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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Vida social e diversões"

Inquérito 0221

Locutor 262
Sexo feminino, 61 anos de idade, pais não-cariocas
Profissão: médica
Zona residencial: Sul

Data do registro: 22 de maio de 1974

Duração: 42 minutos

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D
 (inint./sup.)
L
 (sup./inint.) e muito extrovertida, de modo que, e mais velha de sete irmãos, de modo que eu tive muita dificuldade em ter acompanhantes pra me levar nas festas. Mas eu tinha um casal de tios, sem filhos, que nos levava. Então no meu tempo de moça, quando eu entrei pra faculdade, aí que começou mais ou menos. Eu freqüentava os jantares dançantes dos clubes e meu sonho era dançar, coisa que eu mais gostava era de dançar e tinha idéia logo de ser atriz de teatro, coisa que não era possível imaginar na, (riso) na minha época, né? Já e... eu já era fora de, de série pelo fato de estudar em escola superior, ainda mais ser atriz, mas ... De modo que eu fui estudar medicina e nessa, enquanto estudei medicina, me divertia extremamente. Agora além de dança, eu gostava imensamente de música, tanto que eu estava me preparando pra ser pianista. Eu estudava piano a sério. Mas quando eu entrei pra escola de medicina o professor, que era muito bom, Rossino de Freitas, soube e disse ele que eu comecei a baixar de produção e que ele não queria comprometer o nome dele com alunos que não progredissem suficientemente, que eu tinha que escolher. Eu era meio frustrada porque a M., minha irmã seguinte, tinha, estava, tinha se formado, já era professora primária e eu levei uns anos parada de estudo porque papai achava que eu era muito excitada e muito levada, me trancou e me botou na música pra eu não freqüentar escolas, pra eu estudar em casa. De modo que eu misturei um pouco, associei o piano com prisão. E depois batalhei, batalhei e ele me deixou entrar. Houve aquele pronun... uma época aí, que era possível fazer o, uns exames secundários, tinha um nome, no Pedro II, eu então recuperei o tempo perdido e fiz aquele curso secundário no Pedro II rapidamente, em três anos, e entrei pra faculdade de medicina. E com isso não abandonei o piano, porque eu gostava realmente, mas eu tive que abandonar aquela idéia de me tornar uma profissional de piano, ou qualquer coisa assim, porque eu achava que não era, não era tão elevado quanto os outros, aquela tolice. Também eu não sei se eu tinha vocação suficiente, senão não, não teria abandonado. Agora estudei piano, freqüentava concertos, que era o elegante naquele tempo, ma... o público que aliás eu encontro hoje é o mesmo que eu encontrava. Mariucha (inint.) era uma menina que freqüentava as galerias do teatro Municipal. Hoje ela é minha vizinha, muito minha amiga e faz esses concertos, música de câmera, que eu vou sempre ali no 'foyer' do Municipal. Quer dizer, continua ainda aquele mesmo grupo, hoje todas idosas e sempre aquele mesmo público de concertos, né? Eu ia muito a concertos, gostava muito, mas meu fraco era dança. Eu fui andando ... Depois carnaval, era louca por carnaval, porque no carnaval eu podia dar vazão a toda (risos) minha alegria, não é? Sem precisar de par, porque no meu tempo não tinha essas danças de hoje que as meninas vão até sozinhas. Elas vão sozinhas, sem par, dançam (inint.) no meu tempo não, você tinha que ser tirada por um rapaz e dançar e tal, não podia (inint.) eu tinha medo de não ter par a noite inteira, mas carnaval era garantido que eu podia pular a noite inteira que não, não haveria perigo. De modo que as minhas diversões maiores eram essas, mas nunca abandonando ... O teatro que eu queria naquela época, eu não sabia por quê, eu queria me formar atriz. Talvez fosse mesmo pra, pra me mostrar ou qualquer coisa, mas engraçado que depois o teatro hoje em dia é a coisa que eu mais gosto. Hoje meu número um, acima de música, acima de tudo, é o teatro, a coisa que eu mais gosto é teatro. A ponto de, por todas as minhas viagens e tudo, eu sempre só tinha um objetivo: os hotéis mais baratos, comer gastando menos pra sentar na primeira fila do teatro, porque eu queria ver do melhor lugar, as melhores coisas. Isso aí sempre foi. Mas de modo que nós fazíamos isso. Agora limitava porque havia uma série de irmãos, muita dificuldade, era um prêmio, era poder dançar no sábado e no domingo e assim mesmo papai não deixava porque todo mundo ia. Uma, o chá dançante no Country Club depois emendava um jantar dançante no Botafogo, essa era uma época, ou no Fluminense. E nós tínhamos que escolher, essa era a grande dor, ou uma coisa ou outra, as duas ele (riso) não deixava, embora fosse no total uma coisa pequena, que no total seria o quê, de seis às onze. Hoje que as meninas fazem à vontade aí milhões de vezes e dentro de casa. Que nós não tínhamos essa facilidade de festinhas dentro de casa. Quando estávamos um pouco mais adiante demos algumas festas em casa, que papai tinha curso de vestibular, então nós inventamos a tal festa de vestibular, onde havia então umas grandes festas lá em casa. Mas e... eram onde eu me realizava, era nessas coisas, sempre dança, dança essa (inint.) aí casei. Casei com um indivíduo que não suportava, não vou dizer música, não suportava dança, não ligava música, não sabia nada. Mas aos poucos ele ... Dançar nunca dançou, ou por outra, em trinta e três anos de casada, dancei uma valsa com ele um dia. Mas aí ele cortou toda minha vida de dança, mas aos poucos ele foi se interessando por música, hoje tem, tem enorme coleção de discos. Ele foi se interessando pela música cada vez mais erudita, ele mesmo foi se especializando, a ponto de uma vez em Paris, foi quando eu, primeira vez que ele teve uma noção assim ele comprou uma, uma sanfona, não posso dizer nem que aquilo fosse o quê, sei lá como se chamava aquilo, um harmono (sic) bem pequenininho de mão assim, mas o bastante pra ele se interessar pra eu ensinar ele pauta, clave e notas, que quando ele chegou aqui começou no piano e de dedo em dedo ele tirava depois música e tocava. (interrupção)
D
 Todos prestando atenção (sup./inint.)
L
 Podemos continuar? (risos) Mas eu estava falando então de música, né? Então eu digo, acho que também essa paixão por música, voltando um pouquinho atrás, essa paixão de música, eu sempre vivi no meio de música porque a minha mãe ficou órfã de pai muito cedo e minha avó na Bahia não tinha condições, tinha quatro filhos e não tinha condição nenhuma de educar. Ela foi parar em casa de tio, mas que também gostavam já de música então ... Mas a minha avó tinha uma tia cega que morava no Ceará, de família importante, o irmão foi governador, presidente do Ceará se chamava naque... naquele tempo e os irmãos eram deputados, senadores, mas ela era a única mulher e essa criatura, estou contando porque ela muito, é uma figura muito interessante que influenciou muito a minha vida e ela então depois, ela estudava música e os irmãos a criaram como se ela fosse vidente e dona de casa. Ela veio pro Rio, fez concurso pro Instituto Benjamin Constant, era professora de, de teoria, solfejo e harmonia. Se tornou catedrática, montou casa com o que ganhava e mandou buscar minha avó com os quatro filhos. De modo que eu vivi desde pequena envolvida na música no Instituto Benjamin Constant, que, por excelência, naquele tempo os cegos não tinham o que eles têm hoje, que eles hoje estão na sociedade, estão estudando o que querem, mas naquele tempo era música, por, eh, tudo que eles faziam era estudar música praticamente. Minha avó se tornou leitora deles e a minha madrinha que era cega, que era essa senhora, ficou assim, de modo que a dindinha era uma pessoa respeitadíssima. E a casa dela foi uma casa grande, ela mais ou menos sempre teve muitas relações. Tinha um, um, certo bem-estar. E era uma casa aberta onde todos os cegos freqüentavam, vamos dizer, como vida social era vir à casa da dona M. e lá se fazia muita música ca... Um, eh, tocava violino e outro tocava piano. Então nós tínhamos aquelas reuniões musicais desde pequena, eu me lembro desde seis, sete anos eu me lembro perfeitamente disso, porque com seis anos foi quando eu aprendi a dançar com a minha tia que já gostava muito de música, eu tinha sempre, daí a minha mania de dançar. Mas a, a minha irmã que você conheceu outro dia, ela por exemplo está realizadíssima, ela agora se tornou leitora também, ela está lendo prum cego. Mas a vida é completamente diferente porque ele é estudante universitário (inint.) está fazendo vestibular, mas a irm~a dele já é estudante de psicologia, está estudando na Gama Filho, se desloca de Copacabana pra Gama Filho todo dia sozinha, eh, uma vida completamente diferente daquela que nós víamos. Eu acho que a minha vida de música vem desde essa época. Mamãe estudou piano, se formou no Instituto de Música. Mamãe ensinou piano algum tempo, mas quando casou abandonou tudo, se tornou doméstica, só tomar conta de filhos, teve sete filhos em dez anos, não era, não era possível mesmo trabalhar nem fazer nada, né? De modo que essa que foi a, a parte que mais da minha ... Agora não, não, não me lembro exatamente (sup.)
D
 (sup.) Ah, uma coisa que eu queria perguntar, as meninas, as filhas da senhora aprenderam algum instrumento musical?
L
 Ah, a I. estudou piano no colégio mas não gostava muito não. Acho que estudou aquilo mais um, mais por complementação, por cultura, mas estudou. Estudou e é uma grande apreciadora de música e gosta imensamente de música. Pelo menos ... Eu queria mesmo ... Mas a idéia era, era que viessem apreciar a música. A minha enteada, que depois veio morar conosco ela, essa formou-se em música, que ela é pianista profissional, foi depois pra Viena e viveu em Viena toda vida, onde ela estudou música, de modo que continuou o ambiente de música aqui. A V. também estudou piano, embora abandonasse, mas todas elas conhecem música, estudaram pelo menos pra apreciar e G. não, a G., enteada, essa aí era pianista mesmo profissional. De modo que, profissional em, em termos, ela não chegou a ganhar nenhum dinheiro com isso, mas tentou. Mas depois casou também e morando em Viena não era possível, ela trabalhava na embaixada e não tinha empregada, lá acabou sendo hotel dos pianistas mas, eh, lá viviam, mas, eh, ela propriamente acho que abandonou. Hoje ela é, é do Itamaraty. Mas, de modo que na família ... Meu marido, que como eu disse a você acabou se entrosando na música, ele era o maior apreciador da música e depois só queria fones e não sei quê, porque ele vivia noite a dentro, né? De modo que ele botava e vivia aqui com seus fones de ouvido, ouvindo a música dele até alta madrugada porque, você, também, não contei antes, teve um período que nós trouxemos (riso) da Itália um harmono (sic) elétrico, não é, que veio desarmado dentro de uma mala que nem podia vir nem nada e ele que chegava de Manguinhos, eh, tarde, jantava oito, nove horas, lá pras onze horas da noite ele resolvia treinar, ele tomou professor de órgão (inint.) e vinha um professor, dava aula a ele e ele ia treinar. Felizmente que nesse prédio aqui as salas não têm nenhuma, nenhum, contato com os quartos dos vizinhos. É sala sobre sala, sobre sala e pedra, as salas são separadas. Mas ele tocava aquele harmono (sic) até às tantas e o meu vizinho aqui debaixo, que é um senhor muito agradável, mas pouco instruído, mas ele tinha uma grande admiração pelo meu marido. O cientista era assim uma coisa pra ele. Então ele dizia assim: bonita a música que seu marido toca de ... Eu digo: ai, pelo amor de Deus, o senhor não diga isso, o senhor consegue dormir? Atrapalha um pouco (inint.) e ele não tem outra hora. (riso) Coitado, e foi a maneira (riso) que ele encontrou de dizer que estava atrapalhando. Mas o V. tocava aquela ... Assim mesmo como paixão dele por Wagner, porque ele nunca fez por menos, literatura era Sheakspeare e música, apesar de ter, eh, estudado música depois que eu conheci muitos anos (riso) era Wagner, né? Ele tirava Wagner com os dedos, assim dedo a dedo, mas ele tocava toda a melodia, né? Depois se dava ao desplante de interpretar Wagner, então ele mudava, ele não tinha noção assim de ritmo, ele não obedecia o ritmo. Ele achava que ficava mais bonito. Dizia assim: você está assassinando, que Wagner nunca iria gostar de ouvir isso tocado dessa maneira. (riso) Mas ele interpretava, de modo que essa casa sempre viveu imbuída de música, não sabe?
D
 E em termos de atividades assim em que a música participa atualmente em (inint.)
L
 Eu?
D
 Não.
L
 Eles o que fazem? As meninas estão muito afastadas pela vida que levam, elas não têm tempo nenhum, eu não vejo a (sup.)
D
 (sup.) E quanto aos tipos de músicas (inint.)
L
 Mas quem está fazendo, vamos dizer, é a E. que eu digo, a minha neta, que está estudando violão. A I. não vai tanto a concerto. Quem vai mais sou eu, que sou, estando assim meio aposentada, é eu que continuei sempre nos concertos e vou a concerto. Agora então com essa novidade que é a M. que é essa nova diretora da Sala Cecília Meireles, que é a filha da M. minha vizinha, minha amiga, que botou, que eu acho genial essa idéia de botar concerto às seis horas da tarde, porque você trabalha, você está na cidade, o seu desejo é descansar, você descansa ouvindo música, passa a hora do 'rush', passa a dificuldade de, de transporte e não o contrário, você lutar com aquele transporte de uma maneira, chegar correndo em casa, na disparada, é um banho, muda roupa pra conseguir ir ouvir música às nove horas da noite num cansaço que não tem mais fim, né? E é o que aconteceu e a M. faz aqui ainda aqui nas reuniões de música de câmera no 'foyer' do Municipal que são fantásticos. Você nunca foi?
D
 Não.
L
 Às segundas, primeiras segundas-feiras de cada mês. Eu digo são fantásticas porque eu chego lá, a escadaria assim, eles fecham completamente a entrada do Municipal e encostam as cadeiras ali assim, mas a escadaria central fica repleta de jovens, jovens, eh, o público, que os senhores estão sentados nas cadeiras não podem tanto. Uma vez eu tentei sentar ali, fiquei cansadíssima na, naquela escada, mas não tinha mais lugar. Mas jovens com seus 'blue jeans', inteiramente a gosto, ouvindo quartetos de Brahms, música mais séria possível, aquilo num silêncio religioso. Eu acho aquilo fabuloso é a Mariucha, o Arnaldo e aquele Iberê Gomes (inint.) eu acho fantástico esse movimento que eles vêm fazendo. Eles são quarteto do teatro Municipal. Então toda primeira segunda-feira do mês, eles. O sucesso que tem é fantástico.
D
 E a senhora acompanha movimento de música não erudita por exemplo entre nós?
L
 Hum, não. Eu, eu não acompanho muito e, e não sou muito dada. Eu nunca fui muito ... Embora gostando tanto, como eu fui, e era de esperar que eu gostasse, né? Eu so... eh, sou um pouco frustrada, porque eu tive vontade, além de ser atriz, de ser cantora, sempre diziam ... Eu, pra me realizar, eu acho que falando como eu falo se eu pudesse cantar eu punha o dia inteiro pra fora, (riso) minha vontade, mas eu não, não, só diziam que eu tinha boa voz e tal como não estudei muito canto, né, e abandonei, nunca me dei muito, tanto que agora estou um pouquinho mais enfronhada, porque é a conversa que eu optei com minha neta. Ela então me participou que vai começar a estudar violão clássico e diz: vó, agora você vai gostar! Eu digo: não, eu gosto imensamente das músicas que você me canta. Porque a música é muito diferente, eu não estou ainda muito habituada a essa música moderna que eu reconheço até dificílima pra cantar e tudo, acho muito mais difícil, mas não que me agrade totalmente não. Eu sou ainda daquele tipo mais melodioso, daquela melodia mais, mais visível (riso) e audível do que essa atual. Mas eu estou assim a par um pouquinho por causa do, do violão da E. e ela, quando canta, eu acho tão bonitinho, porque hoje em dia você não precisa ter voz, todo mundo canta. O importante é que faça, que dê aqueles tons, que dê a entoação necessária, elas cantam baixinho, cantam com qualquer volume, né? Eh, mas a I. eu acho que abandonou totalmente. A I. só acompanha quando vai levar a E. pra ver, porque a E. é, é alucinada por Chico Buarque e é Edus e não sei o quê, esses ... Assim eu vou buscá-las na PUC às vezes, porque apesar da minha idade inda eu era a motorista que ia buscar de noite, porque sempre fui a motorista da família. Meu marido não deixava as meninas saírem e quando deixava não admitia que voltassem mi... motorizadas por outros. Não era por nada, era de medo. Ele disse que tinha a impressão, quando elas estavam fora, que o fígado dele ficava pro lado de fora. Ele enquanto não visse dentro de casa não sossegava. Então eu sempre fui buscar, porque pode um colega beber um pouco mais, estar com os reflexos mais embo... embotados. Eu ia buscar. De modo que, assim mesmo, pra E. que é neta, eu já tive uma Kombi pra chegar mais gente. Às vezes eu ia buscar, no tempo V., porque eu tive uma filha, depois outra filha com doze anos, e depois uma neta com doze anos. E a minha irmã, da qual eu sou mãe, também tem doze anos mais que a I. Tudo é em doze. Ela atende lá dentro, eu acho que pode deixar. É voz feminina. Ah, você está esperando, né? (risos/interrupção) Mas, de modo que a I. abandonou. A V. não tem muito tempo, a V. no momento ela tem uns discos, poucos, que ela ouve em casa, mas ela está nessa fase de começo de carreira, em que trabalha acho que quinze horas por dia e dorme pouquíssimo, então sempre ultracansados, de modo que ela não tem muito tempo. Mas a, a música que, mesmo com a morte do meu marido, elas me perguntam: por que você não continua a ouvir? Porque eu tenho uma maneira de reagir diferente. Caçoam de mim, me chamam assim: pode abrir o relicário, pode abrir. Isso que você está aqui por exemplo foi uma sala proibida, anos e anos e anos ela ficou fechada. Essa gaveta estava até pouco tempo como estava quando ele morreu, no mesmo lugar, no mesmo tudo, até eu me habituar, porque eu não acho que você mude e mude. Eu não sou assim. Eu vou me habituando, me acostumando aos poucos com o que vem de novo. Então isso aqui era fechado, sagrado, ninguém entrava. Como isso aqui era o, era o recanto dele, onde eu consegui agora, por ironia do destino, desmancharam isso aqui, transformaram na minha cama hospitalar pra, pro meu atropelamento. Então, quando muito, eu consenti que essa gaveta superior tenha o que é meu pra eu poder ficar aqui. Ontem meu genro até perguntou: aqui tem um bloco? Eu digo : não mexe! Disse: mas será possível, tem um bloco e tal com as anotações. Disse: nesse bloco você não vai escrever nada! De modo que a ... Então, por isso, eu não consigo ainda ouvir aquelas músicas. Eu tenho milhões de fitas gravadas com a voz dele que eu ainda não consegui ouvir. Não sei quando vou conseguir. Mas tinha vontade, porque tem assim, diálogos que ele me provocava, as minhas brigas. Se você (inint.) as entrevistas, nós fazíamos entrevistas verdadeiras aqui, porque sempre com a mania de gravar e escutar, ele gra... não tinha tempo de ver os meninos, ele gravava histórias. Então a gente botava as histórias pra eles ouvirem histórias contadas pelo pai, de modo que ... E também ele escrevia muito xadrez pro jornal, fazia as colunas de xadrez. Era tudo gravado, as meninas então tiravam ... Era no ditafone naquele tempo, tiravam do ditafone pra passar pra máquina. Mas sempre foi ... Isso aqui foi, era uma máquina mais ou menos comum aqui de casa. Mas a música não consegui. Os discos estão todos ali. Nunca ouvi nenhum. Ouvi um ou outro quando a V. se casou, ela disse: mamãe, deixa eu ouvir um ou outro desse aqui, porque eu quero ver a música que eu quero escolher pro meu casamento. E ela botou na sala e foi um, um desespero de descontrole tal, descontrole emocional, porque aquilo durou uma porção de dias, sabe (ruído/inint.) era muito ligada a ele nessa parte.
D
 Agora a senhora naquela parte anterior tinha contado que, de seu interesse por dança e eu lhe perguntei o que se dançava na época. A senhora podia contar isso pra C.? (sup.)
L
 (sup.) Ah, conto. Você sabe, C., eu estava dizendo a ela que eu aprendi a dançar com seis anos e com uma tia que hoje tem setenta e oito e dança que é uma bailarina! A ti... Evidentemente as danças daquele tempo, que estão voltando, né, que estão voltando, que era o tal de 'fox', era o samba, eh, tinha um que se chamava 'ragtime', (risos) não sei se você vai ... Eu, o, o 'charleston', até o 'charleston', e o tango. Eu tinha orgulho de dançar o tango, eu tinha um primo muito alto, bonito dançava um tango floreado, que os argentinos gamavam. Então era assim, eu era realmente uma, uma, estupenda bailarina, porque eu tinha amor àquilo, mas sobretudo samba. Eu contei a N. que meu irmão ia nessas gafieiras e aprendia aqueles sambas assim e chegava em casa dançava aqueles sambas comigo. Papai ficava horrorizado, mas a família se divertia, reunia a família, porque nossa família é muito grande e sempre teve muita reunião noturna, isso que você perguntou da outra vez, a nossa família sempre se reuniu. Depois do jantar papai não nos deixava sair, era difícil, a não ser quando se teve namorado e noivou e tal, mas fora disso a família à noite era reunida, porque papai passava o dia inteiro na rua, ocupado, e ele achava que do jantar em diante era preciso haver aquela reunião familiar, onde nós ouvíamos muita música clássica, em disco, já do papai também, pela formação dele e aí ouvíamos ... E nós fazíamos essas palhaçadas, meu irmão botava aquilo, eu dançava com ele esses tangos, esses, eh, sambas de gafieira, que era o meu samba predileto, né? A ponto que eu disse a ela, nós uma vez em, em Nova York ... Aí, mas eu tinha apre... Depois que eu casei, meu marido proibiu tudo e eu fiquei sem dançar, apaixonada. Dancei uma vez nos Estados Unidos com um velho, velhíssimo, mas que também era um bailarino estupendo, que ele não, não me podia dizer nada, porque era pai de um colega dele e que tinha apresentado o primeiro trabalho científico numa daquelas grandes convenções. Então o pai, muito orgulhoso, convidou todo mundo pra jantar num grande, num grande hotel lá, nem me lembro, acho que foi em Chicago, e o velho me tirou pra dançar e, com grande surpresa minha, ele era um bailarino dos meus tempos, ele era de outra geração mas era que nem a minha tia. E eu dancei (inint.) mas dança não se desaprende não e uma vez jantando num restaurante l'a em cima no (inint.) no (inint.) tinha um par profissional que começou a convidar, estava cheio de turistas, começou a convidar os presentes pra dançar então as danças típicas, uma valsa, um tango, as danças típicas locais. O bailarino tirava uma moça e as pessoas levantavam o dedo e tal, e quando ele perguntou se havia alguém pro samba, ninguém. Ele perguntou uma vez, perguntou duas e, olha, eu disse a N., apesar de toda a proibição do meu marido e do respeito que eu tinha a ele o meu patriotismo falou mais alto e eu me levantei e fui dançar com ele e ele foi aumentando. Ah! o senhor! Não, não houve ninguém que dançasse o samba com a bailarina, então eu fiquei dando assim (risos) um show sozinha. Mas dancei e ele, e ele foi aumentando, porque você sabe, bailarino profissional dança exatamente o 'show' meio parecido com o de gafieira, que são aqueles passos, tal, e eu acompanhando, e ele perguntava, ele insistia, de onde eu era? E eu fazia sinal a ele que ficava cansada, não queria falar, pra ele não perceber que eu era estrangeira, e dizia a ele que depois eu dizia: não, que eu estou cansada! E continuava a dançar. No fim, quando ele veio perguntar, eu digo: bom, não é vantagem, porque eu sou brasileira (inint.) ah, N., isso me valeu um prêmio de um jantar de graça e ga... fui eu a primeira colocada. Meu marido, de furioso que estava quando ganhou a garrafa de champanhe e quando ganhou o jantar gratuito, eu disse: você não tem porque ficar zangado! E de modo que ... Mas provando que assim mesmo, muitos anos depois de casada, com filhas grandes e tudo, eu gostava, sempre gostei de dançar.
D
 E as moças na sua época elas freqüentavam festas assim (sup.)
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 (sup.) Ah, freqüentavam. Em geral bem mais do que nós. Porque eu estava dizendo a N., freqüentavam mais do que nós, porque papai era muito feroz, negócio de estudo, estudo, só domingos (inint.) elas tinham festinhas sempre. Havia o Automóvel Clube, que tinha chás dançantes durante a semana e sempre em clubes, né, era muito clube e muita festa em casa de família, que hoje não tem ... Hoje, essas reuniõezinhas, mas havia festa, mas era festa assim de conjunto, a gente tinha um conjunto, vinha bateria, vinha (inint.) vinham três, quatro figuras sempre porque toda casa tinha um piano pra começar, naquela época, não era bem não ter um piano em casa. Toda casa tinha um piano. Então você tinha aquelas festas de conjunto. Essas festas em casa de família eu tinha mais dificuldade de ir, porque papai, se não conhecesse absolutamente a família, não deixava. E voltar com os colegas ele também não permitia. Eu tinha mais facilidade de ir em clube aos domingos, porque minha tia me levava, uma, um casal, essa tia que é grande bailarina, ele j... ela não tinha filhos, então o marido se prestava a ir, os dois dançavam também e nós então freqüentávamos o jantar dançante de, do Botagofo, Fluminense, que era o, o, o quente do momento, ou então, o Country Club, que eu disse, estava dizendo pra N., que Country Club era de seis às nove e o outro de nove à meia-noite, mas o papai não deixava nós emendarmos tínhamos que escolher entre um e outro. Então era uma dor horrível (riso) porque você não sabia qual queria ir, que todo mundo emendava, né, todo um grupo, você ia ao Country, tinha que ficar olhando todo mundo continuar e nós voltarmos pra casa ou então se você chegava num outro e já vinha aquele grupo que estava formado, já está engrenado assim, mas essa era as festas, porque não havia esses, sabe, esse movimento de música que há hoje, que as meninas vivem em teatro, nem cinema, não havia nada disso. O único divertimento de moça era mesmo dançar, dançar e cinema e assim mesmo, pouco. Hoje em dia, elas têm muito mais. Eu estava dizendo a N. que eu acho que elas hoje têm muita diversão. Agora no nosso tempo, tenho a impressão que se lia mais, que se aprendia mais ou se fazia ... Qualquer coisa que se fizesse, se fazia mais profundamente do que elas fazem hoje. Elas fazem muita coisa. Eu só lamento é a parte de criatividade, que a nossa era completamente esquecida, ninguém explorava, ninguém explorava o que é que você fosse capaz de fazer, pra explorar aquela vocação sua. Hoje não, elas não podem se queixar porque elas experimentam de tudo. Eu vejo a minha neta, ela faz um bocadinho de qualquer coisa, ela já fez de tudo. Eu sempre digo: olha, eu acho que você tem que ficar no desenho. Porque ela desenha com uma facilidade extraordinária. No entanto ela diz que vai fazer psicologia infantil, ela adora criança, ela canta, ela agora quer ser professora de violão de criança, mas ao mesmo tempo ela es... pra meu gosto ela escreve, ela tem idéias fabulosas, ela faz diálogos fantásticos, de modo que eu acho que ... Eu escolheria uma outra profissão. É evidente que essa criatura não pode ser médica, ela tem horror a números, ela não gosta de coisas exatas, é, é uma artista. Qual de nós, então (inint.) a nossa família é imensa. Nós nos reunimos, não sei se fa... se eu já falei sobre isso, nós nos reunimos muito, e quando tem só a família reunida, ou seja, papai e mamãe, os sete filhos, genros ou noras, filhos, netos e bisnetos, se estivermos juntos, somos quarenta e dois. No momento, agora cresceu, já tem mais dois, quarenta e quatro e é assim, compreende? E de modo que papai vira-se pra mim, ele que é o homem da música e tal, disse: afinal de contas, não saiu um artista dessa família. Eu digo: papai, nunca foi pesquisada pelo tipo de educação eminentemente técnica que nós todos tivemos, não saiu porque não, vamos dizer, não, não tinha remuneração suficiente. Eu quase fui pianista. Papai tentou, mas não era, era por defesa, porque ele achava que eu era muito levada, então ele não queria que eu fosse pra faculdade, não queria que eu fosse pra escola, queria que eu estudasse em casa. Mas quando a minha irmã seguinte começou a freqüentar o Instituto de Educação e não sei o quê, eu comecei a fazer barulho e consegui então me formar em medicina, debaixo de luta. Aí o professor de piano, que era profissional (inint.) não quis, me fez escolher e eu aí abandonei o piano porque eu achava que piano era, já era 'démodé', já não era, já estava ficando 'démodé', porque antigamente tinha que falar francês e tocar piano, né, essas duas coisas. Tanto que a primeira língua que eu aprendi foi francês, não é? O inglês veio muito depois. Hoje em dia as minhas filhas não falam francês, a V. ainda fez a Cult... a Aliança Francesa até o quarto ano, mas a I. não lê francês. Não, não me conformo a I. leu (inint.) em português, etc.: é um pecado que você está cometendo, não é possível! Não é? Ela disse: não, mas eu não entendo. Entende sim, é uma questão de, de, de ler. Mas, eh, de modo que naquele tempo era saber francês, tocar piano e tal. Na minha família não, era aquele estilo antigo e papai e mamãe estudavam conosco à noite, jamais, oh! (estalo de dedos) isso já é bem mais velho. Mamãe não estudou francês, não teve assi... mas papai achava que não era bem. À noite, nós tínhamos uma francesa que ia lá em casa e mamãe descia. Nós já morávamos numa casa de dois andares, mamãe descia, onde havia já esse curso que eu falei anteriormente a você, mamãe descia e dava aula de francês conosco. Ou então papai e mamãe sentavam-se na mesa, uma mesa grande, de aula, que havia embaixo, onde nós todos ficávamos fazendo os nossos exercícios, os nossos es... estudos e eles dois do lado e mamãe então fazendo também os exercícios de francês e o papai preparando as aulas dele, que ele era professor, então, de modo que nossa vida sempre foi muito mais de dentro de casa, de estudar e que de um certo modo o V. também fazia aqui com as meninas. Eu acho hoje um ... Mas muito so... solto é bom, mas dispersa muito, eu acho que dispersa demais.
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 Eu só vou fazer a última perguntinha à senhora, que nós não tratamos ainda. Eu queria se... sa... como é que a senhora vê, o nosso povo tem interesse por esportes em comparação com outros países onde a senhora viveu e observou?
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 Bom, com a América do Norte, eles tembém, que foi onde eu vivi mais, eles também são por excelência esportivos, mas é aquele, não sei como se chama, eles têm beisebol, mas tem aquele outro, que eles chamam, como é? É futebol que eles chamavam antes, mas eu não sei, o 'soccer', né? Eh, de modo que eles são, eles pensam, eles são es... desportistas por excelência. Do, no hospital, quando terminava a hora do trabalho, eles todos iam pros campos de tênis que tinham ali atrás, os médicos todos iam jogar tênis ou iam pra piscina nadar. Meu marido e eu nunca fizemos esportes de espécie nenhuma, aqui a gente não faz. De modo que, lá nos Estados Unidos, muito. Na Inglaterra eu não vivi o tempo suficiente pra observar. Na Europa, como eu disse a você, eu fui mais congressos e coisas mais rápidas. Eu conheci mesmo mais profundamente o povo americano. Em princípio, como eu disse, bem mais, eu conheço o povo americano bastante e os Estados Unidos de, de leste a oeste, de norte a sul. De modo muito mais infelizmente do que o Brasil, porque vivi lá intensamente, correndo e, e o V. fez depois conferências, depois deu aulas e nós ensinamos aqueles meninos, a gente fazia conferências sobre vida brasileira, aquela coisa toda, misturada com Rotary Clube também, de modo que, mas eu acho que, eram esportes diferentes, gostos diferentes do nosso, a não ser ...
D
 E os nossos como é que são, eh, o que que prevalece entre nós, em matéria de esporte?
L
 Aqui eles nascem com a bola no pé, né? Eu estava dizendo a ela porque ela tinha me perguntado antes, no meu tempo de menina, qual é, o que é que eles se divertiam, né? E eu disse a ela que futebol, sempre por mais pobre que fosse era aquela bola de meia. Vocês nunca viram isso, jogar com bola de meia? Eles fazem aquela bola de meia, não é, e jogavam com bola de meia. Gude, jogava-se muito gude naquele tempo. Fazia aqueles buracos, aquelas búlicas, eu não sei o que que era, eu chamava o pólo de mão.(risos) Eu joguei muito gude, disputar ... Sempre, porque eram meninos, como eu disse a você, comigo tinha que ser brincadeiras com os meninos. Era futebol, jogava-se futebol de, dessas bolas, mas eu já jogava umas bolas também, nunca bola de futebol, nunca se jogava, os meninos naquele tempo, né? Mas o pobre não é como hoje, acho que hoje já está tão estilizado, que já tirou ... O Pelé ainda vem de campo de futebol assim, eu acho, de terra e, e de interior, né? Mas hoje os meninos estão sempre jogando futebol.
D
 E aqueles outros jogos de criança que a senhora mencionou, até eu pedi que a senhora descrevesse um (sup.)
L
 (sup.) Ah, ela perguntou, ela me perguntou porque eu disse que eu jo... pulava carniça. Você sabe o que é pular carniça, C.? Hum, você, um, um indivíduo se abaixa, encosta as mãos nos pés assim e fica assim abaixado e aquilo é a carniça. Você então vem correndo e com as duas mãos você faz ali o ponto nas costas dele e salta.
D
 E ninguém nunca quebrou a espinha nessa não?
L
 Não, não quebrou porque, não sei por quê. Hoje em dia se quebra muito mais. Eu estou dizendo, por isso eu digo, eu não ter quebrado perna naquela época e hoje estar aqui desta maneira, eu não me conformo, porque hoje eu sou uma criatura cuidadosa que trabalho há trinta e sete anos, que olho as esquinas e não sei como é que me aconteceu. Mas naquele tempo eu pulava carniça, eu jogava futebol, me ralava, vivia sempre ralada, mas eram quedas pequenas. Nunca houve um braço quebrado, não me lembro de um colega ter quebrado um braço ou uma perna e no entanto nós éramos ... Cimento, nem sequer em terra não, nós morávamos em vilas e era jogo em cimento, era preciso haver sapato, né? Os sapatos, às vezes, era gritaria: olha o sapato! Mas acho que até descalço a gente jogava. Topadas, os dedos dos pés arrebentados na frente, mas ninguém ligava isso não. E não havia também essas infecções que tem hoje, que nem chega a ter, porque não havia penicilina naquela ... Todo mundo saía correndo, botava iodo, estava acabado, era o remédio da época, não é? Água oxigenada e iodo. Mas era carniça, futebol, amarelinha, mas isso era, isso já era das meninas, eu não brincava brincadeira de menina, jogar amarelinha, e hoje ainda se faz isso, não é? De modo que eu vejo no colégio Benett, quando a E. entrou ainda se riscava com giz aquilo tudo e isso o pobre faz igualmente, porque ele risca na terra, né (sup.)
D
 (sup.) Ah, na época da sua infância havia parques de diversão e que que havia?
L
 Ih, nada, parques de diversões de espécie (inint.) a montanha russa que, quando foi no meu tempo, na independência, mil novecentos e vinte e dois, no, no centenário da independência, então é que eu me lembro que houve aquela exposição, então montaram o parque, tinha montanha-russa. O único divertimento que havia assim é quando vinha o circo. Circo é que era diversão. Vinha assim aquele circo (inint.) todo domingo aquilo e aquilo tudo era grande diversão. E eles faziam aqueles anúncios durante a semana, os animais passeavam pelas ruas fazendo a propaganda ou os palhaços fazendo as suas piruetas e no domingo toda a criançada ia pro circo, né? E nós tivemos bons circos quando eu era pequena. O Sarrazani que era um grande circo. Eu me lembro papai levando aquela tropa, porque onde nós íamos era quase preciso um ônibus, que, porque para levar os sete filhos, aquilo era uma dificuldade, né? Nós não tínhamos carro, nunca tivemos carro, não havia disso. Hoje em dia é que todo mundo tem carro e, nossa família, faz dezoito anos quer um carro, e está pensando num carro, mas não havia e nem havia necessidade, porque, verdade seja dita, que o transporte era fácil, os táxis eram aqueles carros enormes com aquelas cadeirinhas, de modo que você tinha um banco confortável atrás pra três pessoas, umas cadeirinhas que se abriam dentro do carro (sup.)
D
 (sup.) Como ainda hoje na Inglaterra, não é?
L
 Ainda tem aquilo na Inglaterra e junto do chofer podiam ir duas. De modo que nós dávamos ainda, apesar de sete, nós ainda, eh, cabíamos num daqueles 'double side' que eles chamavam. Meu avô e minha avó da parte paterna nos domingos alugavam uns três langolés e iam nos buscar para passear por Copacabana. Copacabana tinha assim algumas casas, mas o Leblon e Ipanema era só aquele areal e que lá no meio corria aquele trilho que era o bonde que passava.
D
 E o que eram langolés?
L

  Os langolés e... eram mais ou menos parecidos com os táxis de hoje em dia da Inglaterra. São aqueles carros assim, mas que tudo vidro, porque por excelência os táxis aqui eram de capota de arriar, daí o corso de carnaval, podia haver corso porque os carros arriavam as capotas e então ia-se sentados nas capotas. Hoje você não pode fazer corso nenhum com esses carros fechados, né? O langolé era fechado, era todo envidraçado, era muito elegante, você podia fechar as janelas, não tinha vento, mas ia com aquela visão total. Então eram langolés chamados. Era muito bom, era o passeio de domingo de minha infância, tinha um desses também, de ir passear de langolé.