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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Meteorologia"

Inquérito 0135

Locutor 153
Sexo masculino, 37 anos de idade, pais cariocas
Profissão: arquiteto
Zona residencial: Sul

Data do registro: 20 de março de 1973

Duração: 51 minutos

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D
 (inint.) exatamente doze horas, quer dizer, daqui a quarenta minutos, nós paramos (sup.)
L
 (sup.) Estou, estou inteiramente (sup./inint.)
D
 (sup./inint.) que é que você está achando do tempo no Rio nesse, nesse começo de verão (inint.)
L
 Há necessidade fundamental de conversar sobre o tempo?
D
 Infelizmente, nós temos, eh ... Agora, a partir daí, se você quiser falar sobre outras coisas, você está completamente livre, que nós vamos conversar da seguinte maneira, quer dizer, o que importa é o que você vai dizer e não o que eu vou te perguntar, porque a minha fala é suspeita.
L
 Perfeito.
D
 Bom, então, quer dizer, nós temos vinte áreas semânticas e vinte assuntos, né, e que distribuímos pelas faixas de idade dos nossos, eh, entrevistados, né, de modo que, pra você, infelizmente, eu tive que escolher entre três, que eram péssimas e a melhor que eu achei foi essa ... Eu digo não (inint.) e não é tão boa, de modo que a gente ... Agora, evidentemente, isso ... Tudo que você disser é importante pra nós, quer dizer, se o tempo for um pretexto pra você, né, eh, falar sobre outras coisas também, essas outras coisas também são importantes. Agora, eu, evidentemente, vou amarrar o que eu puder em torno do tempo, né, quer dizer, você vai falando sobre o tempo, né, suas experiências com ele, como é que você se sente, né, tal, em determinadas estações mais do que em outras, tarará, e você fica completamente livre. Agora, se você parar, por ... Acabou a inspiração, aí eu posso lhe fazer uma perguntinha para engrenar outra vez, entendeu, mas se você falasse quarenta minutos sem nenhuma interferência nossa, perfeito, tanto melhor.
L
 Ótimo.
D
 Quer dizer, você está completamente livre para a partir daí (inint.)
L
 O problema em torno do tempo é o seguinte, eh, o tempo enquanto meteorologia ... Preciso falar mais alto? O tempo, enquanto meteorologia, pro tipo de vida que eu desenvolvo, eh, normalmente não dá muito pra perceber o tempo. Uma coisa errada, né, mas a gente acorda, cai no, no trabalho, no dia-a-dia e aí se esquece do tempo, quer dizer, o tempo aparece no sábado ou domingo, quando tem praia ou não tem praia e, se a gente está muito cansado, dorme e, depois, tem o aspecto do tempo artificial. Um dia a gente trabalha, não é todo mundo, é uma minoria, mas a gente trabalha com ar-condicionado, com ... Então, eu estou aqui dentro dessa sala, se está chovendo ou se está, ou se está sol, eu, pra mim, eh, pouco interfere, evidentemente eu estou exagerando, mas pouco interfere porque só se fica um pouquinho mais claro ou menos claro na cortina. Isso talvez seja uma contradição com, com o arquiteto, com uma coisa dessa natureza, mas realmente eu acordo, pego o carro, entro embaixo na garagem, subo, aí, a partir daquilo meu tempo, o ano inteiro é esse aqui, a não ser quando eu saio pra viajar, então, a gente, às vezes ... Mas mesmo assim, a gente corre para o aeroporto, pega o avião, o avião também está climatizado, né, (riso) a gente salta, tem um outro carro esperando, no fundo é uma loucura, você está sempre (inint.) num tempo artificial, isso é que eu vejo. E chega sábado e domingo, numa determinada fase, eu dormia que nem um louco e hoje às vezes a gente sai, pega as crianças, vai ao clube e, enfim, aí tem o sol, mas assim o próprio tempo, num sentido geral, não, não me afeta muito, aí é um problema de comportamento individual, né, se está sol, está bom, eu não me preocupo muito com isso, não. Se está, está chuva, está ótimo, está frio, eh, é raro ... Eu tenho uma capacidade de adaptação muito grande, então eu sempre arranjo um jeito de tirar o melhor partido da, da situação. Se a situação for ótima, formidável, vamos tirar, aí não precisa fazer força pra tirar, pra encontrar o jeito, ela é ótima, né, então a gente só usufrui.
D
 (inint.) você chama uma situação ótima, assim?
L
 Heim? Por exemplo, o rapaz, agora, que ganhou, lá na Bahia, a loteria esportiva, os treze bilhões, ele deve estar numa situação ótima, né, e, embora eu não jogue na loteria, mas, enfim, deve estar tudo bem pra ele e daí é só ele pensar que vai pra frente, mas, né, obviamente não é uma ... Eu estou exagerando, estou brincando. Uma situação ótima é um, um nível mínimo de problemas (inint./sup.)
D
 (sup.) Em relação ao tempo?
L
 Em relação ao tempo não, mas o tempo pra mim não ... Como eu disse, ele não, não conta muito, quer dizer, se está frio, a gente tem uma suéter, põe, ou põe um casaco, etc. se está quente, eh, eh, tira a suéter, tira o casaco. O que muita gente se preocupa de ter que usar terno, etc. essa barreira eu já, eu já venci, a gravata, o paletó, é um, isso é uma outra luta especial, que eu, que eu fiz e consegui pelo menos dentro do trabalho vencer. Hoje é raro eu ter que botar uma gravata, precisa ser assim o presidente da república, não há essa hipótese, não. O presidente da república vai falar contigo, então tem que botar uma gravata, porque senão bagunça. Mas normalmente eu não uso. Então (inint.) então a camisa, a gente, se está calor, está bom, se está frio, está, também está bom, eu não tenho nenhuma ... Pra mim tanto faz verão como inverno. Eu sinto vibração assim por eu achar um tempo mais, mais interessante, mais agradável assim. Eu gosto muito de, de fim de, de ano assim, em termo de dezembro, quando começa a chegar o calor, a praia, mas aí não é bem o, o tempo, quer dizer, o tempo físico, assim material, que está calor ou que está frio, seria mais assim a própria população, o comportamento. Talvez isso seja uma deformação profissional de minha parte, quer dizer, eu trabalhando em urbanismo e vivendo com cidade, então eu vibro muito em, em luz e casa e gente mexendo e chega aquela véspera de natal, assim, pô, lance de 'frisson', sei lá, eu gos... aquela confusão que existe, eu gosto muito de ver. É gente na praia, então, não só de praia, compra, aquela confusão na rua, gente de calção, de maiô, faz compra, pega e paga e supermercado, enfim, e natal, aquele corre-corre, eu acho aquilo muito (inint.) a cidade se arrumando, etc. Então, mas aí já é um tempo com uma outra característica, não é tempo meteorológico. É claro que ele está por trás ajudando no verão, mas eu acredito que essa mesma coisa ocorra num país de clima frio e que véspera de natal ou alguma comemoração dessa natureza e que todo mundo se mexe também, quer dizer, eu gosto muito é de ver um outro tipo de tempo, quer dizer, talvez o tempo social ou o tempo da comunidade (inint.) as estações, quer dizer, época de carnaval, é um outro tipo de comportamento. Tem um tempo material enfim pra mim, um tempo meteorológico, se é verão, se é inverno, se é primavera, pelo menos aqui, a gente praticamente ... Eu não sinto isso, né? Eu vi agora um pouquinho, eh, nessa viagem, deu pra ver, eu fui nas três vezes, eu fui em vezes diferentes, então dá pra sentir a dife... claramente, a diferença de estação. Aqui não, né? Lá caem as folhas e depois a árvore aparece, as flores aparecem, tem frio, não tem frio, quer dizer, lá quando é frio, é frio mesmo. O verão da... o inverno daqui é uma brincadeira, você põe um casaco, um negócio assim, acabou, não tem, não chega a ter um frio assim, a não ser no Rio Grande do Sul, que aí esfria mesmo e ... Mas só lá pra baixo, verão, verão é, é sempre, né? E agora então o tal de clima está maluco, faz, faz frio no verão, faz calor (riso) no, no inverno. Então, e, e o problema de clima mesmo, nesse sentido, quer dizer, pouco me toca, então é muito difícil a gente desenvolver, a não ser se a gente partisse pra teoria, se fosse ficar chutando, eh, coisas que leu ou que ouviu falar, que aí não, não vem ao caso.
D
 Agora, dentro dessa vivência assim profissional sua e desse interesse seu pela coisa social, eh, no plano do planejamento urbano, etc. o Rio tem sido, assim, atingido por uma série de, eh, fenômenos meteorológicos importantes. Você tem alguma vivência disso (inint./sup.)
L
 (sup.) As chuvas do Negrão, aquelas famosas? Eu tenho impressão que isso, o fe... com esse fe... esse fenômeno que eu me lembro, que vem logo à cabeça são mais as chuvas do Negrão, que aquela época que choveu um bocado e andou desabando aí coisa, favela, gente atrapalhada, etc. A experiência, a vivência que eu tenho quanto a isso é trabalhando no Instituto de Arquitetos, a gente, normalmente, é chamado pra dar opinião e, e é aquela opinião que já está meio tradicional, ou seja, de uma cidade que (tosse) já foi capital da república, pretensamente o centro cultural do país, essas conversas todas, e até hoje não tem um plano, ninguém sabe o que que vai fazer, ninguém sabe o que que vai ser a cidade, se isso vai ser centro comercial ou centro cultural, centro de turismo, cada dia inventam uma coisa. E é incrível, volto a cha... a chamar a atenção, enfatizar a possível deformação profissional, é uma coisa, a gente trabalha e vê que não existe, não é específico da minha profissão, deve ser ... Em termos de Rio, ou em termos de Brasil, de várias profissões, essa é a situação de sociólogos, situação de professor, situação de cada profissional que vê querer fazer a coisa direito e nem sempre a coisa é feita. Mas, no nosso caso, voltando ao Rio, nós achamos que a cidade devia ter uma idéia, não precisava nem um plano, nessa altura dos acontecimentos, eu não exijo nem um plano, alguma noção do que se pretende fazer daqui a três, quatro, cinco anos e isso é impossível. Quer dizer, nós chegamos a, a uma situação meio kafkiana, que a cidade tem um plano que foi feito pelo, pelo quê, por uma firma grega, no tempo do Lacerda, que nós combatemos adoidadamente, mas o plano está guardado, quer dizer, fizeram o plano e não aplicam o plano. Bom ou ruim tinha um, pelo menos, e era alguma coisa, mas nem isto aplicam, então é o negócio mais maluco do mundo, né? E a gente fala em fazer plano, diz que é um negócio muito complicado e que não é, não é o caso. Então cada secretaria tem um plano, então a gente vê um, uma área do governo (interrupção/telefone/inint.) um jardim todo alinhado, então no dia seguinte vem uma outra secretaria e crava no meio do jardim um, um pilar de um viaduto, simplesmente, pra não se acertar e dá aquele bolo e dá esse panorama urbano aí, que a gente sabe, muito lindo, que todo mundo acha o Rio formidável. Copacabana é uma curtição, mas é o fim do mundo pra viver, do meu ponto de vista, agora, tem gente que briga um bocado pra morar em Copacabana, se bem que a moda agora, Copacabana já era, agora é Leblon, Ipanema, mas vão transformar Leblon e Ipanema em outras Copacabanas. Então, o que que a gente pode fazer? Nada. É isso minha (inint.) apenas berrar, é o que a gente faz, um, um grupo aí vem fazendo há uns dez, doze, sei lá, desde que eu me formei, em sessenta, a gente vem nessa briga e talvez antes ainda, com o Diretório Acadêmico, etc. (inint.) vamos fazer um plano? Ah, não pode, e cada um promete, eh: vamos pensar. É muito difícil. Então, com isso, quando vem uma chuvinha dessa, não tem nada preparado, então, quando a chuva é um pouco maior, cria um problema tremendo, quer dizer, despencam os barracos todos e não tem como despencar, né, quer dizer (inint.) o barraco tem, em cima do morro e choveu, correu a terra, choveu, correu a terra, o barraco veio embaixo, o barraco veio embaixo naturalmente. Aí é aquele corre-corre: que que faz com isso, com isso, né? Na hora que o sujeito assim ficou doente, está doente (inint.) teve um enfarte, a tendência é morrer, tem que prevenir a coisa, agora eles só conseguem a ação curativa, então está bom. Então, realmente não tem saída, fala-se, fala-se, fala-se e não se tenta nenhuma solução. Quando procura-se resolver o problema, não é, ah, com uma preocupação social, aí é um monte de outros assuntos, então vamos acabar com as favelas, ou seja, não há outra maneira, esconder as favelas na, esconder as favelas atrás do morro. Aí vem a história do Rio de Janeiro, que é um, é um morro muito bonito, que tem ali o Corcovado e Rio de Janeiro é do Corcovado pra praia, né, depois, atrás, tem o resto e vem o Cristo que (inint.) frente, que está de braços abertos, pra frente é o Rio, pra trás é o resto. E então eles procuram esconder as tais favelas, mas isso não é solução de coisa nenhuma. Então o Departamento de Estradas de Rodagem faz lá su... suas vias, seus viadutos, sua, suas estradas, a turma do, da, de COHAB vai construir suas vilas Kennedy com todos os problemas e por aí a gente vai embora. Mas aí eu já começo a, a fugir do, da história do tempo, que eu quero disciplinadamente ficar. Quer dizer, eu não vejo, em termos de Rio, grandes problemas de, de clima, a não ser aquela chuva, aquelas chuvas que uma vez ou outra caem em, em vários centros. O problema de clima sério, isso aí não ... Isso a gente pega em, em ... Só nos Estados Unidos e eu não conheço nada da União Soviética, mas o frio lá é parada, da última vez que, que eu soube de alguma coisa, eles esta... eles estavam muito felizes, que tinha passado de cinqüenta e não sei quantos abaixo de zero pra quarenta e oito, um troço assim (riso) que, pra mim, é uma abstração, é, é uma abstração e ... Mas problema não tem, honestamente, não tem nada. Quer dizer, não tem terremoto, não tem grandes enchentes, em termos de Rio de Janeiro. Agora, vira e mexe tem uma enchente aí solta no, no país, mas aí a gente, eh, não pode escapar. Não tem um furacão como aqueles que os americanos gostam muito de curtir, cada um tem um nome, então vem, com antecedência, já o sujeito sabe há cinco dias que a cidade vai ser arrasada, então eles sa... saem. Isso realmente é um movimento de clima, aqui não, eu acho que, que não pode se considerar assim o problema. No caso específico, foi um azar desgraçado do Negrão de Lima, quer dizer, o sujeito sentar na cadeira de governador e três dias depois caiu um toró daquele e liqüida todo o esquema de, de Rio. No meio disto tudo, nós vamos fazer uma briga aqui, interessante.
D
 E você acompanhou (inint.) a tragédia que se deu na Guatemala aí no fim do ano (inint.)
L
 Acompanhei por jornal, por revista. Eu estava pensando agora, quando estava falando, naquilo também, quer dizer, no caso do terremoto, até que ponto aquele negócio foi ... A gente pode considerar tempo ou clima, por isso é que eu não, não, não situei bem. Ah, todo mundo acompanhou o que deu no jornal, quer dizer, realmente, teve o terremoto, liqüidou grande parte da população. Eles estavam estudando ... Parece que a cidade estava mal situada, eh, agora, essa história de mal situada, o que que faz com a cidade? Vai raspar assim e botar num outro lado? E, enfim, mas esse acompanhamento foi um acompanhamento que eu acho que todos nós tivemos, né? Queira ou não queira, você passa na cidade, você dá com o olho num, numa banca de jornal e mesmo que você não leia jornal, você não escapa muito da coisa e dependendo do clima da, do país ou da área afetada, inúmeras vezes notícia dessa natureza passa a ser um deus-nos-acuda, né? Então, fizeram a maior, eh, a maior publicidade possível daquela notícia (inint.) talvez seja a minha maneira de ver a coisa, porque milhões de pessoas estavam morrendo de maneiras talvez menos espetaculares ou mais rotineiras. Morria de fome, morria de guerra, morria de uma porção de coisa, então não chega a me comover um, um tipo de problema daquele, daquela natureza. Talvez eu seja um pouco, eh, diferente, cético, alguma coisa assim. Outro dia estavam muito preocupados que desabou o supermercado Ideal, você deve ter visto aí. E a coisa nos atingiu de certa forma. Estava desabando uma porção de coisas por aí, a Paulo de Frontin desabou, não sei o quê, a ponte Rio-Niterói (ruídos externos) não desabou porque ainda não existia, mas nas primeiras tentativas, ela já desabou oito vezes, né? Agora desabou um pedacinho, um buraco lá, matando uns operários. Bom, mas isso tudo é engraçado porque dá ... Na oitava desabada já passou a ser rotina, não chama mais a atenção, mas no caso do supermercado, talvez a, a novidade, ah, enfim, daquela de cinco minutos de impacto fosse o desabamento assim, mas isso não é novidade que o arquiteto responsável pela obra, então geralmente é o engenheiro, é a firma, etc. e ali era um negócio mais, eh, mais elementar, assim mais primário, um projeto que não tinha grandes novidades e o arquiteto que estava lá dentro (inint.) era um indivíduo, não era uma firma, e do meu ponto de vista, eu não conheço o arquiteto, não, não pretendo defendê-lo coisa nenhuma, mas descobriram um bode expiatório, né? Disseram: vamos aí nesse. Esse então seria a vítima. Não precisa ser sociólogo, psicólogo (inint.) professor, não tinha importância, era um, um careta. E então a coisa voltou em cima disso tudo (inint.) é outra história, né? E eu tive ocasião de, de dizer assim em termos de brincadeira, mas botei no papel, escrevi mesmo, porque eu não me surpreendia muito com o que estava desabando não, o que eu me surpreendia é com coisas que estavam ficando em pé, quer dizer, o 'nonsense' que a gente estava vivendo, eh, uma anarquia (inint.) prazos políticos menores do que os prazos técnicos, tantas horas pra fazer uma coisa e se quiser antes pra inaugurar não dá ou então, por problemas de lucro rápido ou coisas dessa natureza, estavam fazendo os maiores absurdos (inint.) a gente, grande parte intuía, algumas, eh, algumas coisas a gente sabia, outras, a gente intuía porque dava pra extrapolar e, e como é que ficava em pé, a gente não sabia. Então, ainda tem muita coisa em pé aí. Com isso eu não pretendo ... Sim, eu não pretendia criar um clima de terror, de que vai desabar a cidade ou vai desabar o nosso século, mas, realmente, uhn, desabou um supermercado, parece que esse tem cinqüenta e fizeram todos eles da mesma maneira, quer dizer, puxa, foi azar, quer dizer, azar chato que tinha gente embaixo, né, morreu com um monte de problema. Mas em cinqüenta cai um, quer dizer, foi um ... Aquele, talvez, risco calculado que era natural, o chato é que, quando cai esse um, deixam de sentir o universo da coisa, de sentir o problema, eh, maior e pega esse um, porque aqui morreu dona Chiquinha, dona não sei quê, aí cria todo aquele caso, aí, publicitário em torno desse aqui, sem saber que já estouraram bomba atômica, já fizeram várias guerras no mundo e que continuam fazendo e que morre, só que todo dia morre, né? A gente pega os números do Vietnã, uma glória saber o que que já fizeram, o que fizeram com o Vietnã, quer dizer, um terço da floresta não tem mais, quer dizer, liqüidaram um terço do país com 'napalm', com não sei quê. Mas isso como é assim à prestação, acho que não foi à vista, foram destruindo aos bocadinhos e era uma guerra, então, na guerra vale tudo, então (inint.) engraçado, eu não tenho ... Uma quantidade de gente que morreu de cada lado e que ainda está morrendo vale assim por uns três mil super... um trilhão de supermercados, e o negócio está lá, né? Então eu vejo a coisa, nessa altura dos acontecimentos eu já me perdi um bocadinho, quer dizer, voltando ao problema da Guatemala, agora que eu voltei, o problema da Guatemala eu vi, acompanhei e eu me preocupo muito mais é com a situação política da Guatemala, que me parece que é (risos) um terremoto permanente, uma questão lá, há não sei quantos ... Tem um presidente lá, o Somoza, não sei o quê, um daqueles presidentes lá, que estão lá há uns cinqüen... quinhentos anos e eu me interessei mais não foi por quantidade de gente que morreu, nem quantos edifícios caíram, eu fiquei muito ma... mais interessado, não por, por 'hobby' ou por coisa parecida, mas, digamos assim, que a gente chama hoje de curtir, eu curti muito mais, eh, ver a turma querendo tirar partido da desgraça do próprio povo. Então, gente da ONU, do próprio Brasil, que não queria mandar mercadoria pra lá ou o socorro, enfim, porque eles já estavam dividindo entre eles mesmos, aquela cúpula, que é, que é uma, que é uma loucura. Isso, realmente, me atinge mais do que um desabamento. Talvez eu, eu esteja vivendo uma época em que a gente vê tanta gente morrer, tanta coisa errada, que morrer mais um menos um, não que não me atinja, mas eu, eu já fiz uma casca. Agora, tem determinadas coisas, quer dizer, o, eh, o sentido assim de pouca vergonha, não é pouca vergonha moralista, não, o sujeito bater a carteira do outro, assim formalmente, sem a menor compostura, talvez a coisa seja (inint.) isso ainda me choca, não que eu aceite matar, nem que aceite bater a carteira com compostura. Mas realmente tem um determinado nível que eu não consigo ... Puxa, o sujeito que faz um negócio desse, quer dizer, aproveita, pode até roubar, rouba com classe, não é? Bater na hora do terremoto, está chegando assim meia dúzia de garrafinhas de leite pra quebrar o galho de, de uma população, o sujeito ainda quer tirar três pra ele, vendo a coisa. Re... enfim, isso tudo, quer dizer, não é um problema só da atitude, isso fica impune. Isso é que realmente me choca, na medida que, que essa impunidade cada vez não sei se aumenta mais, mas também eu não conhecia anteriormente. Quer dizer, um imperador daqueles, de uns, de uns séculos atrás, eh, obviamente, era muito mais impune do que um homem desse, eu não sei quanto mais, mas aí entra num nível que pra mim, não consigo raciocinar, que é o do mais ou menos, já num, num estado do absurdo. A história do, do frio lá da União Soviética e que o (inint.) era menos cinqüenta e três passou pra menos quarenta e oito, pra mim é frio pra burro e, e realmente não vem ao caso, a partir de zero já me apavora (sup.)
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 (sup./inint.) esse tipo de preocupação sua (sup.)
L
 (sup.) Hum (sup.)
D
 (sup.) em, em termos de Brasil, há uma série assim de empreendimentos, talvez a gente pudesse ligar à extensão territorial brasileira e à diversidade climática brasileira.
L
 Hum.
D
 Favela, por exemplo, em relação ao êxodo rural, êxodo rural a condições climáticas, eh, problema amazônico, por exemplo, agora mesmo o conflito com a, com a Argentina, etc. dentro de todo um (inint.) como é que você vê isso em termos de Brasil? (sup.)
L
 (sup.) Eu acho que não tem ... Do ponto de vista climático, se tem, eh, tem muito pouco.
D
 (inint.) qual que seriam essas ligações? (sup.)
L
 Obviamente não ... Aí você citou mil coisas diferentes, uma que é a favela, uma outra que, essa que está ligada, que seria o êxodo rural, um outro, a Amazônia, que não tem nem gente pra fazer êxodo pra lugar nenhum, o outro, a Argentina, cá embaixo. Bom, eu, eu acho que clima aqui não tem, a não ser que, que pro lado da Argentina é mais frio, lá pro lado da Amazônia é mais úmido e o êxodo rural, se, com muita boa vontade, se a gente tivesse que falar do tempo, tinha a famosa seca. Bom, então a seca funcionando aqui como um dos fatores que teoricamente expulsariam o, o camponês daqui da, da área da zona rural, etc. Eu acho que a coisa não, não, não é, o fenômeno não é, está longe de ser, eh, do ponto de vista assim físico da coisa, problema fundamentalmente econômico e social. O clima ajuda um bocadinho, no caso do nordeste, mas não tem nada com a Amazônia, na Ama... (inint.) do, do, em termos de nordeste, esse êxodo existe, não é, por um lado, está bem, tem seca, é uma parada o sujeito sobreviver na seca, mas há toda ... No próprio nordeste você tem áreas que poderiam assimilar esta população ou parte dessa população, eh, em termos de trabalho, e que não expulsaria com, com essa facilidade em que a coisa vem o... ocorre. Eu tive uma época lá, trabalhando lá, uns dois meses, em Pernambuco e deu pra sentir de perto, ah, alguma coisa, algum fenômeno. Nunca estudei isso profundamente, mas existe uma coisa, há um momento que a seca dá lá dentro, no sertão, aí a turma vem para, pouco a pouco vem, vai chegando pra cidade e tem, chega na zona da mata que tem todo aquele plantio de cana, etc. mais ou menos, quer dizer, papai do céu sempre joga do lado da gente, quer dizer, ele dá condições de, de sobrevivência, se a gente utilizar, muito bem, se não ... Aí é que é a entrada do papai do céu, aí entra o clima e, e toda, toda a natureza. Mas o, o que eu vi é o seguinte: chegava uma hora em que coincidia esse êxodo chegar com a época de cortar cana, então era relativamente fácil absorver uma grande parcela daquele êxodo cortando cana. Mas chega um dia em que acabou de cortar cana, agora é esperar crescer outra vez e não tem nada pra fazer lá de mais, é só isso, então está na hora da turma voltar, mas quando coincide da turma ter que voltar e não ter condições lá dentro, aí o bolo dá, e o bolo dá todo pela seguinte maneira: só fazem uma coisa nessa área da cana, é incrível, aí volto aí a falar do problema do espaço urbano, a luta daquele pezinho de cana com o tijolo, está um coladinho no outro, você corta assim a cana assim pra fazer uma casinha, num cantinho, o canavial é encostado na casa e mais um (inint.) pedacinho de terreno pra plantar milho, etc. uma coisa pequenininha dessa natureza. Então, o problema ... Se isso aqui houvesse um outro tipo de concepção, um outro tipo de desenvolvimento, não é porque é um outro tipo de concepção, um outro tipo de estrutura funcionando, econômica, aí, aí era possível ajeitar uma série de coisas, inclusive ter maior recursos da própria região e desenvolver pra poder ter, poder aplicar, problema de irrigação, não sei quê, porque hoje em dia, a tecnologia já mostrou que não tem, eh, esses problemas de seca, de clima, não tem nenhum mistério, o sujeito já foi à lua, a gente chega, eu vi lá em Israel uma coisa que eles fazem que é de certa forma é uma maldade, mas está muito claro, toda aquela área que eles tomaram da Jordânia, etc. lá pra dentro, conhecida, Jerusalém, então tem umas estradas assim, então tem morrinhos assim, como a gente vê aqui, morro de meia laranja assim aí pra dentro, e tem um que é verdinho e tem até aquelas árvores grandes e outro é pedra pura, então eles mostram os dois, era assim e depois do biotônico Fontoura ficou assim, quer dizer, antes e depois. E então, dá pra fazer, não tem mistério nenhum, o que interessa, o importante é que se faça, agora há interesse nesta área aqui pra se fazer isso, há condições de se fazer isso aqui? Aí começa uma outra história, aí é um clima de outra natureza, não é um (inint.) não é um clima de na... ah, natural, físico, seria um clima econômico, um clima político, um clima social e um clima sem natureza, aí uma outra na... outra característica, outro conjunto, outro universo meteorológico.
D
 Agora, a destruição da floresta amazônica, você não vê conseqüências graves, não só pro Brasil, mas para o mundo em termos de condições atmosféricas? (sup.)
L
 (sup.) Se eles, se eles partirem realmente ... Bom, isso aqui é no nordeste, se eles partirem realmente pra destruição eu tenho a impressão que vai se conseguir não a curto prazo se destruir aquilo, mas a, a, a luta está apenas começando, no meu ponto de vista. Quer dizer, com toda ... Outro dia mesmo eu estava conversando com um grupo de pessoas aí, papo, cafezinho, com todo esforço que eles estão fazendo, de Transamazônica, perimetral, etc. eles vão ter que botar um burro dum dinheiro aqui dentro pra poder manter esta estrada, porque por enquanto eles estão fazendo um risquinho de lápis. Se a gente chegar no quintal da nossa casa e sair cavocando, brincando de soldadinho ou de carrinho, quando a gente era garoto, a gente ficava com o dedo assim, uma, uma retinha no capim, três dias depois o capim tomou outra vez, eles vão ter um trabalho enorme pra conservar aquela estrada, senão a floresta engole aquela estrada ainda, com a maior tranqüilidade. Eu não acredito que a curto prazo, eh, gere o, quer dizer, essa Transamazônica, etc. gere uma nova civilização, uma coisa assim. Belém-Brasília tem dez anos, né? Eu sei que já tem uma população enorme em torno dela, mas não chega a ser, assim ... Se você passar de avião e assim, quer dizer, ela não chega nem a ferir. Até aí já estou falando fisicamente, né? Seria se a gente pudesse botar aqui um, um, nessa mesa, se transformasse assim num, num gramado, numa coisa assim e a gente no fim está brincando, está fazendo um risco de lápis, tem um monte de microbinho, que seriam as pessoas ali funcionando, coisinhas ocorrendo naquele, naquele risquinho, mas não afeta o conjunto (inint.) mas apenas, o único, eh, o único perigo aí já é em termos de humanidade, eu tenho a impressão de que a humani... que a humanidade é extremamente preda... predatória, então ela vai, com a maior tranqüilidade, destruir aquela floresta e aí o problema não é desse governo nem de governo nenhum, nem do próprio país. Quer dizer, se vão dar sopa, eles vão destruir aquela e todas as florestas, a não ser que baixe aquele juízo assim que todo mundo espera, mas eu acho muito difícil. Essa ganância de espaço, de não sei quê, de lucro, de problema de faturar mais dinheiro, etc. é o negócio mais louco. Então, isso me lembra muito, quer dizer, muito porque eu li recentemente aquela, aquele livro sobre a história dos, dos índios americanos. Não sei se vocês leram. E, e agora está, está estourando, ah, essa última coisa que eu li no carro, antes de chegar aqui, ah, uma coisa, oitenta anos depois, repetindo a mesma coisa, trocando cavalaria americana por tanque, mas é a mesma coisa. E os índios lá, meia dúzia de índios brigando contra um país inteiro. Até aí não tem nada, só pra gente poder então voltar, o que foi, quer dizer, a invasão do homem branco em todos Estados Unidos em busca de, de ouro, daquelas corridas de ouro, de espaço pra plantar, pra criar, etc. que é a outra face do filme de 'Western', de 'cowboy', né? E a gente vendo o livro, quer dizer, o, o índio como era um sujeito sensacional assim, era, porque já está, já não existe (inint./risos) e o susto do índio dizendo ... É incrível. Eu não me lembro qual foi, de que tribo ou coisa assim, eu li o livro muito rapidamente. Li em três dias. E o (inint.) um daqueles caciques lá: impressionante a capacidade que o homem branco tem de destruir a natureza pro próprio consumo. Então tinha uma história (inint.) interessante que eles ficavam realmente, eh, abestalhados e (inint.) simplesmente liqüidados, o próprio homem branco liqüidou, né, (inint.) foi formidável, que é um boi como outro qualquer, né, que se aproveita tudo e eles aproveitavam aquilo pra sobrevivência, né? Então, cada coisinha daquela tinha uma função pro índio e o homem branco matava aquela tonelada, com ... O homem não tinha metralhadora ou, mas aqueles rifles de repetição, etc. Tiravam a pele, empilhavam as carcaças e ia embora. Então, eu acredito que aí também, eu não tenho nenhum preconceito racial, no caso, contra o homem branco, mas aí o homem aspas civilizado, esse troço é que me assusta, e ele entra com a, com a maior falta de compostura, com a maior falta de pudor, e liqüida. Então eu acho que a Amazônia, que a tendência é liqüidar, em nome do bem-estar social da humanidade, todo mundo está defendendo a humanidade, em nome de tudo, quer dizer, eles liqüidam, fundamentalmente em nome do, do tutu, quer dizer, do dinheiro no bolso, isso é que é o fundamental, eles vão liqüidar a Amazônia. Não acredito que seja um problema agora, a curto prazo (inint.) eles vão acabar com a Amazônia logo, vai mudar o mundo, eu tenho a impressão que o mundo está mudando e cada dia muda mais, quer dizer, se os caras estão ... Proibiram, combinaram que não vão soltar mais bomba atômica em cima, mas estão soltando embaixo, e não é, não é bem atômica, é de hidrogênio e já, já eles inventam mais outra ignorância e isso vai até um dia chegar que baixe o bom senso, embora não acredite muito nesse bom senso, não. Mas tem isso aí, tem um grupo que luta por ele e tem um grupo que manda e que acha que a história é outra, é processo, é inexorável e a gente tem que ganhar dinheiro cada vez mais. E, e realmente aí é o problema do poder, quer dizer, é muito difícil eu chegar hoje num sujeito e ele poder parar. A engrenagem é de tal maneira que, ou junta ... A gente, pode ser, entra na fase que eu considero bastante utópica, mas é a alternativa que se tem, que é um dia o povo vai se entender e diz: olha, basta! Mas esse coitado do povo está tentando fazer isso há muito tempo. Pode ser que criem condições futuras e mude. Hoje em dia, eu estou convencido que se tiver que dar um basta ou mudar mesmo alguma coisa significativamente vai ocorrer nos Estados Unidos. A gente vê que milhões de problemas lá ... Está pegando fogo. Eu não acredito num ... Porque aí chegamos já, politicamente, num, em movimentos assim do tipo a revolução na América Latina, esse troço, eu não curto muito essa não, acho que realmente não dá pé. Se tiver que virar alguma coisa do lado ocidental, vai virar é lá de cima. Vai ser uma frustração. Vai ficar todo mundo: pôxa, o americano é que manda na gente (inint.) muito pobre. Mas se tiver que virar é lá em cima mesmo. Aí mistura índio com negro, com porto-riquenho, com drogado, com não sei que bicho se superpõe (inint.) com mulher, o diabo, né, o 'gay power', o terceiro sexo, o quinto sexo, a gente já não está entendendo mais nada nesse bolo que está formando. Lá é que o negócio tende a virar, lá é que eu senti pela primeira vez, quer dizer, quando eu entrei num ambiente, quer dizer, a barra está pesada. Você não sabe onde que está pisando e, e eles notaram que o sistema aqui vale tudo, então eles estão presos no próprio sistema, vale tudo em termos, né? Mas vai chegar um momento em que o negócio vai mudar de qualidade, alguém vai dar um basta e aquele treco vira, eu não sei como vai ser, mas isso pelo menos é o que me orienta hoje. Então, como eu estou de quintal, quer dizer, aquele guri que mora no fundo do quintal, então que é que eu posso fazer? Como eu não vou pra lá, que eu não gosto de (inint.) e de clima quente, não é o meu, o meu jeito, então (inint.) trabalhar aqui no quintal, ver como é que a coisa fica, criar condições pra quando virar, respingar o menos possível pro lado de cá, mas isso é, é natural que, que vá acontecer. Então, voltando a, voltando à historinha da Amazônia, é ... Depois eu chego na Argentina. Mas o problema da Amazônia é que ... Eu acho ... O meu ponto de vista é esse, quer dizer, ainda não vão ... Esse ... Hoje em dia isso não tem grandes perigos, em termos de Amazônia, mas pode ser que eu esteja completamente equivocado, esteja entrando de anjo, mas, provavelmente, pelo que eu ... Essa, essa historinha que está aí dando sopa, quer dizer, eles vão liqüidar essa Amazônia (inint.) tudo muito, muito irresponsável. Vão liqüidar isso com a maior tranqüilidade (inint.) besteira, não sei quê, não faça isso. Mas não adianta. O que eles estão fazendo, que a gente reclama pra burro, é que abre a estrada, e é ... Isso acontece cá embaixo também, é que abre a estrada pra ver que bicho dá. É, é o problema agora da Rio-Santos, por exemplo, fizeram a Rio-Santos, então, vamos fazer o aproveitamento da área da Rio-Santos, então, quem traça, quer dizer, quem faz a estrada, como esse troço é um, é um problema só, então, eu traço a estrada assim, eu acho legal, curva de nível, tecnicamente, não sei quê, inclinação, palhaçada, depois vamos ver o que que acontece aqui em torno, se vai ser turístico, se vai ser industrial, se vai ser ... Ninguém sabe (inint.) quanto vai dar de tutu, pra mim, quer dizer, toda a luta em torno disso. Por que não estudar toda essa área e dizer: olha, não é ... Entre, entre outras coisas, passar uma estrada nesta área. Agora vamos fazer isso, isso, tomar conta da área, para não haver especulação imobiliária, etc. até quando estiver tudo arrumadinho. Eles fazem sempre 'a posteriori'. Aí, a gente traça a estrada, que pode, eventualmente, ser exatamente essa, mas poderia ser alguma coisa que ... Um pouquinho diferente assim. Bom, isso ocorre aqui na Rio-Santos e na hora, aí vem um, um dos grilos profissionais, na hora que esse negócio está armado, aí contratam uma firma francesa pra fazer o projeto. Aí a gente morre de raiva aqui, briga e xinga todo mundo, porque tem mil firmas brasileiras que podiam fazer isso com o pé nas costas, inclusive que são contratadas pra fora pra fazer, mas aí vão contratar um francês lá. Está legal, já foi um grego, vai um francês (inint.) o fim da picada! E pega-se o filé-mignon, que é a decisão do que vai ser isso, e entrega-se pro estrangeiro, em nome da segurança nacional, que Deus perdoe, e esse é o 'nonsense', quer dizer, a Rio-Santos foi um tubo de ensaio da Belém-Brasília, da Transamazônica, e agora com a Supertransamazônica, que é a periférica não sei das quantas. Mas então a nossa luta, a nossa incompreensão, a perplexidade ou a minha, quando eu digo a nossa (inint.) é ... Poxa, está bem, abriu a, a Belém ou a Transamazônica, aí o que que vai acontecer? Então tem agrovila, não tem agrovila. E, e como é que você vai deslocar? Não, a turma do nordeste vai pra lá, mas parece que é um jogo de xadrez, que você tira daqui dum cantinho um peão e põe pra cá. Na verdade é família, é problema social. Às vezes morre gente que nem sabe, vai saber historicamente, quando aparecer um, um pesquisador e for estudar aqueles negócios, relatos lá. Está morrendo gente que ninguém nem sabe como é que é. Mas vamos pra frente, né? E aí é aquele 'nonsense' que acontece, esse do caso da Transamazônica eu estou mais ou menos de perto porque dentro do (inint.) a gente (inint.) tem que atender a Transamazônica e, Deus me livre, parece que é um negócio simples, não ... Então: vamos atender a Transamazônica! E como é que faz? Mil órgãos: INCRA e (inint.) IBA não tem mais, mas INCRA, ministério da fa... da Saúde, ministério do não sei quê, milhões de caras trabalhando lá dentro, cada um no, ministério do Interior, não faz plano, não faz (inint.) então você sai correndo, quer comprar um terreno pra fazer um, um centro social, um treco dessa natureza, aí não pode, que a terra está guardada por não sei quem, enquanto não fizer o plano. Mas o plano não dá tempo pra fazer, quer dizer, quando a bomba já estourou, trator já passou, é que vão fazer o plano. É realmente um negócio de fundir a cuca de cada um. Prum cara metido a planejador ou que vive de planejamento ou que pretende ensinar planejamento, essas coisas todas, isso realmente enche a paciência da gente. Antigamente, eu ficava uma fera, brigava, xingava. Hoje em dia eu já, já acho que é ruim, aí eu já começo a rir de determinadas coisas (inint.) talvez a ... Essa aparente serenidade ou outra coisa, é que a gente vai vendo que a coisa é muito mais complicada do que a gente pensa. Às vezes, um determinado fato assim isolado, menor, deflagra nesse 'nonsense' do subdesenvolvimento ou país grande ou em via de desenvolvimento ou "milagre brasileiro", sei lá, deflagram uns processos que a gente realmente não entende. Hoje em dia, eu estou estudando, ou curtindo muito melhor que estudando, o planejamento de um processo decisório (inint.) então, é como é que forma determinadas coisas. Então, é a importância do filho doente, da mulher que brigou com o cara, os troços mais michas assim deflagram os processo decisivos no país. Então a mulher briga com o cara, o cara veio de mau humor, porque tinha que acertar um negócio, ele mudou de idéia, está brabo, mas ele tem o poder, então, brum, cai tudo por terra. Aí que vai procurar o que é que houve, foi a mulher que deu uma bronca, que o bife não estava quente (inint.) fica perplexo, mas funciona mesmo. Então, o sujeito que não veio porque encontrou uma namorada legal, então o plano não saiu, não saiu (inint.) não entregou no prazo e naquele dia não acontece nada, mas cinco dias depois, tem umas duas namoradas, uma curtição, não sei quê (inint.) quer dizer, uma total irresponsabilidade. Então não entregou, não deu jeito e aquilo vai acumulando besteira e quando ... A besteirinha em si não tem nada, mas como ninguém controla coisa nenhuma, aquilo vai crescendo, vai crescendo, de repente você perde o controle das coisas, você já não controlava, mas você, pelo menos o processo permitia um controle, você não controlava por omissão. Chega um determinado momento que ele desanda, ele acelera e você perde completamente aí a possibilidade de controlar. Aí é, realmente é difícil. O país subdesenvolvido, falta tecnologia, 'know-how', falta vergonha pra se trabalhar, mas estamos aí, vamos fazer curso, muito computador eletrônico, PERTS excelentes, eu acho que o troço mais ouvido hoje em dia é PERT (inint.) você faz um PERT, é a melhor maneira de gastar papel e tempo, pra furar, quer dizer, não funciona mesmo, a não ser numa coisa que, que você tenha perfeito conhecimento de cada momento. Mas agora ficou, agora não, já está meio fora de moda, mas fazer PERT (inint.) e eu tenho tido experiências sensacionais com (inint.) com mapa, hora por hora o que vai acontecer. Geralmente é feito pelo estrangeiro, que não desconfia o comportamento do carioca ou do brasileiro, e o carioca, então, fica o negócio mais engraçado do mundo e este tipo de experiência eu tive assim no metrô do Rio de Janeiro, que eu morri de rir do primeiro dia. Vieram os alemães, cobríssimos, bacaníssimos (inint.) e eles foram, pra você ter uma idéia, eles foram contratados ... Não sei se você se lembra de uma represa que iam, que iam não, estão fazendo, Assuã, no Egito, e que ia afundar, inundar um templo lá daquele bacana e houve um movimento internacional, a ONU, a UNESCO, não sei quê, pra salvar o negócio. Fizeram mil projetos, descobriram um bacana e foram escolher a firma do mundo que poderia fazer, executar esse projeto. O projeto foi executado com o maior sucesso, o negócio correu religiosamente, deu certo. Pra você ter uma idéia, o templo era uma, uma caverna, aquele negócio cavocado. Os caras tiveram que fazer, cavar o morro, retirar aquele buraco, que era o buraco maior e tirar o buraco de dentro, levar essa porcaria toda pra cima do morro, fazer um outro morro em cima do morro, pra água chegar, tampar esse aqui e você ter a caverna lá em cima. Mas igualzinho, com aquela sutileza de, de egípcio.
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 (inint.) nesse filme "Eram os Deuses Astronautas" (inint.)
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 (inint.) eles reproduzem isso (sup.)
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 (inint./sup.) fases desse trabalho (inint.)
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 Eu vi, eu vi o filme da companhia, então toda, todo o projeto, toda a execução do projeto e é um negócio louco, porque os russos, que estavam financiando lá com os egípcios, eles estabeleceram o prazo, disseram: ah, não temos nada com isso, não. E todo dia represam lá em cima (inint.) e a água ia subindo, se tivesse errado, aquele negócio virava mar, acabava. Bom, então, era um negócio pra valer mesmo, e está subindo, o concreto está baixando e a água está subindo. Bom, eles conseguiram fazer o negócio. E um negócio assim que aquele templo tinha um dia tal, o sol batia, e no fundo a coisa tinha quatro deusezinhos ou, e diabos e não sei quê, e o sol ... Não sei se um deus e três diabos, um troço assim. E o sol um dia entrava pelo buraco, iluminava só o deus, lá no fundo. Bom, um negócio assim superbacana, matemático. Eles fizeram esse troço. Bom, esta mesma firma veio pro Brasil pra fazer o metrô. Então: meus parabéns, vamos trabalhar! O fino, né? Então eles resolveram contratar a gente em fevereiro, eu morri de rir. O, o alemão que tinha comandado lá, sujeito simpaticíssimo, muito inteligente, não entendia por que em fevereiro não se contratava ninguém. Eu fui lá: você quer trabalhar comigo? Trabalho, a partir de março você pode contar comigo, mas fevereiro não dá, né? Então, o negócio (inint.) pro carnaval, que depois eles aprenderam, muitos deles ficaram no Rio, que fevereiro (inint.) o país começou no dia doze de março. Até então nós estávamos fazendo relatório do ano passado, preparando a fantasia, esperando ver o que que a Mangueira fazia, praia (inint.) fundamental no planejamento. Dia doze de março, o outro dia, começou o ano, e aí vai acabar, não sei (inint.) vai acabar em dezembro mesmo, se não tiver nenhuma copa do mundo, que aí o negócio está uma parada. Isso tudo, esse lado cultural, é fundamental que se observe, então os caras fizeram um PERT. Outra coisa que eles não conheciam era um negócio chamado virada, você deve conhecer, porque qualquer universitário sabe o que que é. Então a gente ia, era uma dúvida assim: como é que a gente faz? Então os técnicos vieram pra cá, disse: bom, o método é muito fácil, vocês vêem a cidade como era em mil novecentos e ... Mil oitocentos e oitenta, o metrô ia ser projetado pra mil novecentos e oitenta. O que ela é hoje em termos de, e o que ela vai ser em mil novecentos e oitenta, e tivesse um plano, ia ser ótimo, mas não tem. Mas como é que não tem plano? Toda cidade tem plano. Eu digo: bom, lá na terra de vocês, mas aqui não tem. E isso foi em sessenta e oito, em que estudantes estavam numa briga danada aí na rua com a polícia. Então, era mais engraçado que estavam falando em intervenção na Guanabara, MDB, governo da ARENA. Disse: olha, eu não garanto a você (inint.) pra pagar o contrato. E pode garantir? Não, vocês estão trabalhando numa outra área, num outro tipo, num outro ritmo e ... Aí o negócio fura. Você ter que inventar um sistema de planejamento pra isso, um esquema ... E, e essa historinha contada até que diverte legal. Então, todo dia, o cara tinha que dar um, um desempenho físico e tinha um, um cara que tomava conta religiosamente sério. Eles todos acordavam cinco, seis horas da manhã, estudava uma hora de português, vê que troço sensacional, sete horas da manhã eles estavam lá, pá, pá, pá, trabalhavam sete horas, acabavam o trabalho, iam pra casa. E a turma chegava (inint.) estavam pagando bem. A turma chegava sete e meia, sete e quinze, ninguém chegava sete horas e antes das seis já estava se mandando e às vezes estava até às sete (inint.) e então (inint.) então tinha que inventar, tinha que botar a cabeça pra funcionar, não estava de preguiçoso não, mas passava dias, ficava conversando, como é que quebra esse galho? E não existe a teoria do quebra-galho pro alemão (inint.) um amigo meu: pô, por isso que esses imbecis perderam a guerra, não têm flexibilidade nenhuma. Aquele negócio está todo marcado, taque, taque, taque. Tem que dar certinho. Bom, então, dia tal tem que entregar o trabalho, dia tal tem que ... Isso é que interessa pra gente, são os grandes prazos. Então, nós fomos, fomos, chegou nos três últimos dias, nós dormimos no trabalho, era aquele negócio assim de dormir na mesa, pá, pá, pá. Dia tal, para surpresa geral do consórcio, o trabalho estava lá! Bem feito, de nível, etc. Mas esse prazo (inint.) não é tudo vagabundo, tudo índio, não fez nada esse período (inint.) não, isso aqui foi o tempo de maturação, de ficar imaginando possíveis saídas, inventando (sup./inint.) criando determinadas, eh, saídas, quer dizer, ousando. Na verdade, é um negócio que eles não costumam fazer muito, quer dizer, isso é incompatível com a tecnocracia, que você ousar (inint.) e por que não? Aí tinha que fazer certas experiências. No fim, quando o negócio deu certo, bom, está legal, agora vamos fazer, mas aí o prazo, o prazo já estava, estava virado. Não tem nenhum preconceito, dorme em cima da mesa, come sanduíche, dia tal, estava lá, bom, o quei. Bom, esse tipo de coisa, que hoje em dia, me preocupa, cada dia isso aqui é mais maluco, é mais (inint.) o que está no livro, porque aí entra, aqui, sarampo do filho, mulher do não sei quê, a secretária, é que o filme bacana que o cara viu, ou o que que o Ibrahim disse, e por aí vai embora.
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  Acho que é melhor terminarmos (riso).