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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Comércio Exterior e Política Nacional"

Inquérito 0113

Locutor 129
Sexo masculino, 26 anos de idade, pais cariocas
Profissão: economista
Zona Residencial: Norte

Data do registro: 10 de outubro de 1972

Duração: 41 minutos

Clique aqui e ouça a narração do texto


D
 O Brasil ainda faz do café o seu produto básico de exportação?
L
 Meu negócio é falar, né? Está certo. Hoje em dia não faz, né, eh, aliás não faz não, faz. Mas pretende que, pretende-se que isso, que não faça, né? E, eh, procura, o governo procura incentivar outros tipos de exportação: minérios, principalmente minérios de ferro, mas no sentido da pergunta, de que o Brasil ainda faz? O Brasil não faz. Procura não fazer, mas ainda é o principal.
D
 Porque que você diz: procura não fazer, mas ainda é?
L
 Procura não fazer, porque, eh, seria a dependência de um produto principal, na pauta de exportação, é muito ruim pro país, qualquer crise internacional ou qualquer problema ne... nesse tipo de mercado atrapalha tudo, atrapalha tudo não, mas atrapalha num nível muito elevado o, a balança de pagamentos no mercado. Parte de, de ex... a parte da exporta... de exportação do país, de moeda estrangeira, recursos de moeda estrangeira. Então quanto mais diversificada pudesse ser a pauta de exportação melhor pro país, mais seguro fica a sua balança de, comercial. É a mesma coisa que, que uma indústria produzir somente um tipo de produtos e se o mercado desse tipo de produto tiver um baque, uma queda qualquer, ela vai sofrer muito mais do que se ela tiver um número muito maior de produtos, eh, sendo fabricados. No caso, a pergunta diz que ... Pergunta, né? Exato. Se o país ainda faz (sup.)
D
 (sup.) Não, é maneira de provocar (sup./inint.)
L
 (sup.) Exato, uma maneira de provocar, eh, assim incentiva o negócio (inint.) então a gente procura não fazer, mas infelizmente ainda é o principal produto. Ainda está preso ao café.
D
 Você falou em minérios também e que é mais que tem? Eh, quais os produtos básicos (sup./inint.)
L
 (sup.) Os produtos básicos de exportação. Minério, café, né? Café, o café. Minério hoje em dia, cacau, açúcar, é cana-de açúcar, né, ou açúcar de cana, aliás, eh, vejamos, principais. Está vendo que é tudo produto primário. E dizem aí que o pro... a exportação de produtos manufaturados está crescendo muito, né? Ver se consegue entrar no mercado. Se conseguir muito bem, mas ... O forte ainda é produto, produto primário.
D
 O que que é produto primário? Explica pra gente.
L
 (riso) Assim é fogo, dar aula, fica tipo aula, é fogo na roupa. Produto primário? Você entende, você teria ... Eu não sou economista, estudei economia, mas não sou economista.
D
 Ainda bem, se você fosse economista não estava respondendo sobre isso.
L
 Não estava respondendo sobre isso? (riso) Mas, produto primário seria, é que você pode classificar em produto primário, secundário e o terci... é o produto (inint.) a economia é que classifica assim: primária, secundária e terciária. A primária é o produto de exporta... de exploração pura e simplesmente. A secundária já seria manufaturado e semi-manufaturado. E o terciário já a parte de serviços, né? Economia terciária. Então esse tipo de, esse tipo de classificação se, eh, usa aproxima... usa-se uma aproximação, mais ou menos disso, pra, pros produtos, pro tipo de produtos de fabricação ou de exportação. No caso de produtos primários, eh, produtos de exploração pura e simplesmente, de chegar lá tirar, de uma mina ou agricultura também seria primário. O secundário, que em termos de exportação, também é secundário, seria a parte manufaturada. E o terciário seria serviços. Que é parte, o nível já bem adiantado de exportação, é o país conseguir exportar serviços e não pura e simplesmente o, o, produtos, já exporta inteligência. Dá muito mais dinheiro, né? O agregado é muito maior. O agregado ao capital é muito maior.
D
 Isso acontece com o Brasil?
L
 Bem, existem uns poucos casos, né? Nós temos feitos, aí, um, umas exportaçõezinhas de 'know-how' mas muito pouco, é contar um, dois por ano, eh, tem-se exportado aí uma fábrica de celulose pra Cingapura, prum lugar desse assim e, quer dizer, seria a fábrica já pronta e pra ser montada. Então foi exportada também com isso foi exportada a parte secundária de produto manufaturado, mas também conhecimento dessa montagem que vai, foi inclusive gente pra lá, pra montar isso lá. Pra montar não, para superintender a montagem. E aqui com, com nossos vizinhos aí menores e desamparados por enquanto: Uruguai, Paraguai, de vez em quando vai gente pra lá, mas isso não, não representa quase nada, né? Em termos de, em termos de merca... em termos de comércio exterior brasileiro é ninharia total, total.
D
 Então, você não acha que não há condições de se criar um mercado comum sul-americano?
L
 Tinha que entrar a Venezuela, né? O governo venezuelano não alisa.
D
 Por quê?
L
 Porque, eh, condições haveria, né, teoricamente haveria, assim como há teoricamente o Mercado Comum Europeu, condições do mercado comum abranger todos os países da Europa. Quer dizer, Europa oriental isso dificilmente vai abranger. Mas a Europa ocidental, incluindo Portugal, que tem uma economia muito inferior à Itália, à França, a Itália já não é grande coisa, mas a França ou a Inglaterra, ou a Suécia, ou a, ou a Suíça. E aqui o negócio é muito pior. Se bem que nós, nós ou a Argentina ou o Chile ou o México não, não sejamos uma, nenhuma grande potência, mas existem grandes desni... desníveis. Existem grandes desníveis, (riso) aí, e, eh, as economias às vezes se complementam, que em, em termos de comércio exterior e de, de mercado sul-americano, mercado comum sul-americano, no caso da Europa isso é muito importante a economia se complementar, mas se complementa, mas normalmente se complementa a favor da gente. Nós pegaríamos a parte do leão. Quer dizer, nós exportaríamos, passaríamos a fazer o que faz os Estados Unidos com a gente, o que faz a Inglaterra com a gente. A gente exportaria manufaturado e importaria produtos primários, que para nós é ótimo, mas pra eles não é. Então qualquer desses países, falou em mercado comum latino-americano é querer levar paulada. Porque é um susto total, vai praticamente colocar, existe um risco de colocar a economia desses países num, numa negritude, vamos dizer assim, total. Eles ficarem, eh, num bloqueio econômico, eh, bloquear totalmente a sua economia nacional mesmo, as suas indústrias florescentes, aquilo tudo, eh, seria talvez exterminado pela penetração do nosso produto. Talvez não. Isso é um negócio muito difícil. Eles, todos eles têm medo disso. E inclu... principalmente e quem grita mais é a Venezuela que tem uma certa força, mas grita muito, grita muito porque tem força no mercado exterior em termos de petróleo, não em termos de, de indústria, indústria é pouca. E eles sofreriam muito com isso. Eles teriam, continuariam exportando o quê, petróleo, e importando o quê? Manufaturados nossos, aço, automóveis. A indústria deles, que eles fazem barr... co... colocam barreiras violentíssimas pra proteger as indústrias deles, certos casos, em outros casos não, as barreiras não existem, pra importar produto americano, produto europeu, as barreiras praticamente não existem. Em alguns casos. Em alguns tipo de produtos. Mas sinceramente tipo de produto, a maioria talvez, as barreiras são muito grandes e que no mercado comum eles teriam que diminuir essas, eh, terminar com essas barreiras tarifárias. E então o produto entraria, o nosso produto, o produto argentino, o produto do Chile, o produto do México, são muito ma... países muito mais industrializados do que qualquer, do que a própria, do que a Venezuela, entraria lá por, teria condição de entrar por preço mais baixo do que o preço que eles conseguem colocar o produto deles no mercado deles. E isso ia atrapalhar um pouquinho a indústria deles que ainda está nascente. Eh, você não pode entender um, um mercado comum com um Paraguai no meio. Não tem sentido. O Paraguai em termos de comparação com o Brasil, com a Argentina, com o Chile mesmo, não existe praticamente. A Bolívia, o que que a Bolívia produz? A Bolívia tem uma renda per capita de oitenta dólares talvez, acho que não chega nem a cem dólares, eh, quatro famílias ou cinco famílias tomando conta do país. Famílias latifundiárias. Então não tem condição. O mercado regional poderia ser. O mercado comum regional, eh, Brasil, Argentina, Uruguai, Chile, sul, por exemplo. México, Venezuela, Colômbia, com algumas restrições, fazendo um grupinho lá em cima, pra depois procurar agrupar isso tudo, quer dizer, desenvolver em termos regionais e quando esses, esses países tivessem um certo grau de desenvolvimento maior, aí procurar o global. A Venezuela já procura isso com o mercado, como é que é? O Pacto dos Andes. Tem o Pacto dos Andes lá que é uma espécie de mercado comum mas que está muita briga e tal e não vai pra frente também, porque tem país lá que não tem condição, tem o Equador no meio, tem a Col^ombia no meio e não dá pra ...
D
 Você falou na ALALC, o que você sabe sobre ALALC? Que que ela representa?
L
 ALALC é um nome bonito, né?
D
 É.
L
 Associação Latino Americana de Livre Comércio. Eh, tem uns, a ALALC deve ter uns dez anos ou mais, a ALALC deve ser de mil novecentos e ... Teve a Operação Panamericana, na época do Juscelino, foi sessenta, sessenta e um, a ALALC deve ser dessa época, sessen... (interrupção) Então antes da interrupção, está aí, está bom? O negócio era a ALALC. A ALALC deve ter o quê? Deve ter uns dez anos, uns onze anos, a idéia aí, muito bonita, baseada, moldada em cima do, do, do, do Mercado Comum Europeu e uma idéia menos, mesmo tipo do Mercado Comum Europeu, uma idéia de integração econômica regional. E que todo ano tem uma reunião, há umas reuniõezinhas aí, a turma discute, discute, discute, quase que sai no braço às vezes e de prático não sai quase nada, né? Então é muito bonito, muito bacana, eh, espetacular, no papel é lindo, existem tratados lindos, grandes à beça, coisa escrita pra burro, mas na hora de colocar na prática, o negócio não sai. E de acordo com os seus interesses, cada país procura torpedear esses tratados. A Argentina agora mesmo torpedeou, eh, as barreiras de muitos produ... as barreiras tarifárias de muitos produtos tinham, pelos tratados, caído, a Argentina aumentou em cima dos produtos brasileiros, produtos uruguaios. Parece que o Uruguai, o Uruguai entrou no negócio. E isso trouxe uma grita total aí, mas ela ficou com a, com a barreira durante muito tempo porque a economia dela está acabada, está muito ruim, e procurando desenvolver, eh, dar um pouquinho de oxigenação à sua economia, por intermédio de barreiras. Aproveitando esse, essas barreiras que os Estados Unidos criou e na mesma época mais ou menos eles criaram umas barreirinhas parecidas lá. A idéia não foi má e eles aproveitaram. E o Equador às vezes já aument... já colocou barreira. A Venezuela não faz quase acordo nenhum. Entra no, entra nas discussões e na hora de discutir a pauta de produtos, quer dizer, a lista dos produtos que vai ser, que terão realmente, eh, redução na sua, na sua, nos seus impostos de importação interna, nos impostos internos de importação, na hora da, na hora prática, não sai quase nada.
D
 E a posição do Brasil?
L
 A posição do Brasil? Bancar o bonzinho.
D
 Por quê e como?
L
 Bancar o bonzinho. Bonzinho com o pé atrás, é a posição que eles estão fazendo aí. Nós temos assinado tudo quanto é acordo, agora o país que tem mais, que a, a lista dos produtos com tarifa reduzida é a maior lista teoricamente. A tarifa é reduzida, mas as, as, assim, os entraves burocráticos são aumentados. Então nós dizemos que, eh, a gente pode importar o aço argentino, era, vamos dizer, imposto de, imposto de vinte por cento, depois passou a ser cinco por cento. Mas vá você querer importar o aço argentino que não vai ser mole. A burocracia ficou muito maior. É muito mais confusa. Então dificulta, acaba dificultando muito mais o, a, as trocas, as trocas, eh, comerciais. E eles têm chiado, a Argentina chia, o Uruguai chia, o Peru chia, todo mundo reclama, mas isso continua. Nosso governo diz que vai acabar com isso, que isso não existe, que as barreiras tarifárias estão realmente baixas. E realmente certas coisas a gente importa bastante deles. Tem, existem certos trechinhos da economia, que por interesse nosso, nós fazemos uma complementação econômica e outros trechos, outros setores da economia não. Então em certos setores indus... de, de, de produtos manufaturados isso existe, em outros inexiste totalmente. Quer dizer, pura e simplesmente dentro do nosso interesse. E nós falamos muito, mas na prática o negócio é como a gente quer. O negócio é esse. Essa é que é a verdade. E é o que todos eles reclamam. Chega no, chega em qualquer, qualquer reunião dessa, o nosso delegado fala lindo, fala lindamente, espetacularmente, assina papel à beça, mas na hora daquilo se tornar real, começa a aparecer os probleminhas. Então o negócio, quer dizer, é, é, é briga de lobo, né, um querendo comer o outro, ninguém querendo abrir a mão. Todo mundo tomando cuidado. É um negócio que está no papel e está morto. Na prática a ALALC está morta. Não existe, quer dizer, está morta, não, não existe, também não, mas, não nesse sentido, mas no sentido de ... Eu acredito que a tendência será a extinção. Negócio que de vez em quando algum aí pensa, um mais corajoso aí pensa em acabar, extinguir de vez porque dificilmente vai chegar a algum, algum ponto útil, útil realmente de integração real de economia. E a própria, eh, as próprias economias, de cada país da região, dificulta a integração. Fica um negócio muito difícil. E, e, eh, porque ... Vamos ver se eu falo um pouco mais. (riso)
D
 Pergunta é que não falta.
L
 Pergunta é que não falta. Não, mas ... Quanto tempo tem? (riso) Eu vejo pelo tempo. Eu controlo o tempo (riso/sup.)
D
 (inint./sup.) olhe pra essa fita que é até acabar essa fita. Como é que você acha que são aceitos os nossos produtos no exterior?
L
 Como são aceitos? Em certos lugares muito bem, em outros lugares como produtos não sendo brasileiros, né? Na Venezuela não são. A maioria dos nossos produtos que entram lá não são brasileiros. Isso é um negócio que pouca gente sabe. Eles lá não sabem que é brasileiro. E se você for dizer que é brasileiro vai ter briga, ninguém gosta do negócio, não pode ser, que aí seria um país latino-americano exportando manufaturados pra eles e eles não admitem isso. Eles não querem admitir, que estaria demonstrando que eles estariam num grau de desenvolvimento menor do que o nosso. Então eles não querem, não querem admitir isso. Tem lá, esses elevadores Otis, ônibus e tudo, e o venezuelano médio, médio e mesmo acima de médio não admite que seja brasileiro e muitas vezes entra como não sendo brasileiro, entra com um 'made in' qualquer outra coisa. Aquilo vai, é uma operação de triangulação: vai prum outro lugar e de lá vai pra lá. Isso é efeito de nossos, de nossos programas comerciais, é falta de gente capacitada e é efeito de interesses estrangeiros no negócio. A mesma coisa é o café. O café existe isso (inint.) o café existe isso. A gente exporta, vai muito café pra Rússia sem ser exportação direta. O inglês compra, o americano compra e exporta pra Rússia. Exporta pra uma porção de países comunistas, principalmente os países comunistas. É muito comum. É uma tremenda triangulação. Então eles ganham dinheiro às custas da gente, eles ficam ganhando dinheiro às nossas custas aí, como intermediário, intermediário no mercado internacional, que não é mau negócio, né, muito pelo contrário, é ótimo!
D
 E a posição do nosso governo face a isso?
L
 (riso) Bem, no café tem o IBC aí brigando, né? O IBC, o IBC tem procurado terminar com isso por intermédio de entrepostos, entrepostos na Europa, procurando incentivar direto, a venda direta, a venda, o IBC vendendo diretamente pra esses, pra esses países e quase, procurando que quase todo o café ou a maior, a maior parte do café que entre, entre nesses países seja proveniente do IBC e, e não venha de outros, de outras fontes, por intermédio dessa triangulação. Agora em outros produtos não, produtos manufaturados por exemplo até talvez exista interesse. Se chegar lá um sujeito lá de Hong-Kong querendo comprar um negócio aqui pra vender não sei pra onde o pessoal vai bater palmas pra ele e vai ajudar. Que o negócio é vender manufaturado, né? Agora, o café não. O café já está estabelecido, já tem o seu mercadinho aí certo, seguro, garantido. Então não interessa pro, não interessa pro governo, não interessa ao país de maneira nenhuma. Mas produtos manufaturados não, nós não temos mercado. A gente está, nós estamos no, no, nos buraquinhos do mercado internacional, a verdade é essa. Manufaturados o Brasil não existe. Um produtor americano bobeou lá e deixou de vender uma coisa qualquer aí, nós procuramos fazer aquela folguinha pra vender. Mas essa folguinha, pra nós, é coisa à beça, mas pra eles não representa nada. Não representa absolutamente nada proporcionalmente, em proporção ao, ao, ao mercado deles. Então nós temos hoje em dia, um milhão, dizem que esse ano vai chegar a um milhão, não faço muita fé, mas um milhão de dólares, um bilhão de dólares. O que que representa isso no mercado internacional? Nada, em termos de manufaturados, não representa nada, nós estamos só com uns pedacinhos, estamos bancando o rato em volta do bolo que o gato vai comendo e a faisquinha que, a faisquinha não, o pedacinho que ele bobear lá, ele vai lá e pega. Então esse rato tem que ficar mais forte. Tem que brigar mesmo pra poder conseguir alguma coisa. E quando a, a quantidade que ele quando começar a pagar for maior, o gato vai brigar. Vai ver e brigar. Aí é que vai ser fogo na roupa. Aí é que o negócio vai ser difícil continuar se manter o nível de exportação. Eu acredito que o governo inclusive deve estar esperando isso: que nossa exportação deve crescer, a exportação de manufaturado, deve crescer até um milhão, um bilhão e meio, por aí. Talvez passe um pouquinho. E é bem provável que, hum, vamos dizer, conseguiu um bilhão e meio, no outro ano caia, pelas barreiras, pelas barreiras tarifárias, pelo, pela maior briga no mercado internacional. Porque aí os outros produtores, os outros vendedores de mercado internacional passam a sentir que existe um novo concorrente. Isso já existe em alguns produtos. Tem coisas aí que já estamos começando a entrar pelo cano por causa disso. Eles já começaram a procurar colocar barreiras na nossa frente. Então, eh, cada vez o, o mercado é mais competitivo. Tem que brigar mesmo por ele, tem que ter produto de grande qualidade, produtos de preço, preço baixo, coisa que nós não temos. Nem qualidade nem preço, na verdade não se tem. Numa coisa ou outra se tem preço, mas preço às custas de incentivos fiscais violentíssimos, que qualquer outro país desse aí, o Brasil seria o primeiro a chiar. Se os Estados Unidos incentivassem a exportação deles como nós incentivamos a nossa, nós estávamos aí gritando que nem uns loucos. Porque o que o governo dá pro exportador é, é violentíssimo. Qualidade quase não há, essa é a verdade, fora um ou outro, um ou outro caso aí, eh, assim heróico.
D
 (inint.) de quê por exemplo (inint.)
L
 Torno por exemplo tem, muito conhecido, indústrias Romi, do Rio Grande do Sul, tem qualidade. Eh, sapato, essas indústrias de Franca, Novo Hamburgo, tem qualidade, uma qualidade média, porque o preço, a exportação de sapato por exemplo que nós fazemos não, eh, a maior parte é sapato de preço médio pra baixo, não é sapato, não são sapa... não são produtos caros, produtos de primeira, é qualidade média. Então nós estamos entrando num produto, num mercado de qualidade média, que aí o negócio está bom. Agora, outro tipo de coisa, a maioria não vai. Nego exporta, o pessoal exporta algodão com pedra dentro. Ainda está nisso. Ainda existe isso. Eh, o importador procura, procura contato, manda uma carta pro expor... pro, pro, prum industrial brasileiro ou prum exportador em potencial brasileiro e exportador esse que se apresentou as, muitas, normalmente se apresentou por intermédio do Itamarati, como exportador, como querendo exportar. Então o indivíduo lá da Itália manda uma cartinha pra ele aqui, querendo comprar alguma coisa, por exemplo. E essa carta chega aqui, fica na escrivaninha dele dois, três, quatro, cinco meses e o italiano está esperando a resposta. Então existe muito, isso acontece à beça, é inclusive deselegante, não é? É muito comum. Eles reclamam muito isso. Eh, mandar amostra de uma qualidade e mandar o produto de outra. Muito comum. Tem acontecido isso à beça com sapato. E tem outras coisas aí. Ainda precisa muita, muito especialização assim nesse tipo de mercado. Nós não temos nenhuma tradição exportadora em manufaturado. Ninguém conhece aí fora nosso produto. Então, tem que forçar a barra e ficar forçando, pra poder conseguir alguma coisa, senão, não vai conseguir de maneira nenhuma. E além disso, a, a, o nível da nossa economia. Um, chega um supermercado desse americano, como tem acontecido aí, pede aí, eh, duzentos mil pares de sapato. A fábrica produz cinqüenta mil no ano inteiro. Como é que ele vai, como é que, como é que ela vai manter esse nível de exportação se, eh, não produz nesse nível de quantidade? Não tem condição. A Puma teve, aconteceu isso com carro, eh, pedidos da Suíça de vinte carro por mês, eles fabricam, eh, quarenta carros, parece, por mês, nem quarenta carros por mês, por volta de quarenta por mês pro Brasil e pra exportar. E chega um pedido, um, um único consumidor pedindo vinte por mês. É um troço. Não tem condição, muito difícil. Eu queria que fechasse um pouquinho pra beber água. (interrupção) Rodou?
D
 (inint.)
L
 Eh, mas, quer dizer que ... Falar sobre a ONU. A ONU não é uma (sup.)
D
 (sup.) Não, não. Houve uma reunião agora, mas não foi de ONU.
L
 Qual é a reunião que você está falando? ONU, ONU ... Ah! (riso) Tá. É que enquadrou. Teve o FMI e o Banco Mundial.
D
 O que é FMI?
L
 É o Fundo Monetário.
D
 O que é isso?
L
 Fundo Monetário Internacional.
D
 (inint.) eu sei que é uma coisa complicada (riso/inint.) você podia explicar rapidamente.
L
 Rapidamente pra acabar a fita?
D
 (inint.) não (riso).
L
 (riso) Vamos ver se, vamos ver se enche. O FMI, Fundo Monetário Internacional, um negócio aí depois da guerra, uma reuniãozinha nos Estados Unidos e, com, presidida ou com participação (inint.) presidida pelo maior economista do século, o Lord Keynes, que foi todo o bolador do, da estrutura do FMI, como uma estrutura estabilizadora de moeda internacional. Estabilizadora do mercado, estabilizadora da moeda. Instituído o padrão-ouro de equivalência de moedas e ... Veio por aí afora, eh, isso veio através desses anos aí, padrão-ouro, padrão-ouro estabelecido, eh, participando de FMI, no fim, só os países ocidentais, ficaram de fora os orientais. E inicialmente os países, eh, participantes da guerra, as potências vencedoras, porque foi feito quase paralelamente à fundação da ONU, depois foi entrando os outros que tinham representatividade no comércio internacional. E isso através dos anos houve um, um desvio da, um desvio da, assim, da, da estrutura não, um desvio da idéia, eh, o padrão-ouro sumiu praticamente e passou a valer o pa... a existir, na prática, o padrão-dólar. A paridade com o dólar, das outras moedas com o dólar, que ligou a, a estabilidade monetária mundial à estabilidade econômica de um país só, no caso os Estados Unidos, o dólar americano. Agora, né, caso faladíssimo, a história, a economia teve uma recessão, eh, a economia alemã, alemã, francesa, eh, italiana muito pouca, a japonesa muito. Em grande escala, numa grande, num grande progresso, a França trocando seus dólares por ouro, já que o dólar estava como padrão praticamente e poderi... e era possível a troca do dólar pelo ouro. Pelo ouro, ouro, eh, metal mesmo. E a França começou a encher seus, seus tesouros, seus cofres de ouro, a Fran... a Itália, a Itália não, o Japão começou, pretendeu fazer isso, não teve condição, que foi barrado, a Alemanha queria fazer mas não teve coragem e o ... Com isso chegou a um ponto que os Estados Unidos, o tesouro americano já não tinha mais condição de fazer a troca, a conversão do dólar por ouro e suspendeu essa conversão pura e simplesmente, no grito, eh, no grito, que o outro lado também soube gritar, mas soube gritar procurando ajeitar o negócio. E até agora eles estão procurando ajeitar, né? Eh, valorizam o marco, valorizam o iene, valorizam outras moedas (sup.)
D
 (sup.) E a nossa moeda? (sup.)
L
 (sup.) Pra compensar, a nossa desvalorizou, né?
D
 Por que que (inint.)
L
 Eh, nos Estados Unidos houve, está havendo agora, o ano passado justamente houve, houve em grau muito maior e esse ano em grau muito menor, eh, a inflação que também existe aqui. Então a nossa moeda é va... valo... seria desvalorizada ou valorizada em função principalmente do, do dólar que é ainda a moeda, eh, na prática, a moeda padrão no mundo inteiro, para trocas comerciais. E com isso, vamos dizer, nossa inflação foi de vinte por cento, a americana de seis, nós desvalorizamos nossa moeda de catorze, quinze, procurando ajustar a nossa inflação com a inflação externa, de tal modo que não fosse importado a inflação externa. E durante um pequeno período isso aconteceu. Nós estávamos importando a, a, a inflação que existia através do mundo aqui pra dentro, pra nossa economia. E instituíram o, a desvalorização, a minidesvalorização, que é um negócio muito antigo, que o, o Chile já fez isso, foi na época do, mil novecentos e sessenta e poucos, ninguém fala, mas o Chile durante uns dois ou três anos por, fez essa minidesvalorização, de dois em dois meses mais ou menos desvalorizava o, o escudo chileno. E lá não deu, não funcionou porque a economia chilena não estava em grande desenvolvimento, a nossa está. E essa minidesvalorização não adiantou nada: simplesmente tirou todas as reservas, eh, incentivou a saída de reservas do país, chegou um ponto que eles tiveram que parar. Nós, pra nós isso está funcionando razoavelmente, porque com essa desvalorização os nossos produtos continuam com preço razoavelmente competitivo, nós não deixamos encarecer o preço. Com isso, o nosso, o preço do nosso produto no exterior não encarece em termos de dólar, já que há uma inflação, o preço em cruzeiros aumenta mas o dólar também aumenta. Então em termos de dólar o preço se mantém estável e às vezes até decresce. Em certos casos pode decrescer por certos interesses.
D
 E internamente (inint.)
L
 Internamente, o quê? A, a, a ...
D
 Essa inflação (inint.)
L
 A inflação (sup.)
D
 (inint./sup.)
L
 (sup.) Não me considero capacitado pra falar sobre isso não, sabe? Isso é um negócio enroladíssimo, muito enrolado mesmo. Existem muitas nuances (sup.)
D
 (inint./sup.)
L
 (sup.) Certo, mas é, é uma questão muito difícil. A inflação, excesso de meio circulante, o quê? A inflação de quê? Que tipo de inflação? Qual é a nossa inflação? Negócio que uns dizem um negócio, outros dizem outro e eu não tenho opinião formada do tipo de inflação que nós temos, não tenho mesmo. Não me acho em condição de nem abrir a boca sobre isso, que além de tudo é um negócio enroladíssimo. É um troço que, que envolve muita coisa, muito detalhe, eh, inter-relações, um número muito grande de inter-relações.
D
 Quais são as pespectivas que nos acenam, não só ao Brasil como à Ame... América Latina também, as próximas eleições americanas? Como é que você vê Nixon (sup.)
L
 (sup.) Ou McGovern? (sup.)
D
 (sup.) Brasil, América Latina ou McGovern, Brasil, América Latina? É.
L
 Nixon, Brasil ... Tem duas relações: Nixon, Brasil. McGovern, Brasil. McGovern, América Latina também? McGovern versus o resto seria, será, eh, meio por cento, né? A possibilidade é muito pequena. Então acho que nem, nem, nem vale isso. Nixon é uma coisa, né?
D
 Não, mas na última pesquisa aí, já subiu um pouquinho.
L
 Ele subiu um pouquinho, mas isso não acredito não. O americano médio não vai deixar de prestigiar o, o seu herói, não tem condição. O ... Vai ganhar fácil, acho que ganha fácil lá e política mesmo, a política como há bastante tempo aqui.
D
 Por que você acha que ele ganha fácil?
L
 Eu acho que ganha. Não sei. Eh, ele agrada. Eu acho que ele agrada ... Eu acredito que ele agrade lá dentro. Lá ele agrada. Ele, a política dele agrada a média. Aquela média que procura o seu interesse, pra essa média do povo ele é razoável. O McGovern, eh, pra essa média, eh, assusta, é o desconhecido. Então ninguém vota no desconhecido. A gente vota no, no claro e não no escuro. Eu acho que é isso que vai acontecer lá.
D
 (inint.) falar em votar, como é que funciona lá?
L
 Lá?
D
 É, partidos, etc. e aqui também. Como é que você descreveria o tipo de governo que existe lá, que existe aqui (inint./sup.)
L
 (sup./riso) Lá? Lá, há ene partidos, né? (sup.)
D
 (sup./inint.) quais os interesses do Brasil, do governo brasileiro (sup./inint.)
L
 (sup.) No Nixon ganhar, por exemplo? Aqui? Lá, eu acho que lá é o sistema ene partidos, pode ter qualquer tipo de partido, partido regional, até ter uma certa representatividade, partido nacional. Eh, voto ... Como é que eles chamam? Voto ... Não me lembro mais. Eh, existem uns eleitores, não, cada estado tem um certo número de eleitores que isso é uma, uma instituição antiga e que na prática, praticamente, funciona. E um voto universal, universal não, o voto direto do povo pro presidente, os eleitores no caso ... Quem quiser ser eleitor, quem não quiser votar não vota. E quem quiser votar vota em quem quiser e, e o ganhador normalmente é empossado, né? Lá.
D
 E aqui?
L
 Aqui, dois partidos.
D
 Quais são?
L
 ARENA e o meu caro MDB, e a possibilidade da existência de um terceiro, parece que houve uma mudancinha, que haveria uma possibilidade muito remota de existência de um quarto, não tenho certeza, parece que houve uma mudança nesse troço. Eh, cada partido tem que ter não sei quantos milhões de eleitores, uma representatividade na, no senado, eh, uma representatividade na câmara, congresso, na câmara dos deputados, eh, representatividade num número mínimo de estados, em deputados e tal, aquilo tudo (inint.) por aí. Na constituição, eleição direta, na prática, eleição indireta.
D
 (inint.) que significa eleição direta?
L
 Eleição direta, o indivíduo, eu, você votando no fulano, eleição indireta, eu, você votando num fulano que vai votar num outro. Pode ser válido, pode não ser. Muito discutível.
D
 Isso foi sempre assim?
L
 Não foi sempre assim, né? Havia um outro sistema. Lembra-se que havia um outro sistema.
D
 Não me lembro mais.
L
 (riso) Havia o voto universal, voto universal, não, o voto direto.
D
 (inint.)
L
 Ahn?
D
 O que que houve (inint./tosse)
L
 (tosse) Não sei, não sei mesmo, honestamente. Não é, não estou fugindo da pergunta não. Não sei mesmo, eh, porque isso, a gente analisando sem, analisando em termos políticos no bom sentido, você pode considerar a eleição direta válida e pode considerar ela não válida, depende de como o sujeito analisa, entende? Agora, o que fez mudar? Eh, existiu há algum tempo um governo revolucionário que ... Talvez seja isso, eh, e é bem provával que seja. Um interesse de pro... se proteger. Acabou a fita. O interesse de ... Ainda bem. O interesse de se proteger, de proteger a revolução.
D
 Não acabou não, parou.
L
 Parou? Então o interesse de proteger a revolução, que pode ter ocasionado isso, pode ter feito com que isso seja instituído. Pode não ser a, a ... (sup.)
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 (sup.) Soltou lá! (sup.)
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 (sup.) Está rolando o carretel. Então pode ter sido um interesse do governo, de instituição, né? E pode não ter sido, uma idéia pura e simplesmente política. Não andaram pensando em voltar com o voto distrital que eu nem sei direito o que que é, e que isso é um traço discutido pra burro? Honestamente não sei não, não, não dá (inint.) pode ser uma certa idéia, pode se tender prum lado ou pro outro, mas, afirmar que foi isso ou foi aquilo, não vejo como.
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 E a Bolsa de Valores, é a salvação ou armadilha?
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 A Bolsa de Va... Como é que é? Salvação ou armadilha?
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 Salvação ou armadilha?
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 Acho que não é nem uma coisa nem outra, né?
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 E o governo face a ela?
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 Otário. Otário talvez bem intencionado, talvez não, não sei. Não o governo em si, certos homens. Eh, pouco controle, muito pouco controle. Agora, não é nem salvação nem armadilha, é uma instituição necessária, supernecessária, agora, que existe necessidade de ter mais controle, muito mais controle, coisa que não existia, agora está começando a existir, muito de leve, mas está começando a existir. Mas ainda é pouco, ainda precisa de mais controle. Talvez bem mais (sup.)
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 (sup.) Controle pra quem, de quem pra quem?
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  De quem e pra quem? Eh, o governo, a Bolsa é um mercado, não é? É pura e simplesmente um lugar que institucionalizou-se que ali se reúnem os mercados de títulos. Poderia ser no meio da rua, certo? Mas, no meio da praça, mas foi ali e só quem é devidamente capacitado lá e tal pode entrar. Então pura e simplesmente compra e venda. Pra, pra instituição como um todo, pra economia como um todo, principalmente no tipo de compra e venda que é, no tipo de mercado que é esse, mercado de título importantíssimo pra economia, é interesse do governo proteger esse mercado. Se o governo deixar, se deixar livre totalmente isso pode ficar na mão de especuladores, de gente que vai usar às vezes seu conhecimento ou seu poder econômico pra ganhar dinheiro às custas do, de, do, de quem tem pouco poder econômico ou de quem tem pouco conhecimento ou do mal informado ou do bobo ou de lá o que seja. E então como é uma instituição importantíssima pra economia, tem que haver controle. Porque se deixar livre, a especulação pode se espalhar à vontade, como andou havendo isso. E isso pode acarretar assim uma, uma febre total no mercado. O mercado cair demais como caiu. Assusta, né? O pouco informado ou o pouco capacitado financeiramente, que não tem condição de, de garantir, de, de garantir não, de, de agüentar aqueles baques, ele vai se assustar. Isso vai fazer com que ele, com que diminua o número de pessoas, diminua o dinheiro circulante nesse tipo de mercado e eu acredito que não seja interesse de ninguém, principalmente do governo, se o governo está interessado em fazer o país desenvolver e a Bolsa, como mercado de títulos, como representante, vamos dizer assim, máximo do mercado de títulos, é importantíssimo ... Está acabando? É importantíssima no, no, no soerguimento da, da economia do país. Então o governo tem interesse nisso, tem interesse, teria interesse também de manter isso, essa Bolsa saudável, o mais saudável possível, porque ela, ela repercute demais na economia nacional. Então, controle-se, né? Haja, seja feito, sejam feitos controles, pra que, eh, esse tipo de, de especuladores de, no caso, até inescrupulosos não, tenham dificuldade de entrar. Porque que não entre, não dá, né, mas tenham dificuldade de passar os outros pra trás, de fazer suas manobrazinhas, normalmente manobras violentas. Só havendo controle. Muito controle.