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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Cinema, televisão, rádio, teatro, circo"

Inquérito 0194

Locutor 222
Sexo feminino, 49 anos de idade, pais cariocas
Profissão: professora de geografia
Zona residencial: Sul

Data do registro: 05 de dezembro de 1973

Duração: 40 minutos

Som Clique aqui e ouça a narração do texto


D
 (inint.)
L
 Cinema, televisão, rádio.
D
 (inint) interessava saber assim, eh, cinema, rádio, teatro, televisão, circo, o que que lhe interessava mais assim, lhe parece mais interessante?
L
 Bom, eu realmente só acho interessante mesmo cinema.
D
 Por quê?
L
 Porque acho que é uma coisa muito mais variada, muito mais, muito mais rica, inclusive de experiência, prefiro realmente muito assistir cinema, mesmo quando eu ligo televisão é pra ver cinema.
D
 Hum.
L
 Quer dizer, eu sempre tive interesse por cinema. Não vivo muito o, a evolução do cinema, o que há de novo em cinema porque levo uma vida muito ocupada, chego em casa tarde, saio cedo no dia seguinte, não tenho oportunidade de ir assistir mas eu, houve uma fase quando eu trabalhava menos, a vida era mais organizada, jantava-se mais cedo porque as crianças tinham horário, todo mundo obedecia, todo mundo comia na hora certa, então nós íamos muito a cinema, acompanhávamos muito cinema novo, `nouvelle vague', depois paramos. Hoje eu vou muito pouco a cinema, mas por falta de oportunidade e de tempo.
D
 E quando ia como é que era? Dá pra descrever uma ida ao cinema? (diversos documentadores)
L
 Como é que ia, era uma ida ao cinema? (sup.)
D
 (sup.) É.
L
 Como é que nós fazíamos pra ir ao cinema? (sup.)
D
 (sup.) É, uma ida ao cinema. (sup.)
L
 (sup.) Ah, bom, numa certa fase, isso eu acho que é interessante marcar, qualquer filme bom nós nos preocupávamos de ver, nos interessávamos (sup.)
D
 (sup.) O que que era filme bom?
L
 Um filme novo, um filme diferente, um filme premiado, um filme que tivesse assim algum, algum destaque especial nós íamos. Nós nunca fomos de, de ir muito a cinema assim ver filmes antigos e tal por uma questão de oportunidade. Era principalmente uma questão de oportunidade. A, a, a nossa maneira de organizar a vida foi sempre uma vida muito doméstica e muito trabalho. Então o cinema era quando por um acaso se estava disponível para sair de noite e se ir ao cinema. Uma das razões inclusive de nós irmos pouco ao teatro é porque acabava não indo porque o teatro era mais tarde, porque teatro tinha que marcar com antecedência e acabava não indo. Mas eu mesma sempre preferi cinema a teatro.
D
 Sim, mas e (sup.)
L
 (sup.) Agora (sup.)
D
 (sup.) A ida ao cinema.
L
 A ida ao cinema. Não estou entendendo bem o que você quer que eu diga (inint.) cinema (sup.)
D
 (sup.) Uma ida ao cinema, descreva (sup.)
L
 (sup./inint.) de casa.
D
 Sair de casa.
L
 Íamos ao cinema, cinema Paissandu por exemplo nós íamos muito.
D
 A escolha era (sup.)
L
 (sup.) A escolha (sup.)
D
 (sup.) Porque era próximo, pelo filme ...
L
 Não, pelo filme. Num certo período foi escolha pelo filme.
D
 E o que que orientava essa escolha (sup.)
L
 (sup.) Íamos ao cinema Riviera lá no, no fim de Copacabana, no tempo que o Riviera era o cinema que passava bons filmes.
D
 Mas o que que orientava essa escolha?
L
 Saber que o filme era interessante, era bom, era, era novo, sei lá.
D
 E como que a senhora sabia?
L
 Ah, porque os amigos comentavam o que se lia no jornal, acompanhava pelo jornal, dava tempo de ler a crônica do jornal, no domingo a gente lia os filmes que iam passar na semana. Isso tudo contribuía pra gente se orientar sobre o que que estava passando. Hoje eu não sei. Eu sei dos filmes bons que estão levando porque meus filhos me dizem: mamãe, você não viu esse filme, precisa ver.
D
 Sei. Agora (sup.)
L
 (sup.) Quer dizer, perdemos o hábito e por falta de tempo e também de certa maneira porque os filmes bons geralmente são pesados e a pessoa está cansada, não sei quê, pensa duas vezes antes de sair pra ir ver um filme que é um filme pesado.
D
 Que que é um filme pesado?
L
 Ai, um filme pesado. Está muito complicado, (risos) mas um filme pesado, um filme denso e amargo.
D
 Quais são os tipos assim de filme?
L
 Que eu via nessa época?
D
 Ahn.
L
 Nessa época eu via tudo, gostava de todos. Hoje em dia eu re... com muita frequência não vou ver um filme que seja desse tipo muito pesado, muito denso, não me agrada não. Em todo caso ainda vou assim Bergman e coisa assim, uma vez ou outra ainda vou.
D
 Mas vamos supor que haja um filme.
L
 Hum, que eu fui ver.
D
 Então a senhora vai ...
L
 Hoje vejo mais filme de, uma comédia boa às vezes eu vejo.
D
 Então o que que faz? O que que tem que fazer pra chegar lá, me descreve assim tudo isso (sup.)
L
 (sup.) Descrever. A primeira coisa é resolver o que que vamos ver, a discussão é imensa, se vamos, se não vamos, a que horas vamos, aí depende do problema de chegar uma pessoa a mais em casa pra jantar por exemplo. Hoje por exemplo se eu fosse ao cinema teria chegado uma irmã, eu já não fui ao cinema, que ela apareceu de última hora. Então a decisão da ida ao cinema geralmente é muito demorada e acabamos não indo. Mas quando resolvemos ir está muito bem, lá pra nove e tanto de repente, não, não, não vamos esquecer, vamos perder a hora, vamos, não vamos, vamos, não vamos, vamos. Bom, então já surge um problema. Primeiro problema: ah, só vamos ao cinema em lugar onde possa estacionar carro perto. Não vamos ao cinema, por exemplo, cinema Um, em Copacabana muito mais raro a gente ir por causa de problema de onde botar o carro. Em compensação nós não vamos pro Rian porque só tem filme que não interessa. Quer dizer, as coisas ficam mais difíceis, né?
D
 Hum, hum.
L
 Aí saímos, chegamos no cinema, entramos na fila, pagamos a entrada, assistimos o filme e voltamos pra casa. Só, acabou.
D
 E quando está muito cheio?
L
 Ah, não vamos a filme muito cheio por princípio.
D
 Nunca aconteceu isso?
L
 Aconteceu muito mas cada vez mais nós evitamos ir (sup.)
D
 (sup.) E aí, e quando acontecia?
L
 Isso é que é o grande problema porque o dia nosso de tranqüilidade pra isso seria uma sexta-feira, sábado ou domingo, aí tem muita gente no cinema, então não vamos. Noutros tempos não havia problema. Quando eu tinha quinze anos, o cinema que a juventude no Rio de Janeiro ia era o cinema São Luís.
D
 Hum, hum.
L
 E todas as pessoas que se conheciam no Rio de Janeiro iam ao cinema São Luís nos domingos às quatro horas da tarde. Tinha que chegar às três pra conseguir sentar. Ficava aquela multidão mas uma verdadeira multidão naquele `hall' grande do São Luís mas era todo mundo conhecido, era realmente um ponto de encontro, todo mundo estava ali pra se divertir junto, esperando a hora do cinema mas isso tem quinze anos, né? E hoje em dia não, hoje em dia o máximo é uma filazinha e tal.
D
 E televisão?
L
 Televisão? Eu nunca gostei de televisão. Programa de televisão eu tenho verdadeiro horror.
D
 Por quê isso?
L
 Porque me irrita a monotonia, a demora. Por exemplo, nunca consegui assistir um programa de televisão inteiro, de ponta a ponta, a não ser (sup.)
D
 (sup.) Qualquer tipo de programa ou, ou ...
L
 Olha, eu não consigo me lembrar de um programa que eu consiga assistir assim de ponta a ponta. Novela às vezes mas mesmo assim nunca segui uma novela assistindo todos os capítulos. Uma vez ou outra ou com mais freqüência dependendo da época, do horário mas mesmo assim a novela das sete horas que eu estou à toa em casa, já cheguei do trabalho, estou esperando os filhos chegarem pra jantar e a empregada vê novela, então não tem outra solução, eu vejo a novela também esperando ela acabar de ver a novela pra pôr o jantar na mesa. Mas fora isso programa propriamente de televisão não temos o hábito, quando muito meu marido às vezes vê futebol (inint.) muito pouco.
D
 E seus filhos? (sup.)
L
 (sup.) E eu vejo, vejo filme à noite como uma maneira de me desligar do que eu estou fazendo pra me interessar pra dormir, assim uma, uma espécie de um calmante, um remédio que eu tomo pra dormir.
D
 E seus filhos vêem?
L
 Meus filhos não vêem televisão.
D
 Por quê?
L
 Porque nunca se interessavam. Viam quando eram pequenos, desenho e tal, "O Homem de Virgínia" nos domingos à noite me lembro que eles viam.
D
 Hum, hum.
L
 Mas pouco a pouco eles se desinteressaram, nunca vêem, raríssimo.
D
 Quer dizer, também na televisão a senhora (sup.)
L
 (sup.) Há um desinteresse (sup.)
D
 (sup.) Vai assistir um filme.
L
 Também eu só ve... só vejo praticamente filme e uma novela sem muita regularidade (sup.)
D
 (sup.) A senhora, a senhora teria assim noção (sup.)
L
 (sup.) Agora isso (sup.)
D
 (sup.) Das, das coisas que estão por trás por exemplo da (sup.)
L
 (sup.) Ah, do que é a televisão, ah, sim (sup.)
D
 (sup.) Apresentação de uma novela, da apresentação de um filme (sup.)
L
 (sup.) Isso nós temos muita, muita convivência entre os filhos porque inclusive a minha filha mais velha já trabalhou na televisão.
D
 Hum. Que que ela fazia?
L
 Ela trabalhou como auxiliar de cenarista quando ela era estudante lá na escola de Desenho Industrial e, e trabalhava em princípio deveria ser na parte de cenário propriamente mas a coisa mais desorganizada que existe no país eu acho que é a televisão. Ninguém acredita como é que chega a esses resultados, né?
D
 Hum.
L
 E ela participava de tudo, desde comprar as flores pra pôr no vaso na sala lá do, do, em que ia se passar aquela cena que ia ser filmada até controlar realmente uma porção de coisas. Ela tinha uma atividade muito grande, que ela é muito eficiente, assim muito dinâmica, então ela vivia muito aqueles problemas, muito interessada e tal. Tenho também uma sobrinha que trabalha (inint.) televisão no jornal (inint./sup.)
D
 (sup.) E o que que ela tem que fazer (inint./sup.)
L
 (sup.) Então a gente tem uma vivência quanto ao, como é que a coisa se processa e tudo.
D
 Como é? A senhora poderia descrever isso? Eu tenho interesse em saber exatamente como é que se processa esse trabalho, quer dizer (sup.)
L
 (sup.) Olha, eu, eu na parte de novela (sup.)
D
 (sup.) Uma novela ou pra um (inint./sup.)
L
 (sup.) Na parte de novela por exemplo eu me lembro de que a característica era essa: uma improvisação muito grande, uma desordem, a parte de cenário sempre terminava na última hora, falta de material, falta de, de direção, perda de tempo, sobrecarga de trabalho em certas fases, vazio de trabalho noutras fases e de repente aquela grande virada, a noite era virada, o dia era virado porque você vai filmar não sei quantas cenas. A característica que eu guardo disso, desse contato que eu tive era com a desorganização.
D
 E ...
L
 Muito violenta inclusive.
D
 A parte assim de noticiário?
L
 De noticiário eu não tenho, não tenho convivência assim não. Não sei como é que se faz a montagem.
D
 Ah, essa sobrinha da senhora (sup.)
L
 (sup.) É, mas eu não tenho muita convivência com ela (sup.)
D
 (sup.) Não tem assim idéia não? E prum filme?
L
 Filme também eles se interessavam numa certa época porque eles também se interessam muito por fotografia.
D
 Hum.
L
 Depois os trabalhos deles de escola são na base de fotografia, de televisão também.
D
 Mas vamos supor que (sup.)
L
 (sup.) Eu já acompanhei, saber como é e tal mas nunca me interessei muito não.
D
 Mas tem uma idéia assim, se for fazer um filme que que é (sup.)
L
 (sup.) Não (sup.)
D
 (sup.) Preciso pra fazer esse filme. Vamos começar a fazer um filme (sup.)
L
 (sup.) Que que é preciso pra fazer um filme.
D
 Então.
L
 A primeira coisa na minha opinião pra fazer um filme, eu, eu me interessei numa certa época inclusive em problemas de filme didático.
D
 Hum.
L
 Meu marido pensou em fazer uma ocasião ou esses filmes de, não digo de propaganda, mas esses filmes no gênero do que deveria ser um Amaral Neto por exemplo, que é um programa de mostrar o Brasil, de apresentar regiões e fatos típicos de cada área, etc. e tal, eu acho que haveria uma riqueza muito grande a ser aproveitada.
D
 Hum, hum.
L
 Como tema, esse tema geral de Brasil, apresentação regional que é muito mal apresentado, muito, muito desperdiçado no Brasil. Isso nos interessou inclusive numa certa fase nós pensamos mas justamente quando tínhamos tempo, lazer para pensar numa coisa dessas não tivemos oportunidade de fazer nada. Quando veio a oportunidade não tivemos tempo, então acabamos não fazendo. O único contato que eu tive com isso foi uma vez um rapaz arquiteto que estava querendo fazer um filme sobre o Rio de Janeiro, visando, bom, ia vender a idéia para o estado da Guanabara, o Departamento de Estrada de Rodagem, que foi o órgão que organizou o plano Lúcio Costa na Barra da Tijuca. Então o objetivo dele era fazer um filme sobre o Rio de Janeiro que levasse espontaneamente, conduzisse o assitente a aceitar a idéia do plano Lúcio Costa e a entender o que que o plano Lúcio Costa representava dentro do estado da Guanabara. Então ele esteve me procurando pra pedir informação sobre o Rio de Janeiro e eu me interessei e ajudei muito em termos de sugestão inclusive como que ele deveria fazer. Primeiro sugeri uma pessoa pra fazer o trabalho pra ele formalmente, essa pessoa não quis e eu acabei, sem participar oficialmente do grupo, ajudando muito nessa idéia de fazer um, uma visão dinâmica do crescimento da cidade, apresentar um roteiro que desse realmente alguma coisa de interessante para uma visão de conjunto. Porque o que acontece com esse tipo de filme que pretende ser um filme, ahn, de divulgação cultural, de divulgaç~ao da realidade brasileira ou mesmo esse de propaganda é que na grande maioria das vezes eles perdem assim minutos longos mostrando uma máquina bem amarela com aquele operário com o macacão bem vermelhinho com os dizeres da propaganda nas costas e desperdiçam a oportunidade de a propósito daquela propaganda fazer um filme interessante. Então eu ajudei bastante esse rapaz nessa parte de roteiro e realmente me interessei na possibilidade inclusive de vir a lidar com isso quanto a filme dessa natureza, né, mas depois não, nunca tive tempo mesmo. Não, não levei adiante.
D
 Agora ele (inint./sup.)
L
 (sup.) Mas eu me interessaria num (sup.)
D
 (sup.) Roteiro desses teria que tomar uma série de providências pra concretizar.
L
 Ah, mas aí nesse (sup.)
D
 (sup.) O filme (sup.)
L
 (sup.) Tipo de filme é muito simples, né?
D
 Que que seria?
L
 Bom, nesse tipo de filme ele ia contar basicamente com duas coisas: uma parte de desenho, animado obviamente, em que ele iria apresentar com mapas, expansão por exemplo, ondas de expansão da, da ocupação ao longo do litoral contornando a parte do maciço da Carioca, curtas ou longas, enfim, uma coisa do gênero que serviria para acompanhar e uma visão realmente da cidade e aspectos antigos quando apresentasse a parte central da cidade, a parte mais antiga da cidade e pouco a pouco ir mostrando dinamicamente como é que a cidade foi evoluindo, se expandindo até chegar à baixada de Jacarepaguá, que seria um coroamento do filme (inint.) né?
D
 Seria (sup.)
L
 (sup.) Então no fundo ele ia usar o quê? (sup.)
D
 (sup.) Ele precisaria de pessoas (sup.)
L
 (sup.) Ele ia usar imagens, imagens (sup.)
D
 (sup.) Que iam ajudá-lo, não? (sup.)
L
 (sup.) Da realidade atual e ia usar desenhos.
D
 Mas ele ia precisar de outras (sup.)
L
 (sup.) Ia (sup.)
D
 (sup.) Pessoas pra ajudá-lo a fazer isso tudo.
L
 Ele ia precisar basicamente dele próprio, se ele fosse realmente, porque filme dessa natureza quem, quem organiza o filme é quem faz a fotografia do filme, é quem monta o filme, é o próprio.
D
 Hum.
L
 Não seria desdobrado (inint./sup.)
D
 (sup.) E se fosse um filme (sup.)
L
 (sup.) Ah, bom, um filme comercial (sup.)
D
 (sup.) Comercial normal (sup.)
L
 (sup.) Aí é uma equipe numerosa. Cada um tem uma função (sup.)
D
 (sup.) Tem idéia assim do que que é (inint./sup.)
L
 (sup.) Ah, vagamente.
D
 Mas (inint./sup.)
L
 (sup.) Vagamente. Bom, você tem o roteirista, tem, tem as pessoas responsáveis pela montagem toda de cenários, filme comercial tem uma parte importantíssima (inint.) tem toda a parte de rouparia, de, de, como é que se diz, tem uma expressão us... usada pra isso que eu já estou me esquecendo, de contra-regra por exemplo que é quem controla a, a parte toda de material, né, tem os da fotografia propriamente, fazem o serviço com a câmera, tem os responsáveis pela, pelo controle do diálogo. Eu não, não tenho realmente uma noção de quantas, quantas funções existem mas essas funções podem ser desdobradas. Quanto maior o empreendimento mais variada a, mais variado o número de funções, né?
D
 E as pessoas que vão representar, como é que isso funciona?
L
 Aí depende também do filme. Nos filmes modernos a coisa é bem diferente, né?
D
 Como assim?
L
 Porque há mais espontaneidade. Num filme dessa natureza hoje em dia se usa muito, muito personagem que não é um artista organ... criado pra aquilo. Há muita espontaneidade hoje nesses filmes, além do artista tradicional, que estudou o papel, que respeita o papel, existe mais liberdade no filme hoje do que havia antigamente.
D
 Como é que era antigamente?
L
 Antigamente havia um rigor muito grande de obediência ao papel estudade e à letra do papel. Não se podia fugir absolutamente ao diálogo, aquilo era tudo muito respeitado e a impressão que eu tenho, eu não convivo muito mas a impressão que eu tenho é que no cinema moderno há muito mais abertura no sentido de que há espontaneidade do intérprete de mudar um pouco aqui, mudar um pouco ali conforme e o, o diretor aceita, enquanto que nos, nos, nos velhos tempos devia haver um rigor muito maior no cumprimento rigoroso daquilo que estava previsto.
D
 E em termos assim de televisão?
L
 Ah, televisão (sup.)
D
 (sup.) Das pessoas que representam também?
L
 Televisão também hoje eu acredito que haja mui... muito mais espontaneidade do que havia no começo. Há, há muita, muita, muita coisa na televisão hoje que deve ficar por conta do, do humor do momento, embora haja o respeito ao, ao `script' preparado e tal, mas deve haver muito mais liberdade do que havia dez anos atrás ou quinze anos atrás (inint./sup.)
D
 (sup.) Agora eu estava querendo saber uma coisa também, assim os tipos de programas. Mesmo a senhora não vendo televisão, quais são as, os tipos de programas que a senhora sabe que existem?
L
 Aí ...
D
 Na televisão.
L
 Tipos de programas. Classificar os tipos de programas? Bom, existem os grandes programas que têm mais auditório, né, Chacrinha, Flávio Cavalcanti, Sílvio Santos. Como classificar esses programas? Programas de auditório, tipos variados.
D
 E o que que caracterizaria assim (sup.)
L
 (sup.) Ah, aí, no, no caso desses grandes é principalmente o contacto com o público, né? Eles souberam atrair realmente o público, cativar o público e manter aquele público mais ou menos sob controle.
D
 E como?
L
 Com, com uma forma de apresentação que teve aceitação.
D
 É só a forma de apresentação?
L
 Ah, sim, a personalidade deles. O conteúdo eu acho que não é tanto o que vale não porque o conteúdo eles mudam um pouco, às vezes o Flávio Cavalcanti já tem mudado, a gente comenta, ouve falar, mudou o estilo do programa um pouco pra aqui, um pouco pra lá, é mais, eh, a maneira de conduzir o programa e não o tipo de, de, de número, de `show' ou tipo de, de encaminhamento que ele faz dentro do programa mas a maneira dele de apresentar, de explorar os assuntos, o sensacionalismo. Ele, ele tem variado mais, né? O Chacrinha eu acredito que seja mais tradicional. Não, não tenho uma convivência tão grande, é mais espontâneo, né? Sempre foi assim e mantém aquilo.
D
 E além dele?
L
 Agora, além desses eu sei que existe um famoso Sílvio Santos, que dura não sei quantas horas, a característica é essa. Não, não sei como é que é (sup.)
D
 (sup.) E além desses que a senhora chamou de auditório?
L
 Além desses existe aquele outro tipo que eu nem sei se é feito para o auditório ou não, desses programas cômicos que tem o famoso "Balança mas não cai" de antigamente.
D
 Hum.
L
 Que parece que sobrevive, né, e outros que têm aparecido, que têm desaparecido que eu vi algumas vezes, o Jô Soares, aquele padre, que as crianças me chamavam pra ver, imitando um padre, pregando no púlpito, "Faça humor não faça a guerra", não é?
D
 Hum, hum.
L
 Que já não existe mais, já mudou. Então há uma, uma, eu acho que há uma pobreza muito grande, então os programas não podem durar muito tempo, a não ser um do tipo Chacrinha ou do tipo "Balança mas não cai", que tem um auditório fixo, não sei por que que mantém aquele interesse, apesar da grande monotonia que deve ser, porque deve ser sempre as mesmas `charges', as mesmas coisas. Não, realmente eu nunca consegui assistir nenhum deles.
D
 A senhora falou num, num pro... coisa do tipo Amaral Neto repórter.
L
 É, aí já é outro estilo, né, já é um tipo de reportagem que procura mostrar alguma coisa, fazer propaganda de alguma coisa, obviamente tirando lucro disso, da propaganda que está fazendo mas que tem um valor eu acho de informação muito grande. Eu também não tenho paciência de ver.
D
 Além desse tipo de informação.
L
 Mas que eu acho que ele, ele é, ele é significativo, ele tem um valor cultural porque ele dá realmente um conhecimento a muita gente que nunca saiu do Rio de Janeiro, que não conhece o que ocorre fora do Rio de Janeiro fica conhecendo, né, acho que isso é importante.
D
 E além, eh (sup.)
L
 (sup.) Podia ser melhor ...
D
 Essa idéia de (inint./sup.)
L
 (sup.) Mas eu acho que é, é uma, é uma das coisas melhores da televisão é esse tipo de programa que é raro, não há muita coisa.
D
 E em termos assim de veiculação de área de informações, a senhora nota alguma diferença nas, na programação de televisão?
L
 Como, em que sentido veiculação de área? O que que você quer dizer com isso? (sup.)
D
 (sup./inint.) jornal.
L
 Ah, bom, além dos jornais, você fala, dos jornais da televisão que você está falando?
D
 Hum, hum.
L
 Ah, jornal (sup.)
D
 (sup.) Como substituto do jornal imprensa (sup.)
L
 (sup.) Aí eu acho que eles, eu acho que eles têm um, têm uma vantagem no sentido de que eles resumem a informação mais fundamental do dia mas acho que eles são extremamente pobres, também perdem muito tempo com fatos banais que não têm significado nenhum, que ocorreram em São Paulo, no Rio de Janeiro, numa pequena coisa assim sem nenhum interesse que eles perdem com muita freqüência uma boa parte do tempo disponível. Aí talvez seja conseqüência da situação política por não poderem dizer outras coisas, não sei. Mas o que eu sinto é um vazio muito grande no conteúdo do jornal em relação ao tempo que eles ocupam com qualquer programa de televisão obviamente. Além dos anúncios, o próprio conteúdo da informação que eles dão é mínimo em relação ao tempo em que eles falam.
D
 E isso (inint.) tem falado muito por causa disso na aldeia global e ...
L
 É.
D
 A senhora sente diferença nesse sentido (sup.)
L
 (sup.) Não, eu acho que esse, isso não há dúvida influência da aldeia global. É um fato porque às vezes o fato que eles estão noticiando não teria interesse nenhum direto para quem está assistindo mas a pessoa que está assistindo passa a acompanhar, passa a viver aquele problema e, e a se envolver por aquilo porque está ali no noticiário da televisão todo dia. Por exemplo, famoso caso do, do rapto do, do neto do milionário, não sei quê. Todo, toda semana na televisão tem um comentário, tem uma notícia, aquilo é veiculado, aquilo é retomado e cria-se aquele ambiente em torno do problema. Isso eu acho que tem uma influência muito grande na população, passa todo mundo a conviver em torno de determinado tipo de problema que antes uma boa parte da população nem tomava conhecimento. Mais da metade da população que hoje sabe do, do, do rapaz que cortaram a orelha talvez nem soubesse que o pai, o avô dele existisse, quem era, quem não era, etc. e tal, não é?
D
 Hum.
L
 Isso já é um efeito do, da influência da televisão.
D
 Mas havia por exemplo o rádio (sup.)
L
 (sup.) E passam a dar importância enorme a tudo isso. Ah, mas o rádio não tinha a mesma penetração, né?
D
 Não? Por quê?
L
 Eu tenho a impressão que o noticiário do rádio não tinha (inint.) não se ouvia, não, ou não se fazia uma pessoa ali. Eu não sei não, eu tenho a impressão de que o noticiário do rádio, talvez porque o tempo no rádio fosse controlado de outra maneira, ele se amarrava ... Olhe, olhe a expressão, vê? Ele, ele se limitava com muito mais freqüência às notícias importantes, política, etc. Notícias do dia-a-dia, um acontecimento a não ser um, o rapto do rapaz teria sido noticiado mas não ... Os comentários em torno do ocorrido, quer dizer, retomar aquilo, fazer render a notícia dias seguidos com mais uma observação sobre o fato, mais outra observação, o rádio não fazia isso.
D
 Como é que fazia? (sup.)
L
 (sup.) A televisão faz. Ah, o rádio dava a notícia no dia do rapto, depois comunicava que foi descoberto o raptor, ou então mataram o, a pessoa que foi raptada e, e, ou seqüestrada, enfim.
D
 É (inint.) costuma-se (sup.)
L
 (sup.) Noutros tempos falava mais rapto, hoje já se diz que não se fala rapto, se fala seqüestro mas nos velhos tempos se dizia rapto, né?
D
 É.
L
 Há rapto. Na minha infância foi o famoso rapto do filho do Lindenberg, só se falava rapto.
D
 E em termos de (sup.)
L
 (sup./inint.) quando eu aprendi a palavra rapto, que eu nunca tinha ouvido falar.
D
 Hum, hum. E em termos de utilização de, como meio de comunicação tem-se falado muito que a televisão seria assim um instrumento de banalização.
L
 Ah, isso (sup.)
D
 (sup.) Dos acontecimentos, enquanto que o rádio, eh ...
L
 Eu acho que o rádio selecionava mais, não que ele selecionasse o tipo de notícia mas eu acho que ele não, não explorava da mesma maneira que a televisão explora. A televisão, hum, a televisão é mais feito o jornal propriamente, que sempre fez, eh, estardalhaço em torno de certos tipos de notícia e tal. E o rádio acho que era mais sóbrio. Noticiário do rádio acho que era mais sóbrio.
D
 A senhora costumava ouvir rádio?
L
 Noticiário ouvia todas as noites.
D
 Só?
L
 Havia um padrão: música, noticiário. Nunca vi, ouvi programa de rádio também. Ouvia "Balança mas não cai" porque (inint.) meu sobrinho mais velho tinha um ano e meio ou dois e ele gostava de ouvir, não sei por que cargas-dágua.
D
 O que que havia assim antes da (inint.)
L
 Ah, não me lembro.
D
 Não tem muita (inint.)
L
 Eu nunca, nunca fui de ouvir rádio. Eu ouvia música (inint.) perdi o hábito. Bom, porque também não se pode ouvir muita coisa dentro de uma casa onde já tem uma vitrola ligada permanentemente em altos brados. Então pouco a pouco fui perdendo o hábito de ouvir música. Inclusive mesmo ouvir música no quarto por exemplo que era uma coisa que eu fazia antigamente, eu perdi o hábito e hoje se eu tenho o rádio ligado no quarto eu presto atenção à música e aí não, não me isolo tanto.
D
 E hoje com a televisão qual é ainda a função do rádio? Ele deixou de (inint.) assim.
L
 Eu acho que ele mantém uma função importante.
D
 Onde é que a senhora observa que (sup.)
L
 (sup.) Em primeiro lugar (sup.)
D
 (sup.) Ele é usado (sup.)
L
 (sup.) Eu acho que ele é mais usado pelas pessoas que não estão em casa e que querem estar a par do que que está ocorrendo, pra começar chofer de táxi. É onde eu ouço rádio, eu só ando de táxi.
D
 Hum.
L
 Eu todos os dias ouço o noticiário na rádio Globo, às vezes na rádio Jornal do Brasil e ouço um programa que todo chofer de táxi ouve, um program policial na hora do almoço, quando eu venho almoçar, não sei qual é o nome, um programa por exemplo de casos assim familiares ocorridos. Ainda hoje quando fui pra cidade e o motorista consulta o passageiro, não sei se você tem o hábito de usar como eu, de andar de táxi. Mas hoje por exemplo o motorista me, que me levou, quando nós estávamos na praia, já tínhamos passado o Catete, ele ainda fez comentários: e, e a senhora viu este con... este conselho que este indivíduo está dando pra pobre da senhora? É um conselho inútil porque ela, ela recorreu a ele numa aflição muito grande e ele está dando um conselho que não vai servir de nada pra ela. Esses homens não têm capacidade pra dar conselhos dessa natureza. (risos) Eu achei muito engraçado. No entanto ele ouve o programa, quer dizer que ele se interessa. É quando eu sei o que acontece no rádio, é, é pela, pelo, pelo táxi. Mas a maioria das vezes em que eu hoje ouço rádio é quando estou de carro, quer dizer, quando saio pra passear ouço música no carro.
D
 E aí qual é o tipo de ...
L
 Aí rádio Ministério da Educação, rádio Jornal do Brasil, dependendo, uma ou outra mas geralmente rádio Jornal do Brasil.
D
 E futebol?
L
 Futebol na minha infância assistia, me interessava, na minha juventude, depois meu marido não se interessa, eu fui me afastando, hoje em dia só acompanho futebol em época de campeonato do mundo e eventualmente guardo lembrança de ter sido Flamengo.
D
 Ter sido?
L
 Ter sido porque realmente hoje não, não me abala muito mais. Futebol eu não acompanho mesmo não.
D
 Não acompanha.
L
 Não e, e há uma coisa muito curiosa que, na roda, ahn, dos meus filhos a grande maioria também não se interessa por futebol. Tem alguns rapazes que às vezes vão assistir futebol, que jogam futebol na praia mas a maioria não se interessa, então eles mesmos não, não, não é um assunto em casa futebol. Mesmo loteria esportiva eu falo muito: quando eu ganhar loteria esportiva, eu só joguei três ou quatro vezes porque eu não me lembro de jogar.
D
 E em termos de (sup.)
L
 (sup.) Quer dizer, não há uma vivência do problema do futebol aqui. Naturalmente, eh, por exemplo, as crianças consideram Pelé o, que que eles chamam Pelé, seria, meu Deus, qual é a expressão usada, careta, uma coisa que o valha e meu marido por exemplo gosta muito do Pelé, acha o Pelé formidável. Então as, as grandes figuras de futebol às vezes se comenta e tal, mas não ... Eu fui ao Maracanã uma vez (inint./sup.)
D
 (sup.) Bem, mais uma coisa que me interessava saber, essa, esse grupo jovem que convive com seus filhos, qual é o meio assim de comunicação, de informação que eles utilizam?
L
 Varia muito. Um, uma parte, inclusive em casa aqui, em casa a minha filha de dezoito anos praticamente não lê jornal. Não sabe o que se passa pelo mundo, não está informada, é alienada total.
D
 Não toma conhecimento.
L
 Ela toma conhecimento porque se conversa sobre os assuntos à mesa e ela aí tem que participar de alguma maneira e invariavelmente pergunta alguma coisa fora de hora porque já se falou aquele assunto anteriormente ou todos já leram, todos estão a par daquilo que ela ignora completamente porque ela não leu.
D
 Não é a que estuda comunicação.
L
 Não, é a do meio, vai estudar psicologia.
D
 E a que estuda comunicação?
L
 A que estuda comunicação ... Estuda, não, se forma agora, né?
D
 Logo agora, né?
L
 Essa ela se interessa. Agora não tem muito tempo. Então ela lê jornal, lê Veja, eventualmente alguma outra coisa ou então lê uma revista sofisticadíssima, varia muito, de acordo com o momento.
D
 E em termos assim de (sup.)
L
 (sup.) E o rapaz ao contrário, o rapaz lê muito, jornal regularmente, de ponta a ponta, Caderno B, tudo e com isso inclusive pra ele está sendo muito importante. Agora mesmo ele não, ele está terminando o cursinho, era, ele fez científico e no último ano, como estava interessado era em música passou pra fazer clássico, fez um concurso de um bolsão, ganhou uma bolsa, sem nem se preparar, eu ainda pensei que não passasse, ganhou bolsa de cem por cento, no primeiro semestre assistiu às aulas, teve notas boas, no vestibular simulado no meio do ano, no segundo semestre como ele estava inteiramente envolvido na flauta ainda tinha que estudar francês audiovisual pra poder se candidatar à bolsa, ele abandonou o cursinho. Mesmo assim nunca mais foi, só foi fazer as provas e se saiu razoavelmente. Só não se saiu muito bem em matemática porque o programa era diferente do que ele havia feito em, em, no científico mas na parte de história e geografia obviamente ele tem uma convivência maior, agora a parte de história, de português, inglês que ele sabe muito bem ele se saiu muito acima da média da turma embora não tenha ido a nenhuma aula no segundo semestre. Por quê? Porque lê sempre jornal, então (sup.)
D
 (sup.) Ele lê só jornal (inint./sup.)
L
 (sup.) Ele lia muito antes, ele agora lê muito pouco porque não tem tempo.
D
 Sei.
L
 Materialmente falando ele não tem tempo.
D
 E es... esse (sup.)
L
 (sup.) Mas ele tem a vivência de ter lido muito e continuar lendo jornal, então ele sabe o que que se passa e hoje num cursinho, terceiro ano, vestibular, isso é importante.
D
 E esse grupo costuma, eh, ir a cinema (sup.)
L
 (sup.) Ah, sim (sup.)
D
 (sup.) Também?
L
 Também há fases. Houve uma fase em que iam muito. A mais velha por exemplo ia muitíssimo a cinema num certo período. Agora, em parte por influência dele, em parte por influência do, dos outros amigos eles têm ido mais a concerto, música e tal. E o tempo não é muito.
D
 E teatro?
L
 Teatro pouco. Todos vão pouco ao teatro.
D
 Por quê?
L
 Não sei, eles vão às vezes. Por exemplo "Hoje é dia de rock" cada um deles viu duas ou três vezes ou quatro ou cinco, enfim foram não sei quantas vezes ver " Hoje é dia de rock".
D
 Já foi ver?
L
 Eu não fui, acabei não indo.
D
 Acabou não indo?
L
 Eles falaram tanto e eu acabei não indo.
D
 E a senhora a teatro (sup.)
L
 (sup.) Mas (sup.)
D
 (sup.) Também não vai?
L
 Eu vou muito pouco, muito pouco mas nós realmente saímos muito pouco porque como eu passo o dia na rua e, e, e a casa está cheia de noite eu fico em casa, no movimento dos, dos jovens, né? Ainda ontem eu fiquei lendo um livro aí, um romance até uma hora da manhã. Meus filhos já tinham ido dormir e tinha amigos aqui, eles ficaram ouvindo música e quase uma hora da manhã chegou o namorado de uma outra menina, de uma delas.
D
 E esse (sup.)
L
 (sup.) Com outro rapaz. E isso tudo ...
D
 Quando a senhora tem oportunidade de ir a teatro?
L
 Eu não tenho muita oportunidade porque geralmente eu ... Quando que eu vou a teatro? Eu não vou praticamente ao teatro. Eu vou raríssimas vezes.
D
 Qual foi a última vez que a senhora foi?
L
 Qual foi a última vez mesmo? (pausa) Deixa eu me lembrar. (pausa) Não estou me lembrando. (pausa) Quando que eu fui ao teatro a última vez?
D
 Porque se fala muito assim (sup.)
L
 (sup.) Fui ver a "Capital Federal".
D
 "Capital Federal" se fala muito assim (sup.)
L
 (sup.) Mas não sei se foi a última vez não. Acho que foi uma das últimas vezes (sup.)
D
 (sup.) Numa espécie de, de decadência do, do teatro.
L
 Eu nunca, nunca me interessei muito não, em parte porque era difícil, era raro, era problema de horário, era distância, era o fato de que eu tendo filhos pequenos e movimento em casa e mesmo depois de eles crescidos eu nunca sabia se eu estaria livre ou não. Até hoje quando acontece de eu marcar alguma coisa eu me arrependo sempre de marcar porque nunca vou saber se naquele momento vou estar disponível.
D
 Nenhum de seus filhos nunca teve interesse assim por teatro, participou de coisas (sup.)
L
 (sup.) Ah, sim, a mais velha já fez teatro no tempo de menina de colégio e tal, participou muito.
D
 Como é que era?
L
 Ah, quando ela estava no colégio Santa Úrsula participou, se exibiu e tal.
D
 Como é que era?
L
 Nem me lembro mais. Foi uma fase muito rápida, um ano no máximo, quando ela tinha quinze anos, ela se interessou por teatro. E acho que nos Estados Unidos também ela se interessou por isso, não tenho certeza, mas ela nunca viveu não. Na fa... na família eu tinha uma cunhada que era empolgada por teatro, tinha realmente mas era uma pessoa assim muito instável, muito confusa, muito complicada e ela trabalhava lá no grupo do Tablado, meu irmão também ia ajudar (inint.) eletricista, de vendedor de bilhetes, então acho, acompanhamos um pouco vida de teatro através deles um certo período.
D
 (inint./sup.)
L
 (sup.) Mas eu ...
D
 O que que a senhora sabe assim de teatro? Por exemplo (sup.)
L
 (sup.) Mas não (sup.)
D
 (sup.) Pra que uma peça (sup.)
L
 (sup.) Não nos interessamos (sup.)
D
 (sup.) Chegue a ser (sup.)
L
 (sup.) Não nos interessamos muito não. Eu não, eu pessoalmente tenho uma certa má vontade, me irrita um pouco, não sei bem por quê. Houve um período que eu ia mais. É a tal história, há uma fase da vida em que o tempo livre é pequeno mas em que se corre mais pra aproveitar mais aquele tempo e há uma fase em que a pessoa vai talvez por comodismo se afastando e, e indo menos. Houve um período que nós íamos bastante a teatro, agora estou tentando me lembrar, o tempo de Maria Della Costa no Municipal, eu vi muita coisa de teatro mas depois pouco a pouco me afastei.
D
 Mas lhe irrita em, o quê?
L
 Não sei, eu não tenho, não sei lhe dizer por que que, me irrita, não é, me irrita é o, a, a programação definida de sair de casa para ir ao teatro. Eu acho que também é um pouco de questão de, de ambiente de vida. Vivendo em Laranjeiras, tudo é longe, tudo é fora de mão, tudo é difícil, então pouco a pouco ... Como em casa nós temos mov... muito movimento nós acabamos ficando mais em casa, eu acabo não indo a lugar nenhum, é a mesma razão do cinema.
D
 Hum, hum.
L
 Sendo que o teatro ainda é mais difícil. Cinema a pessoa ainda pode sair dez horas (inint) casa nove, nove e tanto (barulho de alguém mexendo no microfone) então o mais freqüente é nós acabarmos não indo a lugar nenhum. Com isso eu vivo muito fora do teatro, cinema, de televisão.
D
 Mas não tem importância. E circo (sup.)
L
 (sup.) De todos esse assuntos. Ah, circo então (sup.)
D
 (sup.) Circo a senhora já foi alguma vez na vida, né?
L
 Algumas vezes. Bom, quando eu era pequena eu ia muito aqui no, dois quarteirões adiante tinha um circozinho no alto do morro.
D
 Como é que era esse circo?
L
 Ah, eu mal me lembro, mal me lembro, não tenho grandes recordações assim de alguma coisa especial do circo não. Eu me lembro que nós íamos com freqüência a um circo na esquina da rua Leite Leal com Laranjeiras. É só o que eu me lembro do circo da minha infância. Depois circo Sarrazani, já no centro da cidade, que era um acontecimento também na minha infância, antes da guerra e depois naturalmente levando os filhos ao cinema, ao circo, né, já no Maracanãzinho.
D
 Mas aí como é que era? O que que tinha lá?
L
 Aí, ah, todos esses números clássicos de circo (inint.) trapézio (sup.)
D
 (sup.) Exatamente os números clássicos de circo que eu quero saber (sup.)
L
 (sup.) De, de elefantes, de cachorrinhos, de mágico, enfim, nem me lembro, não vou há muitos anos, inclusive a partir de um certo tempo eu passei a ir menos, meu marido ia, eles iam já com outros amigos e tal, com outras pessoas acompanhando e eu passei a ir menos porque eu nunca me interessei muito por circo não.
D
 Por quê?
L
 Por quê? Achava monótono talvez. Não, não sei. Porque há pessoas que mesmo depois de velhos gostam de ir a circo, né? Aqui, por exemplo, se hoje me chamarem pra ir ao circo eu não vou, se chamarem meu marido pra ir ao circo e for um grupo animado ele vai. Aí é uma questão de gostar ou não.
D
 De que que ele gosta (sup.)
L
 (sup.) Eu ia (sup.)
D
 (sup.) No circo?
L
 Ah, ele se empolga com qualquer coisa porque se lembra muito dos circos da infância. Ele vibra muito com os problemas, as, as lembranças dele de criança e tal. Ele gosta (sup.)
D
 (sup.) E aí ele chega animado, contando (sup.)
L
 (sup.) Gosta (sup.)
D
 (sup.) O que que ele (sup.)
L
 (sup.) Ele não vai muito não mas quando ele vai a qualquer coisa no gênero ele gosta muito.
D
 Aí o que que ele conta?
L
 Ele não conta muita coisa não. Ele volta satisfeito, entusiasmado mas não conta muita coisa não. Mas mesmo meus filhos não vão muito a circo não. Quando tem, ainda agora recentemente houve circo de, circo chinês (inint.) eles não vão. É raríssimo eles irem. Há muito pouco interesse da parte deles.
D
 Muito pouco.
L
 É. Eu não sei.
D
 (inint./sup.)
L
 (sup.) Se a qualidade do circo é que é ruim hoje em dia, que é raro haver um bom circo.
D
 E assim (sup.)
L
 (sup.) Quando foi a última vez que eu fui? Nem me lembro (inint./sup.)
D
 (sup.) Quando crianças eles iam?
L
 Iam bastante. Sempre que tinha um circo melhor assim aqui no Rio nós levávamos.
D
 E que que eles gostavam?
L
 Ah, de tudo, a começar de sair de casa pra ir pro circo. Saíam com outros. O programa circo é que era apreciado. Agora quanto aos números eu acho que eles gostavam de tudo.
D
 Quais eram esses números? Dê uma idéia assim.
L
 Ah, domador de leões, cachorrinhos, motocicleta maluca, não é não? Trapézio, aqueles de lidar com pratos, o chinês, né, não me lembro bem. Tinha os equilibristas com pratos na, na extremidade assim dum, dumas varas longas, né?
D
 Hum.
L
 Mais o que que eles se lembravam? Eu não estou me lembrando. Acho que não vou a um circo há mais de quinze anos, (risos) dez, doze anos pelo menos eu não vou.
D
 E hoje por, hoje em dia (sup.)
L
 (sup.) Dez, doze anos (sup.)
D
 (sup.) Há até assim uma quantidade imensa (sup.)
L
 (sup.) Eu não (sup.)
D
 (sup.) De peças de teatro.
L
 Ah, infantis.
D
 Infantis.
L
 Muitas, antigamente não havia.
D
 Antigamente não havia.
L
 É. Eu não, eu, rarissimamente havia alguma coisa pra se levar uma criança. Mesmo cinema havia pouco, né? Quando muito "Tom e Jerry" e tal.
D
 E quan... que tipo assim de (sup.)
L
 (sup.) Eu, eu, o máximo que eu levei os meus era isso, era desenho animado no domingo de manhã ou então alguns filmes tipos filme, eh, "Help" por exemplo eu vi com eles de manhã. Aquele outro (inint.) que eu esqueci o nome (pausa). Mas teatro infantil havia pouquíssimo, não me lembro de teatro infantil, alguma vez ou outra, não me lembro não. [barulho de alguém mexendo no microfone]
D
 E programas assim de televisão eles tiveram influência de, na fase assim de criança, de adolescente (sup.)
L
 (sup.) O menino se interessou muito numa certa fase não por programa propriamente, por esses filmes seriados, né, aqueles filmes, eu me lembro bem d'"O Homem de Virgínia" porque no domingo nós saíamos pra ir na casa da minha sogra e tínhamos que voltar pra casa a tempo do menino ver "O Homem de Virgínia", que ele fazia questão. Ele tinha seus oito anos uma coisa assim. Mas não, nunca foram desses maníacos não. Tiveram uma fase, eu tive um menino que morreu, que era depois da mais velha, eu me lembro quando ele, ele tinha seus sete pra oito anos, eu evitei ter televisão em casa (inint.) o hábito em primeiro lugar. Enquanto pude eu não tive televisão.
D
 Atualmente a senhora tem?
L
 Tenho.
D
 Como é? Que tipo? (sup.)
L
 (sup.) Ah, é uma televisão comum, não, portátil, muito pequena mas que vai pro quarto, vem pra sala, conforme se quer.
D
 Eh, ainda é ...
L
 Preto e branco, é, preto e branco, não é colorida não.
D
 E pega bem aqui?
L
 Muito bem, não tem problema nenhum não.
D
 Não precisa utilizar assim (sup.)
L
 (sup.) Não, não tem antena externa nem nada.
D
 Nada?
L
 Não.
D
 Então eles costumavam ver o quê? Tinham interesse em (sup.)
L
 (sup./inint.)
D
 A senhora evitou a televisão.
L
 Naquela época eu, eu evitei a televisão, eles começaram a ver muito no vizinho e não houve outra solução. Oi. Jantou? [pergunta da entrevistada a circunstante e resposta (Jantei).] Mas ...
D
 Já está acabando.
L
 Mas o, depois eles tive... começaram a ver, era um, havia inclusive um seriado nacional naquela época.
D
 Hum.
L

  Que era um polícia rodoviária de São Paulo. Até que tinha um que eles achavam muito engraçada a maneira de falar de um paulista, eles achavam engraçadíssimo. Isso eles, isso eu me lembro bem, eles apreciavam, tinha um cachorro, uma coisa assim e aquilo interessava muito, empolgava muito. Depois eles pouco a pouco foram se desinteressando. Realmente é uma família curiosa, nunca houve uma fase assim de telemania não, nenhum deles.