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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Meteorologia"

Inquérito 0118

Locutor 135
Sexo masculino, 60 anos de idade, pais cariocas
Profissão: médico
Zona residencial: Norte

Data do registro: 16 de outubro de 1972

Duração: 51 minutos

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... o clima do Rio, quando começar. Essa distância está boa?
D
 Está, está ótima.
L
 Pode começar? Quando quiser, dá o sinal.
D
 Pode começar.
L
 Considero o clima do Rio profundamente desagradável, porque é um clima úmido e quente. Embora nascido e criado aqui, jamais pude apreciar este clima. Considero indesejável, prefiro o clima frio e seco. Muitas vezes indago por que os colonizadores teriam fundado a capital no Rio, não obstante as vantagens portuárias, transportes, comunicações etc. que incluem a capital, o Rio, digo, incluem o Rio como uma cidade, eh, naturalmente, eh, eh, localizada, para ser a capital do país. Mas isso não impediria que mais tarde se mudasse, pouco mais tarde se mudasse a capital para um sítio mais ameno. É fato que as figuras, eh, do império sofreram quando dom João VI teve que emigrar pro Brasil, houve queixas muito grandes da sua comitiva e, de dona Carlota Joaquina nem se fala, tinha horror ao clima do Rio. É a umidade, o calor que tornam o Rio assim desagradável. Muitas vezes tenho considerado São Paulo, em comparação com o Rio, superior a ele, porque São Paulo estando a oitocentos metros de altitude, embora seja um pouco úmido, já tem a favorecer a amenidade do clima. Petrópolis, perto do Rio, embora úmido também é um, é um clima agradável, muito bom. Não se pode negar a influência que tem o clima sobre a saúde e sobre o comportamento das pessoas. Como disse, eu posso falar à vontade mal do Rio, porque sou carioca, filho de pais, pai e mãe carioca e dos quatro avós, um deles é carioca. Portanto, eh, sou credenciado a criticar a minha própria terra e mais ainda, sou bairrista. Acho que a mudança do, da capital pra Brasília foi um benefício para o Rio que ao tempo em que era a sede da capital sofria o mal das, dos políticos, eh, virem para cá. Eles traziam os seus protegidos, os seus desvalidos para protegê-los à custa do contribuinte carioca. Acho que foi um negócio excelente pra nós cariocas a mudança do, da capital para Brasília. Agora os pedintes vão pra lá, pra Brasília, para que os seus protetores, os seus padrinhos, os seus políticos cuidem deles. O clima do Rio, eh, como já disse, é desagradável. Torna-se pior ainda com a poluição atmosférica, fenômeno generalizado em todas as partes do mundo, as grandes cidades do Brasil não podem fugir a essa contingência, dizia eu, torna-se pior ainda e a poluição sonora também existente no Rio em alta escala, ah, fábricas de doenças, eh, cada vez mais numerosas e já a ponto de chamar atenção das autoridades para isso. O número de surdos e pessoas com hipoacusia, que é a diminuição da acuidade auditiva, já é muito elevada, muito elevada. As, as medidas pra esse fim não podem tardar, pra tornar o Rio mais habitável, menos difícil.
D
 Agora, eh, o senhor vê uma diferença, assim entre Rio e São Paulo e Brasília (sup.)
L
 (sup.) Sim (sup.)
D
 Concretamente.
L
 Bom (sup.)
D
 (sup.) Do ponto de vista assim de clima, qual seria a diferença (sup.)
L
 (sup.) Sob o ponto de vista de clima, eu nunca estive em Brasília, mas conheço os dados sobre, climatológicos de Brasília e considero o clima de Brasília muito superior ao do Rio e de São Paulo. Eu diria que o pior dos três é o Rio pelo seu elevado teor de umidade e temperatura (sup.)
D
 (sup./inint.) durante o ano inteiro, ou o senhor acha que há diferença (sup.)
L
 (sup.) Não, diferenças, eu digo, eu falo em termos médios. O verão no Rio é pior do que o verão de São Paulo e o verão de São Paulo é pior que o verão de Brasília. Brasília tem um clima ameno, pode ser criticado apenas pelo excesso de secura, o, o grau de umidade é mínimo em Brasília. Isso que também cria problemas, também cria problemas, mas o, o bem-estar é muito melhor em Brasília. Belo Horizonte é famoso pelo seu, pela amenidade do seu clima. Todo mundo elogia o clima de Belo Horizonte. O, o que é o clima de Belo Horizonte? É um clima seco, frio e seco. Faltando umidade o clima torna-se agradável. O próprio frio suporta-se muito melhor, como o calor suporta-se muito melhor, porque a umidade impede que o corpo perca calor, ceda calor ao ambiente. O equilíbrio térmico é um princípio pelo qual todos os corpos desigualmente aquecidos, quando em contacto, o mais, eh, o mais quente cede calor ao menos quente e o menos quente recebe calor do mais aquecido. O, o, o corpo humano e o ar que o cerca, eh, não foge a essa regra, cedendo calor, procurando ceder calor ao ambiente, se o corpo encontra um ambiente úmido, como é o caso do Rio, eh, o, tem muito mais dificuldade em compensa... e em conseqüência o mal-estar é grande. Essa é que é, é a dificuldade ... Para uma mesma temperatura, digamos, trinta graus centígrados, se o ambiente é úmido, o mal-estar é pronunciado, se o ambiente é seco, é um calor perfeitamente suportável.
D
 Agora (inint.) em sua permanência no exterior (inint.) Estados Unidos, o senhor teve (inint.) do ponto de vista de clima, climáticos, diferente do que nós tivemos aqui?
L
 Bom eu tive ... Sim, sem dúvida alguma, sem dúvida alguma. Nosso clima é tropical. Eu estive na Califórnia uma boa temporada onde o clima tem tonalidades tropicais, tem este sol intenso de grande luminosidade, tem poucas chuvas, mas não há termo de comparação, o clima lá é muito mais ameno. Já na costa atlântica, Nova York, por exemplo, é muito úmido,assemelha-se um pouco ao Rio. A Flórida é extremamente úmida e quente, o clima da Flórida já é tropical. O verão numa cidade da Flórida é muito parecido com o verão no Rio ou n... em Santos ou qualquer dessas cidades (sup.)
D
 (sup.) O senhor esteve assim no exterior sempre foi em período de verão?
L
 Não, não. Estive diversos climas, diversos, diversas estações, verão, inverno, primavera, etc. (sup.)
D
 (sup.) Inverno, por exemplo.
L
 Ah, inverno é sempre muito agradável, né, pra quem gosta de frio (sup.)
D
 (sup./inint.) sua experiência (sup.)
L
 (sup.) Como eu (sup.)
D
 (sup.) De inverno.
L
 O, o, o inverno a gente se agasalha e tem os recursos, principalmente nos Estados Unidos onde o conforto é uma, uma mística da população, encontram-se recursos capazes de compensar o desconforto do inverno. É mais difícil se compensar o desconforto do verão, embora con... consiga-se, o ar-condicionado melhora consideravelmente, e, e nos Estados Unidos o ar condicionado é, é comum, não há uma loja, uma casa comercial, um escritório, uma igreja que não tenha ar-condicionado pros ... Até os fiéis perdem a fé na sua religião se tiverem que enfrentar uma igreja desconfortável (riso). Os hospitais, eh, a, os centros cirúrgicos, as salas de operação, todas elas são graduados pra ser, eh, ter uma tem... a mesma temperatura o ano inteiro, agradável no inverno ou no verão. Bom ...
D
 Eh, apesar de haver assim um inverno mais rigoroso, há também o, o mesmo problema de no... nosso calor (sup.)
L
 (sup.) Há, há, conforme a região, os Estados Unidos, como o Brasil é um país enorme, de grande extensão geográfica e, e ainda com a, a, mais amplo porque tem costa no Pacífico e costa no Atlântico e nós só temos costa atlântica, não é?
D
 (sup.) Hum, hum (sup.)
L
 (sup.) De modo que pela sua extensão, os Estados Unidos tem praticamente todos os climas e embora em latitude diferente, ele tem climas muito parecidos, zonas onde os climas são muito, onde o clima é muito parecido com o nosso. E nós temos no Brasil frio intenso, nos, nos estados do sul, temos Porto Alegre um inverno ri... muito rigoroso, já estive no inverno em Porto Alegre e testemunhei isto, e (sup.)
D
 (sup.) Como é que era isso?
L
 Ah, é o, Porto Alegre é muito úmido e é um frio cortante, é um frio duro de se, de ser suportado, porque o frio úmido é tão desagradável quanto o calor úmido (sup.)
D
 (sup.) Hum, hum (sup.)
L
 (sup.) A, a umidade é a grande inimiga do bem-estar, do conforto.
D
 E assim em termos de ausência de comodidades (riso) como há nos Estados Unidos como será, seria assim possível suportar esse frio nessas áreas do Brasil, do sul?
L
 Aí, é evidente que depende da situação de cada local considerado. Lembro-me que quando estive em Porto Alegre, há muitos anos, o hotel dispunha de aquecimento, aquecimento nos corredores, aquecimento generalizado, era um hotel considerado de primeira classe em Porto Alegre. Acredito que hoje, eh, todos os hotéis tenham aquecimento e até mais amplo, aquecimento elétrico, aquecimento melhor, mais modernizado, mais adiantado. Mas na, na época que lá estive era aquecimento por meio de aquecedores a vapor (sup.)
D
 (sup.) Hum, hum (sup.)
L
 (sup.) Mas que eram al... altamente satisfatórios. Agora saía-se do hotel, entrava-se no frio da rua e nas lojas não havia aquecimento, uma ou outra casa particular, geralmente de pessoas estrangeiras, encontrava-se com lareiras (sup.)
D
 (sup.) Hum (sup.)
L
 (sup.) São Paulo algumas casas antigas têm lareiras, também. No Rio não há lareira, a não ser pra enfeitar, mas pra funcionar não (riso).
D
 Agora me diz uma coisa (inint.) estava no Rio (inint.) atrás, chuvas (sup./inint.)
L
 (sup.) Ah, estava. Começo do governo Negrão de Lima (sup./inint.)
D
 (sup./inint.)
L
 (sup.) Fiquei muito agradecido àquelas chuvas porque os políticos nunca deixaram demolir barracos, né, e aquelas chuvas fizeram o favor de demolir barracos, botar abaixo, seja por que processo for, embora desumano, era preciso demolir barracos e as chuvas fizeram esse favor. Sob esse ponto de vista, Cristo mostrou-se muito amigo do carioca, ah, diminuindo o número de barracos, porque os barracos do Rio são um fruto da politicagem (sup.)
D
 (sup.) Hum (sup.)
L
 (sup.) Desde que se inventou, desde que se deu voto a todo mundo, ah, os políticos passaram a proteger os favelados, porque os favelados, eh, votam. Se o favelado não vo... votasse, estaria entregue ao deus-dará. Mas como ele vota, tem sempre um político para, eh, protegê-lo, para encobri-lo. Não importa que isso resulte um prejuízo para a população inteira. Repare que sob o ponto de vista de saúde pública, a existência de favelas é uma, um insulto, é uma barbaridade, é inadmissível, sob o ponto de vista de saúde pública, nós temos alguns milhares de pessoas morando nos morros, eh, lançando seus dejetos no chão, urinando e evacuando no chão, e quando a chuva vem esses, esses dejetos são trazidos pra quem mora cá embaixo, pra quem não está no morro (sup.)
L
 (inint./sup.) o senhor está fazendo uma relação com, com o problema topográfico, a topografia da cidade do Rio de Janeiro, eh, problema do Rio que foi construído em vales e (sup.)
D
 (sup.) Sim, mas foi, esta... sempre existiu assim, mas não foi pra que os, os, os sem teto fossem fazer teto lá em cima, vivendo em condições sub-humanas e tornando as condições de vida dos que não moram em favelas ruins, piores. Sob o ponto de vista de saúde pública, o Rio é uma cidade, eh, péssima, uma cidade de baixíssimo índice, ou, aqui já é rotina os desarranjos inter... intestinais. De onde vem isso? Vem das péssimas condições sanitárias da cidade, principalmente devido à existência de favelas. Durante uma fase da minha vida eu trabalhei em saúde pública aqui no Rio e tive a oportunidade de conhecer bem esse problema. Mas tudo vale, menos falar-se em demolir barracos. Falou em demolir barracos ... Já há até uma classe, classe de favelados. Como se ... Eles não pagam impostos. Vá-se ver quanto paga um favelado de imposto de renda ou de imposto ... Não paga imposto nenhum, não paga nada. É, é uma classe que chega, invade um terreno de terceiros ou do governo que seja, então go... é de nós todos. Não é permitido que um vá usufruir aquele terreno pra produzir, eh, mal para os outros, pra trazer prejuízos, pra trazer aborrecimentos. Acho benemérita essa campanha do BNH e da COHAB de construir casas e remover os favelados e peço a Deus que isso se efetive o mais depressa possível pra livrar, livrar o Rio desta praga, deste (sup.)
D
 (inint./sup.) eh, eh, o senhor acha que esse problema também atinge problema de poluição de mar?
L
 Atinge tudo. Problema de poluição de águas de modo geral. O, o, a, as condições, aí, já aí os favelados não têm nada com isso mais, que o nosso mar já é poluído, não se pode mais tomar banho em, em Copacabana, em Ipanema, no Leblon, em nenhuma praia da zona sul, na Urca, Praia Vermelha, onde seja, porque a água é poluída, quem quiser vê lá detritos de lixo boiando na água e fezes, é, é só entrar na água, não precisa entrar na água não, chegar na beira da praia, na arrebentação e olhar, com água pelo tornozelo e ver a quantidade de fezes e de lixo que existe boiando na a... na, na água. Por quê? Porque antigamente quando era uma cidade pequena, este, eh, essas, esses dejetos eram levados em chatas e lançado no mar alguns quilômetros de distância daqui, onde as correntes marítimas já, já conhecidas, levavam para longe. Com o crescimento da cidade e a entrega dos serviços ao estado, porque antigamente quem fazia serviço com as chatas era uma concessionária chamada City Improovements, passou ao go... ao governo do estado e o estado não deu aos navios, às chatas que faziam, ah, o transporte dos dejetos para os locais adequados e passaram a lançar por aí mesmo, aqui nas proximidades e as correntes trazem pra praia, o número de casos de hepatite cresceu fabulosamente, as diarréias, as perturbações de toda ordem, as dermatoses, etc. As doenças que se apanham na praia são imensas e são numerosas, digo eu.
D
 E isso varia assim com a fase do, do mar?
L
 Não. Varia com a freqüência às praias. No verão a incidência dessas doenças são muito maiores porque é muito maior o número de pessoas que toma banho de mar (sup.)
D
 (sup.) Hum (sup.)
L
 (sup.) Nos meses mais frios e chuvosos diminui a freqüência às praias, diminui o número de vítimas (sup.)
D
 (sup.) Hum (sup.)
L
 (sup.) De candidatos à infecção. Eu sou um carioca que lamento muito ter deixado de tomar banho de mar, coisa que eu sempre gostei a vida inteira. Depois que o mar ficou desta forma, deixei de tomar banho no Rio e Icaraí, as praias de banho é a mesma coisa, pior ainda porque as que estão dentro da baía são mais sujas ainda.
D
 (inint.) o senhor tem assim tido hábito de sair durante as férias pra (sup.)
L
 (sup.) Ah, tenho, tenho (sup.)
D
 (sup./inint.) pra onde? (sup.)
L
 (sup.) Como eu vou sempre pra montanha, vou sempre pra lugares frios, gosto muito do sul de Minas e gosto de permanecer nesses lugares, eh, onde há repouso, onde há ar puro, ainda a poluição atmosférica e a sua (inint.) ainda não atingiram essas cidades (sup.)
D
 (sup./inint.) dar uma idéia desse, nesse contato que o senhor procura com a natureza (sup.)
L
 (sup.) Pois não (sup.)
D
 (sup.) O que que o senhor observa, o que que o senhor vê, o que que o senhor valoriza, o senhor acha que (sup./inint.)
L
 (sup.) Eu valorizo a minha saúde, valorizo o, o que eu vejo é um ambiente que eu gostaria de ter na minha terra. Eu costumo ir pra Caxambu, é uma cidade no sul de Minas, a cerca de mil metros de altitude, clima seco, dotada, a cidade dotada de todo conforto, de modo que tem-se no Rio tudo que se precisa ter numa cidade, tem-se, digo, em Caxambu, tudo que se precisa ter numa cidade civilizada, com um clima privilegiado, uma tranqüilidade invejável.
D
 O senhor sai assim pra passear?
L
 Caminho pelas montanhas, pelas estradas, ah, diariamente ando a cavalo, ando a pé, faço banho, tomo banho de piscina, faço esporte, eh, durmo durante o dia e sobretudo não olho para o relógio, porque o relógio é o maior inimigo dos que têm o que fazer nesta cidade, estar-se sempre com o olho no relógio para que a próxima obrigação a cumprir não seja atrasada. Os dias de férias são os dias da minha forra. A forra do relógio, vou pra Caxambu sem olhar pro relógio, a não ser no dia da volta.
D
 Sei. Agora, como é que são os passeios (inint.) o relaxamento, aí esse, esse contato com a natureza é mais, eh, não é sob a pressão do relógio, certo, então ele se faz pela natureza em si, que na cidade nunca se tem essa oportunidade, né?
L
 Perfeito. E (sup.)
D
 (sup.) E o que que o senhor observa de noite, durante o dia?
L
 Observo que é, é aquele ambiente ideal de paz e de tranqüilidade, de calma, eh, pode-se olhar uma paisagem nova sem preocupação, sem ruído, sem ser amolado, sem ser incomodado, sem ter obrigação de ir daqui para ali, pra fazer aquilo ou aquilo outro. Pode-se ler um livro, pode-se estudar num ambiente ideal de tranqüilidade. Isto é o que representa esses lugares. E eu sempre recomendo aos meus clientes, eh, às pessoas que precisam de repouso, que não vão, que não vão pra esses lugares em ocasiões de veraneio, porque uma porção de gente vai e esses lugares perdem a tranqüilidade!
D
 Hum, hum.
L
 Deve-se ir para esses lugares em ocasiões fora do veraneio. Agora, por exemplo, é ótimo porque esses lugares estão vazios, só tem a população local. Raríssimos veranistas, raríssimos visitantes. De modo que pode-se usufruir de todo aquele sossego, de todo aquele bem-estar e sobretudo de uma população inteira querendo servir a gente, porque são poucos os que têm lá, para, que eles têm obrigação de atender, de modo, os que, eh, os que lá estão são muito bem servidos e atendidos. Há um, um lucro muito grande de saúde, há um, um, é, é um investimento grande. Eu me refiro a Caxambu como pode ser qualquer outro lugar, quem gosta de praia pode ir pra Ubatuba, pode ir pra São Sebastião, pode ir pra U... pra Cabo Frio, para lugares onde se tem o mesmo repouso à beira-mar.
D
 Agora, eh, eh (inint.) Caxambu a mil metros de altura (sup.)
L
 (sup.) Cerca de mil metros de al... (sup.)
D
 (sup.) Não há vento lá (sup.)
L
 (sup.) Não há vento (sup.)
D
 (sup.) Não? (sup.)
L
 (sup.) Não, não. Como de resto, Campos do Jordão também não. Cidades, eh, de beira-mar são mais sujeitas a correntes de vento do que as cidades de montanha.
D
 Normalmente?
L
 Normalmente.
D
 Mesmo no período de inverno?
L
 Mesmo no período de inverno. Caxambu não tem, não tem vento.
D
 E, por exemplo, o Rio teve, já teve as grandes enchentes aqui, tudo no período de verão, né?
L
 Sim, mas é uma, é uma conseqüência da nossa geografia. Montanhas à beira-mar, a água cai nas montanhas tem que escorrer pra o, a, o, o, para a parte baixa, onde estão as ruas da cidade, daí as enchentes. Se nós morássemos nas montanhas e nunca precisássemos vir à parte baixa, não tomaríamos conhecimento das enchentes. Se fosse possível todo mundo morar no Alto da Boa Vista, no Sumaré, no Corcovado, em todos esses morros, no morro do Andaraí, eh, morro da Gávea, pedra da Gávea, etc. se morássemos lá, sem jamais descermos, não tomaríamos conhecimento das enchentes, não é verdade?
D
 É, e, a, e, por exemplo, eu atribuo muito a, a um, teria chovido demais e, e não ao, ao (sup.)
L
 O excesso de chuvas, só, não pode ser responsabilizado. O excesso de chuvas é um componente do quadro, um, uma das geratrizes, um dos fatores da enchente. Há outros fatores como a dificuldade em escoar essas águas. A cidade é pavimentada e quando se pavimenta uma rua, cuida-se de fazer um sistema de escoamento para as águas, naturalmente a previsão não é para águas em excesso, porque então não haveria dinheiro que chegasse para as obras públicas de escoamento. E o excesso de água é que gera as enchentes, como de resto acontece em todas as cidades em todas as partes do mundo. Se a água que cai é excessiva, é uma tromba dágua, é uma, uma tempestade de grande precipitação volumétrica, aí então há a enchente at... que é uma conseqüência da impossibilidade de se prever toda a quantidade de água que vá cair (sup.)
D
 (sup./inint.) tem idéia assim, por exemplo, desses informes a respeito das condições de tempo, eh, em jornais, televisão (sup.)
L
 (sup.) Sim. Olha, pode reparar que o interesse público pela meteorologia aumentou à medida em que os serviços meteorológicos melhoraram a, a sua, a sua previsão. Antigamente era objeto de troça a previsão do tempo, porque falhavam com freqüência e erravam muito. Os meteorologistas não dispondo de equipamento adequado, eh, faziam uma espécie de adivinhação na previsão do tempo. Há uns tempos para cá, eh, devidamente equipados e com gente treinada, o serviço de meteorologia passou a oferecer ao público um serviço, eh, no qual se pode confiar. Raramente há um erro de previsão e o povo interessou-se, o, eh, pode reparar que a maioria das pessoas comenta hoje favoravelmente os serviços de previsão do tempo, eh, dizendo: eles acertam. E passaram a acreditar e porque, de fato, raramente, eles erram. Eh, há um interesse. Em conseqüência desse bom serviço de previsão do tempo, há um interesse geral, o povo já lê, eh, o, as previsões e acredita nas previsões porque sabe que elas são certas. É, é um aspecto muito interessante que os, as pessoas idosas como eu, ah, notam. A, a desmoralização antiga do serviço de meteorologia e o bom conceito que tem hoje esse mesmo serviço, explicados pelas falhas antigas e pelas, pelo acerto das previsões de hoje. O, a mais, o povo entra nesses nu... nesses detalhes, eh, técnicos, eh, zonas de pressão alta, linhas isobáricas e outras expressões técnicas (sup.)
D
 Costuma ler, assim, as, as indicações em algum jornal? (sup.)
L
 (sup.) Costumo, costumo ler mas sem me deter, procurando apenas ver a previsão. É meu hábito como penso que mui... de muita gente ler a previsão do tempo.
D
 (inint.) por exemplo, há, há uns quinze dias atrás eles estavam anunciando uma mudança no tempo e realmente houve essa mudança. O senhor acompanhou o que foi?
L
 Acompanhei e, e durante esses dias todos (sup.)
D
 (sup.) Acompanhou. Podia mais ou menos descrever o que foi que houve assim do ponto de vista de temperatura, de (sup.)
L
 (sup.) Não, não havia nada de especial só aquela previsão do tempo sempre, eh, dando previsão do tempo nas próximas vinte e quatro horas, eh, tempo instável, sujeito a chuvas, eh, eh, eh, possivelmente prolongado, devido achar-se a caminho uma frente fria, ele sempre informando as frentes frias que estavam a caminho, de onde vinham, que deviam atingir dentro de tantos dias, dois dias, três dias, atingir o Rio, às vezes uma frente fria que vem a caminho se dissipa e a, a, eles corrigem a previsão, não haverá mais a chuva, sempre com bastante tempo, eh, de modo a que isso eu lia com um, um interesse normal que todo mundo tem pra saber se vai chover ou fazer bom tempo. (riso)
D
 E agora outra coisa que eu acho que também é interessante como objeto de observação é que eles sempre fazem uma espécie de comparação com outras regiões. O senhor tem olhado isso também ou, ou não?
L
 Não (sup.)
D
 (sup.) Não (sup.)
L
 Não. O tempo que nas outras regiões vem informado, mas eu não, nem leio, não me interesso. O que me importa o tempo em Pernambuco ou o tempo em, eh, Brasília. Agora, acho úteis essas informações porque quem vai viajar pra Pernambuco ou mesmo viajar pra Brasília gostará de saber como está o tempo lá, no dia da sua viagem. Principalmente os que viajam de avião, pra não estarem sujeitos ao, ao desconforto de uma interrupção de viagem, de uma demora, de não poder descer porque o aeroporto está interditado devido ao, ao mau tempo, a visibilidade zero e a outros fatores desse tipo que, eh, influenciam as viagens de avião. Quem vai de automóvel também, porque a viagem com chuva é muito mais penosa e mais arriscada do que a viagem com tempo seco.
D
 O senhor, por acaso, já teve assim alguma experiência assim de viagem com tempo (inint.)
L
 Já, já. Por diversas vezes já tive experiência de viajar, principalmente de avião e prefiro não viajar de avião se a previsão do tempo não é boa.
D
 Como é que foi que ...
L
 Ah! São choques que o avião leva, né, naquelas quedas que os, os, os aviões dão ao passar nas zonas de tumulto atmosférico, ao passar naquelas bolsas, que eles chamam bolsas de vácuo, que determinam a, a queda do avião, é muito desagradável pra quem está no avião embora não represente perigo de vida, mas é muito desagradável.
D
 Agora, há, há pessoas assim às vezes observadoras e notam, por exemplo, diferenças no céu, tipo de nuvem, reconhecem, eh, qual é a nuvem que é nuvem de chuva, qual que não é. O senhor por acaso tem alguma vivência, experiência desse tipo?
L
 Não nenhuma (sup.)
D
 (sup.) Nenhuma? (sup.)
L
 (sup.) Nenhuma, sou completamente desinteressado e desinformado a esse respeito. Me limito a ler as previsões e, e me guiar por elas. Em uma fase da minha vida eu fui fazendeiro e, no sentido de que tinha uma fazenda, embora morasse no Rio e só fosse à fazenda em fins de semana. Nessa ocasião eu me interessei muito porque a, o tempo é um fator importantíssimo para quem tem fazenda, porque a água é a essência do fazendeiro, da vida do fazendeiro. Sem água os pastos, o verde morre, o verde seca e sem verde não há vida animal possível. As, o prejuízo é enorme. O fazendeiro não pode dar um cruzeiro a cada vaca e mandar ela comer no restaurante (sup.)
L
 (sup.) Sei (sup.)
L
 (sup.) Ele tem que providenciar comida todo dia pra vaca de qualquer maneira. Eu digo a vaca como pode ser o carneiro, pode ser o cavalo, pode ser o animal que for, que ele cria, ou o porco, ou o que for, ele tem que providenciar a comida, não pode comodamente meter a mão no bolso e dar um, um dinheiro: vá comer no restaurante. Não pode fazer isso, então a, a, a comida de quem mora na fazenda, dos animais que, que estão na fazenda, depende da água, a água é fundamental. Tive muitos prejuízos por falta dágua e prejuízos por excesso de água. O fazendeiro sofre barbaramente.
D
 Qual é a, a região, a área em que o senhor tinha (sup./inint.)
L
 (sup.) Estado do Rio, vale do Paraíba (sup.)
D
 (sup./inint.)
L
 (sup.) E município Paraíba do Sul e criava, produzia leite (sup.)
D
 (sup.) Sim (sup.)
L
 (sup.) Criava gado leiteiro, atividade que eu algum dia retornarei se ficar rico (sup.)
D
 (sup.) Sim (sup.)
L
 (sup.) Em vez de comprar um iate, eu compro uma fazenda, mas sempre pensando que a fazenda é como o iate, um lugar de recreio, porque ninguém pode pensar que seja lucrativa uma atividade, cujo produto de renda, cuja, eh, venda do produto é tabelada, mas produto esse que para ser produzido custa muito caro, depende de uma porção de coisas que não são tabeladas. Então é uma injustiça muito grande, o fazendeiro tem que comprar sal, arame farpado, torta, eh, mão-de-obra, paga impostos, cimento, parece mentira mas cimento é, é indispensável a quem está em fazenda, grampos, moirões de cerca, uma quantidade enorme de materiais que ele precisa e, eh, produtos veterinários, que ele tem que comprar a qualquer preço, do contrário ele tem um prejuízo enorme, para que ele possa produzir leite. Agora, o que ... Toda semana sobem o, os preços dessas utilidades, mas o leite do fazendeiro é tabelado, porque na hora que o fazendeiro quer um centavo a mais pelo seu preço, as autoridades chamam-no de tubarão, que é ali... alimento das crianças, alimento dos pobrezinhos, alimento dos desvalidos, e o fazendeiro então entrega todo o seu patrimônio e vai ser desvalido, vai passar pro outro lado e pedir esmola, porque é, é uma, um sistema de dois pesos e duas medidas, com, tudo é tabelado, tudo aquilo que o fazendeiro precisa é tabelado e o seu, preço do seu leite está vinculado a estas coisas e basta subir um item que ele terá que subir imediatamente o preço do leite, ou então nada é tabelado e o leite também não é tabelado. O sistema que existe é um sistema injusto para com o fazendeiro. Talvez se não houvesse essa injustiça, em vez de eu ser médico, eu fosse fazendeiro. Mas como é, atualmente, não é possível ninguém sobreviver. A senhora pode ponderar: ah, mas existem muitos fazendeiros que até enriquecem! Perfeitamente. Como há pessoas que enriquecem com salário mínimo, basta não comer, não se vestir adequadamente, não cuidar da saúde, viver como animais, dormindo em choças, vivendo em condições infra-humanas e todo ... O dinheiro funcionando em mão única, o dinheiro só entra, não sai. Então é possível qualquer um ficar rico, até quem ganha salário mínimo.
D
 É, agora, e o aproveitamento (inint./sup.)
L
 (sup.) O gado de corte é um, é um tipo de atividade diferente. Exige capitais imensos porque é preciso um latifúndio para que se crie um gado de corte. O (sup.)
D
 (sup./inint.) depende da extensão?
L
 Depende da extensão de terras, o que não, não é possível em, em áreas próximas aos grandes centros. O gado de corte é criado em Mato Grosso, é criado no norte de Minas, em áreas onde a terra é mais barata, para que possa ser possível a criação do gado de corte.
D
 E in... influi nisso o clima?
L
 O clima influi, muito, muito, porque, eh, do clima decorrem as condições da, da, de vida do animal nessas áreas. Por exemplo, o vale do Paraíba, onde eu tive fazenda, é absolutamente inadequado porque é calor, eh, clima quente e úmido. Há grande quantidade de parasitas, como, como o berne, por exemplo, que dá nessas regiões. No pantanal do Mato Grosso, não há berne, no Triângulo Mineiro não há berne, o berne está vinculado a certas áreas e o berne é um inimigo tremendo do gado, o carrapato é outro parasita, eh, causador de grandes prejuízos, grande sofrimento, o, o, o gado não engorda devido ao berne, o gado sofre devido a, ele transmite doenças, o carrapato, em certas áreas não existem carrapatos. Então isso tudo está vinculado ao clima, a, a área, a zona e isso pra não falar nas pastagens. Em certos lugares, por exemplo, no Triângulo Mineiro que é uma zona de criação, o capim jaraguá é nativo, ele cresce com uma força extraordinária o ano inteiro. O fazendeiro não tem seca, não precisa comprar torta pra sustentar o gado, ele pode comprar pra suplementar a alimentação de certas fases do ano, mas se ele não tiver dinheiro pra comprar, o gado dele também não morre de fome, porque ele tem o capim jaraguá o ano inteiro.
D
 Eh, o, outro problema também é a influência de raça animal, pra ser, dar mais lucro? (sup.)
L
 (sup.) Ah, isso é evidente, há raças leiteiras e há raças de corte. Dentro das raças leiteiras há umas mais, eh, umas cuja produção o leite é mais gordo, tem mais teor de gordura e outras de leite de menos teor de gordura. A raça `jersey', por exemplo, é uma raça de alto teor de gordura, em compensação, o volume de leite produzido por uma vaca `jersey' não é tão grande quanto o volume produzido por uma vaca holandesa. A vaca holandesa produz maior volume, em compensação menor teor gorduroso. Uma coisa compensa a outra (sup.)
D
 (sup.) Por acaso ... Nós estamos fugindo completamente da área, mas está me interessando assim ter uma informação, eh, sobre ... Hoje em dia fala-se muito assim no, eu não sei exatamente o que
 que é, mas uma coisa, semi-estabulização, estabulização, tipo de (sup.)
L
 (sup.) Ahn (sup.)
D
 (sup.) Eh, desfrute mínimo no Brasil, então, pra aumentar (sup.)
L
 (sup.) É, é (sup.)
D
 (sup./inint.) seria possível assim o senhor dar alguma idéia (sup./inint.)
L
 (sup.) Não muito, mas tenho idéia do que seja. Ah, pode ser o, o, o gado pode viver em regime de campo, que é o gado livre, que a maioria das fazendas adota esse regime, e o regime de estabulação, que é o gado preso no estábulo e o chamado regime misto ou de meio campo, meio estabulação, meio campo, o gado passa parte do tempo no estábulo e parte do tempo solto. O, o, o, esse regime chamado de confinamento mantém o gado preso ce... num, num cercado e, e sempre com alimentação à dis... ao dispor. Então o gado come freqüentemente e fica parado, não tem como gastar suas energias e aquelas calorias transformam-se em gorduras, o gado vai aumentando de peso constantemente. Essa é que é basicamente, eh, o quadro que é a razão de ser dessa, desse regime (sup./inint.)
D
 (sup.) E é mais econômico?
L
 Aparentemente sim, dependendo da área, da região, tudo depende do, da, da, dos recursos que dispõe o fazendeiro. O fazendeiro é um desamparado, é um pobre, embora seja um, um dono de terras, muitas vezes la... latifundiário até, mas ele não dispõe de, de dinheiro nenhum, nenhum. Esse, eh, daí ele não poder adotar, eh, métodos modernos do tratamento do gado, pra melhoria da sua qualidade, da sua produção, da alimentação do gado. Vital, a alimentação do gado é vital para que o gado possa ou crescer e dar carne mais depressa, porque enquanto o fazendeiro está esperando, o fazendeiro do gado de corte, enquanto ele está esperando o bezerro crescer, ele não está ganhando nada, está gastando. Quanto mais depressa o bezerro crescer e chegar no ponto de poder ser vendido pro corte, me... melhor para o fazendeiro. E o fazendeiro do gado de leite quanto maior número de litros de leite produzir por dia uma vaca, melhor para ele. Esses são os, os, os dados fundamentais da atividade de cada um deles. Ou corte, ou, ou pecuária, ou corte ou pecuária do leite (latido)
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 E em termos de desgaste (inint.) conteúdo proteínico do leite é imenso, quer dizer, o que deve ser em termos de exigência da produção de leite é muito grande, né (sup./inint.)
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 (sup.) Bom, o ministério da Agricultura, os técnicos, etc. têm tabelas adequadas pra isso. Os fazendeiros se guiam por aí, a quantidade de tortas corresponde a tantas calorias, etc. isso ... Empiricamente o fazendeiro solta o, eh, o gado no pasto, havendo pastagens verdes não há problema nenhum, o gado por si mesmo sabe qual é a quantidade que ele precisa, o que o fazendeiro tem que dar é o sal no coxo, porque o sal, eh, o animal precisa e não tem como obter se o fazendeiro não der, fora disso ele solta no pasto, ele come à vontade. Agora, faltando pasto o fazendeiro tem que suprir as necessidades calóricas, calóricas do gado com as rações, com os outros recursos. Mas nós começamos falando em clima (sup.)
D
 (sup.) É e acabamos (sup.)
L
 (sup.) E acabamos falando em gado.
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  E eu agradeço.