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PROJETO NURC-RJ

Tema: "A cidade e o comércio"

Inquérito 0233

Locutor 278
Sexo masculino, 41 anos de idade, pais cariocas
Profissão: advogado
Zona residencial: Sul

Data do registro: 26 de junho de 1974

Duração: 42 minutos

Som Clique aqui e ouça a narração do texto


D
 ... permitido chamar você porque acho que fica mais fácil (riso) e (sup.)
L
 (sup.) Mas é lógico! (sup.)
D
 (sup.) Ah, que você fale o que lhe ocorre, dado esse tema, e eu posso fazer uma sugestão inicial e se depois a, o papo morre eu posso fazer pergunta, S. também, e aí a gente mantém uma conversa durante quarenta minutos, não é? (sup.)
L
 (sup.) Sei, sei. Quarenta minutos?
D
 Quarenta minutos (riso/inint.) bom (inint.) vocé podia por exemplo descrever isso aqui, esse lugar onde você mora, né, e situar isso dentro da cidade do Rio de Janeiro, tá? Se isso ainda existe, por quê, por que não, e outras (sup.)
L
 (sup.) Bom, e aí, eu vou te dizer uma coisa muito interessante: eu nasci numa rua que fica nesse mesmo quarteirão, faz parte desse quarteirão, na rua Mena Barreto, uma rua ali adiante e vivi toda a minha infância na rua Visconde Silva que é a continuação da rua Mena Barreto. E nessa ocasião não havia praticamente tráfego por aqui, principalmente na rua Visconde Silva. Nós jogávamos futebol na rua Visconde Silva e ficava um dos gols numa calçada, o outro gol na outra calçada, atravessado na rua e quando passava um automóvel nós parávamos o jogo, deixávamos o automóvel passar e o jogo depois continuava. Hoje em dia eu acho que você não consegue atravessar a rua Visconde Silva, a qualquer hora do dia, a não ser no sinal, e mesmo assim tomando um certo cuidado porque há o perigo do, dos carros ultrapassarem o sinal. E eu sempre morei por aqui, é muito engraçado isso. A L., minha mulher, morava aqui nessa casinha mesmo, quando solteira. Eu a conheci aqui. Nós formávamos uma turma, isso aqui todos são conhecidos, eram todos conhecidos e a vida era bem melhor, não é? Eram aqueles casarões grandes. Eu por exemplo morava ali na rua Visconde Silva, num casarão enorme. Tínhamos galinheiro, tinha uma, uma mangueira enorme no fundo da casa. E padeiro, o açougueiro, o ... Todo mundo se conhecia, tudo vinha em casa. Um batalhão de empregados, não é? Hoje está uma coisa horrível porque com essa, com esse crescimento urbano desenfreado o, a rua Visconde Silva, como todas as ruas da cidade, estão invadidas de automóveis ou entulhadas de automóvel, o nível de barulho é brutal. As casas estão muita, muito, várias delas derrubadas. A minha antiga casa não está derrubada, felizmente. Aliás está muito bonita, foi toda reformada pelo comprador atual. Imagina, o meu pai a vendeu por oitocentos cruzeiros e foi um bom preço. Era uma casa, era uma beleza de casa. Todo o madeirame dela é de pinho-de-riga, todo o madeirame. E o meu pai não era um homem rico, meu pai era um funcionário público. Ele tinha doze filhos, você imagina, doze filhos e tinha que criar aquela garotada toda. Mas mesmo assim pôde comprar essa casa, ele comprou essa casa, essa casa própria ele depois vendeu pra esse tal, por essa fortuna (inint./riso)
D
 Você podia descrever essa casa pra gente?
L
 Ah, isso era uma casa maravilhosa! Primeiro lugar, tinha um porão habitável enorme, esse porão era cheio de mistérios prum garoto: tinha locais mais escuros, quartos de guardados, onde se encontravam coisas há muito esquecidas, tinha um enorme salão, no início, na, na frente da casa tinha um salão enorme e nesse salão tinha um, um escritório, um lugar de estar e tal, muito, muito agradável. E na parte de cima, esse tipo de casa antiga, que é na realidade um grande corredor, com quartos indo ao lado desse corredor. Mas pé-direito alto, janelas todas de grade de ferro, eh, a tábua corrida de pinho-de-riga, bandeira da porta, coisas que hoje em dia não tem mais, coisas (sup.)
D
 (sup.) Bandeira de porta?
L
 Bandeira de porta.
D
 Que é isso?
L
 Bandeira de porta é uma parte da porta s... eh, superior. Você está vendo aquilo?
D
 Hum.
L
 Bem, aquela parte superior, antigamente, em portas antigas, eh, tinha, eh, o vidro (sup.)
D
 (sup.) Tá (sup.)
L
 (sup.) Tinha o vidro pra, pra, pra, pra iluminação do, do, do, do recinto, não é? Muitas vezes vidros coloridos, que dava um ar assim de, de, de cafonice altamente simpática, né, lá, o sol batia ali, tinha um vidro colorido, não é? (riso) E essa casa era assim: no fundo da casa tinha um, um galinheiro, onde havia uma criaçãozinha de galinhas, tinha um coradouro de roupa, não é? E nós ali fazíamos no fundo do quintal muitas vezes nossas cabanas, onde simulávamos uma série de brincadeiras e ficávamos lá sozinhos, era uma delícia, uma sensação de liberdade total. Era assim a minha casa (sup.)
D
 (sup.) Nunca tiveram problema de segurança? Ou, vamos dizer, se preocupavam com isso?
L
 Não, nós não éramos preocupados com segurança e nun... Eu não me lembro de ter tido assim problema de ladrão, eu não me lembro. Eu me lembro é um problema de ladrão, mas foi em outra casa que eu morei na rua Dezenove de Fevereiro. Se você quiser que eu descreva essa casa, eu também descrevo, essa era (inint.) horrível. Essa era uma casa desagradável, porque era uma casa muito mal construída, muito mal feita, enchia, a rua enchia, a casa enchia também. (riso) Entrava água dentro dela, que era muito baixa, né? E tinha uma coisa horrível, que era um telhado em cima, ou, um telhado não, um terraço, em cima, de, de cimento armado que parecia o pátio de uma prisão, né? Aquilo era horrível! Nós moramos ali eu já era rapazinho e estava na faculdade até. Uma vez entrou um ladrão lá. Entrou um ladrão e ia entrando pela janela no quarto de meu pai e eu me lembro que foi tão engraçado, porque o meu pai espantou o ladrão: xi, passa fora (inint.) como se fizesse com um cachorro, né, (riso) e o ladrão realmente fugiu e parece que fugiu pra dentro de casa. Então nós fomos caçar o ladrão, eu e o meu irmão que estava com uma angina, um dos meus irmãos, um pouco mais velho que eu. Uma angina de, de garganta, então fraquíssimo, e ele pegou um guarda-chuva e eu peguei um cinzeiro. Felizmente não encontramos o ladrão, porque nós íamos levar uma facada, certamente. Mas não tínhamos problema de segurança.
D
 E atualmente? (sup.)
L
 (sup.) Como aliás aqui não temos. Engraçado! E aqui se explica por um motivo, não é, porque, você não sei se reparou, a divisa do, do fundo dessa vila com a Amendoeira, essa, essa, eh, oficina de automóveis enorme que tem aí. Então os muros são muito altos (inint.) não tem saída pelo fundo da vila e o ladrão que, que entrar aqui ele tem, ele corre o risco de, de, de ser encurralado, não é? De modo que nós não temos, não temos tido problema de ladrão não. Houve, uma vez, um sujeito que entrou aqui, entrou aliás na casa dum vizinho, depois fugiu por aqui e foi embora, e um vizinho aqui deu um tiro pro ar e tal e coisa. Mas nós não temos, não temos tido problema de segurança não.
D
 Problema de pressão imobiliária?
L
 Não, ninguém quer casa de vila, não é isso? Ninguém quer casa de de vila, porque casa de vila é uma casa que, que não serve pra especulação imobiliária. O sujeito pra fazer qualquer coisa em termos de, de construção, de edifícios e pra especulação, ele teria de comprar com uma porção, uma porção de gente, não é? Ele teria que, que, que negociar com vários e tem sempre aquele problema de negociar, fica um por último, um por ... Aquele que fica por último quer sempre mais, não é isso?
D
 Mas eu (sup.)
L
 (sup.) Então não, não temos tido muita pressão não.
D
 Mas esse tipo de pressão está acontecendo com o F., pintor. Saiu no O Pasquim que ele mora numa vila, eles estão forçando de toda maneira, bo... estão ameaçando botar marginais morando na vila, telefonam de madrugada pra ele, ameaçando de morte. Ele e uma outra proprietária, que não quer também vender a casa (sup.)
L
 (sup.) É na Lopes Quintas?
D
 Não, é na Prudente de Morais.
L
 É? Então deve ser um caso especial. Vai ver que, eh ... Bom, aqui, felizmente, então talvez não seja o motivo não seja a vila, eh, o motivo seja que realmente ainda não atraiu a atenção nem a cobiça de alguma pessoa. Não temos tido desse problema não. A Furnas andou comprando muita coisa pela redondeza, n~ao é, mas ela não, parece que não vai chegar até aqui.
D
 E o Rio como cidade, o senhor disse que ela ... O Rio modificou bastante, não é, que ...
L
 (sup.) É (sup.)
D
 (sup.) Mas o senhor falou do problema do trânsito. É só problema de trânsito?
L
 Não, evidentemente, o Rio modificou em muitos outros aspectos, né? E como tem se modificado como uma, uma série de outras cidades, quer dizer, você tem, você observa isso em quase todas as cidades. Agora, eu, eu, eu disse por onde estive e eu devo dizer uma coisa: eu não conheço cidade mais agressiva do que o Rio de Janeiro, quando se fala em centro da cidade. Quer dizer, por exemplo New York 'down town', o centrinho de Nova York, não é tão agressivo como o Rio de Janeiro, em termos de barulho, em termos de, de, de gente empurrando, em termos de, de, de corrida e etc. Não é tanto. Tóquio, que dizem que é o fim da picada em matéria de poluição, de cidade desagradável, etc. eu acho que é um paraíso (riso) perto do Rio de Janeiro, perto da Esplanada do Castelo. Mas, mas o Rio de Janeiro tem se modificado demais, não é? Quer dizer, o Rio de Janeiro, eh, realmente é uma cidade que podia ser bem mais agradável, não é? O Rio de Janeiro a gente tem essa impressão, ah, isso é lugar comum, mas é uma, uma verdade, quer dizer que ... Apesar de todo o esforço da natureza, o Rio de Janeiro não, não tem, não chega a ser uma cidade boa por causa dos homens que vivem nela, não é, uma cidade muito prejudicada. O que se faz aí em termos de viadutos horríveis, o que se faz em termos de asfaltamento indiscriminado de, de, de ruas e o que se faz em, em desfiguração de, de, de edifícios e de casas, o que se faz em, em destruição de, de, de, de, de árvores e de, de, de zonas verdes, não é, que aliás já, eh, já são muito poucas, não é? O que se fez no Rio de Janeiro em matéria de, de transformar a cidade, que era uma cidade que tinha determinadas soluções para o clima tropical. O Rio de Janeiro era um, antigo. Eu não peguei esse tempo, e agora eu não sou tão velho assim, mas a gente sente. Quando a gente pegava aquelas regiões mais antigas do Rio de Janeiro, o Rio de Janeiro era uma cidade bem bolada prum clima tropical: ruas estreitas, casario se aproximando, formando uma sombra, não é? As casas de paredes grossas, pé-direito alto, varandas, etc. E o Rio de Janeiro foi destruído, quer dizer, todo esse aspecto do Rio de Janeiro. Não sei se você é de Recife ou é do norte.
D
 Do norte (sup.)
L
 (sup.) Mas no norte se encontra muito ainda alguma coisa nesse sentido, quer dizer, o bom senso de construir, tendo em vista o clima tropical. Nós enchemos o Rio de Janeiro de concreto armado, de vidro, acumulando calor. O Rio de Janeiro não devia ser tão quente como é hoje. Eu tenho certeza como não era. Se a gente vê os retratos de antigamente, se a gente vê, você lê Machado de Assis, você sente que o Rio de Janeiro não podia ser tão quente, eles não podiam levar aquele tipo de vida, né? E o Rio de Janeiro hoje é uma cidade bastante inóspita, eu acho. Barulho como existe no Rio de Janeiro eu acho que dificilmente se encontrará em outra cidade.
D
 O senhor falou antes em poluição. O que que numa cidade, principalmente, ah, produz a poluição, acarreta a poluição?
L
 Bom, o automóvel, não é? Principalmente isso, né? É fuma... fumaça de ônibus e gás carbônico, pelo menos é o que a gente ouve e o que a gente sente, né, a gente sente. Você já andou pela rua Buenos Aires, na hora do movimento?
D
 Já (sup.)
L
 (sup.) Houve um tempo que eu trabalhei na Buenos Aires (inint.) eu era da Junta Comercial, se tinha então que passar um, um tempo ali. Na rua Buenos Aires era uma coisa impressionante! Eu tenho impressão que um sujeito que trabalha num bar daqueles, ali na rua Buenos Aires, termina com problema de pulmão em pouco tempo, que a gente sente o cheiro da fumaça, o cheiro do, eh, daquele óleo queimado dos ônibus, não é, o óleo diesel queimado. É uma coisa tremenda!
D
 E a avenida Brasil? Quer dizer, quando eu penso no pior do Rio de Janeiro eu penso na avenida Brasil, n~ao é? (riso)
L
 Eh ... Você sabe que quando você falou em avenida Brasil, eu sabia que você iria pichar a avenida Brasil, não é? Aí eu pensei numa coisa que eu acho que é pior ainda e que eu associo muito à Avenida Brasil: é o Fundão.
D
 Sim (sup.)
L
 (sup.) Mas é Universidade (risos) Federal do Rio de Janeiro, pra quem vocês estão trabalhando, no Fundão. É o fim, é um negócio inacreditável, né? E ind... já me disseram que o homem que, que, que resolveu isso, que aliás é um, um, parece ser um homem de muito valor, o Assis Ribeiro, né, foi ele que fez o plano. Isso ele fez há muito tempo e tiveram o bom senso de não construir nada lá até bem pouco tempo, não é? (riso) Afinal deu um ataque de bobagem e fizeram a porcaria do Fundão lá. (riso) E eles atribuíram o problema ao fato de que ... Não, quer dizer, ele dizia que ele não estava errado em planejar uma universidade na Ilha do Fundão, foi errado foi fazer a avenida Brasil e toda uma industrialização do Rio de Janeiro naquele local. Mas o Fundão é um absurdo, né? O Fundão é um negócio inacreditável! Eu andei dando umas aulas no Fundão em janeiro e fevereiro, que me pegaram prum programa da COPPE. Vocês conhecem a COPPE?
D
 Hum, hum.
L
 Pra eu dar umas aulas lá de, de direito pra engenheiro. Imagina só! Aliás foram muito interessantes as aulas justamente por isso. Mas eu nun... nunca imaginei que o Fundão pudesse ser uma calamidade como é. Eu tenho a impressão que deve andar até cobra naqueles jardins ali do Fundão. Vocês trabalham lá no Fundão?
D
 Ainda não. (riso)
L
 Não?
D
 (risos) Não.
L
 Coisa horrível! É um calor incrível! As distâncias enormes, não tem transporte pra ... Aquele pessoal todo pedindo carona (inint.) eu não sei, eu não im... eu não posso imaginar como eles consigam estudar ali naquele lugar. É inacreditável!
D
 Agora, você morou sempre praticamente em Botafogo. Você acha que Botafogo é um bairro de alguma forma peculiar no Rio de Janeiro ou há outros com certas características de Botafogo (inint.)
L
 Olha, Botafogo já foi um, uma coisa muito especial no Rio de Janeiro. Quer dizer, Botafogo já foi um bairro de, de, de pequena burguesia e vivendo com relativo conforto, ao menos nessa região aqui, então todos tinham mais ou menos o mesmo estilo de vida e havia então uma comunhão muito grande. Realmente era um bairro, bairro no sentido de, de que, que havia uma comunidadezinha ali. As pessoas se conheciam, se cumprimentavam, se detestavam, se gostavam, tinha alguma coisa de vida em comum, que é muito interessante, não é? Hoje eu acho que esse negócio está muito destruído. E se você procurasse um característica especial pra Botafogo, eu acho que eu não poderia dar de pronto assim, eu tinha que pensar muito porque não aparece. Talvez se você tivesse me perguntado do Catete, Largo do Machado, eu talvez pudesse dizer alguma coisa, porque eu acho que o Catete tem um bocado de fisionomia, não é? Você já foi ao Lamas?
D
 Já.
L
 É, o Lamas é uma coisa, não é? Então a gente vê aqueles tipos do Catete. É um determinado tipo de gente, não é? É muito interessante. Aquele Largo do Machado tem um, certas coisas que caracterizam muito o lugar.
D
 O Lamas vai acabar, não é?
L
 Vai, vai acabar. Pra fazer o metrô, não é?
D
 Hum, hum. E o metrô? E os meios de, de transporte nessa cidade em geral? (riso)
L
 Bom, essa cidade tem uma coisa inacreditável, que, eh, que é absolutamente inadmissível. Aliás isso tem de um modo geral no Brasil, em todas as cidades brasileiras. Agora aqui e em São Paulo o negócio atinge a um ponto de catástrofe, em que são todos obrigados a ir à cidade de carro, não é isso? Então vai uma pessoa num carro ... Eu por exemplo pego meu carro, um ca... carro grande, eu vou sozinho pra cidade ocupando um, quanto? Uns dois e meio metros quadrados de pista, não é? E depois vou lá e arrumo estacionamento, o que, que é absolutamente inadmissível, não é? Então é impossível você fazer praça, fazer, etc. Todo mundo vai de carro pra cidade, é um inferno, está todo mundo habituado com isso. Vamos ver se com o metrô ... Eu acho o metrô uma necessidade, eu acho que, que é realmente necessário fazer o metrô, devia estar sendo feito com mais dinamismo, mas está sendo feito muito devagar. Porque o metrô tem que ser feito com um pouco mais de espírito empresarial. Aqui no Rio parece que não existe isso, não é? Mas pra que, que, que se evite esse afluxo de carros pra cidade e esse afluxo de ônibus, que o Rio de Janeiro é uma cidade muito bem dotada de ônibus, a quantidade de ônibus que tem atravancando as ruas é enorme! E por isso dá todas esses desas... dá neurose, chofer de ônibus tem que ser um neurótico, ele não pode deixar de ser um neurótico, ele anda o tempo todo nessa, nessa base.
D
 E os trens suburbanos?
L
 (inint.) o trem não (sup.)
D
 (sup.) De vez em quando a gente vê no jornal. Agora mesmo saiu, saíram várias notícias no jornal (sup.)
L
 (sup,) Hum. Negócio dos pingentes etc. (sup.)
D
 (sup./inint.) é, eu nunca entendi muito bem por que há pingentes e por que caem.
L
 Olha, uma vez me contaram uma coisa que eu quase não acreditei. Mas depois, pensando bem e tal, eu acabei acreditando. Durante a guerra, na FEB, foi um inferno, morreu muito soldado brasileiro. E depois foi necessário puni-los, eh, muito rigorosamente, porque começou a ficar popular uma mania de dar sopinha pro alemão. Eles estavam na trincheira e aí de repente dava uma levantadinha, vem aquela bala toda, o sujeito abaixava, achava uma graça enorme. De vez em quando um pegava uma bala, né? E isso vai muito por conta da falta de preparo, não é? E ... Ou então não há realmente noção de, de perigo, eh, uma parte do problema do pingente é isso, quer dizer, o sujeito não tem noção do perigo. Viajar dependurado num trem deve ser muito mais confortável, muito mais gostoso, muito mais, eh, excitante do que viajar dentro dum trem daqueles, quer dizer, que deve ser horrível, não é? Então vai ali, está fresquinho, fazendo sinal, olhando pra todo o mundo, etc. e eles (inint.) muito isso, não têm realmente noção de perigo, como não tem, não é, a gente vê como se atravessa a rua, como se faz ... Quer dizer, a noção de segurança pessoal aqui é uma noção que, que não está muito bem arraigada, né? E o pro... o pingente em parte é isso, e em parte também é porque os serviços de, de, de trens, eu não conheço bem, deve ser horrível, né, ele deve realmente não ter lugar pra ficar e, e as portas não se fecham direito. Agora eu não sei se vocês já viram alguma vez fotografias do metrô de Tóquio ou do metrô de Nova York.
D
 Você podia falar um pouco dessas cidades pra gente (sup.)
L
 (sup.) Eu não tive coragem (riso) nunca de entrar num negócio desse (sup.)
D
 (sup./inint.)
L
 (sup.) É realmente impressionante, quer dizer, na hora da volta do trabalho, é realmente impressionante como eles são tafulhados! Então em Tóquio é uma coisa horrível, é gente por ... Tóquio é um bocado ... Tem gente até, até não poder mais. É um inferno de cidade, é uma coisa! Você vê gente pra todo lado, todo lugar que você for. E o metrô não, não, não é essas coisas assim não, quer dizer, é limpo, ninguém cospe no chão, aqueles negócios todos que, que, que, que infelizmente aqui acontece muito. Lá não acontece, mas não é um lugar confortável e é apinhado de gente, é uma coisa horrível! E nós vamos ter sempre esse problema, um problema de cidade, não é? Mas você queria que eu falasse sobre Tóquio, Nova York, Tóquio, não é? (sup.)
D
 (sup./inint.) como cidade, é. Tóquio que é mais estranha pra gente (sup.)
L
 (sup.) Tóquio, Tóquio é uma grande cidade. Tóquio é uma grande metrópole. Você encontra em Tóquio em matéria de sociedade de consumo ... Porque inclusive eles são um pouco 'nouveau-riche' em matéria de sociedade de consumo, como nós estamos começando a ficar, né? Aquele negócio de consumismo, né? Você encontra realmente em matéria de loja, em matéria de variedade de coisa, em matéria de restaurante, os melhores restaurantes franceses do mundo, que são melhores do que em Paris, porque o garçom serve bem, em Paris o garçom serve como se estivesse fazendo um favor, né, em Tóquio não, a co... cordialidade japonesa e a cozinha francesa com um 'ma^itre' importado, quer dizer, que, que, que conhece muito bem. Casimiras inglesas ... Então é, é realmente uma potência, viu? O, a, as luzes da cidade, porque geralmente isso é alguma coisa que aparece logo, quer dizer, uma cidade que, que, que está nadando em riqueza é geralmente uma cidade muito cheia de anúncios luminosos, né? E, e isso é esfuziante! É uma beleza! Se você sai do centro de Tóquio e começa a andar pelos arredores, você vai ver uma situação de habitação muito, muito precária, eles vivem muito precariamente. Acho impressionante como as casas são inconfortáveis e como são ruins, viu? Você vê gente de, de boa, de boa situação social e econômica vivendo em condições péssimas, quer dizer, uma casa como essa, em Tóquio, é, é realmente alguma coisa pra um nababo, viu? Basta dizer que ...
D
 E do ponto de vista urbanístico e arquitetônico? Como é que é Tóquio? (sup.)
L
 (sup.) É horrível! (sup.)
D
 (sup.) Assim pra gente ter uma idéia (sup.)
L
 (sup.) É horrível! São prédios geralmente baixos, que eles têm problemas de terremoto e só agora há pouco tempo é que desenvolveram um sistema de construir, eh, uns edifícios flutuantes, eu não sei como, que o, na hora do terremoto, aquele negócio flutua. Feio, arquitetura muito feia! Você não vê edifícios bonitos como você vê, por exemplo, em Nova York, em São Francisco, que é uma cidade linda, né, e você não vê isso, são geralmente edifícios pesadões, feios.
D
 Mas é estilo oriental, ocidental? Como é que é? (sup.)
L
 (sup.) Não. Basicamente ocidental, tem muito pouca coisa, mais ou menos quase que como relíquia. O estilo é ocidental. E você se afastando um pouco da cidade, você encontra essas habitações, algumas em estilo oriental, mas eu acho que isso é mais curiosidade do que operacional mesmo. Tóquio é uma cidade ocidentalizada, é ocidental mesmo, hum?
D
 E a parte de serviços públicos?
L
 Bom, o serviço de, de táxi é uma coisa que é formidável. Nunca vi serviço de táxi tão espetacular como em Tóquio!
D
 Como é (sup./inint.)
L
 (sup.) O sujeito sempre tem troco, não aceita gorjeta, está ouvindo, dá gorjeta, ele não aceita! Eh, de paletó, gravata e tal, o táxi todo limpinho, é um negócio impressionante! Eh, ônibus, funciona bem o ônibus de Tóquio. Quando a gente vai a trabalho, a gente gasta pro, pro cliente (riso) então não anda de ônibus, eu não sei, mas eu acho que deve ser bom. De modo geral tudo funciona em Tóquio, né, é tudo, é muito, muito bem organizado. O Japão é muito bem organizado. Então é aquele negócio que, que, que funciona, que você não tem isso mais nos Estados Unidos, que tinha nos Estados Unidos nos fins de cinqüenta e sete, depois que começou os Estados Unidos, eh ... Agora eu estou preocupado com meu português, eu disse: começou os Estados Unidos. Eu devia dizer: depois que os Estados Unidos começaram (inint./risos)
D
 (sup./risos) Não se preocupe não. Não, pode ficar à vontade (sup./riso)
L
 (sup./inint.) começaram a ingressar assim, um pouco mais de, de revisionismo da, da, da, de toda aquela rigidez que de certa forma fez a grandeza deles e fez também a chateação deles, não é? Tóquio, eh, no Japão ainda está nesta fase, quer dizer, uma fase de muita disciplina, de coisa. Então esse negócio todo funciona, funciona tudo, os serviços públicos devem funcionar muito bem.
D
 Os meios de comunicação (sup.)
L
 (sup.) É, meios de comunicação excelentes. Lá é excelente (sup.)
D
 (sup./inint.)
L
 (sup.) Telefone, telex, em qualquer lugar que se vá. Não, isso é (inint.) funciona admiravelmente bem. Uma limpeza tremenda, tudo muito limpo.
D
 Como é que se faz a limpeza?
L
 Ah, eu não reparei, eu não sei. Mas acho que se faz de noite. Eu não me lembro de ver careta limpando a rua (risos) assim no, de dia não, deve ser de noite, eles devem passar aquela ... É muito limpo.
D
 Você se lembra, nos Estados Unidos, você assim viu como é que se faz a limpeza das cidades. Se varia de uma cidade pra outra, comparado com o Rio de Janeiro, enfim, os vários sistemas.
L
 Não, eu vi, vi sim, eu vi várias vezes aquelas máquinas passando vassouras. Eu não me lembro de ter visto algum gari no, nos Estados Unidos, eu não me lembro não. Me lembro que me impressionou muito nos Estados Unidos, foi o pri... o primeiro país que eu vi com neve, viu? Então a limpeza das ruas depois que o gelo começa a se derreter, não é? Não sei se vocês já viram isso, fica uma coisa horrível, uma lamaceira, um negócio infernal. Então vem aquele aparato todo de caminhões e coisa e tal pra limpar aquilo e é realmente uma operação de guerra a limpeza, não é? Tirar aquele montão de neve misturada com lama.
D
 Há um capítulo que faz parte também do nosso assunto, é comércio. Você começou a falar um pouquinho sobre o comércio de Tóquio, né (sup.)
L
 (sup.) Hum (sup.)
D
 (sup./inint.) a gente podia falar um pouco sobre comércio. São Francisco, que você acha uma cidade maravilhosa. Como é que é o Rio de Janeiro. Como é que você vê o comércio dessas várias cidades, comparadas.
L
 Olha, eu tenho horror de fazer compras e sempre quando viajo eu sou obrigado a fazer compras, né? Então eu compro tudo que me vem, tudo que eu vejo, eu compro logo pra ficar livre daquele negócio e pra trazer todas as encomendas e tal, compro (inint.) compro qualquer coisa. E então eu não, talvez eu não seja uma pessoa muito boa pra falar sobre comércio e ... Agora aqui o, no Rio de Janeiro ... Vamos ver o comércio aqui no Rio de Janeiro, não é? Você quer que eu fale sobre o comércio aqui no Rio de Janeiro.
D
 Aqui existe vários tipos, não é (inint) do centro, tem o da zona norte, o da zona sul (sup.)
L
 (sup.) É. O que a gente ... O que eu tenho notado aqui no Rio de Janeiro, eu acho que o comércio progrediu muito aqui, ultimamente, quer dizer, em matéria de, de atrair consumidor, de, de, de sofisticar a oferta, de, de, isso realmente, principalmente na zona sul, não é? O comércio da cidade é decadente (inint.) parte da cidade é uma lástima, não tem nada realmente em termos de comércio pro consumidor. Em Ipanema, em Copacabana, na zona sul em geral, a gente vê que, que houve um progresso extraordinário nesse sentido, que vem justamente atender a essa maior demanda, porque, se dizem que uma faixa da população no Brasil não conseguiu sair da miséria e que vive na marginalização em que vive, o fato é que uma outra faixa realmente foi, teve o seu poder aquisitivo muito aumentado, não é?
D
 E está comprando muito produto estrangeiro, até o ponto que o governo resolveu intervir, né?
L
 É, porque tem também havido uma oferta muito grande de produto estrangeiro, não é? E aí vão ... Se nós estamos falando de comércio, tem uma regra no comércio que é muito importante, que os brasileiros não gostam de ver. Aliás, eu acho que ninguém gosta de ver, por isso é que existe esse negócio que chamam protecionismo, quer dizer, proibir concorrência de produtos estrangeiros. Você tem que comprar pra vender, porque o Brasil, pra exportar, ele tem que comprar, não adianta, se ele não comprar lá fora, ele não consegue exportar. Então, por exemplo, se você taxa a importação de vinhos de Portugal, que é praticamente o que Portugal tem pra vender, porque nem bacalhau mais ele consegue vender, porque o bacalhau, eh, a Escandinávia já produz muito mais, quer dizer, não consegue vender nada pra Portugal. Então isso é inevitável, compreendeu, é inevitável. E essa fome de comprar artigos estrangeiros, isso é natural num, num, num país que, que começa a se lançar agora e pessoas começam a ter acesso a uma série de coisas novas. Isso vai ter que ser satisfeito de uma forma ou de outra, né? Pode haver uma restrição, talvez esteja certa essa última restrição que houve agora, mas em bases provisórias e precárias, isso não pode durar por muito tempo. Você não pode viver isolado do mundo. Só se, né, optar por um novo sistema de vida, isolar, fazer uma chinazinha: não entra nada aqui, etc. Pronto (sup.)
D
 (sup.) É, mas (inint.) foi ... Acho que foi muito dirigido pro, eles mesmos disseram, né? Pro supérfluo. Então quem quer comprar champanhe francesa, se pode pagar duzentos cruzeiros, vai poder pagar trezentos.
L
 É, pode. Mas, eh, se você ... Você consome muito mais champanhe francesa se ela tiver um determinado preço, não é? Eu não sou defensor da champanhe francesa não, eu não acho ... O que eu acho é que isso não é uma medida que possa resolver o problema, viu? Isso não é uma medida que possa resolver o problema, porque, eh, de fato nós vamos ter de comprar uma série de artigos e isso nós passamos a comprar em maior intensidade, com maior intensidade, a partir do momento em que nós começamos a exportar também com maior intensidade. Quer dizer, você tem que comprar queijos italianos se você quer vender sapatos pra Itália ou qualquer outra coisa assim, viu? Você não vai poder comprar só máquina e equipamentos, você tem que satisfazer uma pauta comercial variável, exportando e importando. De modo que isso é um pouco de, de lutar contra a natureza, às vezes se tem de lutar numa situação de emergência, a situação está muito difícil. Agora eu não sei por que que o Brasil não toma uma medida mais concreta no sentido de restringir o gasto de petróleo, isso é que era preciso fazer um pouco, não é, que isso realmente pesa, não é? (sup.)
D
 (sup.) Como é que isso poderia ser feito? Restringir, como poderia ser feito?
L
 Aí nós estamos saindo do nosso assunto, não é? Não é nem comércio nem cidade (sup.)
D
 (sup.) Sim. É. Mas compra e venda (sup./inint.)
L
 (sup.) É. (riso) Bom, como poderia ser feito? Eu não ... Mas alguns países já fizeram isso, que os postos de gasolina fecham no domingo, se limita a velocidade pra veículos e ... Talvez a gente pudesse começar a pensar em alguma coisa a longo prazo, porque o Brasil vai ter um problema de petróleo, o pro... o problema de petróleo ele é crônico. Não há Petrobrás que o resolva, porque o crescimento da demanda de petróleo é enorme. Então não tem sentido, por exemplo, o Brasil produzir automóveis de grande consumo de gasolina. Nenhum país que, que, que tem problema de petróleo faz isso, ouviu? Então nós estamos aí a produzir, por exemplo, o meu carro é um carro que consome muita gasolina, eu não poderia falar isso, mas eu não deveria poder comprar um carro desse, compreendeu? Mas isso é ... Eu sei que tem uma série de outros problemas, que tem uma indústria estabelecida aqui, é preciso fazer com que essa indústria possa viver. E talvez, eh, seja o caso de tomar alguma medida, que consumir gasolina como o Brasil consome é uma coisa que não se pode mais admitir.
D
 Alguma vez o senhor viajou com a sua mulher pra fora?
L
 Ih! Se você fa... se ela estivesse aqui você não podia nem falar nisso.
D
 Eu queria saber dela, o que que ela comprou? (riso)
L
 Não, ela não, ela não, não, ela não, não me acompanha nas viagens, porque eu faço sempre viagens de trabalho. E então não, não tem havido muita chance dela viajar, viu? (sup.)
D
 (sup.) E aqui? Ela gosta de fazer compras, como é?
L
 Ela go... Ih, ela, ela gosta. (riso) Ela faz bastante compras. Ela compra muito, ela gosta, ela realmente um dos prazeres da vida dela é fazer compras, sabe? E compra mesmo, ela compra adoidado. Ela gosta que não é brinquedo! E eu acho que ela sabe comprar direitinho, sim (sup.)
D
 (sup.) O quê? (sup.)
L
 (sup.) Compra muita roupa, viu, gosta muito de comprar roupa e tal. E as minhas duas meninas também ingressaram nisso. Então está (inint.) compram muito, muita roupa mesmo! Uma coisa incrível!
D
 Que é que você acha da roupa que elas compram? Da roupa feminina em geral, que está sendo usada agora?
L
 Eu acho linda, eu acho uma beleza! Francamente, eu acho maravilhosa, viu? Minha mulher gosta muito de ver vitrines, viu, e eu detesto. Não tenho a menor atração por comprar coisas. Eu não, não sei a que atribuir esse negócio, eu realmente eu não gosto, não gosto de comprar coisas, eu tenho horror, eu compro logo a primeira coisa que eu tenho. Eu não sei se é porque eu quando moço tive uma vida bastante apertada e feliz. Eu era muito feliz, quando garoto, uma família muito feliz, nós tínhamos muito, muita segurança, muita paz, muito equilíbrio em casa. Então nós tínhamos uma felicidade muito grande. E eu tinha tudo isso sem comprar, compreendeu? E a partir do momento que eu passei a poder comprar, eu passei a ter uma porção de outros problemas, (riso) eu não sei se associei. Detesto comprar, detesto olhar vitrine, mas a minha mulher gosta muito, vê uma porção de coisa (sup.)
D
 (sup.) Ela compra sempre em locais, nos mesmos locais, tem preferências, eh ...
L
 Bom, ela só compra na zona sul. Por exemplo, sábado ela ás vezes quer que eu leve ela pra fazer compras, porque ela não sabe guiar. Então eu tenho que ... E eu me recuso a ir a Copacabana num sábado, guiando, pra não ... Vamos pra aí tudo (inint.) vamos comprar na cidade. Ah, não! Aí ela tem razão também, porque não encontra o mesmo tipo, não é? Esse negócio de compra, você tem que ir numa casa de classe pra encontrar coisa de classe, pra ter a escolha, não é? Porque a pessoa não vai com uma predisposição no sentido de comprar esta ou aquela coisa, ela geralmente vai, vai, vai e ela acaba comprando. Mas ela compra o supérfluo e compra por prazer, de modo que isso é muito interessante, que ela não compra o que ela, o que ela precisa, compreendeu, ela compra aquilo que lhe agra... ela compra realmente pelo prazer de comprar, o que é uma coisa das mais atraentes (inint./sup.)
D
 (sup./inint.) coisas pessoais só ou (sup.)
L
 (sup.) Coisas pessoais, compra às vezes pra mim coisas. É o prazer de comprar (inint.) um sapato, aquele sapato, eh, cisma que tem que comprar, compra pra mim o sapato. Eu digo: não estou precisando de sapato, não quero outro sapato. Mas ela compra. É o prazer (sup.)
D
 (sup.) Etiqueta (sup.)
L
 (sup.) É o prazer da pessoa, não é? Sei lá, aquele, aquela coisa em que a pessoa ... Não, não é por etiqueta não, é por simpatia (sup.)
D
 (sup.) Não, a etiqueta que eu digo é vestido de etiqueta (sup.)
L
 (sup.) É, é, é (sup./riso)
D
 (sup.) Exclusivo ... Quer dizer, suas compras, é ela que compra suas coisas (sup.)
L
 (sup.) Ah, de um modo geral é ela que compra porque eu, eu não gosto muito de comprar, então ela compra. Ela me veste, me põe todo bonitinho. É.
D
 E como é que você reage diante do que ela compra, quer dizer ...
L
 Não, ela gosta, ela compra bem, ela compra bem e me, me poupa esse trabalho e compra tudo e compra muito bem mesmo, ela compra coisas muito interessantes (sup.)
D
 (sup.) Sim, mas apesar de, de não comprar, você deve ter suas preferências, em matéria de, de roupa masculina (sup.)
L
 (sup.) Não, tenho, eu tenho. Por exemplo, eu, eh, eh, roupa de trabalho eu compro, roupa pra eu trabalhar: terno, camisa social, essas coisas, eh, eu, eh, muito raro ela comprar. Ela entra no terreno da roupa esporte e ela sabe também o meu gosto, ela sabe o que que eu prefiro, etc. e mais ou menos atende a isso, ouviu?
D
 Agora (sup.)
L
 (sup./inint.)
D
 (sup.) Eh, ah, ah, você vê os homens e as mulheres em lados diferentes a esse respeito, em compras, ou não? Há mulheres que se comportam da mesma maneira que homens e vice-versa e ...
L
 Bom, as mulheres geralmente compram mais, não é? Eu acho que, eh, olhando assim em grandes números, você deverá chegar à conclusão que, que as mulheres são mais especializadas em compras, não é, (riso) e os homens são mais especializados em produzir o dinheiro pra se comprar. É a própria organização social que nós temos é que leva a isso. Então a mulher é mais levada a fazer compras, a prover a, a casa e tal, que é obrigação dela, não é? Geralmente na divisão de trabalho é isso. Está se modificando muito, mas ainda é muito assim. Então ela é mais levada a comprar, se habitua a comprar.
D
 E a supermercado, você não vai, não faz compras desse tipo?
L
 Ah, isso eu gosto! Ah, isso eu gosto! Aí eu gosto (sup.)
D
 (sup.) Então como é que você faz (sup.)
L
 (sup.) Entendeu, no supermercado eu não tinha me lembrado. É, viu, que quando você falou em compras eu pensei de compras de ... Mas isso aí eu gosto de comprar comida, isso eu gosto (inint.) ir no supermercado, compra uns vinhos, etc. (sup./inint.)
D
 (sup./inint.) supermercado (sup./inint.)
L
 (sup.) Por isso é que eu não gostei daquela sua tirada da champanhe lá (riso) eu gosto de (sup./inint.)
D
 (sup.) Ah, quem me dera! E eu também adoro supermercado (sup./inint.)
L
 (sup./inint.) É, ir num balcão de, de, de especialidades então! Eh, em que se compram uns vinhos bons, uns bons queijos, não é? E depois come aqui sozinho, em casa, né, (riso) isso, isso eu adoro isso! E eu gosto também de comprar ... Eu não gosto de comprar carne, essas coisas todas. Sabe que eu, eu nun... nunca mais fui à feira, mas antigamente, nas poucas vezes que eu fui à feira, achei ... Acho a feira uma delícia! (sup.)
D
 (sup.) Acho uma beleza! (sup.)
L
 (sup.) É, tanta coisa, tanta escolha, tanta coisa pitoresca. É bom, eu gosto, sim, muito de comprar (sup./inint.)
D
 (sup./inint.) feira é uma coisa dessa cidade que está ...
L
 É, é ... E esse negócio de supermercado é uma das maiores bolações, não é, de, matéria de, de, de comércio (sup./inint.)
D
 (sup.) Você podia comparar os nossos supermercados com os americanos que realmente são (inint.) uma sedução, não é?
L
 É, eles têm ... Embora eu lá eu não, não conheça muito bem, eu nunca, não tinha esse problema de comprar em supermercado, não é? Mas o que eles apresentam no sentido de convite à compra, esses supermercados, não é, de, de, de colocar estrategicamente o, o material pra ser comprado, pra chamar à atenção, não é? Eu geralmente, quando eu vou a um supermercado, às vezes eu sou encarregado de ir ao supermercado com uma lista, não é, e, e às vezes eu crio um problema porque eu não compro, não compro nada não, mas muita coisa da lista eu não compro e compro uma série de coisas que não estão na lista, não é, e venho com grande felicidade (inint.)
D
 Em torno assim de (sup.)
L
 (sup.) Agora, se vocês não viram uma coisa sobre compra, em matéria de cidade, e que vai começar, porque a gente já está começando a ter também, que é um negócio realmente gostoso pra quem gosta de comprar e pra quem não gosta, sei lá, então ... São esses grandes 'shopping centers', não é? Agora estão começando a fazer ... Tem um em Ipanema que, que não é muito grande. Vão fazer um na avenida Atlântica, que vai ser enorme. Eu vi um em Washington, que aliás fica afastado da cidade, do tumulto dos automóveis, é bastante afastado, um lugar chamado Chevy Center. Que beleza! Que coisa! Que luxo! Que lojas! Então ali tem uma cidade, pra se fazer compras.
D
 (inint.) seria vantagem, eh, a existência disso relativamente ao comércio tradicional?
L
 Bom, pro comércio, isso é um grande negócio, não é, que ele atrai pessoas ali, então o sujeito ... Geralmente o sujeito que vive em cidade grande é um chato que não tem nada que fazer no sábado e domingo, não é? Ele vê televisão, aí depois de certo tempo também enche da televisão, um sujeito que não gosta de ler, tem horror de ler, não tem ... A vida em casa geralmente pra ele é um inferno, com aquilo tudo num apartamento ou fora do apartamento, a mulher dele brigando, os filhos e tal. O sujeito que geralmente (inint.) o sujeito que vive num tipo de vida do, quer dizer, o homem moderno é b... basicamente um chato, é um sujeito (sup.)
D
 (sup./inint.) um homem infeliz (sup.)
L
 (sup.) É, é um infeliz. Então ele tem que fazer qualquer coisa. Em São Paulo vai pro aeroporto, não é (inint.) vai pro aeroporto ver avião, que ele não tem outra coisa que fazer. O dia que botarem um super-'shoping center', com uns repuxinhos, pro sujeito que está duro olhar o repuxo, ou uma porção de, o que a gente via, restaurante, casa de chá, nesse lugar, o sujeito senta ali, toma um sorvete, mas fica, tem um ambiente, aquelas praças internas, está ouvindo, climatizado, então o sujeito não sente nem calor nem frio, no verão tem ar refrigerado. E chega ali, é um convite pra compra tremendo. Mesmo que não precise de nada, compra (sup.)
D
 (sup.) Brasileiro gosta de comprar (sup./riso)
L
 (sup.) Adora.
D
 Sabe por quê? Essa restri... (sup./inint.)
L
 (sup./inint.) está em lua-de-mel com compra (sup.)
D
 (sup.) Essa restrição agora pra comércio, pra turismo no ex... exterior. Eu leio muito crônica social porque é interessante.
L
 Hum (sup.)
D
 (sup.) O Zózimo Barroso diz hoje que vai acabar o turismo de mil dólares, que o brasileiro compra. Vai, bate na galeria (inint.) galeria Lafayette, aí volta, eh, vai incomodando todo o mundo dentro do avião, cheio de sacolinha, não sei o quê. Que que brasileiro geralmente compra fora do Brasil?
L
 Olha, compra uma porção de besteira. Heim? Acabou?
D
 Não, não (riso/inint./sup.)
L
 (inint.) olha aqui, você vai em Nova York, tem casas especializadas pra vender pra brasileiro. Eles olham logo a nossa cara assim de, de estrangeiro e tal (sup.)
D
 (sup.) Cearense (sup.)
L
 (sup.) É. E já, sempre falam uma palavrinha ou outra em português, eh, brasileiro tem emprego em Nova York fácil. Vai trabalhar numa loja dessas, que deve valer muito. Então a gente vê aqueles brasileiros, tudo falando alto, português e tal. Então o que que compram? Camisa Jacaré, que é uma camisa horrível, é caríssima, não é, é horrível, inclusive mal cortadas, etc. não é? Calça dessa, calça Lee, que até que é uma calça razoável e tal, mas se encontra na rua da Alfândega aí aos pontapés e mais barato do que lá (sup.)
D
 (sup./inint.) hum (inint./sup.)
L
 (sup./inint.) que vem de contrabando, não é isso? Esses negócios que e ... Ih, eu trago aos milhares aí pra minha mulher, a maior felicidade dela, essas coisas de 'revlon', eu não sei o que lá (inint.) etc. Eu compro aquilo tudo. E compro essas televisõezinhas, essas coisinhas, tudo que quebra e não tem mais conserto, não é? Então compram uma quantidade desse negócio ... Realmente compram uma brutalidade de coisa que precisa e que não precisa, etc.
D
 A Argentina está sofrendo horrores, não é? Com o brasileiro (sup./inint.)
L
 (sup.) Também vão lá e compram, né? Tem um problema de comprar. É realmente ... O sujeito vem cheio de coisas e tal e traz no avião, né? E brasileiro viajando é meio, meio cara-de-pau, não é, o brasileiro viajando é meio, meio grosso, porque ... Eh, geralmente brasileiro é um sujeito que está descobrindo o mundo, sei lá, sei lá. Isso é uma coisa muito engra... Então você vê ele falando muito alto (inint.) em outros lugares não, não há esse hábito, que aliás é ótimo nosso, não é, de falar alto. Você chega num restaurante, tudo no maior silêncio. Restaurante aqui é aquele negócio, uma barulhada, todo mundo falando alto (sons imitando falas) contando piada. Mas (inint.) você chega e encontra brasileiro falando alto no cinema. Você vai em filme de pornografia em Nova York, um lugar desses qualquer que tem, só tem brasileiro falando alto lá e achando graça e acha que pode falar palavrão, aquele negócio, é uma coisa! Mulheres e homens. É uma coisa impressionante (inint.) é uma festa! É. Então se, imediatamente todos se põem a divertir, não é isso, é divertidíssimo pra eles, mas a gente fica assim meio sem graça. Uma vez aconteceu comigo um episódio que eu ... Essa daí até eu fiquei com vergonha. Foi quando ... Uma, uma das vezes que eu fui a Tóquio, acho que foi na segunda vez. Em Nova York eu mudei de avião, passei pro avião da Japan Airlines ... Acabou, não é? (sup.)
D

  (sup.) Acabou...