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PROJETO NURC-RJ

Tema: "Ensino e igreja"

Inquérito 0111

Locutor 127
Sexo masculino, 30 anos de idade, pais cariocas
Profissão: engenheiro
Zona residencial: Suburbana

Data do registro: 05 de outubro de 1972

Duração: 40 minutos

Clique aqui e ouça a narração do texto


D
 Teste, teste, teste.
L
 Estou à disposição de vocês. Estou à disposição de vocês agora.
D Muito bem. Então fale.
L
 Então que eu fale sobre, sobre escola, primeiro, então?
D
 É.
L
 Vamos dizer, a escola de que eu me lembro mais, com mais facilidade. As outras deverão vir, eh, gradativamente. Bom, a escola ... Faculdade! Faculdade! Foi a última e portanto a que está mais recente. Seria interessante falar sobre o quê, por exemplo? Eh, eh ...
D
 Como era a faculdade, que aparência ela tem, como é que ela funcionava.
L
 A influência que a faculdade exerceu sobre mim, coisas assim desse gênero?
D
 Não. Não especificamente, mas pode ser. A idéia por exemplo que você tinha da faculdade, antes de entrar, não é, e no final das contas como é que ela, que é que ela representou pra você. Pode falar.
L
 Bem, aí, é, é, é difícil começar. Depois que eu começar (sup.)
D
 (sup.) É claro. Claro! (sup.)
L
 (sup.) Não há problema.
D
 Então vamos começar pelo curso primário. A primeira escola que você, que você cursou, como é que foi?
L
 Eh, eh, que eu ... Foi a escola Azevedo Júnior, aqui em Cascadura mesmo.
D
 Como é que é essa escola?
L
 As recordações que eu tenho da, da escola, quais, a... atualmente que eu ainda guardo, as professoras, o, o ambiente em si. Talvez porque fosse uma outra época, também, e devido talvez também à criação que eu tive, então exerceu uma, uma influência, é claro, como toda escola exerce sobre toda e qualquer pessoa. Na minha opinião, é evidente. Agora dizer assim ...
D
 Era como?
L
 Heim?
D
 Na apa... apa... na sua aparência? A aparência da escola. Como é que era? Grande, pequena, velha, nova.
L
 Era grande. A primeira vez, o primeiro contato, por assim dizer, que eu tive com a escola foi, foi, foi bacana, muito embora eu não fosse muito satisfeito pra lá, porque estava, era pequeno ainda, estava habituado em casa, com a mamãe e tal, então não, não estava satisfeito, não é, de, de ir pra lá e de, de ficar longe da, da minha mãe. Então foi aquele problema que normalmente se vê e se, se sabe, de, de criança que chora e tal, mas depois acostuma. Eh, o ambiente ali mesmo, os outros, as outras crianças.
D
 Como é que era a sua sala de aula? Como é que era a sua sala? Você se lembra? Como é que era o ambiente? O ambiente.
L
 Tempo?
D
 O ambiente físico da sala. Ambiente físico. É. Descreva a escola.
L
 Eh, era um, era, era, que agora já está um pouco mudada, já estive lá e já vi que está mudada, um casarão, eh, acolhedor, a menos pra mim era acolhedor, e em que inicialmente eu não, não encontrei assim aquele ambiente que talvez achasse encontrar, julgasse encontrar, mas que mais tarde, com o correr do tempo, fui, fui me familiarizando evidentemente e, e gostando. Eu era criança que não gostava de faltar à escola e ... Fosse outra pessoa comentando, poderia dizer que eu era caxias já a essa época. Mas não era caxiagem (sic) não. O problema é que gostava de estar lá, não é, me sentia bem, gostava do, da, do convívio com, com, com os outros colegas e tudo mais.
D
 O que que você fazia? Você gostava das coisas que você fazia na escola?
L
 Que eu fazia na escola?
D
 É.
L
 Especificamente estudava, é evidente.
D
 Mas no primário, já, logo de início?
L
 Ah, estudava. Estudava, que quando eu fui pra, pra escola eu já escrevia razoavelmente, já lia. Minha mãe em casa foi ensinando. Então quando eu fui pra escola já lia e escrevia razoavelmente.
D
 Você levava assim algum material pra escola, específico? Você tinha assim algum material específico pra levar pra escola? Você tinha uma roupa especial pra ir pra escola? Você levava alguma coisa com você pra escola? (sup.)
L
 (sup.) Tinha uma roupa especial pra ir pra escola. Ah, assim é melhor, procurando puxar é melhor. Tinha uma roupa especial, era um uniforme. Havia uniforme. Era, era, a, a calça azul-marinho e a blusa branca, não é, com aquele distintivozinho, EP, escola pública. Então eu me sentia satisfeito de vestir aquela roupinha e tal. Levava merenda, entende, naquela, usava-se naquela época era ... Como é que chama? Merendeira, né? Havia merendeira. Então, eh, se colocava ali a merenda. Colocava ... Havia um cantinho pra colocar um copinho dágua, parece. Havia um cantinho pra colocar a água. E eu gostava, gostei de um modo geral da, da, da escola em si.
D
 O material escolar você levava aonde?
L
 Na pasta. Tinha uma pasta.
D
 Pasta, como?
L
 É. Pasta comum. Levava o material, as coisas, na pasta (sup.)
D
 (sup.) E que material vocé costumava levar?
L
 Caderno (sup.)
D
 (sup.) Porque cada criança leva um, não é (inint.)
L
 Sim. Eu levava caderno, lápis, borracha.
D
 Hum.
L
 E foi interessante, agora, falando em material, foi interessante, estou me lembrando que ainda nessa fase de primário, de, na fase mais de transição de primário pra ginásio, eh, eu ... Foi um problema danado pra eu me acostumar com a caneta. Eu escrevia só com lápis. Então foi, foi uma, uma coisa, né, a letra saía horrível, eu borrava o que escrevia. Enfim, era um problema sério. Até que me acostumei com, com a tinta. Imposição do, de, de, de, eh, de, do curso, do curso, do curso de admissão, não é? Obrigavam que a gente escrevesse a tinta e tal. Outra fase já, o próprio curso de admissão, já que falei nele, né? O curso de admissão foi uma fase assim dura, uma fase como é pra toda criança, né? Eu encarava, sempre encarei as coisas com muita seriedade, com muita, muita, vamos dizer, muita, interesse. O que eu fazia, fazia porque tinha vontade de fazer e portanto queria chegar a bom termo daquilo. Não gostava de pegar as coisas por pegar. Aliás, nunca fiz nada por fazer, de forma que aquilo foi uma, uma experiência pra mim assim séria, uma experiência que me trouxe também, já daí, um início de responsabilidade.
D
 O que que motivou esse início ... O que ou quem motivou esse início de responsabilidade em você? No curso de admissão especificamente (sup.)
L
 (sup.) A responsabilidade de, de passar pra, pra um, uma fase mais importante da minha vida.
D
 Não, eu quero dizer, que pessoas. Não houve influência pessoal de ninguém?
L
 Evidentemente meus pais, não é?
D
 E depois, só?
L
 Pessoas, meus pais.
D
 Só, só seus pais? Na escola?
L
 Na escola. Você quer dizer, na escola, com o sentido de me, me despertar a, a (sup.)
D
 (sup.) Incentivar (sup.)
L
 (sup.) A responsabilidade de, de ter, de ter que fazer uma coisa e fazer bem feita e tudo mais.
D
 Hum, hum.
L
 Sim, talvez professores. Professoras, no caso. À época eram professoras.
D
 Eram todas assim da mesma maneira, o procedimento de, delas era uniforme? Quer dizer, todas do mesmo tipo?
L
 Não, não. Umas exigiam mais, outras menos e, e eu sempre me norteei por aquelas que exigiam mais. Então relativamente eu me, me, me sentia à vontade com todas, porque eu me baseava na que mais exigia e dali pra frente tudo estava bom. Não tinha problema nenhum.
D
 E por exemplo na escola, você podia faltar normalmente à escola ou havia uma maneira de controlar se o aluno ia, se não ia, né? Se isso ...
L
 Não, nunca faltei.
D
 Sim, mas se um aluno faltasse, não você?
L
 Se um aluno faltasse?
D
 Sim.
L
 Que é que tem?
D
 Não havia nenhum problema? Havia controle? Isso era controlado?
L
 Ah, sim! Era controlado. Havia, havia as fichas de chamada em que diariamente era verificada a presença dos alunos. Então havia realmente um controle.
D
 E no ginásio?
L
 No ginásio também havia controle.
D
 Da mesma maneira?
L
 E particularmente eu acho que isso era válido. Hoje eu não sei, mas na, à época era válido. E, é a tal, a tal história da responsabilidade. Porque se não se exigir do indivíduo, dificilmente ele vai ter consciência da responsabilidade que tem, a não ser raras exceções. Há pessoas que têm em si mesmo uma responsabilidade. Não é preciso que ninguém diga o que tem que fazer, a hora que tem que fazer, porque a pessoa faz. Isso a gente vê a toda hora.
D
 E vocé tendo assim muita vontade de estudar, muita vontade de levar sempre a bom termo tudo o que você fazia, você, pra isso, seus pais precisavam de ajudar muito. Então você tinha tudo, você tinha todo o material escolar, tudo pra, pra você levar a bom termo essas matérias. Você tinha todos as, os instrumentos? As condições materiais? Eh, os instrumentos materiais pra você estudar?
L
 Tinha.
D
 O que que você tinha?
L
 Material escolar, como lápis, borracha, caderno, é isso?
D
 Hum.
L
 Eh, livros? Tinha. Felizmente tinha.
D
 Depois mudou, claro. Gradativamente no curso superior houve necessidade (sup.)
L
 (sup.) Bem, aí ... Ah, bom (sup.)
D
 (sup.) De outros materiais. E aí quais os materiais que você usou no ... Qual o material que você usou na faculdade?
L
 Qual o material?
D
 É, que você usava na faculdade.
L
 Na faculdade?
D
 Sim.
L
 Bem, aí a coisa já muda bastante.
D
 Ahn!
L
 Na época de faculdade, o, o que eu tinha era, era pelo meu esforço. Eu já não tinha mais meus pais, meu pai, pelo menos, eu não tinha mais, como tive. Durante a época de primário, de ginásio, científico, eu tive a assistência de meu pai. O, vamos dizer, o, o mínimo de que eu necessitava eu tinha.
D
 E qual era esse mínimo (sup./inint.)
L
 (sup.) Esse mínimo ...
D
 No ginásio por exemplo você já necessita de outros materiais, porque você aprende outras coisas, então você não precisa só de lápis, de borracha e de caneta, né?
L
 Não. Ah, não, não. Aí não ...
D
 Então, o que mais?
L
 No ginásio já se torna necessário material de desenho, coisa que eu desconhecia.
D
 Que material é esse?
L
 Esquadros, compasso, régua, certo? E o próprio lápis e a borracha mesmo usados já com outra, com outra, com outro sentido, com outra idéia que não aquela só de escrever, eh, de representar outras coisas. Falando em desenho, eu sempre tive um problema de desenho, desenho a mão livre. Eu nunca gostei, não gostava de fazer desenho a mão livre. Desenho comigo tinha que ser com instrumentos. Talvez daí até houvesse algu... alguma tendência justamente pra, pra mais tarde eu me definir quanto a uma coisa ou outra, uma profissão. Pode ser um, um mínimo isso, mas alguma coisa pesou. Do ginásio vai iniciar o meu interesse específico por, por matemática. Então mais assim interesse por coisas exatas: matemática, desenho mesmo. Depois, no científico, com física e química. Então eu vou cada vez mais, mais me ligando a esses, essas ciências.
D
 Você, pra entrar na faculdade fez algum curso preparatório?
L
 Heim?
D
 Pra você entrar na faculdade, fez algum curso preparatório?
L
 Eu não.
D
 E você acha válido cursinhos?
L
 É válido. É válido pra aqueles que fazem o curso fraco. E aí não vai nenhuma censura, heim, aos dias de hoje, mas eu acho que os cursos estão fraquíssimos, de ginásio, de científico estão fraquíssimos. Então o que acontece é que cada vez, ainda que se queira acabar com os cursinhos, é aquela história, é um mal necessário, porque o, o indivíduo termina, o indivíduo termina o seu curso científico teoricamente em condições de ingressar numa faculdade, mas na verdade ele não está em condições de ingressar numa faculdade, porque o curso ginasial e científico são precaríssimos atualmente. Eu vejo, porque mesmo depois de, de estar na faculdade eu dei aula, durante seis anos mais ou menos, e cada vez mais eu sentia a deficiência do pessoal (sup.)
D
 (sup.) Você deu aula, você deu aula, deu aula pra que alunos, que tipo de alunos? Você deu aula para que tipo de alunos?
L
 Aluno?
D
 Sim, que tipo?
L
 Eu dava aulas particulares. Eram, eram alunos que se sentiam fracos. Eram alunos que ficavam em segunda época. Enfim, justamente o, o problema. Os alunos que não me procuravam é porque não havia problema, não é? Então aqueles se adaptavam ao regime de, de aulas, de, de provas. Eu sentia que o problema principal era a, era a, era a inconsistência do que eles estavam aprendendo, que no fundo, no fundo eles não estavam aprendendo nem metade do que se aprendia mais tarde, ah, anteriormente aliás. E sinto isso hoje ainda com, com parentes mesmo. Eu vejo que se consegue, eh, passar de ano, porque o objetivo é passar de ano, não é saber, essa é que é a verdade. A garotada hoje quer passar de ano. Saber, bem poucos se interessam. O negócio é passar, pra dar uma satisfação. E isso cada dia mais parece que está acabando, está caindo, não é, pra dar uma satisfação ao pai, à mãe, à família, ou lá a quem seja, ou a si próprio, talvez, de que passou, de que conseguiu lograr um tento, que no fundo não é tento nenhum, na verdade, porque o sujeito está, está se enganando e enganando aos demais.
D
 E os cursinhos relâmpago suprem essa falha do ensino?
L
 Não, eu não acho.
D
 Por quê?
L
 Eu acho que aquilo que, aquilo que a gente aprende com calma ao longo de, de, de três, quatro, cinco anos não, não há condições de assimilar assim em dois, três meses, como, como querem fazer crer esses cursos. Esses cursos fazem máquinas de fazer prova. Não ensinam nada a ninguém. Eles fazem máquinas de fazer prova. O sujeito fica em condição de fazer uma prova de vestibular e passar naquela prova. Agora se ele for um sujeito interessado, se ele for esforçado, ele poderá a longo prazo, eh, eh, amadurecer tudo aquilo que ele obteve ali. Caso contrário, vai ficar no ar, vai ficar solto e vai continuar na faculdade nas mesmas condições e, acho eu, que vai ser um indivíduo se não totalmente incompetente, mas vai se sentir até frustrado, vai se sentir, eh, vai terminar um curso ... Donde muita gente termina um curso, depois diz assim: puxa, que que eu aprendi? Agora o negócio é, é prática, é trabalhar. Certo?
D
 E os professores, que que você acha dos professores de agora? Que que você acha dos professores agora?
L
 Professoras?
D
 Professores de um modo geral.
L
 Professores de um modo geral, atualmente? Com uma visão bem mais clara das coisas. Vamos dizer, alguns, aqueles mais antigos, com uma dificuldade grande de, de, de comunicação com, com o pessoal, especialmente com essa, com essa, com essa rapaziada, com essa meninada de hoje, que, por vezes torna-se difícil de, de lidar e de entender, mas procurando acertar, isso é que é importante, procurando sempre acertar.
D
 Como é que foi a sua experiência de faculdade?
L
 Experiência em, em relação a quê?
D
 À faculdade, tudo, desde o ensino ... Aparelhamento, aparelhagem, né, coisas novas que você ficou conhecendo.
L
 Bem, falando especificamente do, do, do, do meu caso (sup.)
D
 (sup.) Claro (sup.)
L
 (sup.) Eu diria que foi uma coisa espetacular. Foi ... A minha entrada na faculdade, vamos dizer, foi, abriu um mundo novo pra mim, não tenha dúvida. Disso não resta a menor dúvida, porque, ainda que houvesse deficiências, sempre houve, isso não, não vai ser a curto prazo que vai ser corrigido, sei disso, mas ainda que houvesse deficiências, apresentava pelo menos aquele mínimo necessário a quem quisesse se desenvolver, pelo menos pudesse se desenvolver, vamos dizer, em termos de, de conquista social, em termos de, de, de conquista técnica, o indivíduo ter, ter acesso a, a coisas que de outra forma dificilmente ele conseguiria ter, a novas técnicas, a novas, novos instrumentos, novas máquinas, novas idéias.
D
 Que, que, que, que instrumentos, que máquinas?
L
 Bom, quer dizer, novas máquinas utilizadas por nova tecnologia, por uma tecnologia mais evoluída que a nossa (sup.)
D
 (sup.) Sim. Mas quais são elas? (sup.)
L
 (sup.) Que, não fosse a faculdade, dificilmente, como eu disse, seria atingida, seria alcançada.
D
 Claro.
L
 Quais máquinas? Especificamente, quais máquinas?
D
 É.
L
 Bom, um novo motor de um, de um avião, um novo motor de um, de um navio, uma nova idéia de uma estrutura metálica pra uma carroceria, um ... Enfim, uma série de coisas, um novo tipo de concreto, eh, possibilitando estudo por exemplo sobre protensão, que se falava e ainda se fala muito, ainda é uma coisa muito discutida, o tal concreto protendido, enfim, e por aí afora. #D
 Era bem aparelhada a sua faculdade, então?
L
 Era bem aparelhada. Nós dispúnhamos na parte de laboratório de muita coisa, e acredito que outras, outras faculdades, não sei, porque não, não visitei, não tive oportunidade de conversar com colegas de outras escolas pra saber assim se eram ou não, mas acredito que outras faculdades não tivessem aquelas condições. Talvez porque fossem instalações novas. Eu estudei na Ilha do Fundão, então eram instalações, instalações novas, eh, a parte de laboratório completa, tinha praticamente de tudo ali.
D
 E pra ... Tudo é o quê? Consulta teórica, tinha de tudo?
L
 É, nós ti... nós tínhamos na parte de laboratório de química, nós tínhamos lá, não sei se ainda é, o laboratório mais completo de todo, de toda a América do Sul talvez. Tanto que mais tarde foi transferido para lá o instituto de Química. Ele era na Praia Vermelha e foi transferido pra lá porque já havia condições pra funcionar realmente lá. Então no segundo ano de engenharia foi uma maravilha, foi, foi um entusiasmo, foi uma, uma coisa espetacular pra gente, entende, eh, poder utilizar aquelas instalações, aquele laboratório muito bem montado, tudo novinho, espetacular. O laboratório por exemplo de qui... eh, de química foi o que eu falei, mas era, havia uma complementação dele, na parte de, de engenharia mecânica, na parte de engenharia civil, na parte de engenharia eletrônica, naval, enfim, qualquer outro setor. Então havia laboratório específicos. Eu por exemplo, na parte de engenharia mecânica, tinha uma completa instalação, até era idéia mais tarde de funcionar lá na Ilha uma mini-indústria em que nós trabalharíamos como operários especializados, lá. Claro, não, não com a intenção de, de, de, de, de obter renda daquilo nem nada, mas pra o sujeito ter uma, uma vivência do que era uma, uma indústria, antes de sair da escola pronto praticamente pra uma indústria real.
D
 Que que vocês utilizavam, que instrumentos eram esses? Quais eram esses, quais eram esses instrumentos?
L
 As instalações que havia lá? Havia, se não me engano, treze, treze tornos que foram oferecidos, oferecidos por uma indústria de São Paulo, a Romi, ela ofereceu treze tornos à escola, tornos mecânicos. Havia uma guilhotina, havia tesouras mecânicas, havia equipamentos de solda. Então as aulas práticas eram realizadas em pequenos grupos assim de dez, doze alunos e cada aluno ficava num, numa máquina, num equipamento daqueles e era responsável por ele. Eh, fresadoras, enfim, todo o tipo de máquinas que usualmente são empregadas na indústria de verdade, por assim dizer, que aquilo era realmente uma mini-indústria.
D
 Você no, na escola primária você tinha necessidade de levar merenda, né, de levar algum material com você. Agora quando você ia pra a faculdade você levava alguma coisa, você precisava levar?
L
 Não. Não.
D
 Nem para escrever?
L
 Bom, para escrever eu levava, evidentemente, eu levava, subsistiu o regime de pasta. Eu nunca me desgarrei da pasta. Então eu levava uma pasta, uma pasta um pouquinho maior que a, que a de curso primário e de ginásio evidentemente, que eram mais coisas a levar, eram ...
D
 Que coisas?
L
 Apostilas. Livros não, livros não, porque livros eram preços proibitivos e de forma que não se levava, consultava os da biblioteca e dava por satisfeito. Eu levava apostila, levava folhas de, de fichário, por vezes eu usava fich... fichário, por vezes usava caderno, enfim, a coisa era assim variada. Eu usava régua de cálculo, levava instrumental todo de desenho, compasso, esquadro, eh, régua, entende?
D
 Agora, de que que se compunha mais a faculdade? Tinha laboratório que você me disse que tinha, né?
L
 Tinha ...
D
 E que mais, você descrevendo assim a escola?
L
 Tinha sala de recreação, tinha ... Descrevendo a, a faculdade em si, o todo?
D
 É. Exato.
L
 Então, era laboratórios, bibliotecas, sala de recreação onde se jogava pingue-pongue, jogava dama, xadrez, uma cantina, refeitório e não havia mais porque também estava ainda em fase de construção, agora, segundo eu soube, já está quase terminada, eu não alcancei ainda, quando terminei o curso ainda estava, havia muita coisa por fazer, muita obra ainda. Pelo que vi e pelo que se ouvia dizer à época deveria ser uma coisa espetacular em futuro e acredito que o seja.
D
 Você nunca mais foi lá?
L
 Não, não houve mais tempo. Já tive vontade de voltar lá, mas não houve tempo pra isso.
D
 Quando você terminou a faculdade houve algum cerimonial?
L
 Cerimonial?
D
 Sim.
L
 Sim. Houve aquele que havia pra todo mundo, não sei se ainda há, de colação de grau, coisa que eu acho uma coisa boba, mas é tradição, então ... Já houve quem me dissesse até que tradição é uma burrice que se propaga através dos tempos, não sei se é verdade ou não. Opinião de alguém.
D
 E como é que foi a colação de grau? De que que constou?
L
 A colação de grau? Maracanãzinho, todo mundo lá presente, e traje de gala por assim dizer, né, e coral da, da, da universidade federal, cantou al... al... algumas músicas que agora não me recordo sinceramente quais foram, mas cantaram algumas músicas. Falou o reitor, falou o diretor da escola, falaram os oradores de turma. Bom, a cerimônia em si era isso e aquela chamada nominal de cada um, a gente levantar e responder, as famílias lá presentes e a aplaudirem cada um que era chamado, comemorando o término do curso.
D
 Roupa de gala que você chama é o quê?
L
 Sim, não é propriamente roupa de gala, força de expressão, mas terno, gravata.
D
 Não havia uma roupa especial não?
L
 Não, não havia roupa especial. Não era, não era como ainda se usa em algumas faculdades, eh, aquela, não me recordo agora que nome se dá àquilo. Uma capa, não é, não se usava aquilo. Felizmente, felizmente não se usava aquilo, certo?
D
 E assim de caráter religioso, não houve nada?
L
 Houve, houve solenidade de caráter religioso. Também tinha uma pregação de um padre, de um rabino e de um pastor protestante.
D
 Por que isso? Por que três?
L
 Naturalmente pra que satisfizesse a todas as crenças, todos aqueles que ali estavam.
D
 Você acha isso importante?
L
 É importante até o ponto em que se considera a cerimônia importante em si, porque cada um pode dar aquela, a importância que, que julgar. Acredito até que houvesse pessoas que estavam ali contrariadíssimas. Eu por exemplo particularmente não estava muito satisfeito ali, que havia perdido minha mãe recentemente. Há, há cinco meses, então não estava satisfeito porque de certo que eu gostaria que ela estivesse ali, que pudesse ver ou, ou então que pudesse estar comigo, não tanto ali, mas comigo, saber da, da, da minha conclusão de curso. Seria mais uma comemoração íntima não uma comemoração cole... coletiva. Aquilo ali no momento era uma cerimônia imposta, então nós teríamos que estar ali e acabou. Mas o mais importante seria em casa, com ela, a satisfação recíproca.
D
 Mas eu digo assim do ponto de vista religioso, você acha importante que ti... houvesse estes três tipos de, de discurso assim, de se atender a todas as crenças, que você falou (sup./inint.)
L
 (sup.) Acho importante, uma vez que existe a cerimônia, então acho importante que exista também uma satisfação de, de cultos, porque se a pessoa encara aquilo com, com seriedade, se a pessoa encara aquilo como uma cerimônia realmente importante, então ela também deve encarar a, a importância religiosa do, do fato. Porque de forma alguma a pessoa pode prescindir de uma crença. Na minha opinião ninguém pode viver ser ter uma crença, seja ela qual for.
D
 Qual é a, a mais comum, a mais geral aqui pra nós, assim no Brasil? Qual é a mais geral assim de ser encontrada, qual é a crença, a religião?
L
 Mais geral? Crença?
D
 Sim. No Brasil, né? No Brasil, claro.
L
 É difícil de dizer atualmente.
D
 Por quê?
L
 Porque a confusão é grande demais, eu acho.
D
 Então explica essa confusão.
L
 Eh, a igreja tornou-se anacrônica, se perdeu e, vamos dizer, eh, muita, muitas pessoas que diziam-se católicas, eh, atualmente vão a centros de, de umbanda ou, ou que outros centros seja, descambando pra outras, outras crenças que no fundo, no fundo eu acho que todas elas são boas, desde que conduzam a um, a um, a um bom objetivo, a um bom ideal, certo? Claro que todas elas procuram pregar a, a fraternidade, a, o bem, em si. Agora no Brasil é muito difícil dizer qual é a crença geral (sup.)
D
 (sup.) Qual é a sua ... Você diz que é importante que todo mundo tenha, então você tem uma.
L
 Bem, eu tenho uma crença, mas essa crença não é católica, não é espírita, eu me considero um agnóstico, eu não sou, não sou espírita, não sou católico, não sou nada, eh, eu sou eu, certo? Agora eu creio evidentemente num, num, num ente superior, não é, num, em algo que governe tudo isso, porque eu acho que é um absurdo se pensar que a gente vive trinta, sessenta, oitenta anos a troco de nada. No fim, morrer e tudo isso acabar por água abaixo. Então, então qual é a diferença entre nós e os bichos? Seria então apenas o raciocínio, certo? Seria apenas o raciocínio então.
D
 Por exemplo, sua mãe, ela funcionava também assim como você, em, em ...
L
 Minha mãe era espírita (sup.)
D
 (sup.) Então como era? (sup.)
L
 (sup.) Kardecista, ela acreditava, embora não freqüentasse qualquer espécie de centro, mas ela acreditava firmemente no espiritismo e, enfim, procurava dentro de, de, de, de certos limites seguir a doutrina espírita. Meu pai não, meu pai era católico. Então talvez por isso mesmo eu tenha tido essa liberdade de pensamento, que ninguém nunca me incutiu coisa nenhuma, pensasse o que eu bem pensasse, o importante era eu agir corretamente dentro dos padrões vigentes na época, claro, porque tudo, esse, esse, esse correto ou não correto depende dos padrões da, da época, é claro.
D
 E ser católico pra ele era o quê?
L
 Era ir, ir a uma missa de quando em vez (sup.)
D
 (sup.) E que mais?
L
 Era não desejar mal a ninguém, não fazer mal a ninguém, acreditar numa entidade, no caso em Deus, acreditava, acreditava em, em Cristo, enfim, em tudo que o catolicismo de um modo geral procura fazer com que os adeptos creiam. Ele acreditava.
D
 Mas ele ia simplesmente à missa ou ele fazia outras coisas mais também que a doutrina católica prega?
L
 Ah, ia de quando em vez, não era metodicamente todo domingo ou todo, todo mês não, não havia assim uma, uma obrigatoriedade, quer dizer, era, era, era católico, quer dizer, à moda dele, não é isso?
D
 Agora o protótipo de um católico, na sua opinião, age como? No ponto de vista, sob o ponto de vista religioso, é claro.
L
 Na minha opinião ou, ou segundo os conceitos da igreja?
D
 Segundo os conceitos da igreja.
L
 É diferente.
D
 Segundo os conceitos da igreja. Exatamente.
L
 Acho que segundo os conceitos da igreja é aquele sujeito que vai fazer sua comunhão, depois ... Não, antes disso ele é batizado, tem que ser batizado necessariamente, depois ele vai, eh, faz sua comunhão, depois ele freqüenta constantemente a igreja, ele, ele se, eh, penitencia, ele se confessa, enfim uma série de coisas que eu acho que não, não fazem sentido, porque o importante em si não é a demonstração externa do que o sujeito, eh, eh, faz. Antes pelo contrário, é o que, é o que ele pensa, é o que ele tem em si, na mente dele, porque não adianta o sujeito chegar e dizer pra, pra um padre que fez isso, aquilo, aquilo, aquilo e que está arrependido, então o padre vai, concede o perdão. Não é o padre que perdoa, é claro, mas ele, por intermédio dele concede o perdão e tal. Aí o indivíduo reza tantas, tantos, eh, pa... padres-nossos, aves-maria, lá o que o padre achar, a penitência dele. Eu não estou de acordo com isso, eu acho que não, o sujeito errou, ele tem de ter a consciência de que errou e acabou-se. Ele não precisa dizer pra ninguém que errou, ele sabe que errou, ele tem consciência, ele é bastante, deve ser, ele deve ser bastante pra saber que errou e pra procurar não errar novamente, errar no sentido de prejudicar quem quer que seja, porque o erro principal, seja qual for a, a religião, na minha opinião, é o sujeito praticar o mal, ou, ou de alguma maneira ainda que indiretamente prejudicar uma pessoa.
D
 A religião em si é necessária à vida comunitária?
L
 Sim, sim, porque bem poucas pessoas, eh, eh, podem manter uma, uma norma de conduta, manter uma, uma, uma linha de, de ação independente de qualquer religião, independente de qualquer princípio, porque a relião (sic), a religião em si ela é também importante porque incute no indivíduo aquela, aquele respeito, aquela, aquele temor a alguma coisa. Então o sujeito não faz, não pratica o mal, não faz uma, uma coisa porque diz: não, se eu fizer isso, depois eu vou ter que pagar, eu vou passar o meu pedaço. O espírita não, o espírita diz: não, eu vou ter que reencarnar. Enfim, no fundo, no fundo, a religião está buscando é levar o indivíduo a proceder de uma determinada forma que não venha a prejudicar outro.
D
 Nas viagens que você fez, você, eh, freqüentou lugares de culto religioso, não é? Visitou, conheceu lugares de culto, eh, de culto religioso, onde se praticava cultos religiosos.
L
 Hum.
D
 Eh, quais os aspectos marcantes desses lugares? Por exemplo, que que impressionou você em Ouro Preto?
L
 Ouro Preto?
D
 Ham, ham. Você foi lá assim numa data qualquer? (sup.)
L
 (sup.) A arte, a, a, vamos dizer, o artesanato de uma época, de uma época em que não era de se esperar que no interior do Brasil houvesse uma, uma, uma obra daquele vulto, uma obra daquela importância.
D
 Que obra? (sup.)
L
 (sup.) E que pudesse ser conservada até hoje. As igrejas, ah, os interiores das igrejas, as esculturas.
D
 O interior da igreja, você saberia descrever como é o interior de uma igreja?
L
 Seria bastante difícil descrever.
D
 Tenta pelo menos.
L
 Não há condições assim.
D
 E em Brasília?
L
 Bom, Brasília impressiona, Brasília causa um impacto. Inicialmente porque, como se sa... como se sabe e como se pensava, era uma, um povoado melhorado no interior. Mas não é, não é isso, é uma coisa espetacular, então causa aquele impacto. A gente chega pensando em encontrar uma, uma, uma meia dúzia de casas, encontrar o, o palácio do, do Planalto, né, no caso, encontrar umas, umas três construções a mais que apareciam constantemente na televisão, que a gente leva aquela idéia de que fosse uma propaganda, né, política e chega lá não encontra nada disso. É, o negócio é espetacular, entendeu? É uma coisa ...
D
 E em termos de igreja? Vocé visitou alguma igreja em Brasília?
L
 Visitei. A catedral de Brasília.
D
 Como é que é essa catedral? Essa você não sabe também (sup.)
L
 (sup.) É justamente o que tem de mais bonito na capital.
D
 E como é que ela é?
L
 A idéia do, do arquiteto no caso foi de lembrar mãos erguidas ao, aos céus, segurando uma hóstia, o teto em si seria a hóstia. E é uma coisa espetacular. Essa eu posso descrever que me impressionou assim por demais. Então são ... Ela é composta de colunas de concreto, eh, espaçadas, vamos dizer, de três metros, mais ou menos, e nesse espaçamento existe malhas de, de, de ferro ou de aço, no caso, colocados, eh, painéis de vidro nessas malhas, colocados painéis de vidro que recebem os reflexos durante a noite de um lago que circunda toda a igreja. Mas é uma coisa espetacular, eh, holofotes (sup.)
D
 (sup.) E há lugares assim pra (sup./inint.)
L
 (sup.) Holofotes incidem a luz sobre o lago. O lago então reflete sobre o, os vidros. E aquilo então dá uma idéia até de movimento. Porque a água se movimenta do, do lago, qualquer movimento mínimo que seja na água, ele se transmite a, aos vidros. Então dá aquela impressão assim de que há uma movimentação muito grande na ... Uma coisa espetacular. Isso externamente. Internamente também é outra, outra surpresa. É uma coisa muito simples, é uma construção simples assim em termos de ... Não há grandiosidade de, de, de quadros, de ... Ela é despida de, de baixos-relevos, de coisas assim de, de artesanato. São bancos individuais, banquinhos assim como fossem cubos, pequenos cubos, pra que as pessoas possam se sentar. Pende do teto uma, uma viga e, presos a essa viga, três anjos, enormes, não, não sei de que são feitos, eh, de que material é feito, mas como se tivessem pairando sobre o ambiente, com asas abertas pairando sobre o ambiente. Então é uma, uma impressão bastante agradável. E não traz assim aquele ambiente pesado da igreja, embora o ambiente pesado da igreja também seja agradável pra mim, no caso, especificamente.
D
 Defronte assim dos bancos não há nada? Um lugar onde fica, né, a pessoa que vai falar?
L
 Pessoas?
D
 Sim. Há um lugar pra que as pessoas se sentem, né? Há uns bancos que você falou, uns cubos.
L
 Sim.
D
 Mas só há isso?
L
 Ah, para a pessoa falar, se dirigir a quem estiver sentado? Há um palanque, uma região, um altar, acho que seria um, um altar, um pouco mais elevado do que o, o plano geral e com alto-falante. Com alto-falante. Com microfone, com microfone, em que o padre, no caso, se dirige aos presentes.
D
 Assim só rapidamente, que a fita está acabando, você se lembra assim quais são as, as cerimônias assim religiosas, por exemplo, da igreja católica, assim aquelas datas que normalmente são co... comemoradas assim com maior ênfase? Durante o ano. As festas religiosas.
L
 Datas?
D
 Sim, quais são essas festas? Não, a data específica não. Festas religiosas. Que festas religiosas?
L
 Aí não. Não, eu não entendi a pergunta.
D
 Quais são as festas que a igreja católica comemora?
L
 Quais são as festas? Eu acho que a festa máxima da, da, da igreja católica é o natal, no caso.
D
 E além disso, além do natal?
L
 Páscoa.
D
 Você já foi alguma vez à igreja durante a páscoa, pra saber aquelas cerimônias?
L
 Fui quando pequeno.
D
 Não se lembra?
L
 Não, não. Sinceramente não.
D
 Que outras festas?
L
 Fui também quando, ainda quando pequeno assistir à missa do galo, enfim outras solenidades.
D
 Quando a missa do galo? A missa do galo é quando, heim?
L
 Heim?
D
 Quando a missa do galo?
L
 Quando?
D
 É. Quando é que se celebra a missa do galo? Não é uma missa comum. Em que data?
L
 Sim, não é uma missa comum, claro.
D

  Em que data? Pode deixar.