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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Transportes e viagens"

Inquérito 0142

Locutor 161
Sexo feminino, 36 anos de idade, pais cariocas
Profissão: psicóloga
Zona residencial: Norte

Data do registro: 30 de março de 1973

Duração: 40 minutos

Clique aqui e ouça a narração do texto


D
 Basta você começar talvez contando as viagens assim mais recentes que você tenha mais lembranças de como (sup.)
L
 (sup.) Hum, hum (sup.)
D
 (sup./inint.) não é?
L
 Sei. Mas se eu, acho que se eu contasse a viagem que eu fiz, digamos assim, eu, eh, ultimamente, eu me deteria muito talvez no transporte e sim no lugar que é muito bonito. Mas, enfim, o que eu posso falar também é a respeito de estrada.
D
 Hum.
L
 Eh, o que a gente encontra muito é dificultade de andar pelo estado do Rio pelo menos. O problema de atravessar, por exemplo os lugares são muito bonitos e talvez, eh, devem ainda ou pouco ... Eu gosto de lugares mais agrestes assim que a gente não tenha que andar toda cheia, toda emperiquitada, cheia de, de roupa e ... Por exemplo Cabo Frio já está muito badalado, né? Eu gosto muito daquele estado do, daquele pedaço lá do estado do Rio. E nós descobrimos um lugar que não está, eh, ainda contaminado. E talvez por causa do transporte, porque quando vier a ponte eu acredito que aquele, aquele, eh, local vá também ser invadido de, de gente de fim de semana, por enquanto não, justo por causa da dificuldade, porque você ou vai, dá aquela volta enorme por Magé ou então fica uma hora ou mais ou duas, uma hora de assim se você tiver sorte. Você fica quase que duas horas a esperar, a esperar aquela barca que vai, aquela barcaça que vai devagar e não sei se obedece muito a horário, enfim e ... Ou então vo... ir pela estrada de Magé por exemplo, está, a estrada está péssima, eh, esburacada e enfrentar também o pessoal de fim de semana, né, o motorista de fim de semana que também é outra tragédia, n'e?
D
 Hum.
L
 E trágico. Mas enfim, eh, o lugar ainda vale essas coisas. Quando vier a ponte a coisa, o, o tráfico vai fluir com uma facilidade, eh, maior e eu acredito que vá todo mundo querer comprar casa, enfim, vá ter ... A grã-finagem vai descobrir que, eh, Rio das Ostras tem muita grã-finagem mas está, mas ainda está, ainda está, digamos assim, preservado. Cresceu até um certo ponto pra ... Talvez aquilo vire, vire Cabo Frio, por enquanto está muito bom (sup.)
D
 (sup.) É (sup.)
L
 (sup.) Apesar, apesar do transporte, apesar da dificuldade eu acho que lá está preservado de uma porção de coisas. Lá está (sup.)
D
 (sup.) As pessoas vão sempre pra lá em transporte particular, próprio?
L
 Eu acho que o ir de ônibus não é muito penoso.
D
 Hum.
L
 Ir de ônibus não é muito penoso porque leva, eh, eh, ou tem o transporte aqui no Rio ou então atravessa e pega lá na estação de Niterói. Mas de qualquer jeito é enfrentar todas essas coisas que a gente enfrenta de carro que ... O que tem de desastre não é normal, é de... tem um trecho, me parece de Araruama, noutro dia nós pegamos um, mas um, um negócio incrível, morreu a família toda. Porque eles vêm na toda. E é justo, é o chofer de fim de semana que quer fazer, eh, pensa que a estrada está livre, tem retas ou lá o que seja. E quer fazer as extravagâncias que, que pensa que pode. Ou às vezes não sabe dirigir mesmo, né? Sempre tem que na estrada você tem que saber (sup.)
D
 (sup.) Mas quais seriam essas extravagâncias? (sup.)
L
 (sup.) Como é que vai ultrapassar. Vai ter que prestar uma certa atenção. Agora mesmo quando eu vinha hoje de manhã foi até o ... Está um bom tema porque eu vinha de manhã, eh, com a colega, vinha de carona, que a gente vinha um pouco apressada. Mas a madame sai do posto, em vez de pegar ... Se ela sai ou ela, ela pega direto, tem que pegar a esquerda, então o que ela fez? Primeiro ela pegou a direita enganando que ia ficar e depois entrou na esquerda na frente (sup.)
D
 (sup.) Hum (sup.)
L
 (sup.) Da gente. Quase que a gente pega a dona por detrás. Depois se pegasse por detrás ia dizer: não, a culpa era de quem vinha e não sei quê. E a outra, na curva fechada, simplesmente a M. bateu no, no, no meio-fio porque en... entra na curva, entra na curva e entra fechado, assim em cima dela. Eu qua... eu berrei, não estava vendo o carro disse: puxa, M., mas que barbeiragem, como é que você fez uma dessa? Ela disse: não, você não viu do meu lado? O sujeito que ia na curva fechada. Curva fechada assim eu tive que sair pelo meio-fio senão já era uma vez. Mas (sup.)
D
 (sup.) Você dirige?
L
 Não. Eu não dirijo e não quero dirigir. Eu prefiro andar de táxi. Apesar de tudo no táxi eu fecho o olho, eu confio e ele que vá levando. Eu na história? Eu sou muito distraída, sabe? Já pensou na hora que seja ... Eh, o pessoal me chama de Peninha, que é um personagem do Walt Disney.
D
 Hum.
L
 Me chamam de Peninha porque eu muitas vezes, eh, acendo, acendo a boca e não tem cigarro. E um negócio desse, você já pensou, no carro que você tem que ter aquela precisão, você na hora de ir pisar no freio você resolve pisar no acelerador, não engrena direito? O negócio é muito complicado pra ... É bom pra quem tem um bom controle motor, um negócio certinho assim, uma boa capacidade de, de, de atenção. Agora, eh, entrando talvez mais, mais no assunto, viagem maior que eu fiz foi, eh, foi uma vez acho que até, até Goiás, só. Foi um, um treinamento de professores que eu dei, eh, eu, digamos assim, a coisa mais rápida, mais gostosa ainda é um avião, né? Se bem que dá um, um certo medo de você, eh, estar lá em cima o negócio despencar. Pelo menos aqui você sabe. Eu já passei algum susto com carro. A gente já bateu. Eh, está tranqüilamente no sinal, vem o sujeito de trás. Mas é um sinal que tem ali na Montenegro. Não, na Farme de Amoedo que quase não, a gente não vê. Está meio escuro, enfim, acho que o cara vinha conversando, vinha com, com uma pessoa que nem era namorada dele, sei lá, enfim, acho que era um contrabando qualquer e aí ele chega e bate pra gente. Bati com a cabeça assim. Na hora eu choro e falo tudo quanto é palavrão, depois eu sossego, fico calmíssima. Mas na hora tenho que chorar e dizer um montão. O que eu disse de montão pra ele não foi brincadeira. Mas, eh, tem essas coisas, eh, o automóvel dá a impressão que é uma coisa mais segura porque você está com o, com o pé na terra, né, pé na terra. Parece que, não sei, a distância é menos. Lá se der uma confusão, se der uma confusão acabou, explodiu e acho que não escapa nem a alma, nem, nem, nem, nem pra ver, eh ...
D
 Pra você viajar de avião quais são as providências assim que você tem que tomar? Desde ir comprar a passagem até chegar num lugar e saltar.
L
 Bom, tem que se ver, ver horários e coisa, comprar passagem e depois esperar lá aquela coisa desagradável, vim pesar bagagem, está, está no peso, o que não está. Depois aquela revistinha maravilhosa pra entrar, né? Esperar o horário muitas vezes, às vezes esperar. Quando é no Galeão agüentar aquele calor insuportável e, eh, eh, aeroporto internacional não devia ser assim, devia ter um ar condicionado ou, ou, ou, enfim, ventilador e uma coisa qualquer. Não, não dá pra dizer. Sala de visita devia, a coisa estar, estar bem melhor. Eh, são, enfim, coisas desagradáveis. Eu nunca viajei pra fora daqui. Sei que a coisa é muito pior porque meu irmão viajou pros Estados Unidos. Então acho que uma hora antes, uma hora e meia antes do, do, do avião sair ele entrou naquela saleta. Primeiro a revistar a bagagem dele toda, depois revistar ele próprio, até sair, até ... Enfim é um negócio muito moroso, viu, muito moroso mesmo. Podiam arrumar um jeito, eu não sei, ou de confiar mais nas pessoas ou enfim de fazer um negócio mais rápido. A pessoa está naquela ansiedade de viajar. Viajar de avião nin... que eu acho que ninguém viaja sem estar ansioso. Ah, isso é besteira. Ahn? Por causa da, da história do apesar de ser bom, de ser gostoso você entra aqui. Viajar pra São Paulo, por exemplo, você leva seis horas mais ou me... só no ônibus. Eu nunca fui de ônibus, eu fui de, de avião. Eu já me dei ao luxo de ir almoçar em São Paulo depois voltar. Eh, fui, eu fui e voltei. Mas é num instantinho você chega no, no aeroporto, pega a sua passagenzinha, espera quando te chamarem lá na ponte aérea, entra, cinqüenta e cinco minutos depois você está em São Paulo. É uma beleza, entende, é uma beleza. Ir naquele arzinho, você viaja no conforto, é muito gostoso.
D
 Alguma vez (sup.)
L
 (sup.) Agora (sup.)
D
 (sup.) Você teve problema de bagagem?
L
 Olha, eu não (sup.)
D
 (sup.) Eh (sup.)
L
 (sup.) Tive não, mas muita gente já teve.
D
 Que tipo de problema?
L
 Ah, ah, de a bagagem extraviar, né?
D
 Hum.
L
 Isso de peso, de coisa assim eu nunca (sup.)
D
 (sup.) Sei (sup.)
L
 (sup.) Tive não. Eh, o negócio, a única coisa de bagagem que tive é de demorar muito, né? Fica aquela, aquela confusão, parece uma praia de peixe, todo mundo chamando: é, é, é essa, não é, não sei quê. A gente espera um tempão pra tirarem a bagagem da gente também (sup.)
D
 (sup.) Mas nunca lhe aconteceu de você ter um peso excessivo, além do permitido?
L
 Não, não. Não, comigo nunca aconteceu. Mas já sei de muita gente que vinha pra cá e a mala foi parar em Pindamonhangaba, um lugar por aí. E, e até voltarem, um, um negócio muito desagradável, a pessoa ficar com a roupa do corpo. E tem essas coisas. Em avião tem essas co... comigo nunca aconteceu. Eu já viajei até de, de a... avião chamado fabiano, avião da FAB.
D
 Ahn.
L
 Aquele que só tem, eh, lu... lugar de pára-quedista, né? Tem um banco aqui, tem um banco aqui, não tem calefação, não tem coisa nenhuma. E, mas não ... Viajava tranqüila, nunca tive medo não.
D
 Que outros tipos (sup.)
L
 (sup.) Nunca tive medo (sup.)
D
 (sup.) De avião você já viajou?
L
 Não, só viajei desse, do, ou o ultraconforto, eh, os antigos eram assim, não sei qual era a marca. Essa, acho que era Douglas ou não sei quê. É um, mais antigos. Eu comecei a viajar eu tinha o quê, eu tinha uns quinze anos, por aí. Prim... minha primeira viagem de avião eu devia ter uns quinze anos. Foi quando eu fui justo pro Paraná. Não, a primeira vez eu fui de trem. Mas o trem é muito chato porque a gente tinha que ir até São Paulo, fazer uma baldeação, pegar um outro lá e pegar um trem louquíssimo noturno que corre, corre, corre, corre adoidado. E depois então parar em Curitiba e não sei se ele ia até Ponta Grossa, acho que não. Alguém ia esperar a gente em Curitiba pra ir depois até Ponta Grossa. Ah, te... tenha dó, é muita mão-de-obra. Então, a gente ... Eu preferi ir sozinha. Eu era menor ainda, me lembro, eu era menor e eu fui aos cuidados da aeromoça. Então a, uma aeromoça de... confundiu a coisa e pensou que eu era, eh, colega. Ahn, que eu era colega, que ia pra, e que ia pra, pra base de ... Eu digo: não, eu não sou colega não. Eu que, eh, a ou... a outra recomendou tanto. É que eu não podia, normalmente eu não podia viajar, eu era menor, não podia viajar sozinha, tinha que ser recomendada e ela estava crente que eu era colega. Eu digo: não, eu, eu vou pra Ponta Grossa. Um negócio assim. E depois eu fui, depois eu fui de FAB porque já naquela época, eh, a passagem de avião era muito cara, né? Não pode estar viajando assim à toa de avião não (sup.)
D
 (sup.) Por quê? (sup.)
L
 (sup.) Tem esse inconveniente também que eu achava que a coisa podia ser, digamos assim, sair mais barato, né? Fazerem mais, talvez uma propaganda. Enfim, mais coisa pra estarem sempre cheios ou, ou estar maior aproveitamento pleno e a coisa poder ser mais popular, entende? Eu acho que a ... Não sei, eu não entendo, eu entendo que a manutenção seja muito cara, que avião seja um negócio muito especial mesmo. Mas eu acho um absurdo você pagar um dinheirão, uma foturna pra ir. Se você quer ir a um lugar mais longe você tem que ir de avião. E você paga uma fortuna, né? Você indo de ônibus você não vai agüentar ir até, ir até Recife por exemplo. O lugar mais longe de ônibus que eu fui foi a, a Salvador. Mas fui na antiga, a, a Rio-Bahia. Assim que colocou asfalto aí nós fomos. Levou trinta e quatro horas. Disse que agora leva vinte e quatro, né? Ah, beleza. Então o negócio está melhorando. Fizeram outra também, a litorânea. Mas, eh, de qualquer jeito você passar vinte e quatro horas viajando de ônibus não dá pra entender, né? Aí você faz uma, uma forcinha e quer ir de, de avião. Eu acredito que, eh, estimulando o, o turismo interno e indo mais gente as com... as companhias tendo certeza de que vão contar com aquele número xis de pessoas eu acho que, eh, vai haver assim talvez tendência a barateamento da coisa. Não sei.
D
 Qual foi o avião melhor que você já viajou?
L
 Ah, eu não sei nome de avião não. Mas é aqueles jatos, aqueles que fazem um barulho enorme, aqueles são grandes, têm todo conforto (sup.)
D
 (sup.) Você já foi assim lá dentro do avião, assim lá ou você fica sentadinha assim, não vai, não levanta, nada?
L
 Ah, não. Eu fico, eu costumo ficar sentadinha. Nunca fui lá pra ver as coisas não. Eu vejo a, eu já vi uma cabine assim entreaberta. Vi que é uma complicação danada lá dentro. Mas como é que faz, o que, como é que é, o que aco... que botão que ele tem que apertar e como é que tem que ser eu, eu não entendo nada, nada, nada, nada.
D
 Quer dizer que você senta lá e cumpre todas as ordens?
L
 É. Eu fico quietinha. Ah, não fumava, apertar cinto, tudo. Direitinho, bonitinho 'comme il faut`. (risos)
D
 E esse trem que você foi pra Ponta Grossa, como ele era por dentro?
L
 Ora, lembrar direitinho, direitinho eu não lembro. Era, eu estava, eu estava viajando de leito. Numa cabine tinha, tinha dois leitos, né? Era eu e minha avó e razoavelmente confortável. Dormia na parte de cima. Sei que a ... Dava um apavoramento danado. Você te... você estava dormindo, você acordava assim, você assim, parece que você deitada a velocidade é muito maior. E dá uma sensação de que a qualquer momento o trem, aquele troço ia, ia encos... ia bater em outro, ia descarrilhar, um negócio desse tipo.
D
 Quanto tempo de viagem que dava nesse trem?
L
 Eu não lembro precisamente. Eu sei que nós, que o negócio foi o seguinte: nós baldeamos em São Paulo. Nós ficamos dois dias na casa de uns parentes, depois é que nós pegamos o outro. Já que a gente ia a São Paulo, nós aproveitamos e ficamos dois dias na casa de uns primos. Depois então nós pegamos. Mas, olha, eu lembro que a gente pegou o trem aqui de noite, chegou em São Paulo de manhã, bem cedo, de manhã mas chegou. Acho que nós pegamos aqui umas dez horas.
D
 Hum.
L
 E cheg... eu acho que agora vai mais rápido, né? Acho que agora está bem menor a, a, o tempo. Mas eu acho que foi mais ou menos isso, umas dez horas, às sete horas da manhã nós estávamos chegando em São Paulo. E lá eu não lembro bem. Eu acredito que a gente tenha apanhado, eh, eh, era noturno. Também chegamos de manhã. Foi mais ou menos o mesmo tempo. Eu acredito que entre quinze e vinte horas a viagem, por aí.
D
 Vocês só dormiram, não fizeram refeições no trem?
L
 Eu acredito (sup.)
D
 (sup.) Não saíram da cabine (sup.)
L
 (sup.) Que re... (sup.)
D
 (sup.) Pra lanche? (sup.)
L
 (sup.) Olha, eu não lembro muito mas acredito que, eh, pelo menos café da manhã a gente deve ter feito.
D
 Mas como é? É na própria cabine?
L
 Não. É no restaurante. Tem um carro-restaurante e a gente, e a gente vai, toma refeição ali. Olha, eu não estou bem lembrada, eu tinha doze anos nessa época.
D
 Você nunca mais viajou (sup.)
L
 (sup.) Foi a única (sup.)
D
 (sup.) De trem? (sup.)
L
 (sup.) Foi a última vez. Ah, fora o trem da Central. Uma beleza, né ? Ah, essa, dessa eu tenho que contar muita coisa.
D
 Hum.
L
 O trem da Central pra Campo Grande. A gente fazia, eh, passava uma boa parte da minha vida viajando nessa base. A gente, se a gente pegasse o trem das dez e pouco a gente chegava ainda no horário lá, pegava a camionete e tudo. Mas simplesmente a gente ia em pé, ia num desconforto danado. Então nós pegávamos o trem das nove e quarenta, um negócio assim. Assim mesmo, de vez em quando, tinha: ah, que descarrilhou não sei quê, porque atrasou o, o, o trem de não sei quê. Volta e meia tinha. Então simplesmente você não sentava, você era sentado na cadeira, né? Você era distribuída assim. Entrava, você ficava na porta, vinha um montão de gente (inint) e a coisa se distribuía assim. Agora, tem coisas cômicas, gozadíssimas. Tinha o, o menino que vendia bananada que dizia assim: olha a bananada, é o puro sabor do caroço da goiaba. E outras coisas mais. Não tinha nada que ver uma coisa com a outra, entende? E desse (sup.)
D
 (sup.) Tinha (sup.)
L
 (sup.) Trem a gente tem coisas e histórias, histórias pra contar.
D
 Tinha gente em pé assim dentro do trem e fora do trem, não é?
L
 Ih, ia, ia, ia muita gente. E olhe, esse nós pegávamos mais vazio. Quando nós atrasávamos, pegávamos um outro era, era um negócio. Você não podia nem mexer. E teve uma passagem que, eh, aconteceu da gente pegar, nós perdemos, nós tínhamos um trem da base aí. Nós éramos, tínhamos uma carteirinha do trem da base que vinha de Santa Cruz, passava por Campo Grande e pegava a gente. Professora tinha direito. Mas quando a gente perdia esse e acontecia dele não passar, que também acontecia com ele, acontecia confusões, então nós pegávamos o outro, o trem comum. E o que aconteceu uma vez foi de eu viajar bem embaixo da axila de uma senhora que nunca tinha ouvido falar em desodorante nenhum. E eu sou baixinha, né? Ela assim e o meu estava ... Mas era um negócio no que, não parecia nada, era uma senhora limpa. A gente via que o problema era de descuido. Limpa, limpa, limpa, toda arrumadinha, toda certa. Mas com um sovaco assim pra cima. Vou lhe contar, vou lhe contar. Um cheiro! E tinha o pessoal que estava em frente começava a gozar: mas não, pois é, porque leite de colônia, né, leite de rosas, essas coisas e a dona não era com ela. Passou numa ho... hora assim ali por, por, eu não sei se era Duque de Caxias, eh, Deodoro, passou por Deodoro, tinha o cheiro das cavalariças. Hum (inint) disse: hum, que cheiro maravilhosa, né, dois botaram, botaram a, a cara pra fora assim do trem pra sentir, preferia sentir o cheiro de cocô de cavalo a sentir o, o cheiro da... da... daquela senhora. Foi gozado. E, e outras 'cositas` que aconteceram.
D
 Você não foi pra São Paulo de trem agora essas (inint.)
L
 Não. Não, não. Eu não fui mais. De trem eu não viajo. Fora, fora ir, essas viagens de, pra ir pra Campo Grande e voltar, trem de Central eu não, eu não viajei mais de trem. Eu viajei ultimamente mais ou de ônibus ou de carro mesmo, de automóvel ou de, ou de avião. Mais pra longe de avião. Eu não tenho, tenho usado mais. Eu tive umas duas viagens que eu, eu andei trabalhando no MOBRAL então eu fiz treinamento de professor. Durante pouco tempo. Fui uma semana lá pro sul. Fui uma outra semana pra Goiás. Mas foi pouco tempo e fui de avião. De ônibus mesmo a última vez que eu viajei, deixa eu ver pra onde que foi, assim eu não consigo me lembrar. Viagem grande foi, foi pra Bahia. Acho que eu fui até Angra dos Reis uma vez de ônibus.
D
 Mas qual é a diferença (sup.)
L
 (sup.) Fui a Macaé também de ônibus. Mas, mas eu tenho ido mesmo é de, é de automóvel.
D
 Qual (sup.)
L
 (sup.) De carona (sup.)
D
 (sup.) É a diferença que você vê entre os ônibus assim que vão de uma cidade pra outra e os que andam aqui por dentro da cidade?
L
 Ah, não tem comparação, é muito mais confortável, né?
D
 Mas conforto implicando em quê? Que é que seria (sup.)
L
 (sup.) A, a poltrona estofada, você não pára toda hora, ar condicionado e enfim e não tem gente em pé, né? É aí. Quer dizer, não tem relativo. Eh, agora eu estou querendo me lembrar. Eu, eu estive em Patos de Minas. É também uma viagem longa. Eu fui até Belo Horizonte, depois fui até Patos de Minas de ônibus. E corre que no trecho de Patos de Minas a, de Belo Horizonte a Patos de Minas a turma pega mais o, o matuto. Então ele já sabe. Ele pára. Só tem aquele ônibus ali. Então ele pára. Aí vem o pessoal, fica em pé, me lembro o pessoal com, segurando galinha e: ô cumpadre, não sei quê, um fala com outro, pára fora de, fora de, de cidade. Enfim, pára num lugarejo que já sabe que o, tem o fulano que está esperando ali. Então ele entra com, com galinha, fica em pé. É um pessoal mais, mais, mais humilde. Você sente pelas, pelas roupas assim pelo jeito.
D
 Você já viajou de ônibus assim de noite ou de carro assim que tenha dado algum problema? Porque às vezes de noite a gente não enxerga direito, etc. (inint.) claro, né?
L
 Olha, já, já deu problema sim quando nós fomos de, nós fomos numa kombi de Salvador, quando eu fui a Salvador, até, até Paulo Afonso. Nós éramos pra, pra ficar hospedados lá dois dias como se fôssemos, eh, estudantes do DASP. Quer dizer, eh, ha... havia alguns estudantes do DASP e nós nos metemos na história. E íamos ficar lá em Paulo Afonso. E simplesmente nós nos perdemos, né? A viagem que devia demorar, eh, de umas seis horas levou vinte e quatro, porque simplesmente nós saltamos pra, pra procurar o caminho, então parávamos. E aquele medo de estar perdido mesmo, de não saber onde estava (sup.)
D
 (sup.) E não havia nenhuma indicação? (sup.)
L
 (sup.) Sertão, sertão, norte da Bahia, gente, zona de cangaceiro. Nós passamos lá de dia (sup.)
D
 (sup.) Não havia indicação nenhuma?
L
 Não, o chofer devia saber, né? Ele disse que sabia mas ele se perdeu. Então, nós, eh, nós procurávamos, eh, procurávamos, eh, a, uma das indicações era a roda do pneu, se tinha passado ali recentemente, se não tinha, indagação. Mas teve uma hora que não tinha mais pra quem indagar. Aí nós saímos com ... Eh, assim, nós fomos andando ao léu, né, até que nós demos de, de manhã numa, numa cidadezinha que tinha até uma característica interessante: tinha, eh, uma fonte de água quente, que só tinha aquela fonte lá, nem ligava. Aquilo podia até ser atração turística. E daí então a gente se, a gente se governou por ali, entende? Ele disse: não, você de... você deu volta pra cá, deu pra lá. E nós então pegamos aí a es... pegamos a estrada certa. Sei que na volta foi uma beleza, né? Na volta foi ótimo. Na ida (sup.)
D
 (sup.) E aqui no Rio pra, na sua vida normal como é que você se locomove? Você não tem carro, não dirige.
L
 Não, não. E... eu vou de ônibus e, e, e de táxi, né?
D
 Hum.
L
 Eu sou assim, ah, uma, uma grande usadora de táxi. Adoro andar de táxi. Podendo. Às vezes dá no bolso. Quando eu estou mais dura eu tenho que ir de ônibus. Tem um ônibus que eu adoro (inint.) que eu detesto. Só lembro mesmo que eu numa porção de circunstâncias eu acabei indo trabalhar ... Eu trabalho pelo estado, trabalho no Maracanã, trabalho no Instituto de Educação de Excepcional. Então, eh, eu tenho que tomar um bendito ônibus que acho que é o ônibus mais demorado, mais moroso da face da terra. E volta e meia eu encontro com um engui... enguiçado por aí. É o quatro cinco quatro, Grajaú-Leblon. Que disseram pra mim: bom, ele encurta a viagem. Mas ele é tão mole e ele demora tanto. Não tem uma mínima consideração pelo passageiro, que acho que o intervalo máximo que devia ter entre uma saída e outra devia ser assim de uns dez minutos. Você perdeu um ônibus então depois você daqui a dez minutos você chega e pega, né? Mas não. Esse demora meia hora. Já vi cada um demorar meia hora com o, o, os veículos estão em péssimo estado de conservação. Você próprio vê. E quando ele atrasa a gente pergunta: mas qual é, que que houve? Ele diz: não, é que o, o, o não sei quê, aí dá o número lá, quebrou. Então agora, o, o do horário era esse. Quer dizer, eu acho detestável, viu? Eu acho detestável.
D
 E o sistema de pagamento ? Porque nem todos os, os ônibus (sup.)
L
 (sup.) Hum, hum (sup.)
D
 (sup.) Usam o mesmo sistema, né, pra você entrar e pagar. Há algumas diferenças.
L
 Ah, eu prefiro roleta, né, porque a ficha você perde. É passar pela roleta e, e pagar, está pago, você anda ... O outro é muito chato. Tem um que é de papelzinho.
D
 Hum.
L
 E às vezes passa o fiscal. E o fiscal quer o papelzinho e você sabe lá onde você botou o papelzinho. A ficha a mesma coisa. Eu então que sou pa... trapalhona às vezes a ficha cai, perdeu a ficha, então ele pára. Diz: moça, esqueceu a ficha. Aí não, tem que voltar, entregar a ficha. Eu prefiro a roleta, tranqüilo, é muito mais cômodo.
D
 E eles respeitam assim de parar em lugares determinados ou param em qualquer lugar?
L
 Olha, o que eu tenho observado é o seguinte: em termos deles pararem, eles param nos lugares certos. Agora, quando a gente está esperando e se está mais cheio um pouquinho a coisa ou às vezes nem está cheio e ele está com pressa, ele simplesmente, você no ponto faz sinal e ele, ele não pára. Ele não pára, às vezes ele passa por fora. Já vi muitas e muitas vezes. A gente às vezes está esperando, esperando aquele bendito daquele ônibus, pois é justo no di... geralmente acontece no dia que você está atrasada. Aí você conta que vai acontecer. Aí o miserável chega e passa por fora. Isso é muito desagradável, sabe, desagradável mesmo.
D
 Em relação assim às pessoas que trabalham num ônibus.
L
 Hum.
D
 Eh, essas pessoas e os passageiros.
L
 Olha, eu acho que o clima pelas coisas que são, sabe, a, eh, podia ser muito pior. Porque o motorista, eh, pelo que eu sei ele tem um regime de trabalho que não é brincadeira. E só ... Eu, eu, eu tenho muita pena de quem é motorista de qualquer jeito, entende? Porque eu acho que ele passa por, por poucas e boas e não é, é muito tempo e, e eu acho o trânsito muito des... desgastante. Você ... Ele está toda hora: pára e não sei quê. E às vezes ele esquece mesmo. Tem gente que toca aquela bendita campainha, toca três vezes pra saltar. Enfim, é todo um, um, uma situação estressante. Assim se ele chegar um dia e, e, e der um, der um estouro por qualquer coisa, entende, eu acho perfeitamente, eh, é, é plausível, entende, que ele diga um ... Eles nem, nem sempre são lá muito educados mas eu acho que pela, pelo que se exige deles eu acho que tranqüilamente eles são, eles são, está razoável, entende? O que eles são está muito razoável. Porque eu acho que isso não é regime de trabalho não. Na minha opinião devia, deviam fazer, digamos, duas viagens e parar quinze minutos ou mais. Me parece que quinze minutos do, dá pra pessoa se refazer, dizem que dá. Vai se refazer, vai, enfim, vai sair daquela coisa. Ou que, que ficasse meia hora descansando. Mas parece que não. Eles pegam não sei quantas viagens seguidas assim nesse trânsito bandido. Não, não há quem agüente. Aqui mesmo nessa rua tem um bendito de um sinal que você fica, você fica cinco minutos pra atravessar. Porque tem um, tem gente que pode entrar pela direita, tem gente que pode entrar pela esquerda, você tem que esperar tudo isso. Enquanto isso o outro sinal já fechou. E fechou o daqui. E não tem sincronização de sinal quase que nenhuma. Eles, eh, parece que eles nem ligam pra isso. O resultado: acabou daqui. Primeiro que é uma pista de corrida, né?
D
 Hum.
L
 Vem esse pessoal da, da, a Jardim Botânico é uma rua incrível, é perigosíssima, perigosíssima. Eu só atravesso no sinal, muito raramente sem ser no sinal. É naquela faixa de lá e nessa faixa daqui. Não atravesse fora do sinal porque você entra pelo cano, mas entra muito bem entrado. Eu, a primeira vez que eu vim trabalhar, que eu, eu atendo pais, então eu costumo trabalhar muito na ponta, no horário de ponta que eu chamo, então é dezenove horas, por aí. E eu vim a primeira vez era de noite e eu fiquei assim meio espantada de querer, de querer atravessar e não conseguir. O sinal ... Não, dá uma sensação esquisita. O volume de, de, de, de tráfego é uma coisa incrível (sup.)
D
 (sup.) O que que você acha (sup.)
L
 (sup.) Eu não contei não mas a impressão é que eu tenho que é uns bilhões por minuto, que passa aquela coisa assim coisa esquisita.
D
 O que que você acha dessas coisas que estão acontecendo? Eh, na semana passada as pessoas começaram a se matar em São Paulo com revólver, um atirando no outro. Dois motoristas morreram na hora. No dia seguinte outra morte.
L
 Olha, eh, o problema, o problema pode ser que o, o carro dá sempre margem pra, pra violência. Você encontra, tem pessoas tranqüilíssimas, eh, a minha amiga que me dá muita carona, a primeira vez que eu ouvi, apesar do palavrão estar muito divulgado, mas a primeira vez que eu ouvi um palavrão da sua boca foi, foi no volante, entende? Parece que, eh, libera, libera a agressividade ou lá o que seja. Agora, eh, há essa história toda de você ter um regime de trabalho naquela base e em cima de que ... Além de pessoas que gostam de, de se demonstrar talvez uma personalidade mais demonstrativa como a gente chama de, principalmente quando homem está ligado muito à potência e à masculinidade. Então é mostrar aquela, aquela potência agressiva, eh, bota o cano de descarga, eh, fazendo aquele barulhão todo. É uma espécie de dizer: eu estou aqui, olha como eu sou bacana. Botar coisa no carro. E, e libera muito a agressividade e quase que como que o carro e o, o ocupante, eh, tivessem uma só imagem corporal, o carro fica fazendo parte dele. E se a pessoa está mais agressiva pouquinha coisa é quase como se tivesse uma arma, entende? Você, você é agressivo, você pode usar os punhos. Você é agressivo tendo uma arma eu acho que a ocasião é que faz o ladrão. Você é agressivo tendo uma arma a coisa vai no tiro. O que se devia proibir no caso é primeiro, evidentemente, ver e, e talvez aprimorar o sistema de não deixar as pessoas muito agressivas, eh, serem motoristas. Me, me parece que ainda a coisa é muito deficiente. Os exames são muito deficientes. A confiar nas coisas que eu ouço, mesmo a parte do psicotécnico me parece que é muito deficiente. Eu não sei, eu não fui lá, eu não vi. A pessoa que viu que disse que a coisa deixa muito a desejar mesmo. E o outro lado eh, eh, digamos, não deixar armas, enfim, porque a pessoa se exalta, viu, numa situação dessa, às vezes até o susto, o bater. E a gente que vem tranqüilamente, chega uma pessoa e faz um negócio desse, faz o que aconteceu hoje conosco, uma curva fechada. E no dia que bateram em mim por detrás? A primeira coisa que eu, a primeira coisa que eu disse foi um, uma fileira, uma fieira assim, enfileirado, um palavrão atrás do outro, do susto. Libera a agressividade da gente aquele susto. Ou a gente reage chorando, chorando e ficando medrosa ou a gente não reage agressivamente. O sujeito vai, discute, se encalora, está com a arma na mão: pimba. Afora outras coisas que, eh, eu acho que fica delicado mexer, e eu sei mas eu não quero dizer, então, eh, que há toda uma atmosfera de, digamos assim, social normalmente. Uma sociedade, eh, cutuca e aperta umas certas coisas e solta outras. E a mim me parece que também isso pode ser influência, digamos assim, do estado de repressão geral que a gente encontra. A gente encontra um lugar onde a gente pode desreprimir certas coisas. Isso está muito colocado. Um homem insatisfeito pode muito colocar na sua máquina, naqui... naquilo que está ao dispor dele, pode colocar a agressividade, entende? No caso do motorista me parece que a insatisfação contra, contra o, o, o patrão, contra a própria vida dele que está todo dia nesse trânsito miserável, não sei quantas horas, às vezes num calor danado. Parece que com o verão parece que aumentou a coisa, né?
D
 Hum.
L
 E desagradável.
D
 É, eles andaram fazendo agora também umas passarelas e tudo pra evitar o quê basicamente?
L
 Olha.
D
 Que estava ocorrendo demais, né?
L
 É. Existem as passarelas e existe também a má educação do povo, sabe? Eu já vi na avenida Brasil, que colocaram mureta inclusive, gente próximo à passarela pulando aquilo. Quer dizer, não há noção de segurança. Eu acho o pessoal muito temerário ainda. Eles preferem, eh, se arriscar e talvez andar mais depressa porque não se sabe porque o vo... já viu? O volume de trânsito de avenida Brasil é um negócio incrível, entende? E o resultado é que todo dia tem uma morte ali, entende? Eu acho que o problema não é só, o problema de trânsito não é só de passarela mas de educação do público (sup.)
D
 (sup.) Mas um, uma morte, eh (sup.)
L
 (sup.) É (sup.)
D
 (sup.) Por acidente ou por (sup.)
L
 (sup.) Eu acho que de, de uma forma geral de educação de, do, tanto do pedreste (sic) quanto do motorista, entende? Eu acho que ali está a faixa, dizem que na Europa tem simplesmente a faixa e não tem o sinal. Então um amigo meu diz que atravessou e, mas com muito medo porque a rua era grande, e ele disse: ai, meu Deus. E os carros vinham numa certa velocidade. E ele disse: eu atravessei mas com o coração na mão porque eu achava que aquilo, eu como brasileiro, eu achava que aquilo não ia funcionar. E ficou admirado que funcionou, que ele pas... chegou são e salvo do outro lado da rua. Quer dizer, ele não esperava aquilo, está entendendo? Então a gente fica sempre, eu fico ainda, eu espero todos os carros pararem porque outro dia morreu um menino de dez anos, né, o caminhão pegou. No Flamengo. E a mãe estava atravessando numa faixa, o sinal estava, o sinal estava pra ela, atravessou direitinho, o caminhão veio, pagou, deu uma multinha de nada. Quer dizer, o cara assassinou, porque pra mim é um assassino, ele foi descuidado, ele foi negligente, ele assassinou uma criança de dez anos, recebeu uma multinha de nada e ficou solto. Até (inint) ia ser processado, né, não é? Eu acho que, entende, então é muita facilidade nessas coisas todas. O problema de, de edu... educação também da gente.
D
 De qualquer maneira a, eh, as organizações que se encarregam de cuidar dessa parte de trânsito elas têm certas medidas, não é ?
L
 Hum, hum.
D
 Pra ...
D
 Pelo menos (sup.)
L
 (sup.) Sim (sup.)
D
 (sup.) Procurar evitar (sup.)
D
 (sup.) Pra, eh (sup.)
D
 (sup.) Que ocorram esses (sup.)
D
 (sup.) Exato (sup.)
L
 (sup.) Sim. Então as medidas (sup.)
D
 (sup./inint.)
L
 (sup.) Certo (sup.)
D
 (sup./inint.)
L
 (sup.) Exato. Medidas de segurança. Só que eu acho que tudo ainda deixa muito a desejar. E há um outro aspecto também que a gente precisa ver e que esse, esse adiar o aspecto econômico e político da questão que seria ... Está transformando a cidade em pista, está transformando a cidade em pistas para os carros, ou seja, a cidade se transforma, eh, em favor da indústria automobilística e não se transforma em favor, digamos assim, da maior comunida... comodidade, entende? Isso é um, uma, o ângulo no que, eh, poderia ser visto e já poderia ser visto, eh, nós somos uma civilização que tomou o bonde andando, gente. Por que que quando a gente vê a barba do vizinho, a dele não bota a gente ainda de molho. É a poluição, é o perigo, é o estresse, é o barulho. Enfim, o que, eh, não se toma, não se toma providência é no sentido do transporte coletivo. O que já está se pensando lá já é uma coisa futura porque já estão vendo que, eh, construir e construir e gastar um dinheirão em favor de, de a gente poder comprar carro, lá já está se modificando isso, já está se pensando em medidas coletivas. E tem um negócio elétrico. Você sai de casa e chega até o, da sua, da porta da sua casa até um, um outro que seja coletivo e que te leve a qualquer lugar. Estão pensando numa porção de medidas. Aqui não. Ainda é o comprar carro. O carro é 'status`, né? Você não tem carro é uma coisa, se vocês têm carro, o carro é 'status`. Então todo mundo quer comprar carro. E todo mundo estimula, inclusive estimulam a, a, o uso da velocidade na cidade. Porque pensar bem, né, seja como Fittipaldi, o, o carro tem mais potência, compre o tal carro porque tem mais potência e, e, enfim, eh, está, um carro potente é muito bom, você passa, você, você tem a ultrapassagem mais rápida ou lá o que seja, mas, eh, é a tal história, estimula também a correria e nós não temos pistas e não vamos ter. Vai acontecer assim: vai, se, se alarga coisas em detrimento de outras coisas que a cidade está precisando, se alarga ruas, se coloca mais trânsito e se se solta me parece que são de cem a mil, mil carros por dia são licenciados no Rio de Janeiro, nunca o Rio de Janeiro não vai conter mais carro. Além do barulho, eu morava na Francisco Otaviano, gente. De dois, em dois anos o negócio estava incrível que sexta-feira de noite eu custava pra conciliar o sono porque o barulho, eu morava no primeiro andar, então aqueles carros de, de cano de escape aberto, eh, eu, eu, parecia que o carro estava passando dentro do meu quarto. Chegava a balançar assim o, o, o, o apartamento, entende? Não há, não há em que se pensar mais nisso não. Há que se pensar em outras medidas.
D
 As punições você acha que não funcionam não?
L
 Olha, não funcionam e muitas vezes, eh, quem devia de o, acho que muitas vezes o estado devia dividir a responsabilidade, o patrão, está entendendo? Eu acho que há muita imprudência, mas a gente tem que ver todo um contexto pra poder ver de quem que é a responsabilidade. É como diz o outro: pegaram o menino no, no, no colégio São José on... ontem ou anteontem. Mas o sinal não estava funcionando também, né? O cara veio ligeiro, veio, veio a toda e não pôde frear ou lá o que seja mas o sinal também não estava funcionando. Quer dizer, o estado a gente não pode acionar nunca, né? Entende, com as obras que fazem, os buracos que fazem quando não deviam. Por que que não programam a coisa? Faz um buraco só. Buraco pra telefônica, buraco pra água, buraco pro que for e não mexe mais naquela rua.
D
 E o buracão enorme que estão fazendo agora?
L
 E, e o buraco que deixam? E o buraco que deixam, que não tem conserto? Você não paga taxa rodoviária, não sei quê? Isso deve ser pra conservação, né? E muitas vezes já colocaram, chegou ao cúmulo de colocarem ramo de árvore assim no buraco pra comemorarem, fizeram comemoração de aniversário do buraco. Que que você quer mais, entende? Você está muito bem assim de repente o buraco (barulho imitando queda no buraco). Lá vai você, lá vai pneu e, e lá vai derrapada, lá vai uma porção de coisa.
D
 Você acha que vai melhorar essa situação do carro quando eles completarem a inauguração enorme que estão fazendo (inint.) está revolucionando o centro da cidade (sup.)
L
 (sup.) Olha, eu acho que a tendência é melhorar. E, e se proibir por exemplo o ônibus, as... va... sai todo mundo do metrô e ônibus tira e, e não estimula. Já estão fazendo parece que um novo ônibus confortável, que tem musiquinha, que tem, eh, a moça pra servir e cafezinho, não sei o quê pra estimular a gente ir de ônibus. Tem muita gente que já não vai por causa de problema de vaga, né? Agora ai... ainda colocando (sup.)
D
 (sup.) Você vai nele? (sup.)
L
 (sup.) Um ônibus confortável e direto você toma e você vai parar lá eu acho excelente, viu, eu acho maravilhoso, acho excelente. Que o que está, não é ... Eu também ... É o tal do problema do 'status`. Se você vai de ônibus você é, é, é pé-rapado, se você vai de, de carro você já é um pouquinho mais coisa. Então todo mundo quer mostrar que tem carro, embora sabendo que vai ser a maior dificuldade de você encontrar outra coisa se na hora de uma chuva, por exemplo, você está com o carro à mão. Agora, eh, na hora da chuva cadê o táxi? Eles alegam uma porção de coisas. Eles têm toda razão. Choveu um pouquinho o trânsito fica mais difícil. E pode derrapar. É uma dificuldade de, de, deles próprios passarem, entende? Choveu uma coisinha de nada essa cidade fica intransitável. Enche aqui, enche dali. Ou então o pessoal que fica com medo mesmo de derrapada vai muito devagar. Às vezes o medo é, é, é bobo porque, eh, acho que não há tanto perigo assim da derrapada mas enfim você fica com medo do asfalto molhado, asfalto com, com gasolina, sei lá, derrapa, então vai todo mundo mais devagarzinho e ele perde um tempão na rua. Ao mesmo tempo estraga o carro que fre... freia, engrena, freia, engrena e vai de novo. Então é um negócio que ele acha, não acha vantajoso. Então é melhor sair, né? No caso.
D
 Alguns meios de transporte coletivo já alguns ou pelos menos um, não sei ...
L
 Hum, hum.
D
 Ficou completamente de fora, né? Eu me lembro que há alguns anos atrás você dis... dispunha de certos meios que agora não (sup.)
L
 (sup.) Ah, eu sei que o meio (sup.)
D
 (sup.) Não existem mais (sup.)
L
 (sup.) O meio mais adorável ou o mais moroso, mas o mais romântico, o mais agradável. E gozado que a gente não sentia, passava um tempão e a gente não sentia. Gente, eu vinha, eu vinha num, ô, num, num bonde chamado Aldeia Campista ou Lins Vasconcelos. Eu vinha lá de Vila Isabel até o, a Mariz e Barros. Se fosse hoje em dia eu ia achar que era um negócio, meu Deus do céu, que, que coisa mais, mais coisa, mas pensando bem a coisa mais romântica que tem de alguma forma eu achava que pra percursos pequenos eu acho que não dá mais pé de voltar. Mas pra percurso pequeno, sei não, o bonde era gostoso. E a gente acho que vinha conversando ou vinha ... Sei lá, eu sei que o tempo, o tempo passava, custava, devia custar pra passar, mas, mas a gente não sentia. Era muito mais agradável.
D
 Como era o bonde, como era o bonde?
L
 Ah, o bonde era mais um, uma coisa mais, mais gostosa. Vou descrever assim como é que era o bonde: tinha aque... aqueles ban... bancos de madeira, ele era arejado, tinha um probleminha quando chovia que entrava também, né? Mas enfim acho que o meio de cobrar também era meio, meio chato, meio difícil mas acho que não tinha outro.
D
 Como era? Por quê?
L
 Eh, vinha o, o, o cobrador vendendo, se pendurando no, no balaústre e vinha fazendo assim com a mão como que pedindo, pedindo o dinheiro pra gente. A gente tinha que dar o dinheiro trocado. Enfim, devia ser tamb... desagradável pra ele também. Mas eu acho que são umas das coisas que a cidade perdeu. Por ficar grande a cidade perdeu. Acho que bonde não tinha poluição nenhuma, né? O elé... elétrico era gostoso (sup.)
D
 (sup.) O que acontecia também que muita gente fazia na época de bonde, não queria esperar pra saltar no ponto, etc. tomava (sup.)
L
 (sup.) Ah, pegava, pegava andando. Pegava e saltava andando. Ele dizia assim: ô, ô, meu chapa, dá uma paradinha aí, dá uma meia paradinha porque vai saltar ali. Eu acho que inclusive havia, a gente já conhecia, eu pelo menos já conhecia aquele motorneiro, aquele, aquele condutor e ... Gozado que condutor devia ser o outro mas não é não (sup.)
D
 (sup.) É (sup.)
L
 (sup.) O condutor é o nome do troca... do, do cobrador e o motorneiro era o sujeito que ia lá conduzindo o, o, o bonde. Então a gente já conhecia. Nós tomávamos o bonde lá na, na, na estação da Light. Nós já conhecíamos o nosso motorneiro, o nosso condutor. A gente já sabia direitinho quem era, com quem vinha. Eu não sei não, era coisa de uma cidade menor também, né, de uma, uma coisa de bairro, que talvez pudesse ficar no bairro (sup.)
D
 (sup.) Certo. Mulher não (sup.)
L
 (sup.) Eu acho que criança que não viu isso (sup.)
D
 (sup.) Saltava do, com o ônibus andando (inint./sup.)
L
 (sup.) Acho que criança que não viu isso é que nem criança que não vai ver mais quintal, entende? A palavra bonde está ligada pra mim a muita coisa gostosa. E não é uma coisa que você se sentisse fechado. Eh, o bonde vinha um ventinho. Eu não sei, em termos de cidade quente eu acho que é uma coisa adorável. Mas agora a gente tem que andar com mais, com mais, com pressa, toda hora com olho no relógio. Talvez também fosse uma época que eu não tivesse de olho no relógio, né?
D
 É.
L
 Saltar no ponto, cem réis, comprar amendoim. Ê vidão!
D
 E o ...
L
 Ahn?
D
 Houve uma época em que o estado tinha, eh, um tipo de transporte que não é igual aos ônibus comuns. Lembra? Depois ficou em desuso também. Parece que a experiência não deu certo.
L
 Olha, desse (sup.)
D
 (sup.) Era (sup.)
L
 (sup.) Eu não lembro não (sup.)
D
 (sup.) CTC, né? CTC sim.
L
 Olha, esse eu não estou lembrada não.
D
 Não? Foi uma confusão danada pra instalar na cidade.
L
 Ah. Teve o 'trolley`, né? Que chamam de 'trolley`. É, mas esse não, não funcionou porque toda hora, eles, eles chamavam de outra coisa.
D
 É.
L
 Chifrudo. (risos) Lá vem o chifrudo. E então toda ho... É, o chifrudo era um negócio parecido com esse. Bom, mas eu sei é que toda hora caíam os benditos chifrinhos. Saía de lá então parava e ele tinha que ficar naquilo, né, ele não podia dar a volta, tinha muita pouca, pouco tempo de, de poder manobrar sem estar com aquele, com o chifrinho lá ligado. E eu acho que aquilo não funcionou não, acho que não funcionou. Talvez fosse interessante por causa da poluição, ser elétrico e tudo. Talvez fosse melhor. Mas eu acho que aquilo não funcionou. Acho que é como o bonde, melancolicamente falando, como o bonde também não funciona, apesar de ser muito mais gostoso, né?
D
 E esses outros transportes daqui?
L
 Essa cidade tem pressa (sup.)
D
 (sup./inint.)
L
 (sup.) Pra mim deviam bolar um negócio elétrico, sabe? Eh, que ... Elé... elétrico, coletivo que ia desestimular, digamos assim, o uso do carro. O carro você usava pra o seu fim de semana, pra estrada grande que aí não, não dá. O Brasil é muito grande, né, furava estra... tudo quanto era canto, estimulava o pessoal ir passear. E vai passear. Eh, mas aqui na cidade não. Ficava um negócio que se voltasse mais pro coletivo, eu acho, entende? Que evitasse esse caos, né? Eu sei que bonde não dá mais pé de, de sonhar porque não volta mais. Eu acho que eu mesmo fi... já estou acostumada mais à velocidade, eu acho que eu ficaria nervosa. O mesmo trajeto que eu fazia lá da, de Vila Isabel até, até a rua Mariz e Barros eu acho que eu ficava nervosa de, de fazer, entende? Tem uma amiga que fazia mais ainda. Ela ia da praça da Bandeira ao Flamengo e não achava que era muito. Que coisa engraçada o sentido, o sentido da duração, né? Coisa engraçada mesmo. O bonde a gente ia lendo, podia ler, a gente tinha papo de vizinho. Eh, não sei, era diferente mas era coisa de uma cidade menor. Dói, mas dá uma saudade mas não dá mais pra entender, né?
D
 E esses transportes que não são realmente um meio de locomoção quase uma, muito mais universal. Não de quatro rodas mas de você andar numa pequena cidadezinha, né?
L
 Olha, eu andei muito em charrete, já andei de carro de boi, de, por necessidade mas ...
D
 É (sup.)
L
 (sup.) São lá coisas agradáveis (sup.)
D
 (sup.) E em Itajubá, por exemplo (sup.)
L
 (sup.) É mais na base, eh, eh (sup.)
D
 (sup.) O tempo em Itajubá, como era em Itajubá, além de você andar?
L

  Em Itajubá ou era a pé ...