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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Vestuário"

Inquérito 0247

Locutor 297
Sexo masculino, 75 anos de idade, pais cariocas
Profissão: médico
Zona residencial: Sul

Data do registro: 13 de setembro de 1974

Duração: 48 minutos

Clique aqui e ouça a narração do texto


L
 Minha mãe me lembrou de uma quadrinha que li outro dia num jornal de um matuto, que dizia assim: no tempo da minha avó, os vestidos da minha tia só mostravam o mocotó, hoje, mu... seja mulher da vida, patroa ou empregada não usa rou... roupa nenhuma ou usa uma roupa, uma peça só. (riso)
D
 E então?
L
 Isso é uma quadrinha que saiu no jornal outro dia. Eu tenho uma memória prodigiosa, modéstia à parte (inint./ruído) e ensinei matéria de curso superior ao mesmo tempo, né?
D
 Hum, hum.
L
 E tenho ... Gosto muito de poesia, gosto muito de literatura, não é, então tenho uma memória muito especializada pra isso. Se quiser que eu lhe fale alguma coisa sobre, sobre música ou sobre, ou sobre poesia e tal, isso eu posso, agora esses setores profissionais ...
D
 Não, eu queria era que o senhor me desse assim uma espécie de depoimento do que que o senhor viu em termos assim de vestuário.
L
 Em termos de vestuário eu posso lhe contar. Vamos dizer então (sup.)
D
 (sup.) Desde quando o senhor era criança, como é que o senhor se vestia, que que é que as pessoas usavam (sup.)
L
 (sup.) Ô, minha filha, eu, eu, no meu tempo de criança, ainda tenho retratos aí, que eu nos meus sete anos usava cachos. Para os que se interessam em saber disso, que os meninos usavam, né? Hoje está voltando moda dos cabelos compridos, naquele tempo era cachos pendurados assim, era uma coisa ridícula, né, mas, mas era, usava-se, né? Depois eu nunca fui amante de, eh, de, eh, de ... (ruído de xícaras e colheres) Qual é o meu, é esse de cá?
D
 É esse de cá.
L
 Eu nunca fui amante de, de farda. Isso é um detalhe que eu posso lhe dar e talvez não, não seja até ... (vozes ao fundo, para servir cafezinho) Eu sei, minha filha, estou oferecendo aqui pra ... (interrupção) É o colégio, esse colégio Pio-Americano. Quando eu era estudante de Direito, a moda era tão puxada, que eu cheguei a freqüentar aula na escola de Direito de (inint.) vestido de fraque.
D
 Como é que era (sup.)
L
 (sup.) Fraque (sup.)
D
 (sup.) O senhor pode descrever esse fraque?
L
 O fraque era como, como o fraque que se usa hoje, até o, até abaixo do joelho, atrás aquela rabona, não é, é vestido comprido, não é? (sup.)
D
 (sup.) E hoje se usa como?
L
 Agora não, agora mudaram. Eu não cheguei a lhe apresentar minha senhora, né?
D
 Já apresentou (inint.)
L
 Já? Mas usava fraque ou então usava-se muito o jaquetão e chapéu de palha.
D
 Como é que era o jaquetão?
L
 Heim? O jaquetão é cruzado na frente, assim, com du... duas fileiras de botões. Du... duas fileiras de botões, era o jaquetão, não é?
D
 Ham.
L
 Mas nesse tempo por exemplo eu queria lhe dizer algo a respeito da farda, eu fiz o, ah, o serviço militar, que era obrigatório naquele tempo, fazia-se nas faculdades em tiro de guerra. Houve um, os alunos mandaram fazer fardas especiais, em que cada faculdade tinha um emblema. Os soldados não conheciam e a farda era bonitinha, parecia mais de oficial. Então quando a gente saía, eles batiam continência os soldados rasos pra gente. Depois de algum tempo descobriram que nós éramos tão rasos quanto eles, aí diziam palavrão quando a gente passava. (risos) Mas eu que não gostava de farda, vestia a farda todo dia de manhã pra ir pro serviço militar na pra... na, na, na, na, na praça do Russel, ali a praça do Russel, e voltava correndo pra casa, aflito pra tirar a farda. Agora tinha colegas, sobretudo colegas mais pobres, que usavam a farda o dia inteiro, né, o dia inteiro. Agora a não ser isto, posso lhe informar também é que era esquisito, ninguém usava o, essas roupas que nós usamos hoje, de blusa, não é? Era paletó e gravata, colarinho duro, punho duro, não é? Punho postiço que a gente tinha que botar em cada camisa na hora, né, colarinho duro e pei... separado da camisa e o punho e o colarinho separado da camisa, duros, engomados, não é? E era interessante que, vou lhe contar esse detalhe, que a primeira vez que eu botei uma camisa esporte assim, em Petrópolis, tomei um bonde, havia bonde em Petrópolis naquele tempo, e encontrei minha irmã, com que eu não morava com ela e ela me viu sem paletó, disse assim: J., você parece um açougueiro! (risos) Agora hoje é o contrário, né, todo mundo usa, quem usar paletó é que é, é que está esquisito, né? Em matéria de roupa o que eu posso lhe dizer é isso, né?
D
 Mas, eh, para aquisição (sup.)
L
 (sup.) Para aquisição (sup.)
D
 (sup.) de roupa naquela época?
L
 Naquela época a gente mandava fazer roupa em alfaiate, não é? É London-Taylor ainda existe hoje, era o alfaiate que eu mandava fazer roupas. Uma roupa muito cara, muito boa, custava quinhentos, quinhentos mil réis, naquele tempo, que hoje é cinqüenta centavos, não é? Sapato usava-se, se você quiser saber, usava-se botina, botina de verniz embaixo e fingindo de polaina em cima. Posso lhe dizer também que a melhor botina, mais cara do Rio de Janeiro, custava vinte e um cruzeiros, na casa Clark, no largo do Machado (riso/inint.) coisa interessante, né?
D
 Mas era diferente também, por exemplo, além da aquisição, os cuidados?
L
 Bom, os cuidados acontece o seguinte, minha filha, eu cortei relações com meu pai, esse é um detalhe interessante, né, pouco tempo depois de, dele enviuvar, quando ele quis casar a segunda vez, não pelo fato de casar a segunda vez, mas pelo modo pelo qual ele quis se casar e as pessoas com quem ele queria se casar, eu cortei relações com ele e a família toda. Vivi então durante, seguramente, posso dizer, sete anos, morando sozinho, sem família, separado completamente. Nem, nem visitava nenhum membro da família. Então os cuidados que eu podia ter, o que era? Lavanderia mesmo, né, não tinha quem cuidasse de mim, de minha roupa propriamente, né, a não ser depois que casei e que a senhora então passou a tratar desses fatos.
D
 Mas aí, como é que era?
L
 Como é que era? Bom, no princípio havia, eh, lavadeira em casa, né? A gente tinha empregados, entre os empregados tinha uma especial que era a lavadeira. Aliás no tempo de minha mãe a gente tinha cozinheira, arrumadeira e lavadeira, não é? Uma lavadeira especial. Morava-se em casa, não era apartamento, tinha terreno grande, tinha chacareiro. Ainda tinha o chacareiro. Era uma, uma turma de empregados, não é? Tinha a cozinheira, tinha a arrumadeira, tinha a, a, a lavadeira e tinha o chacareiro, não é, naquele tempo.
D
 O que que ela fazia?
L
 Ô, cada uma delas o nome está dizendo o que que cada uma (riso/sup.)
D
 (sup.) Eu, eu gostaria de saber como é que era cuidada a roupa pela lavadeira, na época (sup.)
L
 (sup.) Ah! (sup.)
D
 (sup.) Não só a roupa, por exemplo, do senhor, mas toda a roupa.
L
 A roupa de casa toda era cuidada por ela, lavada em casa no tanque de roupa, com água e sabão, depois naturalmente usava-se muita goma naquele tempo, não é, tinha muita roupa engomada, as senhoras usavam aquelas saias de baixo engomadas, não é, que hoje se usa só pra, pra festa, pra armar a saia de cima, né? E os homens era a roupa comum, colarinho e gravata mesmo, eh, quer dizer, era punho e, e colarinho separados e engomados, como eu lhe disse, né? No mais, era a mesma coisa de hoje.
D
 E, ah, o senhor acha que há mais diferenças (sup.)
L
 (sup.) Bom, hoje está tudo muito simplificado, né?
D
 Como é que é hoje?
L
 Hoje está simplificado demais, não é, porque quase não se usa roupa, não é? (risos) Essa é que é a verdade.
D
 Mas o senhor está aí vestido, né? (sup.)
L
 (sup.) Eu estou (sup.)
D
 (sup.) O senhor podia dizer, podia dizer como é que o senhor está vestido.
L
 Bom, eu estou vestido porque talvez o, os outros caçoasssem de mim, não é?
D
 Mas como? O que que o senhor está usando?
L
 Eu estou usando, estou usando calça, nunca usei bermuda, nunca usei calça curta, mesmo nas férias, não me habituo. Fazem caçoada quando eu estou em Teresópolis: por que que não usa uma calça curta, uma bermuda? Não é vergonha de mostrar as pernas, não, mas é a falta, é falta do hábito, né? Nunca usei. Nunca deixei de usar meia e sapato. Nunca andei descalço na minha vida, nem em tempo de criança. Meu pai não consentia, não é, não consentia que se andasse descalço e então sempre usei sapato, usei meia, cueca e roupa de ... Calça comprida, não é? E agora, de alguns anos pra cá estou usando esses blusões em vez de paletó. Raramente ponho um paletó, só quando eu vou à cidade. Tanto que quando minha netinha está aqui, a M., não é, a M., filha do A.: vovô, você está bonito, heim! (riso) Quando boto um colarinho e gravata ela me acha diferente hoje, porque hoje normalmente a gente usa é isto, não é? Não se usa chapéu mais, chapéu foi abandonado.
D
 O senhor já usou, usou chapéu?
L
 Usei, usei. No meu tempo de estudante de, de, de, de Direito, como lhe disse, usava fraque e chapéu-coco, igual ao do Carlito, não é? Depois passou-se a usar chapéu de palha, como o, o que usam hoje esses, esses tocadores de música aí, tocam na, na palhinha, não é? Usava-se muito. Tenho retrato tirado na avenida Rio Branco, a gente passava, aqueles instantâneos, com retrato de chapéu de palhinha. Roupa branca, usava-se muito, não é, era elegante, um, um jaquetão de roupa branca, linho cento e vinte.
D
 Ah, isso é uma coisa importante: os tecidos são diferentes, não são? (sup.)
L
 (sup.) Ah. Inteiramente diferentes. Que hoje é tudo sintético, né? Esta calça é sintética, esta blusa é sintética, não é, é tudo sintética. Quer dizer, a roupa fina naquele tempo, de homem, era linho, não é? E os estrangeiros ficavam aqui muito espantados, porque eles não admitiam roupa branca na Europa, não é, e quando eles viam um brasileiro de roupa branca, eles diziam logo: olhe, aquilo é, é como se diz hoje, cafona, né? É lá "de là-bas, des pays de là-bas", o país lá de baixo da, é Argentina, é brasileiro. Na Europa não se usava, hoje está se usando, não é? Mas naquele tempo não se usava roupa branca, usualmente nós brasileiros usávamos roupa branca de linho, mas linho verdadeiro, não é, linho puro, não era sintético. E as mulheres só faziam questão de seda, né, a seda pura, seda japonesa ou seda chinesa, né, no máximo seda italiana, quando o mais, mais, mais barato era a seda italiana, não é? Hoje, quem é que vai usar seda, não é? A seda pura está por um preço pavoroso, né, de modo que passou-se a usar depois, aí entrou a moda do algodão. No Brasil se desenvolveu muito a indústria do algodão e a fa... há muita fazenda de algodão, hoje, não é? Algodão, hoje o Brasil está exportando fazenda de algodão para o estrangeiro e com grande nome, grande fama, né, porque temos, de fato, neste ponto um setor desen... O Brasil tem progredido muito, né, setor de, de têxteis, né, está se exportando, eh, `Bangü', como diz o pessoal. (riso) Em vez de Bangu, eles dizem `Bangü' pra ser mais elegante, não é (riso/inint.) para o estrangeiro.
D
 Agora em termos assim do tipo de tecido usado pra, pras roupas masculinas.
L
 Bom, roupa masculina, naquele tempo, por exemplo, não se admitia que um homem usasse camisa a não ser branca, né? Hoje se usa camisa de todas as cores, mesmo nessas festas elegantes, aí na alta sociedade, se vai de camisa azul, camisa vermelha, camisa amarela. Depois da televisão a cores então é um espalhafato, né, porque ninguém vai à televisão a não ser com fanta... com as cores mais berrantes, pra poder aparecer na, na televisão a cores direito, né? Mas, eh, antigamente era só roupa, eh, camisa branca. O homem só usava camisa branca, colarinho branco, gra... as gravatas eram sóbrias, né, não eram como essas gravatas muito estampada. Hoje a gente usa roupa assim de, de blusão só, não é, e, e estampados. Eu não uso os estampados vivos aí, que a rapaziada usa, naturalmente, né, porque a gente é velho, tem o senso do ridículo, não é?
D
 E seus netos, quando eles aparecem aqui como é que eles estão vestidos (sup.)
L
 (sup.) Ah, meus netos, meus netos tem uns que se vestem das maneiras mais estapafúrdias do mundo, é, né? Quer dizer, é desses que compram calça e mandam desbotar de propósito, mandam rasgar na aba, ahã, de (inint.) de propósito, pra parecer velho, né? Porque o bonito agora é usar roupa velha. Naquele tempo ninguém usa... saía com uma calça desbotada. Hoje, se não compra já desbotada, manda desbotar de propósito, não é, também e manda desfiar a bainha da, das calças, né? E as blusa mais estapafúrdia, sobretudo os que são mais ricos, mais abonados, fazem questão de camisa estrangeira, sapato estrangeiro. Eh, eh, eh, o meu neto usa por exemplo, não é, aquilo que nós chamamos de tênis, mas é tênis estrangeiro, tênis francês, né, tênis americano, né? As roupas têm que ter uns dísticos ou uns letreiros sempre que mostrem que, que o indivíduo finge que é das faculdades lá dos Estados Unidos, ou então tem caretas, caras, estas coisas estapafúrdias, malucas completamente. É a loucura da época.
D
 E o tecido?
L
 Ah, o tecido como uma ... O tecido deles? Eu nem sei. Esse tecido deles é, é sintético quase tudo, não é? [(sup./voz de mulher) Suedine, sei lá.]
D
 E assim na, na roupa das mulheres, o senhor nota que houve muita (ruído) diferença ou é a mesma coisa, como é que é? (ruído)
L
 Bom, na roupa das mulheres, eh, a evolução tem sido naturalmente, como quase em tudo na vida, cíclica, né?
D
 Hum, hum.
L
 Evolui tudo prum lado, modifica tudo, não se usa mais o que se usava à antiga, as saias, as saias passaram a ser curtas, depois mais do que curtas, minissaias, não é? Agora está fazendo o que se chama de nostalgia. Nostalgia como sinônimo de saudade. Quer dizer, voltando para a calça, para a, a, a, a saia que já vem abaixo do joelho, né, tem um nome francês aí, não sei bem como é, né, e ali ... A minha neta, minha neta, com dezessete anos de idade vai pra, vai pras festas, vai pra uma reunião com um vestido comprido, arrastando nos pés. Isso há cinco anos atrás era impossível. Era um ridículo. Agora hoje está se usando, não é? Eh, esses ridículos, não é, porque é ridículo, e pro nosso clima é antiestético e é anti-higiênico, não é, essas saias compridas até o chão, vocês me desculpem, vocês naturalmente usam também, mas a verdade é esta, né? Do ponto de vista médico, é a falta de higiene, até.
D
 E antigamente, a sua mãe e a sua avó usavam vestidos mais curtos ou usavam (sup./inint.)
L
 (sup.) Usavam. Não, não, no tempo da minha mãe já não se usava vestido até os pés, usava-se abaixo do joelho, não é, digamos no meio, meio da canela, não é, usavam no meio da canela. Mas não se usava nem, nem curto, acima do joelho, nem, nem ninguém pensaria, né? Ninguém saía também a não ser de sapato. Você quer saber, outra coisa então muito interessante é isso: tinha que ter sapato. Mas sapato verdadeiro. Hoje ninguém mais usa sapato, né? Usa chinelo, usa tamanco, sai batendo tamanco na rua do Ouvidor, procotó, procotó, procotó, procotó, não é? Antigamente isso era, seria uma vergonha, né? Eu fui do tempo em que quando uma pessoa ia, ia lá em casa, ouvia coisas dessas, né, no tempo que eu era criança: fulana foi visitar sicrana, não é, chegou lá, imagina que ela estava em casa de sapato sem meia, de chinelo, de chinelo sem meia! Sem meia não era um, uma vergonha, era um escândalo, não é? Hoje raras mulheres usam meia, não é, e o que eles chamavam antigamente chinelo é o que se usa hoje, é alpercata, hoje chama, mudou o nome só, é alpercata, né?
D
 E o senhor já viu esses sapatos últimos que as mulheres estão usando?
L
 É uma coisa pavorosa, a minha neta usa cada salto de quatro, cinco centímetros, olha aí, de cortiça, né, de cortiça ou de lona ou de, ou de, ou de corda, né, que antigamente era considerada a, a coisa mais ordinária possível. (riso) Hoje é moda. Agora moda evolui, né, vai e volta, vai e volta, vai e volta. Jóias antigamente só se usavam jóias naturais, não é, ninguém usava uma fantasia. Quando usava-se uma fantasia qualquer era: ih, fulana, aquele colar era 'sloper'. Sloper era uma casa antiga no Rio, especializada em fantasias, não é? Até hoje existe, não é? Mas `sloper' era um nome genérico que se dava a qualquer, a qualquer (riso) fantasia, né? Hoje o que se usa mais, o que se tem quase é só fantasia. Inclusive as mulheres da alta sociedade, eu tenho lido aí nos jornais, que com medo de serem roubadas, deixam em casa os seus colares de pérola verdadeira e de brilhante verdadeiro e vão com fantasias pras festas, não é? E todo mundo olha e ninguém diz que é fantasia, porque também as fantasias hoje são muito aperfeiçoadas, muito, eh, se apresentam muito bem, né? Brincos, não é, fosse uma mulher antigamente usar brincos compridos, né, hoje está se usando pendurados, enormes, vêm até quase que o, o ombro, (riso) né? Antigamente não, era uma coisa discreta, era uma pérola, era um brilhante, não é? Normalmente era grudado no lóbulo da orelha, orelha furada, né, orelha furada. Estou procurando lembrar coisas antigas, que você está querendo, né? Hoje (sup.)
D
 (sup.) Mas não é tão antigo assim não (riso/sup.)
L
 (sup.) Nem me lembrava mais. Ainda tem uso, ainda usa orelha furada?
D
 Tem.
L
 É. Pois é, antigamente algumas mulheres só usavam orelha furada, né? Agora, é tarraxa, man... machuca muitas vezes, não é? E tem o seguinte, não é, a, a, antigamente eram só jóias muito finas, só brilhantes, que se usava, né, rubi verdadeiro, esmeralda verdadeira, hoje não. Já eu sou contra jóias. Nem aliança não uso. Em parte eu me habituei com meu pai, que quando moço trabalhava em laboratório de química e deixou cair mercúrio na aliança, estragou. Ele então ficou com receio, passou a usar a aliança pendurada na corrente de relógio. Que também você reparou, não uso relógio de pulso, nunca me habituei, suo, machuca, né, uso este relógio tem cinqüenta anos comigo, não é? De modo que só uso corrente. Mas não uso, nem anel, nunca usei. Quando, quando me formei em Direito, já era, já dava aula pros estudantes de medicina, me presentearam com um anel de advogado. Eu devolvi, pra grande escândalo dos rapazes. Não aceitei, não quis. Quando me formei em medicina, quiseram me dar anel de médico, também não aceitei. Quando meu pai morreu, deixou o anel de médico dele, dei pra minha senhora, ela mandou adaptar pra ela usar. Eu não uso jóia nenhuma, nenhuma, nenhuma, nenhuma. Tenho horror de homem com ... Homem de anel! Tenho horror. Detesto, sabe? É velhice não é, é cafonice, mas detesto.
D
 E esses acessórios que (sup.)
L
 (sup.) Ah, isso então nem se fala. Nunca usei alfinete de gravata, nunca usei aliança, nunca usei, nunca usei anel de ... Se eu fosse usar, tinha que usar os dois, né? No meu tempo de estudante havia aqui um, um senhor que era, era advogado e médico. Então ele usava anel de rubi e de esmeralda. Os bondes naquele tempo tinham um letreirozinho de cada cor pras pessoas que não sabiam ler aprender. Era Vila Isabel-Engenho Novo era vermelho e verde. Então esse médico ficou com o apelido de doutor Vila Isabel-Engenho Novo (risos) por causa do anel de rubi e esmeraldas. (risos)
D
 Agora, uma outra coisa que me interessava assim em termos de coisa por exemplo, era cabelo. O tipo de, sobretudo das mulheres.
L
 Bom, as mulheres antigamen... no meu tempo, no meu tempo de rapaz e moço sempre usavam o cabelo comprido, não é, as se... as mulheres não cortavam o cabelo, não é? Absolutamente não cortavam. Hoje estão cortando muito ou pouco e estão usando o que eu, é outra cafonice da minha parte, tenho horror, verdadeiro horror daquilo que chamam de peruca, não é? Antigamente se dizia cabelo postiço, dente postiço, cabelo postiço, jóia postiça. A palavra postiço antigamente era sinônimo de coisa horrorosa, não é, e a peruca era cabelo postiço, então não se tolerava nenhuma mulher que usasse cabelo postiço, né? A, a maquiagem também, não é? Hoje as mulheres se pintam de uma maneira que parece carnaval, não é? Vocês eu posso falar porque não estão assim, não é? Mas a minha senhora mesmo, minha filha, minha neta, minha nora, de vez em quando aparecem aqui: mas vocês têm a coragem de ir pra rua com esse negócio de branco aqui em cima da pálpebra, parece mascarado, não é? Já houve alguém que disse que as mulheres hoje fazem fantasia de carnaval o ano inteiro e no carnaval se despem.
D
 Ah, isso é que eu gostaria de saber. Já que o senhor falou nisso, toda assim uma evolução de trajes usados pra banho de mar, pra (sup.)
L
 (sup.) Minha filha, quando eu tinha, eu morei na rua Barão de Flamengo, eu era criança, onde hoje tem um edifício na esquina da Praia do Flamengo era um balneário. O mar vinha até ali, até a rua, a tal rua do Flamengo, ali, bem na esquina ali, o mar vinha até ali. Então um médico indicou que nós devíamos tomar banho de mar lá na rua Barão de Flamengo, pertinho do mar. E nós íamos até o mar, eu, minhas irmãs e uma minha tia. As mulheres usavam naquele tempo a calça comprida pra ir ao banho de mar, até o tornozelo. Até o tornozelo, não mostravam perna não. De jeito nenhum, não é? A fantasia de car... de, de, de, de, pra banho de mar era assim. Os homens também usavam umas calças que até hoje ainda usam, fazem aqualouco, não é, até o joelho, pelo menos, não é? Íamos então, entrávamos no banho de mar ali, com muito medo, muito receio. Havia o banhista, naquele tempo havia a figura do banhista que não existe hoje mais. O banhista era pago por mês pra ficar esperando as famílias que chegavam. Então fazia uma rodinha ali dentro do mar, as crianças seguravam, davam a mão uns aos outros ou às senhoras e ficavam. Agora mergulha um bocadinho! A gente mergulhava até, até, (riso) até o ombro, até o ombro e voltava outra vez, mais nada, né? Depois começou a se usar, os homens começaram a usar a roupa sem, sem a camisa (inint.) antigamente o homem, o rapaz também usava a ... Não usava só calção como hoje, né? Agora, os homens tiraram a camisa, usam umas, umas, uns calções muito curtos e a mulher fez mais do que isso, né, porque usa a tanga que o próprio homem não usa. As tangas que as mulheres usam hoje são menores ainda, né? São menores do que as que os homens usam. Hoje é, é, é a nudez completa, né, qual a roupa ...
D
 Agora, houve uma fase assim que a gente podia considerar intermediária.
L
 É, houve uma fase intermediária, a fase do maiô, a fase do biquíni, não é? Eu fui ainda do tempo, aliás não é muito longe, em que meu filho, o A., que era presidente do clube do Ingá, lá em Teresópolis, era proibido senhoras freqüentarem o clube de biquíni. Hoje a própria senhora dele vai, não é, a própria senhora do presidente vai de biquíni, todo mundo vai. De biquíni é modo de dizer, é menos do que biquíni, hoje é, é, é uma, é uma tirinha aqui, a, a, à guisa de, de sutiã, que nem chega a ser sutiã, não é? Não chega a ser um porta-seio, não abraça o seio, é, é uma tirinha apenas pra esconder o bico do seio, né, e a tanga ficou reduzida a uma expressão de ... Eu acho ho... ho... um (inint.) horrível, horroroso. Eu sou homem, devia gostar, né, de ver, mas não gosto, não gosto não. Me, me causa, me causa assim um certo asco. Eu lhe digo com franqueza, se eu fosse delegado e as mulheres fossem prum baile no Municipal com essas tangas que elas vão, eu dizia: tira tudo e entra! (riso) É mais decente do que com isso, né? Como essas moças de capa de, de Manchete, assim uma moça de calça, puxando a calça pra baixo até perto do (inint.) por que que não tira de uma vez, quer mostrar, mostra, não é, mas não faz fita, né? Eu acho que hoje se faz muita fita nessa, nesse ponto, né? Eu tenho, tenho um ... Acho muito horripilante, eu acho que a mu... a mulher se de... se deprecia muito, não é? Um campo de nudez eu já não digo, né? É, é, é uma seita, é uma religião, como, como os índios têm, há, há campos de nudez, o indivíduo vai pra lá, todo mundo está nu e, e perde a noção até de sexo e de, e de feminilidade ou de masculinidade, porque é tudo ali igual, não é? Mas fora do lugar apropriado para a nudez, a nudez é indecente.
D
 Agora uma outra coisa também, nesse aspecto, que me parece bem interessante, inclusive eu de certa forma cheguei a acompanhar uma parte, é a evolução assim da roupa íntima, tanto masculina quanto feminina, sobretudo da feminina, né, como mudou! (sup.)
L
 (sup.) É, bom. É, as, as, as coisas hoje que nós chamamos de cueca do homem antigamente chamavam ceroulas e iam até o tornozelo. Iam até o tornozelo. A ceroula do homem ia até o tornozelo, não é? Calça comprida e ceroula até o tornozelo, não é? Ao passo que hoje não, hoje é, é curtíssima e os homens até estão usando também cuecas de, coloridas, não é, e, e de ramagens. (riso) Meus netos têm, meus netos têm umas cuequinhas aí de ... Cheias de ramagens, de flores, de coisas, né? Antigamente isso era falta de femini... de masculinidade, né?
D
 E as mulheres?
L
 Em matéria de rou... de roupa íntima? Bom, isso eu pouco, pouco conheço, não é? Pouco conheço. Elas diziam, há pouco tempo diziam que estavam abandonando o sutiã, né? Mas parece que já esteve mais na moda abandonar o sutiã, porque ele está voltando outra vez, né? Que nem todas as mulheres podem mostrar os seios impunemente, né? É, eu acho que é isso, né? Umas têm seios bonitos, fazem questão de mostrar, mostram, né? Há outras que é tão feio que preferem usar o sutiã, não é, pra esconder ou para, ou para empinar, pelo menos, né?
D
 Mas pelo menos assim houve épocas em que os hábitos em relação a essas roupas íntimas femininas eram muito mais rígidos, né?
L
 Olha, ne... nesse ponto eu acho que a evolução foi pequena. A mulher sempre usou o quê? Apenas usava mais uma saia, digamos assim. Antigamente não havia nenhuma mulher que pusesse um vestido em cima do corpo, né? Tinha o que chamavam de saia branca e hoje se chama de anágua, né, anágua. Antigamente toda mulher tinha a sua, tinha saia branca e quando ia pras festas usava duas, três, quatro, uma em cima da outra, pra armar, não é? Hoje elas armam com um arame, não é, quando, quando querem fazer uma, uma, uma, uma solenidade maior, mas geralmente fazem mais questão é de tirar, não é, não de botar, não é? [(falas com circunstantes) Que foi meu bem? Que que você quer? Heim? Meu copo? Acho que já levou. (Quer mais água?)] Mas acho que em matéria de roupas íntimas o mais é o sutiã mesmo, né, a ca... a calça, não é, que naturalmente hoje são ... As mulheres usam calça de renda, né, calças de ...
D
 E como é que era antes?
L
 Antes, antes não, antigamente era a calça opaca, calça de, de, calça de fazenda, já me esqueci da palavra, né? Hoje é uma fantasia de calça, não é uma, não é uma, pra não dizer que não usa (sup./inint.)
D
 (sup.) Agora o homem também deixou de usar uma série de coisas que ele antigamente usava, não? Por exemplo as calças masculinas hoje, eh, não precisam de, de ...
L
 De alça?
D
 De alça, porque (sup.)
L
 (sup.) É, mas eu tenho.
D
 É, o senhor ainda está usando, né, mas (sup.)
L
 (sup.) Há, há, há pessoas que não usam, não é, a própria calça serve pra, para prender. Aliás, agora estão usando, não pense que não. Ainda ontem eu lia no jornal, né, que uma das coisas, um dos vícios que eu tenho é ler jornal, né, e um dos jornais ainda, ainda dizia e aliás na televisão também, que agora os homens estão usando, mudaram tanto as, as calças que a calça em cima é apertada demais e em baixo voltou boca-de-sino, não é, o marinheiro Popeye, não é, e então ele dizia, vinha um comentário no jornal dizendo que os médicos estavam dizendo que essas calça apertadas dos homens tiram masculinidade. Tiram, mas é no sentido da palavra porque apertam demais, apertam inclusive os orgãos sexuais. Então lá um dizia: as mulheres felizmente não, não, não têm esse mesmo perigo, podem usar as, as saias bem apertadas, não é, porque hoje estão usando outra vez, bem apertadas ou então é umbigo de fora, que antigamente ninguém pensava nisso, né? Hoje a gente vai pra rua e está tudo quanto é moça aí de, de umbigo de fora, né?
D
 É como o senhor falou, todo mundo usando paletó e, e andando de terno, então havia também outro tipo de, de acessório que geralmente talvez não (sup.)
L
 (sup.) Colete (sup.)
D
 (sup.) Colete e (sup.)
L
 (sup.) Minha filha, é colete, talvez. Não havia ninguém ... Olha, tanto que se chama até hoje, se diz com... comprei um terno. Terno era calça, colete e paletó, não é? O colete hoje só os grandes grã-finos é que usam, né? Eu não tenho mais roupa de colete, a não ser o 'smoking' né, que vai com o 'smoking', com a casaca, pra festa, pra solenidade, fora isto ninguém, os homens hoje não usam mais colete, né, a não ser alguns elegantes que podem fazer questão, aí, na alta sociedade, vão de colete, né? De forma que o colete foi abandonado, porque no nosso clima de ar é mais uma peça, não é, pra esquentar, pra, pra aquecer o corpo, pra dificultar a respiração e que não tem utilidade.
D
 Mas havia também, por exemplo, em vez de cinto, eu acho, as calças eram seguras com aqueles (sup.)
L
 (sup.) Suspensórios.
D
 É?
L
 É.
D
 E isso o senhor chegou a usar?
L
 Cheguei e tenho.
D
 Como é que é?
L
 Quer ver?
D
 Não, eu quero que o senhor descreva. (risos)
L
 Os suspensórios eram duas tiras de, de, de, de fita, digamos assim, fitas em geral de gorgorão de seda, né, que na frente, não é, abotoavam em, nas, nas, nas, em, nas, nos botões da calça, na frente, não é, de cada lado, e atrás num só, né? Quem usa, quem usa calça muito apertada, não precisa, mas eu tenho, por exemplo, algumas calças, onde eu vou a algumas solenidades à antiga, eu diminuí muito de, de peso, não é, se eu não usar, ou tem que apertar demais o cinto ou então tem que usar o suspensório. Agora o suspensório fica oculto pelo paletó, não se nota. Antigamente ficava mais oculto porque ficava debaixo do colete, né? Agora tem só o paletó, né, pra ocultar. Mas é muito raro usar suspensório hoje, né?
D
 Mas antigamente era ...
L
 Antigamente era, era (sup.)
D
 (sup.) Freqüente.
L
 Freqüente, porque antigamente o próprio cinto os, os homens geralmente pouco usavam, não é, pouco usavam o cinto, era só o suspensório pra prender as calças e não precisava de cinto.
D
 É, eu me lembro, por exemplo, de épocas que as meias, os homens também prendiam (sup.)
L
 (sup.) Ah, as liga, liga. Eu por exemplo cheguei a usar. Eu usava liga, né, até liga pra prender a... aqui, apertava aqui de elástico e prendia numa alça, aqui, assim. Mas prendia muito a circulação, não é? Eu me recordo, está aí um fato interessante, que ainda era recém-formado, era médico já, mas comecei a ter os pés inchados e fiquei impressionado. Quando a gente é moço, passa a lidar com a medicina, começa a descobrir uma porção de coisas. Pé inchado é sinal de doença cardíaca e tal. E fui ao Miguel Couto, ao grande professor Miguel Couto, grande mestre, né? Quando cheguei lá ele perguntou: o que é, P.? Eu disse: eu vim aqui porque estou de pés inchados, não sei se estou com alguma doença de coração. Ele caiu na gargalhada, caiu na gargalhada e disse: deixa eu ver esta perna. (riso) E depois: arranca esta porcaria desta, destas, desta, desta liga, joga isto fora e não use mais que você não tem mais pés inchados. Nunca mais eu tive realmente, agora não uso. As mulheres também, né, usavam a meia comprida, não é, até acima do joelho e do, do espartilho, não é, pra modelar o corpo, as mulheres todas usavam espartilho com barbatana, não é, pra estufar mais o seio e, e apertar a, a cintura, não é, e então daí do espartilho vi... vinham alças pra prender a, a beirada das, das, das meias, não é, compridas, né? Agora hoje as mulheres usam meias de um tecido tal que basta dobrar em cima que já, já prende, já segura, não precisa geralmente de, de, de liga, né? Algumas usam cinta, não é, e a cinta tem, prende na liga também, pelo que me parece, que eu vejo aí a senhora usar, né?
D
 Agora uma outra coisa também interessante é que as roupas de, de ficar em casa ...
L
 Bom, as mulheres usavam antigamente uma peça que hoje não usam mais, chamava-se `matinée'. O nome está dizendo: matina, né, `matinée'. Era uma blusa larga, não é, sem ... Que ficava, caía por cima da, da, da saia, né? Hoje geralmente as blusas se metem por dentro da saia. Naquele tempo o `matinée' era solto, então dava maior liberdade de movimento, né? Ela usava o sutiã e a `matinée' por cima, geralmente de renda, brancas, de renda ou então bordadas a mão, não é, eram coisa de luxo, não é? Eram, de... dependia da, do tipo de sociedade que a pessoa freqüentava, não é, do, do meio de vida, das posses, né? As mulheres as mais, mais, mais pobres usavam qualquer `matinée', mulheres mais ricas usavam `matinées' rendados e bordado, não é, bordado da ilha da Madeira, né? Vinha da ilha da Madeira em bordados especiais. Agora, tudo varia.
D
 Pros homens, também. Eu me lembro que o meu avô tinha uma espécie assim (sup.)
L
 (sup) Ah, de roupa de banho, de, de, de roupão pra ir pro banheiro.
D
 Não, não. Quando ele ficava em casa, que ele não ia sair, não é ... Tinha uma, uma espécie assim de ... Que seria uma roupa mais à vontade, também era assim branca, feita de qualquer coisa parecendo, eh, não era linho, mas seria um tecido tipo cáqui, ou qualquer coisa dessas, com ...
L
 Alpaca.
D
 Alpaca.
L
 Bom, usava-se paletó de alpaca. Meu pai, que era professor na faculdade de Medicina e homem muito austero, desse tempo antigo, ele só usava fraque, não é, ele só usava fraque. Só daria aula na faculdade de Medicina de fraque, né, e, e chapéu, não é? Geralmente era um chapéu-coco ou então um chapéu 'gelot' como o Negrão de Lima ainda tem, não é, chapéu mole e de feltro, não é, 'gelot'. O dia em que meu pai pela primeira vez saiu com um paletó-saco, como se diz hoje, né, porque antigamente ou era o fraque ou era o traspassado que era o jaquetão. O fra... o paletó -saco, chamado, esse tem uma fileira de botão só na frente, que é o comum hoje, né? O dia que meu pai saiu pela primeira vez com um paletó-saco e de alpaca preta, brilhante, brilhosa, foi um escândalo na família: ih, papai com paletó-saco na rua! Era escandaloso, era isso, era um paletó, porque antigamente usava era em casa, né, o paletó-saco era só em casa.
D
 É, eu me lembro que o meu avô tinha uma coisa assim de gola, de gola alta, assim durinha, com duas carreiras de, de coisa, que traspassava também, abotoado assim, que ele usava por cima da calça. Não me lembro exatamente como é que era. Agora, e pra dormir? Roupa de, de (sup.)
L
 (sup.) Ah, pra dormir é pijama. O homem sempre usou pijama. As mulheres é que não usavam, né? As mulheres usavam camisola, né, camisola comprida, geralmente muito bonitas, de renda, enfeitada, usavam camisola comprida. Depois é que veio a moda do 'baby doll', não é, que é, que é curtinha, né, ele é, quase que não, não, não é mais camisola. Agora pro nosso clima é muito mais leve, né? E o homem também passou, muitos usam pijama de, de calça curta. Eu não uso.
D
 Mesmo no calor?
L
 Mesmo no calor. Mesmo no calor eu não uso e, e não sei andar sem meia também, nem pra dormir com o maior calor possível. Tenho que dormir de meia. (riso) É um detalhe ridículo (inint.) eu me habituei, como eu lhe disse, meu pai não deixava a gente andar descalço, não é, era feio andar descalço. Eu, quando tive meu sitiozinho aqui em Teresópolis, que ia tomar banho de rio, ou mesmo em Copacabana pra tomar banho de mar, você acredita que eu nunca pude ir descalço à praia? Tinha que ir de tênis, pelo menos de tênis, pra entrar dentro dágua de tênis, porque a sola do meu pé é mais fina que a da mão. Eu não sei andar descalço nem em casa, nem em casa, eu fico espanta... E os netos às vezes fazem caçoada, não é, e eu fico meio horrorizado e de tal modo horrorizado, que a gente tem certos complexos fixos, não é, e eu me habituei de tal modo a ver todo mundo calçado e só via meninos descalços, que a gente chamava naquele tempo moleque, não é, que quando eu vejo uma, quando eu vejo uma menina, uma moça descalça, me causa uma irritação, me causa um mal-estar que não calculo, é engraçado! Não posso ver mulher descalça, acho ... Passam aqui, pra ir pra praia. Olha que agora já se usa muito menos o andar descalço, mesmo os moleques estão desaparecendo, porque com essa moda da, da, da, da alpercata, não é, alpercata agora é de homem, nesse ponto é um grande progresso, não é? Antigamente eles só andavam, homem des... homem, homens descalços na avenida, no Rio, em toda parte, né, o número de gente descalça no Rio era imenso, antigamente, não é? Sapato era caro, eles não tinham dinheiro pra comprar sapato, andavam descalços, não é? De modo que era muito comum, coisa que a gente nota, quem é velho como eu, que diminuiu muito no Rio o número, o nome, o número de pretos diminuiu fantasticamente e o número de gente, de homens descalços. Hoje é, hoje até, eh, o indivíduo que vive de esmola na rua usa uma alpercata. Os meninos descalços a gente só vê na feira, alguns, esses que são carregadores, assim mesmo muito poucos, que eles também usam alpercatas, porque a alpercata é, é, é baratíssima, não é? Há alpercata de todos os preços, mas de modo geral é um sapato, é um calçado barato, não é, e protege pelo menos a sola do pé, que aqui com o asfalto pelando, quente, com o nosso clima, não é, andar descalço eu não sei nem como é que é, como essa gente agüenta.
D
 Agora o tipo de sapato de homem, de calçado em geral, também evoluiu, mudou, né? (sup.)
L
 (sup.) Mudou. Evoluiu, evoluiu, não é? Porque antigamente todo sapato ou era de amarrar ou era de, de abotoar, não é? Usavam uns botões, a gente tinha até um, um, um, um instrumento especial pra puxar o botão pra dentro da, da, da, alça, da, da, da, do botão, do sapato, né? Hoje se usa muito isto, é mais barato do que sapato, tipo alpercata, né, eu uso em casa também só, na rua, não.
D
 Agora uma outra coisa que me interessava também era o tipo assim de diferenças assim de roupa, por exemplo, pra tempo de chuva, pra tempo mais frio.
L
 Bom, antigamente usava-se muito o, o, o, chamava-se de, de, de sobretudo, né? Os homens usavam sobretudo, não é, que era uma ... Colocava-se por cima do paletó, gravata e tudo mais o sobretudo, que era uma, um paletó traspassado na frente também e bem comprido, não é, de modo que protegia bem. Naquele tempo não havia, não havia as, as, a borracha, não é, que hoje se usa, não é, as capas de borracha, não havia naquele tempo, né? Agora os homens usavam sobretudo e o guarda-chuva, não é? E nos dias de muito sol, no Rio de Janeiro, mesmo o homem antigamente usava sombrinha. Eu mesmo eu peguei o tempo do homem usando sombrinha, mas sombrinha creme, não é? Apenas creme.
D
 Era diferente do guarda-chuva?
L
 Era diferente do guarda-chuva. O guarda-chuva era preto, não é? A sombrinha era igual, exatamente igual mas era, era creme, não é? De uma fazenda mais leve, não é, pra dias de sol, não é? Agora, ah, hoje o sobretudo foi substituído pela capa, muito mais prática, a gente dobra até e bota dentro da pasta, não é, pra carregar, pra, pra usar. Os guarda-chuva antigamente eram enormes, hoje há até guarda-chuva pequenino, que a gente leva dentro da, dentro da saca, dentro da (inint.) são progressos, né?
D
 E também diferenças assim na, nos objetos usados, por exemplo, pra carregar dinheiro e ...
L
 Todo mundo usava níquel, não havia ninguém que não tivesse seu porta-níqueis, né? Porta-níqueis e moedas. Agora, era impossível que um homem antigamente usasse a, essas, essas, essas bolsinhas que hoje estão usando.(riso) Isso, antigamente, se aparecesse um homem assim na rua, apanhava, né? (riso)
D
 E como é que era?
L
 Ah, antigamente, não, era, era, era, como se diz, a, a, o porta notas, não é, e o, o porta-documentos. E como dizia, como era o nome que chamava-se?
D
 E havia um porta-notas e um porta-documentos?
L
 Um porta-documentos, não é? Ninguém ia pra rua sem documentos, não é? E ainda hoje eu uso porta-notas e uso porta-documentos. Eu uso, ainda hoje uso, até hoje.
D
 Mas a maioria das pessoas não usa assim, usa uma ...
L
 É, hoje até usam dinheiro solto no bolso, misturado, mistura tudo, né?
D
 Tinha um lugar determinado pra guardar as coisas no próprio, na própria roupa que as pessoas usavam?
L
 Ah, tinha. No tempo do colete tinha. Era, era no bolsinho do colete que se usava o porta... porta-níqueis, não é? Era no paletó que se usava o porta... o porta-documentos, não é? Carteira, era o nome que se dava antigamente, carteira de documentos, não é, e a carteira de notas sempre ... Isso variava, muita gente usava também no paletó, e muita gente usava sempre na, na calça, como eu uso, não é, até hoje. Aliás, muito, muito perigoso, sabe? Eu já fui roubado assim, não é?
D
 E o relógio, também?
L
 O relógio antigamente só se usava relógio desse tipo, né? Isso é um relógio que tem cinqüenta, mais de cinqüenta anos comigo. Nunca atrasou nem, nem adiantou. Minha senhora na, na casa de saúde, duas vezes deu uma volta assim na mesa de cabeceira, ele caiu no chão, abriu, eu catei os ponteiros, botei no lugar, ele continuou andando, não é? Isso era um relógio, cust... custou quatrocentos mil réis naquele tempo, hoje é quarenta centavos. Todo de ouro, inclusive, inclusive o mecanismo todo de ouro.
D
 Qual é a marca dele?
L
 Esse é Internacional, é a mesma marca de Patek-Philipe, não é?
D
 Havia inclusive o Patek-Philipe com uma capa atrás, eu não sei se esse também tem (sup.)
L
 (sup.) É, esse tem, esse tem duas capas. Agora eu botei até um esparadrapo aqui. Sabe por quê? Porque o vidro quebrou e não se encontra hoje vidro direito pra esse caso, então (inint.) coloco este de plástico, mandei fazer, mas não, não segura bem, começa a prender, então eu botei aqui. Nesse tem duas capas, né, e por dentro (sup.)
D
 (sup.) Geralmente vinha o nome (sup.)
L
 (sup.) o nome da gente gravado lá dentro.
D
 E tinha lugar para botar?
L
 No, no, no tempo do colete, era no bolso do colete, não é, agora hoje a gente não usa colete, então usa nesse bolsinho aqui da frente.
D
 E o lenço, quando é que começou a ser usado?
L
 Bom, o lenço sempre se usou, né? Antigamente os homens gostavam de usar um lencinho, eh, saliente da, do, do paletó, não é, na frente. Depois caiu de moda, hoje não se usa mais. Aliás, aquele, aquele, aquele bolsinho quase ficou sem utilidade. Porque era pro lenço e pros óculos. Hoje consideram cafona as duas coisa, usar, usar lenço e usar, usar óculos ali aparecendo também. Eu uso ainda óculos ali, porque senão o bolso fica sem utilidade nenhuma. É o contrário do americano, o americano, nas roupas americanas tem bolsinho em cima, tem bolsinho dos lados, ainda tem um bolsinho pra níqueis no próprio paletó, não é? Não sei se já viram as roupa americana: tem um bolsinho especial pra níquel.
D

  Eu acho que (interrupção).