso da sua própria consciência. Acho que na realidade é chocante nós vermos assim que um sujeito, um único sujeito pode ter dois iates, cinco automóveis e que aquele seu empregado de salário mínimo não tem dinheiro nem sequer talvez pra alimentar seus filhos. Eu acho isso muito chocante. Eu acho que se eu fosse funcionário, o que realmente eu sou, eu sou professora, eu ganho, eu acho que cada um deve ganhar de acordo com aquilo que ele produz, eu acho que isso seria um critério justo. Eu por exemplo não aceitaria ser paga aquém daquilo que eu acho que eu valho quando eu dou aulas. Agora também outro dia eu estava ... Escandalizei um pouco uma turma de psicologia quando eu dizia que se eu sou chamada pra falar num lugar que não pode pagar, que não me pode pagar, como no caso por exemplo de escolas estaduais que às vezes me chamam pra falar pra suas alunas e a diretora, coitada, angustiada, vendo os problemas que as meninas estão passando, ela não vai tirar do próprio bolso pra me pagar, isso não seria justo e eu sinto que ela também dispõe de pouquíssimo pra pagar, então eu prefiro não receber, então num caso assim o dinheiro realmente não importa pra mim. Agora se é um lugar que realmente pode pagar, eu quero receber o justo por aquilo que eu dou, por aquilo que eu faço.
DOC. -  Agora eu não entendi muito bem como é que você recebe o dinheiro. Por exemplo se é o empregador que te dá o dinheiro ou, de que maneira?
LOC. -  Bom, eu sendo professora eu devo receber como todos os outros professores, né, mensalmente, pelo número de horas de aula que eu dou, não é, apenas eu quando (sup.)
DOC. -  (sup.) É fixo? (sup.)
LOC. -  (sup.) Entrei pra um determinado ... É fixo nesse colégio. Apenas quando eu entrei pra o último colégio onde eu estou lecionando, eu já entrei para categoria a por causa do meu currículo, então de acordo com o meu currículo eu acho que eu fiz bem em pleitear uma categoria a. Eu acho que isso vai muito de acordo com aquilo que nós damos, porque eu acredito que também esteja muito ligado à consciência pessoal. Por exemplo se eu faltasse muito, desse aulas pouco preparadas, realmente não desse a mínima atenção, eu não teria coragem de pleitear coisa alguma. Acho que isso é uma questão muito de foro íntimo.
DOC. -  O que que você entende por uma ruína ou uma falha num empreendimento?
LOC. -  Como?
DOC. -  O que que você entende sobre uma ruína, o que que você entende sobre uma ruína, sobre uma falha (inint.) em qualquer empreendimento (inint.) você tem notícia disso?
LOC. -  Ruína?
DOC. -  É.
LOC. -  Num empreendimento? Ruína em que sentido?
DOC. -  Com relação a ruína, ruína total, parcial.
LOC. -  Quer dizer uma falência? É a isso que você está se referindo?
DOC. -  Isso, ahnham.
LOC. -  Bom, em relação à falência, eu poderia dizer a vocês que a falência muitas vezes é o mau, eh, vamos dizer, a má administração de uma empresa, de um, uma indústria ou mesmo de uma firma comercial, etc. mas nós sabemos também que existe a falência fraudulenta, não é, e que essa nem sempre é vista dessa forma. Muitas vezes a falência fraudulenta é tão bem feita, sabe, que ninguém chega a descobrir. A ma... a ... Por exemplo manda-se dinheiro pro exterior e na realidade vocês sabem muito bem que na Suíça, não é, as contas não são nominais, as contas são por número, então a turma manda o dinheiro pro exterior, principalmente pra Suíça, né, e a falência fraudulenta não é muitas vezes descoberta como tal, é dada como a falência total mesmo, o que ... E tira mui... de muito a responsabilidade daqueles que faliram ou que aparentemente faliram.
DOC. -  Como você vê os atos filantrópicos e suas relações com o dinheiro?
LOC. -  Bom, o problema dos atos filantrópicos eu acho assim, eu acho que em primei... Eu já trabalhei muito em campanhas assim financeiras pra se obter fundos pra, vamos dizer, ABBR, IBRM e eu digo a você uma coisa, se nós não déssemos aquele célebre recibo que vai fazer com que a indústria ou a firma possa deduzir no seu imposto de renda, eu acredito que nós fôssemos obter muito pouco. Em relação aos chás de caridade, eu acredito que também se aquele grupinho muito amigo não se reunisse naquele dia, nós também não conseguiríamos passar convites. Eu acho que realmente aquela doação, aquele donativo assim dado com todo coração é muito difícil, sabe, da gente ver, sabe, de um modo geral existe alguma coisa por trás.
DOC. -  Existem riscos no dia-a-dia com o trato do dinheiro. Fale algo sobre isso. Fale alguma coisa sobre esse risco.
LOC. -  Sobre o risco, o mau emprego do dinheiro?
DOC. -  É, o risco, o dinheiro do cotidiano, aquele que você paga, que você recebe, que você manda fazer uma compra (inint.) da sua empregada (inint.) o uso normal do dinheiro, dinheiro vivo.
LOC. -  Bom, eu como sou uma pessoa extremamente distraída, (riso) eu procuro andar com muito pouco dinheiro na bolsa. (riso) O máximo que eu me atrevo a usar é talão de cheque (riso) pra compras maiores e cartão de Diners e Ci... e Credicard porque esses eu sei que é muito mais difícil de eu perder ou de eu me enganar porque eu realmente, como já não gosto de números, mesmo os números numa cédula já não são muito da minha especialidade, então eu, em geral não tem muito problema. Agora, eh, aquilo que você tocou, o dinheiro que se dá à empregada, eu realmente não sou assim muito de tomar as contas e tal e então como as coisas lá em casa por um tempo não andaram muito boas, os trocos andavam assim muitíssimo desfalcados, eu pedi a minha afilhada, que é bem mais organizada do que eu, que fizesse um controle diário da casa, já que eu tinha absoluta certeza que se eu começasse eu não sairia do terceiro dia no máximo. (riso)
DOC. -  Vem cá, você falou sobre o Credicard e qual foi o outro?
LOC. -  Diners.
DOC. -  O Diners. Você pode assim fazer uma, localizar uma diferença, uma relação entre as duas coisas?
LOC. -  Ah, pois não. O Diners nós fazemos, é mais ou menos semelhante ao sistema do Credicard. Apenas o Diners nós fazemos uma determinada compra e até o dia vinte e cinco de determinado mês, aquela compra é paga no mês seguinte. Passando do dia vinte e cinco, vamos supor, nós estamos em abril, uma compra feita até o dia vinte e cinco de abril, ela é paga em maio, no mês de maio, por volta do dia dez de maio. Agora qualquer compra feita no mês de abril, após o dia vinte e cinco, só será cobrada no mês de junho. Agora o Credicard não. O Credicard ele utiliza um sistema de crédito rotativo. Você por exemplo faz uma compra grande demais pro teu orçamento, você então chega e paga, vamos dizer, eh, trinta por cento naquele mês, mas no outro mês você também faz uma compra grande, você não vai pagar tudo de uma vez, então você também paga trinta, quarenta ou dez por cento daquilo que você comprou, então o crédito rotativo. O, isso o Diners não proporciona, o Diners só nos dá, eh, só nos proporciona algo semelhante na ocasião de natal, que nos meses de outubro, novembro e dezembro ele permite que nós façamos compras para pagamento em quatro vezes, sem qualquer acréscimo de juros, o que também traz uma diferença pro Credicard, que nesse nós sempre pagamos juros.
DOC. -  Agora você disse que há uma diferença entre um e outro, não é? Eles têm em comum uma coisa.
LOC. -  Ah, sim, têm em comum (sup.)
DOC. -  (sup.) O quê?
LOC. -  O fato de nós fazermos uma compra sem utilizarmos dinheiro e podermos pagar, eh, e podermos pagar no mês seguinte.
DOC. -  É, mas a gente pode dizer que é dinheiro vivo? Como é que você classificaria?
LOC. -  Ah, sim. Hoje o Credicard e o Diners são praticamente dinheiro vivo. A lojinha mais humilde hoje dificilmente deixará de ter, ou pelo menos o Diners ou o Citicard, lá, pregadinho na sua vitrine, indicando que lá se pode comprar por esse sistema. Isso é realmente uma evolução, eh, em matéria assim de comércio, porque antes só as grandes lojas tinham, né, hoje em dia as lojas mais simples já podem utilizar-se desse sistema (sup.)
DOC. -  (sup./inint.)
LOC. -  É.
DOC. -  Você falou, falou sobre o Credicard, falou sobre o Citicard. Agora me diz uma coisa, como você faria com o banco? Você disse que usa cheque, você usa de que maneira o cheque, como?
LOC. -  Ah, bom, eu uso os meus, os meus talões de cheque de uma maneira assim um pouco engraçada, não é, porque eu tenho lá o meu saldo, né? Porque a PUC deposita no BIG, Banco Irmãos Guimarães, o Jacobina deposita no banco Boavista. Então eu tenho lá aquele dinheirinho, né, que é bem pouco, né? (riso) Então, bom, às vezes eu quero fazer uma compra bastante grande, né, ou mais ou menos grande, então eu faço o seguinte: eu passo o cheque que eu tenho absoluta certeza de que é sem fundos, telefono pro meu marido, ele corre a uma outra agência do banco e deposita imediatamente para mim. (riso)
DOC. -  (inint./riso)
LOC. -  (inint./riso) né, pra que na hora que a loja vá receber o cheque eu tenha fundos, né? (riso) É assim que eu utilizo meus talões de cheque. (riso)
DOC. -  Isso é um risco, né, alto risco, não é?
LOC. -  Não, não é risco não, porque ele é cem por cento ligeiro. Eu emito o cheque, ele corre e deposita. (riso) Não há qualquer perigo. Inclusive, inclusive os dois bancos sabem que existe essa troca entre nós, não é, essa, o que nós poderíamos dizer, essa transa, não é, então os bancos já sabem. Se por acaso bater o cheque lá antes da outra agência ter comunicado, eles não se espantam porque eles conhecem o nosso sistema. (riso)
DOC. -  Qual seria a forma mais usual de um chefe de família, após sua morte, não deixar em desamparo os seus parentes?
LOC. -  Bom, seguro de vida, outras formas como por exemplo essa pecúlio da família militar, uma coisa assim, eu não sei bem o nome. É mais ou menos isso, não é, porque aí a família, a viúva no caso, ficará recebendo, eh, uma quantia xis, que é reajustada sempre de acordo com um, um certo, vamos dizer assim, um certo padrão ou de major, coronel ou qualquer coisa assim que o valha, e realmente isso é bastante interessante porque o seguro de vida por si só é algo que é recebido de uma só vez e se a viúva não tiver um certo critério, não souber realmente empregar aquele dinheiro, ela ficará restrita àquele dinheiro que lhe pagará o INPS, vamos supor, não é, que em geral é muito pouco, né?
DOC. -  Hoje muito se fala na multiplicação do dinheiro. Qual o seu modo de dizer sobre esse negócio da multiplicação do dinheiro? Qual a melhor maneira (inint.)
LOC. -  Sim, eu sei. Olha, por exemplo, eu entrei prum fundo, sabe, de investimento. Eu achei muito interessante porque eu fiquei pensando: puxa, pagar oitenta e poucos cruzeiros por mês pra depois daqui a cinco anos ter não sei quantos milhões, como eles disseram, não é? E como é um, é uma companhia assim de bastante, eh, bastante credenciada, eu entrei. Agora houve lá em casa uma coisa que eu considerei assim muito positiva e que me deixou muito feliz: é que duas das minhas empregadas fizeram também o fundo de investimento. Isso eu considerei assim uma coisa realmente maravilhosa. E eu vou dizer a vocês, eu talvez tenha feito mais por elas, no sentido de que eu queria dar a elas a segurança de que elas estavam fazendo uma coisa tão boa que eu também estava fazendo. E eu acho isso muito importante porque a empregada doméstica, até o momento, não tem qualquer tipo de amparo, então ocorre que elas trabalham, gastam às vezes em bobagens, né, que pelo menos nós achamos bobagem, coitadas, pra elas não é. Is... e dão muito pros parentes, mandam pro interior e ao chegar o fim da vida elas realmente não têm nada. E eu fiquei muito feliz, sabe, que elas tivessem compreendido o que era um fundo de investimento. Agora também pra se multiplicar o dinheiro fala-se muito da Bolsa de Valores, né, que aliás foi o que vocês disseram que eu deveria falar e que eu vim assim apavoradíssima, porque eu sou completamente tola em matéria de Bolsa de Valores, não entendo mesmo, não é, mas eu realmente posso acreditar que muita gente se beneficiou, mas eu sei que também muita gente perdeu e perdeu alto.
DOC. -  Você sabe alguma coisa sobre como é que se investe na Bolsa, qual é o mecanismo, como é que se emprega, de que forma é possível multiplicar o dinheiro? Você não teve nenhuma experiência, nem mesmo seu marido? (sup.)
LOC. -  (sup.) Eu não tive qualquer experiência, nem meu marido porque nós estávamos com o dinheiro reservado para o pagamento de uma parte do apartamento. Nós então raciocinamos o seguinte: podemos colocar esse dinheiro na Bolsa e ele realmente crescer bastante, pode diminuir muito e como nós vamos pagar o apartamento? (riso) Diante disso nós desistimos evidentemente da Bolsa, não é, e fizemos como aquelas pessoas bastante antigas, né, guardamos no banco, o que é totalmente fora de moda, mas que nos pareceu bastante seguro, já que nós tínhamos de, um pagamento a fazer, não é? E eu realmente em, em matéria de Bolsa de Valores, eu fiz uma certa reflexão, mas foi quando eu tive de orientar uma moça no trabalho sobre psicologia da multidão. Eu sugeri a ela que terminasse o trabalho, perguntando se essa corrida assim pra Bolsa não teria sido um fenômeno realmente de multidão, porque era algo assim, não é, impressionante, como as pessoas corriam naquele momento pra Bolsa. Inclusive o papel já não estava mais correspondendo, eh, vamos dizer, o valor que se dava não era um valor real. Eu soube por uma pessoa bastante idônea e que trabalhava na Bolsa que muitos e muitas daquelas, daqueles valores, daquelas cifras apresentadas eram inteiramente fictícias. Que aquelas, aquelas, eh, como eu diria assim, aquelas empresas absolutamente não tinham nem sequer capital que pe... que permitisse que seus, suas ações chegassem àquele, àquela altura que estavam chegando.
DOC. -  (inint.) não era realmente (inint.)
LOC. -  É, foi um jogo assim, houve muita especulação.
DOC. -  Certo, agora você falou em, em ações. Assim você sabe que tipo de ações existem?
LOC. -  Bom, em matéria, ações propriamente, vamos dizer assim, pra, não pra um sentido assim de jogar na Bolsa, mas nós temos um certo número de ações, isso eu acho interessante. Por exemplo, quando meu menino nasceu, ele foi primeiro filho porque nós perdemos a primeira menina. Depois dela veio ele, então na realidade ele ficou sendo primeiro filho, primeiro neto, primeiro sobrinho, primeiro sobrinho-neto. Então, diante de todos esses primeiros que ele foi, ele ganhou importâncias como presente de nascimento. Então eu pensei: em lugar de comprar tantos macacõezinhos, tantas roupinhas etc. etc. eu achei que seria muito bom empregar esse dinheiro em ações. Então eu comprei ações pro meu menino. E ele sabe, ele tem certeza de que ele tem ações e quando dá filhote ele fica muito feliz da vida, (riso) sabe, ele compreende bem o que é isso e agora nós estamos pretendendo comprar pra menina.
DOC. -  E o que é isso?
LOC. -  O que é isso? O que é isso pra ele é que na realidade ele sente que ele te... é possuidor de algo que está crescendo cada vez mais e que quando ele atingir a idade adulta certamente ele vai ter um bom pecúlio. E eles inclusive estão fazendo também, vocês falaram aí em multiplicação de dinheiro. Minhas duas crianças estão fazendo aquela, eh, caderneta de poupança, né, eles colocam as moedinhas no cofre, mas aquilo é uma beleza pra criança porque, olhe, eles às vezes poupam de não comprarem tantas revistas e tantas balas porque têm de guardar moedinha pra botar nos tais dos cofres, né, agora é verdade que também muita moedinha sai da minha bolsa, não é, (riso) quer dizer, nem sempre é um sacrifício deles, muitas vezes é minha bolsa que entra na dança, não é?
DOC. -  Agora você falou, não é, que recebe um ordenado que é depositado no banco, certo? Agora a gente pra saber quanto tem no banco, não é, ou quanto foi depositado, existe um papel que se recebe que vem assim com todos os, os descontos, que tipos de descontos são esses, como é que (inint.)
LOC. -  Ah, sim, o desconto de INPS e no caso meu vem a, um acréscimo, né, de salário-família, já que eu tenho dois filhos.
DOC. -  Como é que você toma conhecimento de que foi depositado aquele dinheiro (inint.)
LOC. -  No colégio, eh, e na faculdade, na PUC, eles dão um, algo que poderia ser chamado em alguns lugares de contracheque, mas que no nosso caso não é bem isso, vem apenas um papel, na PUC tirado pelo próprio computador que lá na PUC hoje em dia tudo (sup.)
DOC. -  (sup./inint.)
LOC. -  (sup.) Ah, eu absolutamente não sei o nome deste papel. Aliás, nunca tive interesse em perguntar. Eu recebo, (riso) eu recebo aquele papel e muitas vezes eu já fui ao banco, já retirei uma importância, antes que me dessem o papel porque a gente chega ali no banco ... Porque eu não sei se vocês sabem que a PUC hoje em dia ela está procurando realmente se tornar uma universidade na acepção da palavra. Então hoje nós já temos uma agência de banco dentro da PUC. Antes era uma pequena sala, hoje é uma sa... uma sala bastante grande, muito bem decorada, muito bonita, com ar condicionado, etc., onde funciona o BIG UNIVEST, não é? E nós chegamos então simplesmente no banco e dizemos: olha, já depositaram aí dos professores? Já. Então, bom, vamos sacar. Simplesmente isso.
DOC. -  E o banco te manda alguma, alguma notificação, digamos assim, do total, eh, de quanto você tem no banco, de quanto você tem (inint./sup.)
LOC. -  (sup.) Não, não, não. Não, hoje em dia inclusive a coisa está complicada, porque antes o BIG fazia, eh, eh, vamos dizer assim, ele ia fazendo, ia lançando toda a nossa conta corrente, eh, num papel onde era passado por uma máquina comum encontrada em qualquer tipo de banco, mas agora o computador também entrou no BIG, então nós só podemos ter o extrato da nossa conta depois de dez emissões de cheques.
DOC. -  E você por exemplo quando você faz (inint.) você utiliza esses cartões tipo Diners ou Citicard, eh, tem certos casos, eh, cartões que você faz uma compra muito grande, fora do seu alcance de pagar no mês seguinte e às vezes o banco ajuda (inint.)
LOC. -  Não, não (sup.)
DOC. -  (sup./inint.)
LOC. -  (sup.) Não, não. O processo é o seguinte: a loja que vende ela recebe integral.
DOC. -  Ela recebe integral (sup./inint.)
LOC. -  (sup./tosse) Perdão. Ela nada tem a ver com o processamento dentro do Ci... do Credicard, que antes era Citicard, não é, ela nada tem a ver com o processamento.
DOC. -  Do banco pra loja é integral. Agora do banco, você paga ao banco, certo?
LOC. -  Olha (sup.)
DOC. -  (sup./inint.) pode ajudar (sup.)
LOC. -  (sup.) Eu pago ao Credicard simplesmente. Eles mandam a conta, nós pagamos. Pagamos como desejamos pagar.
DOC. -  Supondo que você não pague, o que que aconteceria?
LOC. -  Nunca ocorreu (riso) e eu infelizmente não sei te responder, eu não sei o que acontece.
DOC. -  Você (sup.)
LOC. -  (sup.) Bom, em primeiro lugar, eu acho que eu entraria naquela lista negra, né, porque você sabe que o, o Citicard, é impressionante, Citicard logo assim que ele começou, mas é impressionante, um mês e meio, dois meses depois, já tinha lista negra.
DOC. -  Eles são ligados a que bancos?
LOC. -  Agora há muitos bancos, antes era só o Citibank, agora não.
DOC. -  Agora eu acho que ela estava também se referindo a esses, outros, possibilidades da gente conseguir dinheiro. Você quer comprar um carro e você não tem dinheiro. Agora existe um tipo de mecanismo (sup./inint.)
LOC. -  (sup.) Ah, sim. Agora existe o crédito direto. O crédito direto, não é, que facilitou imensamente qualquer tipo de, de compra, daí a queda dos consórcios. Apesar de que nós estamos falando sobre um assunto, gente, que eu sou assim péssima, porque é o tipo da coisa assim que eu não penso muito, sabe, que eu não reflito muito, essas coisas em geral eu não entendo, sabe, eu não sou muito interessada assim nesses assuntos, quer dizer, eu acredito assim que eu não esteja podendo responder muito bem a vocês.
DOC. -  (inint.) e pra compra de um apartamento? Quais são assim os mecanismos pra se comprar um apartamento? Como é que você paga um apartamento? (sup.)
LOC. -  (sup.) Bom, ah, isso nós estamos bastante por dentro, né?
DOC. -  Certo.
LOC. -  Bom, hoje nós temos a Caixa Econômica que nos dá, eh, empréstimos, nos concede empréstimos assim com a maior facilidade. Que vocês sabem que a existência da loteria esportiva vem ser assim um grande benefício pra todo mundo, não é, porque a loteria esportiva traz de tal forma, eh, uma renda, uma entrada de dinheiro pra, na Caixa Econômica, que a Caixa empresta hoje com a maior tranqüilidade. Ela acho que fica feliz se você vai lá pedir um empréstimo, não é? Porque ela precisa movimentar o dinheiro.
DOC. -  Ela empresta a qualquer um?
LOC. -  A qualquer um, mediante a apresentação da renda familiar. Você pode ist... você pode, né, pedir um empréstimo de, no montan... o, o valor do empréstimo deve ser proporcional à sua renda familiar. Quer dizer, você, vamos dizer, no caso, marido e mulher trabalham, juntos ganham tanto, eles podem obter uma quantia xis da Caixa Econômica.
DOC. -  E não tem assim (inint.) por cento (sup./inint.)
LOC. -  (sup.) Exatamente (sup.)
DOC. -  (sup.) Fixado (sup.)
LOC. -  (sup.) Fixado. Ela quando você se apresenta lá dizendo que deseja comprar um imóvel através da Caixa, ela te dá direitinho tudo aquilo, eh, por escrito. Você ganhando tanto, você pode pedir tanto, etc. Agora é muito, vamos dizer, há uma coisa na Caixa, porque todo mundo grita por aí que o sistema da Caixa é desumano, porque as pessoas depois de um tempo não conseguem mais pagar, mas eu acredito que isso também haja um pouco assim de, vamos dizer, assim um pou... haja pouca reflexão da parte da turma que vai cas... ahn, comprar. Porque se eles sabem que o aumento vai ser proporcional ao salário mínimo, nos casos do imóvel até o valor de cento e poucos milhões, o acréscimo é sempre proporcional ao salário mínimo. Quando sobe o salário mínimo, sobe também a prestação. Agora se a turma sabe disso, por que que a turma compra com a ilusão de que pagando, de repente vai ficar mais aliviado. Não vai ficar mais aliviado. Se aquilo já vai ser apertado pro orçamento, será apertado durante quinze anos, não tem nem por onde. Agora os imóveis superiores a essa quantia, a essa importância, esses já sofrem uma correção trimestral, que é bastante mais pesada. Mas é um critério justo, porque quem vai comprar um imóvel superior a cento e poucos milhões já é uma pessoa que pode arcar com uma correção desse gênero. Mas recentemente houve uma modificação que humanizou ainda mais o critério. E essa eu realmente desconheço, mas sei que é uma forma bastante melhor que a Caixa lançou ultimamente. Que realmente havia famílias que estavam em verdadeiro desespero.
DOC. -  Mas por que que algumas famílias não conseguem suportar esse empréstimo?
LOC. -  Porque você sabe, cada vez que sobe o salário mínimo, sobe também a prestaçao na Caixa. E acontece que cada vez que sobe salário mínimo, os gêneros, as roupas, nada disso sobe proporcionalmente, sobe bastante mais do que subiu o salário mínimo. Você vê, o aumento de gasolina ... O que que traz o aumento de gasolina? O aumento do transporte. Aumentando o transporte, aumentou tudo, além daquilo que o comerciante já aumenta.
DOC. -  Você sabe se existe algum nome técnico pra esse tipo de aumento (inint.) algum nome assim usado normalmente, como as pessoas ... Qual é o nome que se dá a esse tipo de coisas que acontecem? Aumento de, aumento de tranporte, dos gêneros. Alguns gêneros alimentícios sobem, eh, não em proporção com o salário.
LOC. -  Realmente não sei o nome técnico que poderia ter.
DOC. -  Você pode comprar o apartamento e não só a Caixa Econômica empresta, né? Existem outros pla... (sup./inint.)
LOC. -  (sup.) Exato, existem outros planos. Parece que o BNH, e agora existem também financeiras que estão ligadas ao BNH ou fazem, ou estabelecem formas e, e bastante semelhantes ao do BNH, porque fora, aliás, desses critérios não é possível vender, não é? Agora eu compreendo que haja uma certa grita, um certo desespero, porque, não sei se vocês já tiveram alguma experiência nesse sentido, mas eu aconselho a qualquer pessoa que compre pela Caixa, pelo BNH, que nunca vá olhar seu saldo. Porque impressiona terrivelmente. Você vendia, você devia vinte milhões, você vai olhar daqui a um ano, você vende, você deve, não sei se estou dizendo uma cifra verdadeira, mas, vamos supor, você já está devendo vinte e oito, mas você já pagou um ano e você está devendo muito mais do que você devia antes. Quer dizer, eu aconselho as pessoas a fazerem o seguinte: você está feliz com seu apartamento, está? Então nunca vá olhar o seu saldo. Imagine que você está pagando um aluguel e desfrute do seu apartamento, porque se vai olhar o saldo fica louco, não é? Porque a correção é uma coisa estúpida.
DOC. -  Agora o que que você acha (inint.) da nossa moeda? Quer dizer, se ela tem valor, se não tem, em comparação com outras moedas.
LOC. -  Bom, eu acredito que no momento a nossa moeda só esteja mais valorizada que a argentina, né? Pelo menos é o que me consta.
DOC. -  Mas isso é resultado de quê? Ela se desvaloriza por quê?
LOC. -  Por que essa moeda vem se desvalorizando assim? Olha, eu acho que são tantas as implicações. Eu acredito que em primeiro lugar seja talvez uma ... Bom, aí nós vamos entrar num terreno um pouco, um bocado perigoso, é melhor deixar essa pergunta de lado.
DOC. -  Não, não, mas em termos, em termos gerais, gerais assim, como, o que que se diz normalmente como causa?
LOC. -  Eu acho que a má administração que sempre houve no sentido geral, de governo.
DOC. -  Certo, mas essa administração em termos de dinheiro faz com que aumente os juros, não é, etc. e levam a uma (sup./inint.)
LOC. -  (sup.) Exatamente, ainda mais porque nós sabemos que ... Agora eu não sei como as coisas estão andando, né, ou é melhor a gente nem saber. (riso) Mas antes nós sabíamos, não é, que os dinheiros públicos nem sempre eram muito bem empregados, eu acredito que isso já fosse uma das causas. Por outro lado, aquele problema de eleições, aquilo fazia assim com que os dirigentes se, ficassem muito comprometidos com grandes industriais. E evidentemente esses industriais tendo esses sujeitos nas mãos, eles colocavam o preço que eles bem entendiam, não havia o menor controle. Eu acredito que hoje esteja realmente havendo um maior controle. Mas eu também não tenho muito in... Sinceramente esse é um campo que não me faz muito pensar não.
DOC. -  Como é que o povo chama esse estado de coisas (sup.)
LOC. -  (sup.) Ah, se você quiser passar pro campo do povo ... Isso é o que me toca muito, sabe? Seres humanos me tocam muito, cifras em geral eu sou meio, sabe, desligada de cifras e técnicas. E em matéria de cifras toda a minha, vamos dizer assim, todo o meu eu é versado assim muito na preocupação do ser humano. Então se você quer saber em termos de seres humanos, eu acho que na realidade, não só aqui no Brasil, mas como no mundo todo, a turma está sofrendo terrivelmente o problema da má distribuição do dinheiro. Eu acho que nós não podemos ficar assim totalmente alheios ao que está se passando, porque nós vemos que a população, vamos dizer, brasileira, sofrendo uma estupidez, mas sofrendo mesmo. Sofrendo e isso é algo que faz pensar porque, em geral, nós quando pensamos em problema de dinheiro, nós pensamos assim em termos de, de, da fome. Mas, gente, não é só a fome. A fome é uma coisa realmente terrível, mas existe algo ainda além da fome, é o problema da turma por exemplo que quer estudar e não pode. Hoje em dia é uma coisa impressionante, eu tenho colegas e vejo pessoal aí querendo estudar, o preço dos livros é uma estupidez. É uma coisa assim que a gente não compreende. Era preciso assim que as bibliotecas tivessem montanhas de livros, cada exemplar tivessem dez, vinte volumes, pra que todos tivessem acesso, porque hoje é um problema imenso. Agora deixando esse problema assim da turma que quer estudar e muitas vezes não pode, se nós vamos cair então na, no problema do sujeito de favela ou pior, o sujeito lá do interior, lá do nordeste, que realmente está passando muitas vezes fome, e que não tem condições, eu não vejo como. Olha, há populações tão abandonadas que eu soube de um avião que caiu há po... há um pouco tempo atrás, eh, numa cidadezinha muito distante na Amazônia, então acreditem vocês que o povo de l'a perguntou como ia o presidente Getúlio Vargas, (riso) não é? A, a falta de informação, quer dizer, o subdesenvolvimento é algo assim que faz pensar, que me toca muito, mas, olha, gente, toca de tal forma que, eh, eu nem sei, é o tipo de assunto assim que é talvez assim difícil resumir, porque eu no fundo sinto uma certa revolta contra esse estado de coisas, eu não aceito muito isso, quer dizer, que a coisa esteja tão mal dividida. Eu não imagino por exemplo que devesse haver um sistema em que as coisas fossem muito modificadas. Eu por exemplo não seria favorável a uma revolução nesse sentido. Eu sou muito mais favorável a uma educação nesse sentido, porque uma re... uma revolução pra mudar o, esse estado de coisas, simplesmente mudariam as pessoas que estão no poder. Então isso não traria qualquer, eh, modificação. E eu não digo isso em rela... em termos de Brasil não, eu digo em termos mundiais, quer dizer, a fome no mundo, não é? Então eu acredito e aqui seria assim um apelo a vocês universitários, no sentido de um nova educação, quer dizer, que nós pudéssemos educar as novas gerações no sen... no sentido de uma nova justiça. Porque infelizmente nós vemos pessoas que já foram às vezes muito pobres, lutaram muito e quando elas atingem uma certa posição, elas passam a massacrar aqueles que estão lutando também. Então eu acredito não numa revolução, eu acredito numa educação pra mudança de base. E se depois dessa eu não for chamada na DOPS, eu me dou por muito feliz. (riso).