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PROJETO NURC-RJ

DIÁLOGOS ENTRE DOIS INFORMANTES (D2)
Inquérito 147
Tema: Vida Social. Diversões. A cidade. O comércio.
Duração: 1h
Data do Registro: 10/04/73
Dados dos Informantes:
Locutor 1 (L1): sexo feminino, 25 anos, carioca, pai carioca, mãe paulista, formação universitária: Filosofia, área residencial: Zona Sul.
Locutor 2 (L2): sexo feminino, 25 anos, carioca, pais cariocas, formação universitária: Formação Bioquímica, área residencial: Zonas Sul e Suburbana.


Clique aqui e ouça a narração do texto 


L2: eh... você é carioca né?... quantos anos já... há quantos anos você mora no Rio?
L1: a vida inteira...
L2: nasceu aqui?
L1: nasci aqui...
L2: está ok... bom... e você eh... mora em Copacabana mesmo?
L1: não moro em Ipanema... mas queria te perguntar uma coisa... qual é a tua imagem você mora em Copacabana né? qual... qual a imagem que você faz de Ipanema?
L2: olha... eu...
L1: não é sobre o bairro não... eu quero saber como vivem as pessoas que moram lá...
L2: [
das pessoas... da vida ( )
L1: é... qual a imagem que você faz?
L2: olha... eu acho...
L1: pode ser franca... hein...
L2: está ok ((risos)) eu não vou malhar não... olha eu acho...
L1: não... mesmo se malhar...
L2: bom eh... está bom... eu acho ... pri/... primeiro lugar o bairro... acho um bairro espetacular... e acho que quem mora em Copacabana deseja à beça morar lá... bom... já estou entrando aqui no à be/ à... hein? agora e... quanto às pessoas que moram lá... eu tenho a impressão que não são diferentes das outras que moram noutro bairro... só QUE... em vista do local eh... das possibilidades e:... eh... e... do... do meio de... maior comunicação que parece que existe lá... diversão e tal... deixa assim elas mais à vontade mais... mais dadas... comunicativas isso... fazendo uma diferença entre as pessoas dos outros bairros né... agora... em relação ao pessoal que mora em Copacabana... eu sou bairrista hein sou bairrista... mas acho que... se comportam quase que da mesma maneira... só que... a evolução natural eh... transportar... a cidade se transportar sempre pra outro lugar outros... pra outros bairros né... quer dizer... bairros se transportam pra outros bairros... e que... dão mais condição de vida... de calma... tranqüilidade... e vai... vai por aí... é por aí... agora o pessoal é legal... comunicativo...
L1: sabe o que que eu acho... eu
L2: [
hã...
L1: morando em Ipanema... eu sou suspeita pra falar... mas ( ) sinto tanto... eu não posso deixar de pensar em outras pessoas que ( ) Ipanema tem um clima... em termo... você disse que ( ) que as pessoas são todas iguais né... uma que não são... mas Ipanema tem um clima... que predispõe sabe... que dá possibilidade à pessoa de se abrir muito mais entende... você pode sair vestida de palhaço de lá... que ninguém vai olhar pra você...
L2: justamente é isso... é liberdade... você pode ser uma artista famosa... passa pela rua tranqüilamente...
L1: ( ) às vezes... ninguém te incomoda... se você sai assim ( )
L2: [
é... hum nem liga...
L1: ninguém está nem querendo saber como é que você está... ninguém nem presta atenção em você... porque aquilo ali ( )
L2: [
é normal...
L1: assim tão boa de cada um viver a sua própria vida... quer dizer... logicamente tem suas desonrosas exceções...
L2: é claro... ( )
L1: mas já está todo mundo naquele espírito de cada um viver sua vida... levar sua vida sem se preocupar com a do vizinho... que ninguém está se importando se você sai de vermelho com verde... amarelo... roxo... ninguém está querendo saber a não ser... agora isso também traz um problema de solidão... né... se você fizer uma análise da... solidão...
L2: é justamente porque... uma vez uma... uma amiga falou pra mim... "engraçado aqui"... ela não é brasileira... então ela falou assim... ela é equatoriana... ela disse assim... "engraçado no Rio... principalmente Copacabana Ipanema Leblon... a gente anda cercado de gente à beça... mas ninguém olha pra gente... ninguém..."... e sozi/... você parece ir sozinha... e você po/... como... ela dizia... "pôxa eu não tenho muito poder aquisitivo agora... mas eu posso andar de calça Lee durante um mês que ninguém vai olhar pra mim..."... vai per/... dizer se ela está ruça... rasgada ou eu que ando muito bem alinhado... muito bem arrumado e ninguém repara... no mesmo bar em que se senta uma... uma... não digo um ... restaurante de luxo entende... mas um bar... um bar assim da moda em que senta um... um deputado... senta muito bem arrumado e tal... do lado dele senta um rapaz hippie... uma moça muito tranqüila mesmo e não... não se sente choque...
L1: mas... ô B.... sabe o que que é... isso é problema de grande cidade particularmente de São Paulo... de Rio de Janeiro no Brasil sabe... você quando você vai ao Paraná... você não sente tanto... é São Paulo e Rio de Janeiro... é uma coisa assim... é uma constatação tão clara que se pode fazer... sabe é aquela massificação... o indivíduo ele se sente massificado... daí ( ) uma neurose crescente... que você hoje em dia você... a gente sabe que morar no Rio e São Paulo você tem que necessariamente ter um grau de neurose qualquer...
L2: é...
L1: ( ) você se sente tão massificado e ao mesmo tempo você quer valorizar o seu eu... mas você não CONSEGUE... entende você não consegue... porque as coisas te abafam... é a comunicação eh... eh... mil coisas te abafam entende... você não consegue se demonstrar como indivíduo...
L2: é claro...
L1: então é aí que eu acho que a nossa solidão vira neurose... Ipanema é muito bom... maravilhoso... você pode andar como você quer... como você não quer... como você quer... mas ao mesmo tempo a pessoa... eu sinto muita alienação... entende... os contatos são superficiais... entende... não sei se decorrente de Ipanema em si... ou já Ipanema é decorrente do Rio de Janeiro ou não sei... problemas de pessoas... de épocas... mas você sente é uma alienação incrível entende...
L2: é... me parece que todos querem esse lugar...
L1: [
então... as pessoas não querem se envolver entende... você... você pode ver uma turma de... pessoal assim de:... típico de Ipanema por exemplo... muito difícil se o indivíduo não tem assim uma formação mais... eh:... humanista... mais assim... é muito difícil dependendo da natureza da pessoa também né... mas de um modo geral é difícil entende... os relacionamentos são muito superficiais... então a gente não se satisfaz... você está sempre insatisfeito... pode passar o dia inteiro junto...
L2: eu sei ( )
L1: [
passa por mil transações... ir a mil boates gastar quanto você quiser e ao mesmo tempo ( ) numa relva com pessoas realmente... sabem ( ) porque Ipanema não é ( ) também né...
L2: justamente... pois é... é esse o o ângulo a... também não é porque a comunicação justamente... comunicação é necessário... isso não há dúvida... é necessária... mas não
L1: [
a gente faz ela ser superficial...
L2: ela é superficial é... ela não cai no:... no:... no:... no eu profundo entre duas pessoas né? eh... conseguem falar assim tal e coisa... mas não transmitir assim sinceramente como um... como irmão chega pra uma irmã e conta um negócio assim profundo... então ela sente... o outro escuta... aceita acha muito bom... então analisa aquilo sob todos os pontos de vistas eh:... freudianos e:... etc... mas sai dali "ah fulano não é... já não liga mais..." e está... está na dele... cada um na deles...
L1: você falou em relacionamento com irmão... você sabe que eu sinto isso... justamente porque não... não aconte/ isso comigo? eu tenho uma família tão unida... nós somos quatro... são dois rapazes e duas moças... então eu sinto isso demais porque no seio da minha própria família não acontece... então eu não posso admitir que aconteça fora...
L2: hum-hum...
L1: eu tenho meus irmãos rapazes que o que eu estiver contando pra você... você é minha grande amiga... eu conto pra eles até as minhas... vamos dizer... as minhas mais íntimas experiências... nós discutimos...tá vendo que você fez um ( )... porque foi muito inteligente... se alguns têm essa mesma tendência universitária mesmo... podiam ser diferentes... mas ( ) sabe? todo mundo? está certo... um é... vai se formar engenheiro esse ano... tem uma... tendência assim mais objetiva... mais prática...
L2: mais materialista...
L1: o outro já deu pra uma ( ) humanista... mas é um garoto assim... é mais novo do que eu... mas tem uma compreensão... uma visão fora do comum...
L2: hum-hum...
L1: então lá na minha casa é assim... se ( ) todo mundo decide junto... é uma coisa tão... tão diferenciada dos dias de hoje que a gente... nós temos tantos amigos desintegrados... a gente só tem a... eu não sei porque cargas d'água... mas nós só temos amigos assim de família desestruturada... essas pessoas encontram assim uma coisa que a gente pen/... pensava que é inexistente na face da terra ( ) pessoas adultas
L2: [
( )
L1: podem se entender tão bem hoje em dia dentro de um apartamento relativamente... quer dizer... um apartamento que não é muito grande entende... mas é uma coisa assim tão... é quase palpável...
L2: é humana... ( )
L1: sabe... o sentimento ali é quase palpável... a interação entre as pessoas lá é quase palpável... então quando eu ( ) uma coisa muito... eh:... rara... então quando eu saio de casa pra me comunicar... pra me relacionar com outras pessoas e que: isso
L2: [
sente o choque né...
L1: não existe... eu sinto uma diferença... tem um choque... uma diferença... uma depressão... um vazio... sabe uma coisa incrível mesmo... mas incrível... por isso é que não é com muitas pessoas que eu me dou entende... porque... sabe eu não gosto daquele relacionamento superficial... a gente sempre se envolve... porque se você não se envolve você não...
L2: [
claro... porque...
L1: aproveita a pessoa... você não entende a pessoa
L2: ( ) não sente a... não sabe o que ela é em si... é natural... claro... quando a gente busca uma amizade é pra sentir saber o que ela é ( )
L1: e em matéria assim de diversão o que você acha assim do Rio de Janeiro pra você sair assim de casa... pra onde vamos... o que fa/... fazer no sábado... domingo... fim de semana... que que você acha da nossa cidade?
L2: olha... tem muita coisa boa... mas eu não sei se é porque já é tanto tempo... já está virando um saco... sabe... eu já não sei nem pra onde eu vou mais... vira e mexe
L1: [
( )
L2: eu vou pro mesmo lugar... você tem muito lugar pra ir entendeu?
L1: que lugar você gosta ir geralmente?
L2: é bar... restaurante... teatro... cinema... de noite... praia eu sei lá... de vez em quando piscina... aí... algum clube... algum conhecido...
L1: você é sócia de algum clube?
L2: [
sou...
L1: de qual?
L2: é o... Monte Sinai sabe?
L1: sei...
L2: na Tijuca? mas eu quase não... eu vou quando eu vou...
L1: está correndo... acho que está correndo uma coisa muito interessante aqui... você é de família de... israelita?
L2: sou...
L1: você vê que coisa bacana... né... eu sou descendente direta de árabe por parte de pai e parte de mãe...
L2: ((risos))
L1: você vê que o nosso pessoal ( ) lá fora... né... e a gente ( )
L2: [
é mesmo é... e aqui a gente ( )
L1: maior integração em tudo...
L2: engraçado né?
L1: você vê que coisa né? ((risos)) bom eu... o que é de minha parte... nunca... nem... com minha família toda... que inclusive a minha irmã... já teve um noivo israelita... de nossa parte não tem o menor preconceito de nada...
L2: eu também não tenho e sinto... aliás os dois primeiros namorados que eu tive eram árabes...
L1: ah... não brinca é mesmo?
L2: a gente se conheceu na faculdade... engraçado ( )
L1: [
e seus pais... você mora com seus pais?
L2: não... moro sozinha... quer dizer... com o meu marido... por enquanto...
L1: ah... eu não sabia que você era casada...
L2: ah... não é? é que eu não estou usando aliança hoje... eu já estou ficando aberta né? mas aliás só fazemos questão ( ) né... ele viaja... fica uma semana aqui uma semana lá... então pois é... então nesse ponto ( ) justamente... quando ele vem... então a gente procura "puxa... vamos sair vamos a algum lugar nos divertir"... mas parte da mesma é cinema depois é restaurante... peça... o negócio está tão caro que não dá mais... né? e...
L1: vocês costumam sair em grupos?
L2: costumávamos... agora cortamos completamente porque justamente por causa dessa superficialidade...
L1: mas você não acha que o problema... o problema está mais eh... ( ) o problema cai mais... pra companheirismo... pra esse lado assim? justamen/... precisamente pra lugar completamente falando... quer dizer... porque se você vai a uma praia com pessoas que te agradam... você está ultra bem... ( ) integrado ótimo...
L2: claro...
L1: não é muito o lugar que importa... você está com teu marido... você está ( ) bom... você não vai ficar entediada... vocês vão ao cinema... você não vai ser ( ) viaja? quer dizer é
L2: [
não...
L1: um problema de comunicação muito maior aí do que um problema concreto... do lugar que se vai...
L2: hum-hum...
L1: isso aí tem que examinar bem... porque de outra maneira quando ocorrem problemas...
L2: ((risos))
L1: mas o problema aí não é tanto sabe? não... tem mesmo...
L2: [
( )
L1: hoje em dia você vai a boate por exemplo... aqui no Rio... você é casada né... eu sou solteira... então acho que eu... provavelmente devo ir mais curtir mais a boate que você...
L2: ( ) curte muito mais de sa/... solteira do que casada...
L1: antigamente não... antigamente eu precisava mais sabe... hoje em dia eu só vou à boate mesmo porque eu gosto muito de dançar e é mais uma vontade que oportunidade pra me extravasar... sabe... eu penso em boate ( ) boate... Rio de Janeiro... pra mim não... o LUGAR que EU tenho tendência de espírito pra ficar... não é... mas eu tinha um gosto eclético... sabe... tanto gosto de ficar no... Parque da Cidade ou numa praia deserta... como eu tenho que
L2: [
( ) extravasar...
L1: de vez em quando tenho que dançar muito... beber muito uísque pra me extravasar...
L2: é verdade... eh...
L1: ( ) Ipanema minha filha...
L2: [
que coisa né? precisa claro... tem mais coisa entre... a semana toda trabalhando... sábado de manhã se não vai à praia se chover... quatro paredes... quer dizer... sai de um escritório... de um laboratório... seja lá o que for pra dentro de casa... outra vez enclausurada... então a gente precisa... de se expandir... não tem...
L1: [
é o problema dessas pessoas da cidade grande... eu acho que é problema fundamental de solidão... eu acho que ainda é...
L2: é simples...
L1: ( ) lugar comum? mas eu acho que a... a verdade fundamental é que o problema das pessoas de São Paulo... Rio de Janeiro... sei lá... Belo Horizonte talvez... mas nessas cidades grandes o problema
L2: [
( )
L1: fundamental continua sendo o da solidão...
L2: é verdade...
L1: e por incrível que pareça... por mais comunicação eh... externa mais aparente... menos comunicação eh:... de indivíduo pra indivíduo...
L2: [
isso daí é... um... é verdade... e depois o que separa muito porque a... é o seguinte é a... mesma classe com diferença de nível social diferente quero lhe explicar o seguinte... quer dizer... você viver vamos dizer... Ipanema... então há um status de sociedade... mas muitas pessoas vivem lá e não têm o mesmo nível econômico entendeu? mes/... então se vira um bocado pra poder... ficar...
L1: [
mas se bem que ( ) de Ipanema ( )
L2: [
não não é só Ipanema... Copacabana... não...
L1: ( ) Ipanema... acho que o problema que tem em Ipanema é problemas que menos existem em termos sabe...
L2: eu sei... mas eh:... vamos dizer quando ( )
L1: [
( ) classe média alta né?
L2: é... mas eu que... mas justamente é isso... já cai nesse problema a classe média alta... ela está doida pra botar um pé na classe... na classe rica... e:... então...
L1: esta classe é a pior que existe...
L2: é a pior que existe... é a pior... quer dizer... então... por exemplo... se você se dá com alguém que está feliz... contente... com a classe média alta... e... você... não está... está naquela de querer pisar na classe rica... então há choque... não consegue... eu justamente por isso que eu ia dizer pra você porque que eu não me dou com muitas pessoas... entendeu... tinha um grupo de amigos... então deixei de me dar e isso não quer dizer que eu... sou muito contente com a minha classe média não... eu quero...
L1: [
não entendi... você teve choque nesse sentido das pessoas... achou que as pessoas te menosprezaram tanto assim...
L2: [
tive tive porque... não não menosprezavam... elas queriam... chegar... é... elas queriam chegar igual... entendeu e quando estavam igual queriam subir muito mais... por exemplo eh:... eu me dava com um gru/... de vez em quando ( )
L1: esse grupo seu era do seu clube... era do seu pessoal...
L2: [
é... do meu clube da... amigos de infância e tudo mais... mesma soci/... mesma posição social eh... econômica eh... como é que se diz eh... intelectual... mas acontece que se a gente melhora um pouco... entendeu... eles já sentem e não querem mais... que acha que não consegue acompanhar...
L1: mas ô... só um esclarecimento... era ( ) dentro da colônia israelita essa situação? agora você sabe que isso é um fenô/... fenômeno não... mas isso é um ( )
L2: é normal ( ) mal ou bem...
L1: [
( ) colônias né? você sabe que ( )
L2: é justamente o que me acontece é que o nosso relacionamento com pessoas que não são da família...
L1: mas você devia procurar então... se você é uma pessoa tão aberta... como que eu acho que você... procura ser pelo menos... você devia procurar se relacionar então com pessoas fora da colônia israelita...
L2: é...é o que já parece que está acontecendo agora...
L1: você não faz questão não?
L2: não...
L1: seu marido faz essa questão?
L2: [
não não não... pelo contrário...
L1: porque o que eu acho que isso não pode existir ( )
L2: existe ( )
L1: não existe mais... de colônia... não pode né?
L2: [
é... justamente por isso é que a gente procura... é...
L1: [
( ) procurar pessoas ( ) afinidade em primeiro lugar né?
L2: principalmente...
L1: aí vocês não vão sentir tanto vazio nos lugares... quer dizer... vocês vão ter muito mais interação com as pessoas...
L2: hum-hum... claro... é o que eu sinto... eu... umas amigas que eu tenho que não são israelitas sabe eh... a maioria é católica mesmo... me dou muito bem com elas... e as outras nada... nem se consegue...
L1: é... nós lá em casa já ( ) há muito... há muitos anos... mas há muitos anos de colônia sabe...
L2: não dá... já era...
L1: [
graças a Deus o Rio de Janeiro não tem essa colônia árabe... em São Paulo essa colônia árabe é fortíssima... e a família toda da minha mãe é de São Paulo... então... quando eu vou a São Paulo ocorre... ocorrem coisas engraçadíssimas... porque eu não sou desse jeito que eu sou... contente... eu me visto do jeito que eu SINTO que eu gosto de me vestir... vestido é curto... biquini é bem biquini... mas... é de acordo com o meio que eu vivo e tal...
L2: claro é natural...
L1: então chego eu lá em São Paulo... a minha mãe tem duzentas irmãs lá em São Paulo... então chego lá... vou ao clube... vou ao ( ) conheço gente... conheço rapaz etc... eu geralmente saio de lá falada né...
L2: ah...
L1: [
minha mãe ((risos)) porque eu... e eu saio de lá não só eh:... cochichada vamos dizer assim... como também triste... porque eu acho que a coisa mais triste do mundo é malícia na cabeça de pessoas né?
L2: é claro né...
L1: isso é uma coisa que me entristece terrivelmente... eu fico deprimida quando eu vejo uma pessoa maliciar a outra...
L2: [
eu também ( )
L1: primeiro que eu acho que ninguém tem nada a ver com a família
L2: [
é claro...
L1: da outra... segundo que eu acho... falta de tempo... envenenamento da mente e mil coisas que você está maliciando sobre a vida dos outros
L2: [
puxa ( )
L1: porque eu tenho valores que fulano x não tem... então eu posso viver a vida que eu quero...
L2: é claro...
L1: então... eu em São Paulo sou uma catástrofe né... porque lá o pessoal de um modo geral é... é muito conservador... então a família...
L1: é quase mineira
L2: a... a tradicional família árabe... então minha filha...já muito mais ainda... muito mais... é verdade...
L1: [
ah... precisa ver gente de muito DINHEIRO né... aquele pessoAL ir pra aquele... sabe? ir pra aquela festa com muita jóia... aquela coisa... aquela ostentação toda... e chego eu e meus badulaques... não uso jóia em hipótese alguma... talvez seja psicológico... não sei... duas coisas...
L2: [
eu também não gosto...
L1: que eu não consigo botar... esmalte em unha... desde que eu entrei pra Faculdade de Filosofia... não sei... problema de estrutura psicológica... ou mudança... o esmalte em unha e jóia...
L2: hum...
L1: não consigo mais pôr... quer dizer vou a... a manicure bota esmalte assim clarinho... base... faço a unha mais ou menos né... de vez em quando... de duas em duas semanas...
L2: [
( )
L1: porque também não suporto ficar sentada na cadeira da manicure... então... eu faço pra manter aquela higiene da unha mais ou menos...
L2: [
é claro né...
L1: eu trabalho... a gente lida com o público... tem que manter uma certa aparência... né se não pega mal...
L2: [
tem que... se não já viu né?
L1: então: o que acontece é isso... não consigo mais usar jóia... uma coisa assim que... sabe... que eu ganhei uma pulseira maravilhosa do meu pai... ele fica ofendidíssimo porque eu não uso né... eu me sinto mal... parece que estou com uma coisa assim que... não sei( ) muito tempo também me... me incomoda...
L2: [
sobressaindo demais né?... engraçado talvez... se a pessoa já... precisa de ter uma... parece que vem de família ou então de formação... não sei tem crianças... pequenininhas... que gostam de joiazinha... de não sei quê...
L1: [
não... mas eu era...
L2: não sei que lá... eu nunca vi...
L1: [
um balangandã... eu era uma árvore de Natal quando eu era pequena... sabe que minha avó me chamava de cigana né?
L2: [
porque você usava muito...
L1: porque eu punha os badulaques minha filha... eu ia pras reuniões da minhas ti/... das minhas tias em São Paulo... pegava jóias... pulseiras e ( ) colar... quer dizer... eu tinha um prazer... o prazer não era estético naquela época... era um prazer incrível... eh:... era um prazer quase erótico... se eu posso dizer assim... me olhar no espelho e me ver toda cheia de badulaques... sabe... desde aquela época que ( ) confusão psicológica...
L2: [
não já eh... engraçado... olha... entende... que aí... não sei... olha... é uma coincidência... sabe... que desde pequena eu também era assim... gostava de me fantasiar de:... de odalisca...
L1: ah: era um barato aquela odalisca...
L2: [
ai... aquelas... aqueles trajes finos e coloca colares aqui e encher os pés e as mãos e outras coisas... até hoje... até hoje...
L1: ah... era ( ) um barato... bem bem bem transparente né... aquele negócio preso aque/ cheio de ( ) prateada ( )
L2: [
adorava... era o meu sonho... era um sonho... você sabe que era o meu sonho... eu nunca... minha mãe nunca fez uma fantasia de odalisca pra mim... fez de tudo... né... bailarina e de outros bichos também... até hoje... eu ainda vou me realizar... né... ainda vou no Monte Líbano de odalisca transparente...
L1: ô B.... sabe que que é isso? isso aqui é porque a gente muda ( ) quando é criança assim calcada na... na... no desenvolver da nossa fantasia... eu sou professora primária e lido com crianças
L2: [
hum...
L1: de cinco anos e meio... seis anos... então como eu fui uma criança muito reprimida na escola... estudei em colégio de freira... aqui nesse colégio tradicionalíssimo... ( ) Sion ( ) mil coisas... então é sempre muito reprimida... eu mostrava um desenho que eu achava lindo... desenhava mal paca... mas achava lindo... porque era uma expressão do meu interior... achava mara/... qual é a criança que não acha o desenho uma obra de arte?
L2: hum-hum...
L1: e é... então eu mostrava pra freira... a freira... a freira dizia assim... "horrível""... ela dizia na minha cara que o desenho estava feio...
L2: pronto... traumatizava...
L1: eu ficava frustrada... aquilo ali me bloqueou pra sempre no terreno das artes plásticas...
L2: ah é é? ((risos))
L1: não é brincadeira... é engraçado mas é verdade... deixa pra lá então meus alunas... meus alunos... não... ô meus alunos...
L2: [
((risos)) ( ) isso aqui é agressão...
L1: você não sabe... eles fazem um tracinho assim na folha... teatro... prêmio Moliére... precisa ver...
L2: [
academia ( )
L1: maraVIlha... prendo lá na... na sala... maraVIlha... "PARECE ATÉ QUE ENTROU NUMA NUMA ESCOLINHA DE ARTE... MEU DEUS... MARAVILHOSO"... eles minha filha... Eles... nem Rembrant se sentia assim... nem Rembrant se sentia assim
L2: está certo é isso mesmo...
L1: eles pareciam verdadeiros Picassos na época... sabe coitado do Picasso ( ) você tem verdadeiros artistas... tem que ser... esse lado da fantasia é o lado que tem que ser desenvolvido porque é um lado existe... então como essa nossa geração foi muito reprimida na... nessa... nessa parte de... fantasia tinha...
L2: hum-hum...
L1: ( ) pobres adultos... com uma pobreza espiritual incrível... sabe... muitas vezes você não se desenvolve sozinha quando é pra desenvolver... você fica tão reprimida vê o mundo... cinzento... quando você pouco consegue exprimir... com seu corpo com sua fala... pouco consegue se exprimir...
L2: então você procura outra... hã-hã...
L1: [
e onde ficou aquela fantasia toda da infância porque não pôde ser posta pra fora?... aonde?... reprimida num canto de você... então o que não chegou um dia fica sempre em você...
L2: [
claro... então chega ( )
L1: você pode passar do presente pro futuro... está tudo no hoje... né... quer dizer... nada vai embora...
L2: [
hum-hum... então é aí que sente... faz uma:... questão de exteriorizar né...
L1: [
por isso que está muito ( ) na educação hoje que eu acho sabe? essa:... vamos desenvolver ( ) botar pra fora... botar... fazer expressão corporal... botar o corpo né pra trabalhar e pra expressar os sentimentos... eu acho isso maravilhoso...
L2: é... então... claro... se isso liga... descomplexa é ótimo... está aí... nesse ponto já entra outra coisa... se referindo a vestuário... de hoje em dia né... eh... hoje em dia se vê peque/... ganoínas pequenas eh... adolescentes assim abaixo de:... de quinze entre quinze e dezesseis e daí pra cima até nós de vinte e cinco né... usando eh:... fantasias etc... artesanato... puxa acho isso ótimo... quando você diz...
L1: [
mas é tudo estado de espírito né B. que eu até não falo... não falo na nossa idade não... ( ) que eu até na hora que eu sentir vontade de ( ) e hoje ( )... né... que eu vim discreta...
L2: [
não... bom... eu também até psicologicamente também... puxa é porque vocês ainda não viram como minha família é bem arrumada...
L1: ( ) eu vim discreta... agora isso aqui... mostra muito... não é ( ) pessoa... não é gratuito se você é uma pessoa cheia
L2: [
é... é claro...
L1: de badulaque não é absurdo né porque eu GOSto desse material
L2: [
não é...
L1: e uso ele...
L2: hum-hum...
L1: é que de alguma forma eu sinto necessidade de usar isso...
L2: [
que sente necessidade... eu tenho sentido uma necessidade irresistível... eu... se eu vejo ( ) eu compro...
L1: [
por quê não usa?
L1: eu uso...
L2: bom... acabei de tomar banho agora e não botei nada...
L1: [
( ) ah... bom...
L2: mas eu uso... e eu hoje comprei achei lindos porque eu comprei achei tão bonito e minha irmã usa também... muita... igualzinha a mim... então dei dois anéis pra ela ela ficou maravilhada "ah... como é que você... você vai ficar... tem se... sem os teus anéis?"... "não... eu dou pra você" e ela dá e troca comigo pulseirinha e coisas... milhões de coisas ( )
L1: [
quer dizer uma coisa incrível dessa as... as pessoas hoje em dia... isso... isso tem sido alvo de discu/... como as pessoas estão dando assim...
L2: valor... né...
L1: como as pessoas precisam se adornar né?
L2: é... isso é uma auto-satisfação...
L1: [
( ) elas precisam se adornar sabe? pra se gratificar acho um pouco ( )
L2: [
é... é verdade... eu acho que... deve ser isso...
L1: eu não entendo muito bem a compreensão psi/... psicológica disso... mas... talvez seja uma forma de gratificação...
L2: [
é uma forma... de gratificação a si própria pra se compensar... eh...
L1: [
que está faltando de outra coisa... de outro lado... então você procura se gratificar de outro lado também... né...
L2: é... às vezes a falta de uma palavra boa... você ( ) eu... pelo menos... me sinto realizada quando eu saio e compro um perfume caro... é... eu compro uma bolsa que meu marido vai me matar depois pelo preço... mas eu acho que aquilo me... me realiza... pode ser maluca hippie... de pena... de... pode ser o que for... fico maluca... talvez eu nem vá usar... mas só saber que eu TEnho... pronto... está aí... talvez eh:... é exteriorização quando eu era menor... minha mãe também não deixava usar tal coisa ou queria... vestir eu e minha irmã iguais e achava ( )... então agora faço questão de ser diferente... um dia eu sou bem assim... cética... fechada... ponho uma roupa bem:... bem tradicional... noutro dia eu ando parecendo uma... uma "hippa" louca como diz minha irmã... "parece uma hippie louca"... é... é verdade...
L1: mas isso é claro... um dia você é uma B. outro dia você é outra...
L2: isso são... são personalidades... é... não... isso... isso eu sei que eu tenho duas viu que eu já... fiz tratamento com psiquiatra... ele me falou...
L1: provavelmente deve ter várias ( )
L2: [
talvez várias... mas eu sou duas com/... completamente diferente... viu... uma hora eu sou uma... menininha e na outra hora eu sou... uma mulher completa...
L1: olha B. vou dizer uma coisa sabe isso é tão natural mas se isso não tivesse poderia não ser ( ) pode crer...
L2: não claro... tem que ser... pois é... aliás isso que eu...
L1: [
sabe ( ) se não for... é um ( )
L2: é... é normal...
L1: porque a gente tem tanta coisa que descarregar e não descarrega tanta coisa... que se você num dia pode descarregar você descarrega... outro diz você tem que se reprimir você reprime... então por isso a eh... a inconstante é ilógica... eu acho que não existe obrigatoriedade de lógica... ( ) ser lógica sabe... que as pessoas não têm oportunidade... de se desenvolverem no mundo moderno como podem... então a vida não pode ter lógica... eu não posso ganhar hoje ( ) no mês que vem... sabe... por isso... por por esse assunto eu quero te perguntar que que você acha do casamento? vindo desse assunto... não sei se você já me entendeu... claro que é tudo numa boa e natural...
L2: [
( ) olha... eu vou dizer... bom... sinceramente...
L1: você que é CASAda... você que é uma senhora...
L2: é... senhora... aliás... agora... não mas te respondendo com toda sinceridade... olha... o... casamen/... eu não sei se eu agi certo ou agi certo... agora...
L1: [
não ( ) você não fica vindo pela tangente não... me responde... teu marido não está aqui... ele não vai escutar...
L2: [
está bom... eu vou dizer... olha eu acho... está bom... ele não está escutando... né... olha... eu acho que casamento... é um negócio maravilhoso... viu... quanto...
L1: [
me fala sinceramente eu não estou querendo que você fale do seu casamento... você como mulher casada... eu quero que você me fale que que você acha do casamento em si como instituição...
L2: eu sei... olha... eu acho ótimo... eu acho que... muitas... eu acho que a maioria pelo menos eu e a maioria... ótimo...
L1: [
acha ótimo...
L2: e quando a mulher gosta... e ela tem necessidade de se libertar... de viver a vida dela... afastar o cordão do pai... da mãe... ser ela mesma... ela resolver... que o casamento liberta realmente... liberta a mulher...
L1: você acha o que liberta é o casamento como instituição B.?
L2: não... não como institui/... olha... sob duas formas...
L1: [
( ) você não acha que é um trampolim... imposto pela sociedade pra essa possível liberação que você está falando?
L2: pode ser que...
L1: não é o casamento em si... eu acho que liberta...
L2: certo... eu sei... pode ser que a... que a sociedade faça obrigatoriedade dele... pra servir de trampolim... está certo... mas... se você olhar sob o ponto de vista assim:... não de sociedade não de sociedade... como lei se... por exemplo... se você é obrigado a pagar uma tax/ uma taxa rodoviária pra você atravessar... atravessar de um estado pro outro... e ali acabou... acabou tudo esse... o guarda não vai te fazer nada... não vai te prender porque você está tranqüila... está quites... entendeu... então você faz o que você quer... eu acho que essa obrigatoriedade não... não influi não não influi em nada... se você acha que casou porque teve que mostrar pra sociedade que você é casada legal e teus pais viram...
L1: [
no início eu te perguntei se era o casamento como instituição legal que ( )
L2: [
eu acho que é uma instituição legal MESmo... e se não der certo... se tiver... quisera eu que tivesse divórcio... e apesar de ser bem casada... mas se não... não desse certo viu... claro... e agora... se não... se não desse... passasse para outras ótimo...
L1: [
o mal é que ainda tem gente que não pensa assim né...
L2: mas é válido como instituição... ou NÃO... de qualquer forma... você sente que: se você gosta de uma pessoa e a outra gosta dela... não precisa de: de papel nenhum para legalizar um amor... uma... um sentimento... mas se aquilo vai reforçar... melhor ajuda...
L1: mas reforçar por quê... por problema posterior de filhos?
L2: é talvez eu acho que isso ainda é:... é necessário... justamente( )
L1: você não acha que casamento não tem nada a ver com o sentimento do... das duas pessoas... o casamento... você pagar não sei quantos milhões pro padre... se casar e: ( ) religioso... aquela coisa...
L2: aquela POMpa toda...
L1: você não acha que isso é nada... em relação ao sentimento das duas pessoas...
L2: claro...
L1: isso deveria existir? ( )
L2: devia sim... devia devia é: mas... eh... como é um dogma tão grande se vem de TANtos anos atrás...
L1: mas isso não importa... as pessoas... mas justamente a gente não pode se acomodar a gente tem que gritar contra as coisas que a gente acha errado senão nada muda... sabe... se as pessoas se acomodam e não brigam por nada... eu vou dizer... eu sou uma pessoa intimamente... revoltada contra isso... porque... eu acho o seguinte... eu por exemplo já tive oportunidade assim umas três oportunidades assim concretíssimas de me casar... de repente você não tem oportunidade... e muito bem casada... sabe... assim... podia morar no exterior inclusive... e... materialmente falando muito bem casada... mas eu sou uma pessoa... não sei se feliz ou infelizmente... hoje em dia eu já não sei se FELIZ ou infelizmente... mas eu sou uma pessoa assim muito... com temperamento difícil... porque:... sabe... nada... não é porque a pessoa não me toca... então a pessoa... eu acho que me casar com uma pessoa... eu quero me casar... com o corpo da pessoa... quero me casar com o espírito da pessoa que eu quero ser companheira da pessoa... quero ser amante da pessoa... quero ser mulher... mulher inclui tudo isso né...
L2: não: uma coisa assim material né?
L1: então não é um aspecto só... né... e: sabe sempre que tem a mãe da gente ( ) a mãe da gente é aquela COIsa... né... a mãe da gente é aquela COIsa... quer sempre ver a gente casado... né... aquela coisa eterna... "mas você não gosta de ninGUÉM... minha filha... mas não é possível... não faz isso não... você não... você não pode ( ) homem perfeito..."
L2: [
não vai encontrar...
L1: sabe... é uma coisa incrível que chega a um ponto que você mesma começa a se indagar... se "pô... será que não sou eu que sou exigente demais...que... será que é alguma coisa errada em mim?"( )
L2: [
eu sei... então pelo modo de insistirem você não quer mais...
L1: [
que eu estou sendo muito exigente... será que eu vou acabar ficando sozinha por causa disso... porque no fundo todos nós temos um medo incrível de ficarmos sozinhos... né...
L2: ( )
L1: qualquer um tem horas que pra qualquer coisa pra uma ligação... por menos superfi/... por mais superficial que seja... solidão é bom até certo ponto... certas horas... então... eu:... como eu trabalho com muita coisa eu tenho muito contato com família porque eu também sou orientadora... pedagógica... então eu trato muito com mãe... eu vejo... o que EU vejo de hipocrisia entre os casais... o que EU vejo... eu trabalho num colégio de elite... sabe... quer dizer... considerado de elite porque as famílias são consideradas de elite porque têm dinheiro... a elite que eu falo... é sinônimo de ter dinheiro... para mim não é elite
L2: [
hum-hum...
L1: mas... naturalmente é... então... o que eu vejo de desagregação... sabe é uma coisa tão inCRÍvel... as crianças... TÃO neuróticas... está entendendo... é TANta... tanta... eu não posso eu não posso aceitar... sabe... eu tive uma formação... sabe... eu sou uma pessoa assim sou tão aberta... sabe que eu prefiro eu prefiro... olha... se eu vamos dizer que eu encontre um rapaz que eu goste né? que ganhe:... menos do que eu... não tem uma faculdade... como já aconteceu comigo... gostei de um rapaz uma vez... muitos anos aí... três anos... naturalmente não era um... a... o homem que minha mãe morria de amores... por ( ) né? que a mãe da gente sempre quer aquele homem que tenha faculDAde... isso... que tenha mais dinheiro que a GENte... que possa dar o ( ) que a gente não TEM...
L2: [
completo...
L1: mas acontece que os meus valores não são iguais os da minha mãe... então eu seria a mulher mais feliz do mundo ainda por cima... era uma pessoa com muitos problemas psicológicos ( ) porque a família dele pra variar tamBÉM... porque até hoje nunca me relacionei com uma pessoa que tivesse família... integrada... então a... eh... ele... quando era pequenininho... aos sete anos ele... viu os pais brigando uma vez... e o pai quis agredir a mãe e ele foi... sabe criança né? foi socorrer a mãe... o pai jogou ele pra fora... aí ele bateu com as costas na porta... foi horrível... você imagina uma cena dessa... uma criança indo pra cima do pai... o pai indo bater na mãe... disse que o pai era um cavalo de mal gênio... foi pra cima do pai... o pai empurrou ele bateu na porta... então ele nunca mais esqueceu essa cena é nítida lá na... no... então ele é uma pessoa griladíssima com casamento... tem que ser... não seri/... não seria normal se não fosse...
L2: claro...
L1: eu com uma família integrada sou... de ver os outros de serem desintegrados... faço idéia ele...
L2: hum-hum...
L1: então ele era uma pessoa tão BOA sabe... tão maravilhosa como gente e não tinha uma... uma faculdade... mas era uma pessoa muito inteligente... tinha "insights" rápidos entende...
L2: [
tinha vivência... né...
L1: era uma pessoa assim... intuitiva... agradável... bom eu sabia que eu tinha que trabalhar a vida inteira... né... ( ) estava consciente disso porque se eu me casar com o F. eu vou ter que trabalhar minha vida inTEIra... em que a... tem que arranjar mais alguma vida... nunca ia ter descan/... descansar nunca...
L2: ((risos)) ia ser o homem da casa...
L1: [
mas eu ia estar com que eu queria... entende... eu ia ajudá-lo... eu ia ter... então eu ia ter oportunidade de ajudar um outro ser humano a se desenvolver... porque eu ia dar tanto em cima dele pra ele fazer uma outra ( ) estudar junto com ele... eu poderia pagar o curso dele que ele não pode fazer atualmente... entende... então a gente ia crescer junto... eu acho maravilhoso as pessoas crescerem juntas sabe?
L2: isso que você não chegou a... a experimentar...
L1: não deu... não deu por problemas mil... problemas externos a nós... quer dizer... não sei né... basta ver que depois ( ) pode ser que dê... um dia né... minha filha a esperança é a última que morre... né...
L2: [
nunca se sabe... as pedras se encontram... claro...
L1: você nem me fale... né... a esperança... opa...
L2: você vê que isso... isso que não aconteceu... que não chegou a ser... acontecer com você... não se deu com você... se deu com uma... irmã que eu tenho... também casou com um rapaz que não tinha terminado o ginásio
L1: e a reação dos seus pais?
L2: foi aQUEla que você pode esperar... que deve ter sido a dos teus pais também...
L1: não não não... meus pais não... me respeitam...
L2: [
não? teus pais aceitaram?
L1: meu pai nunca me falou um a
L2: ah... não?
L1: ele nunca chegou pra mim e disse "I. eu não gostaria que você namorasse com o Frank"... sabe porque ele não podia fazer isso? porque ele sabia que ele o Frank podia ter essas... não ter dinheiro... não ter cultura... que é diferente de não ser
L2: [
mas pelo menos isso...
L1: inteligente... mas ele era um homem íntegro... ele sabia disso... então ele criou um bochicho contra o rapaz... e dizia "olha... ele é mentiroso...
L2: eh... ele não tem culpa disso...
L1: ele não presta... ele bebe... ele joga... não ( )... nada disso então ele não sabe respeitar seu sentimento"... embora eu conheça o meu pai só de olhar sei o que ele sente... eu sabia que não era o homem dos sonhos dele né... lógico... nem da minha mãe...
L2: [
mas... se você quisesse né...
L1: a minha mãe de vez em quando falava né... "olha filha... tens que trabaLHAR... hein... vais ter que trabaLHAR... não sei o quê que... está duro... tem certeza do que você quer minha filha? você é uma moça..."... a minha mãe "você é uma moça culta... minha filha"... cedo entrei na faculdade... então eu sempre fui muito bem na faculdade ( ) me chamou pra trabalhar na faculdade... então minha mãe era orgulhosíssima né... "como é que pode... minha filha... eu não posso entender uma coisa DESta"... sabe... sempre aquele grilo ela tinha... meu pai não... meu pai respeitava mais ( )
L2: ficava na dele...
L1: é...
L2: bom pois é e o caso da minha irmã ela... foi contra tudo e contra todos né... casou com ele... família aquela porcaria que você pode imaginar... pai aqui... a mãe lá... irmão mora num:... uns... num:... num país... a outra mora no outro país...
L1: [
uma desintegração total né?
L2: aquilo nem era família... aquilo ali era um pseudo... e em casa... na minha casa é assim... aquela integração né... ih... é uma coisa horrorosa... resultado...
L1: que às vezes é o MAL... né...
L2: bom... foi justamente... tan/... justamente tanta e todo mundo
L1: [
( )
L2: querendo fazer pelo outro mais do que podia... resultado... ela foi contra tudo...
L1: [
é... ( )
L2: contar... bom... e aliás aliás ela... é super né super eh... ou ela não precisa de ninguém... não quero nada ( ) suficiente...
L1: ela trabalha?
L2: não estava no último ano de odontologia...
L1: e ele não tinha curso universitário né?
L2: não... ele não tinha nem terminado o ginásio...
L1: eu acho tão bacana ( )
L2: [
olha... ela fez TUdo... ela fez tudo contra TUdo... casou com ele... ele está agora no terceiro ano de economia e já tem neném... ele está trabalhando... ela largou a faculdade porque não dava... vai voltar e
L1: [
pois é... B.
L2: está tudo naquela... ela vai...
L1: [
mas sabe o que eu acho... ( ) sentimentos pertinentes ao amor
L2: [
mas é... justamente o amor... o amor que une os dois... minha FIlha... eu nunca vi... eles até hoje vivem... contra TUdo... minha mãe não aparece muito lá... nem pai também não... eu vou porque eu aceito... aceito... achei ótimo o que ela fez... válido... se fosse comigo também faria a mesma coisa mas... eles vivem pra si...
L1: [
você deu a maior força pra ela ( )
L2: dei... fui... fui eu que... fui eu que fez o noivado...
L1: ah... você é uma irmã legal né?
L2: foi... eh... foi o negócio eh... taí... faz e acabou... chega... foi uma confusão danada...
L1: [
é... bota aí essa aliança ( ) é bota e acabou... é e os pais dele estavam na Europa... eles não estavam nem aQUI... aí alias... naquela época por causa desse namoro... os pais dele tentaram reconciliação porque eles estavam separados né... então foram pra Europa e tal...
L1: espera aí... espera aí... você fa/... você ( ) em detalhe importante... pais na Europa... quer dizer que ele eh...
L2: [
é eles tem...
L1: o nível social do rapaz não era tão diferente do de vocês...
L2: [
não... não... era o nível... claro mas...
L1: não... mas o nível inclusive era o nível social da família dele...
L2: ah... mas espera aí um instantinho... o... esse nível que tinha os pais dele... era devido a miLHÕES de coisas avessas completamente ao meu pai...
L1: bom... não importa... mas... mas...
L2: [
bom... mas com roubos isso e até trambiques tinham tinha... quer dizer hoje em dia hoje ia
L1: [
mas tinha... ia pra Europa... então tinha...
L2: hoje ia pra Europa... amanhã comia um pão com salsicha mas...
L1: sim... mas tinha...
L2: entendeu? dava resultado... também deram um azar tão grande que logo depois do casamento foi tudo por água abaixo... se separaram... o pai o que tinha perdeu... o que a mãe tinha perdeu e...
L1: hoje em dia os pais dele...
L2: foram cada um pro seu lado...
L1: não... mas não dão assistência nenhuma ao casal...
L2: NADA... aceitaram o casamento e ainda ficaram contenTÍssimos porque o filho entrou pra uma família... tradicional e tal com uma certa... condição social... MAS os pais dele só condição monetária só... social... aquela... aquele negócio entendeu eles não apareciam em sociedade porque não está é: já foi uma confusão daquelas... e hoje em dia né... vivem bem... não se dão... a sogra dela não se dá com ela... mas...
L1: você sabe B. que... mas não sei... se conhece aquele novo centro comercial lá da Visconde de Pirajá oitenta e seis?
L2: hum...
L1: você já conhece... já foi lá?
L2: logo no início da Visconde de Pirajá...
L1: em frente ( ) não tem aquele negócio... mas você entra...
L2: eu fui só uma vez agora essa semana... que eu vim da Bahia...
L1: é... você entra então aquele ambiente já te envolve né...
L2: é uma coisa né...
L1: entra no ar condicionado... cores... coisas maravilhosas... quer dizer...
L2: [
em tudo...
L1: o próprio ambiente... é um:... uma atração estética incrível aquele negócio... né... então você já se sente envolvida totalmente você tem mudança psicológica... você já se sente envolvida... é difícil alguém sair de lá sem comprar alguma coisa... é o lugar mais caro do Rio de Janeiro...
L2: e não sai... eu não saio de lá sem um pacote... é...
L1: [
é o lugar mais caro... mas você sabe que muitas vezes você compra coisas iguais nos... no Shopping Center de Copacabana pela metade do preço... você mesmo pega... pode ( ) mil coisas lá... é bem mais caro sabe porque... porque está em Ipanema... porque
L2: [
é...
L1: tem ar condicioNAdo ( ) porque tem homem de cabelo até...
L2: [
é aquelas ( ) todas né e tal...
L1: até aqui ( ) você já reparou o ar das pessoas?
L2: [
é que se trata muito...
L1: uma coisa que eu acho engraçado é o ar... eu não sei se as pessoas se esforçam pra ter aquele ar...
L2: talvez...
L1: eu fico perguntando "Deus aonde... que força interior dá a essas pessoas esse ar?"... um ar assim de... "nouvelle vague" um ar
L2: [
é de... de nuvem eh... é...
L1: assim de quem está e não está... um ar assim de descrer a realidade... sabe aquele ar assim as... que as pessoas... acho que... loucas... as pessoas têm um ar de loucas...
L2: [
é... alienadas... alienadas...
L1: você observa bem... eu fui ao cinema um... no sábado... fui ver... sessão de meia-noite...
L2: hum...
L1: Frankstein...
L2: hã...
L1: porque eu... me amarro em filme de terror... né...
L2: é agora voltou a moda?
L1: [
ah... mas... eu me amarro... não não sei se é moda ou se não é moda... mas eu sempre me amarrei...
L2: [
é... mas é a idéia agora é... agora voltou a fase ( ) né...
L1: então: bom... fui eu... eu... meu irmão e a namorada dele... abri um parênteses pra dizer que há muitos anos eu não estrelava... mas depois estrelei por problema de ocasião... porque eu gosto muito de todos dois e era filme de terror... então eu... eles me chamaram mas eu quis com eles né... então meu irmão falou assim "bom... vamos às dez horas... até que a gente compre a entrada... e tome um chopinho lá perto e volte pro cinema..." chegamos lá às dez e meia... eis que chegamos... hã... "que é aquilo ali?" fila da carne não era... só pode ser fila do cinema... na fila de dez e meia até depois de meia-noite... uma fila... a gente ( ) "vão gostar de filme de terror assim na China"... né... eu não sabia que tinha tantos adeptos...
L2: como gostam né...
L1: aí era uma fila pra comprar... e uma fila pra entrar... ah minha filha... quando meu irmão di/ divisou do outro lado daquela fila pra entrar meu irmão "I.... eu estou olhando bem... deixa... deixa até botar o óculos pra ver se aquilo ali é fila pra entrar"... era...
L2: hum-hum...
L1: ficamos de DEZ e meia à meia-noite e dez em PÉ... em fila de cinema pra ver um Frankstein muito do mixuruca...
L2: aqueles que já era né...
L1: não... o primeiro clássico... o primeiro Frankstein ( ) bacana... eu gostei de ver o primeiro filme de terror...
L2: você via aque/... toda a máscara dele...
L1: agora... eu fiquei na fila... então estava lá os dois namorando e eu né... não ia ficar conversando abundantemente com eles né...
L2: [
claro... né...
L1: então eu:... eles ficam lá observando né... e sabem... às vezes eu fico... eu gosto de observar as pessoas... menina mas... eu nem via as horas passarem... que esPÉcies... eu não estou fa/... falando em tom de crítica... ( ) observação pra deixar claro...
L2: [
( ) cada uma...
L1: menina... mas uma coisa inCRÍvel... sabe eh... aquilo ali é uma coisa... mas... menina... mas sabe que tinha pessoas que você... que elas... elas mostravam por fora... o quanto elas estão doentes por dentro... aquilo ali não pode ser pessoa com a mente ( ) legal sabe uma coisa legal...
L2: das duas uma... ou elas sabem... sabem teatralizar muito bem...
L1: tinha uma garota atrás de mim... aquilo ali foi... um deboche ao meu senso estético... a garota... branca coitada... também parecia que veio de São Paulo on/... naquele dia...
L2: transparente...
L1: devia ter uns trezentos quilos... mal distribuídos... entre parênteses... mal distribuídos...
L2: Frankstein segundo...
L1: se você põe o seu longozinho porque agora está na moda você sair de roupinha comprida eu também gosto... tenho a minha também... que você ponha sua sainha de... umbiguinho de fora... vai ficar um... com o corpo comprido mas... se você tem tre/... uns trezentos quilos você põe ( ) um tecido liso né... liso... chama muita atenção... e ela me pôs um estampado estamos aqui oi que houver...
L2: estamos aqui...
L1: estamos aqui... porque tinha todas as cores do arco-íris... né... e mais algumas que ela inventou...
L2: são as misturas ( )
L1: [
( )
D: que loucura...
L1: espera aí... "wait"... espera aí um momento... vamos ver lá porque é um caso raro... eu olhei assim e falei "( ) Picasso aquilo"... menina... mas uma coisa incrível ( )
L2: [
( )
L1: então... ele era franzidinho na cintura... ainda por cima...
L2: com a barriga toda de fora...
L1: é...
L2: toda... não virando assim...
L1: não... era umBIgo de fora... BAnha... celuLIte... tudo de fora...
L2: [
aquele umbigo... aquele diâmetro...
L1: é... foi uma coisa incrível... não sei se ela estava procurando... se ela estava se agredindo ou se ela estava agredindo as pessoas ou ela estava... estava muito feliz como ela estava... sabe?
L2: ou então é... foi como você falou no Shopping naquela loja que é muito psicodélica...
L1: [
ela estava com uma outra peça ( ) até aqui... eh... então você está vendo problemas das pessoas no... hoje em dia ( )
L2: por dentro da moda... querem está...
L1: ah... então... o negócio é curtir... vamos curtir... pra eh:... sei lá se ( ) a ver com... psicológico...
L2: deve ser...
L1: então a maioria... sabe... então essas garotinhas nessa idade de curtir né... a pré-adolescência curtir a infância eu curtia demais a minha... então não curtem mais... né... elas curtem a moda... a badalação... elas curtem a badalação... o que elas pensam ser certo...
L2: é estar por dentro da moda...
L1: então você... você... eu fico assim... você fica preocupada
L2: [
tem coisas absurdas...
L1: com gente... você fica preocupada com o que eles vão ser como adultos... sabe...
L2: é mesmo... e engraçado porque elas...
L1: qual serão esses valores que eles vão ter sabe... se vê aquelas crianças...
L2: e são assim e... incrível... olha... eu já... já andei pro/
L1: [
e hoje em dia...
L2: sondando homens... rapazes assim de deze/... dezenove... homens com... da idade do meu marido... entre trinta e trinta e um... pra saber que que eles acham quando vê uma garota com aquela... aquela roupa tal que é tão curta não é... que curta é uma coisa... agora curta de... da calcinha aparecer mesmo e... blusa completamente transparente tal... está certo... é claro ( ) usa sutiã não tem problema... mas transparente que você vê tudinho mas tudo... tudo e naquela né de muito louca mesmo... muito louca né... que que eles acham dessa... poxa... eles têm uma visão horrível... ele falou... "ela mais composta ficaria bonita... mas botar tudo isso de fora... perde completamente a estética"... a maioria falou isso... pelo contrário se elas querem atrair ou se acham que a roupa é um: fator de... chamativo...
L1: [
mas eles olham... na maioria das vezes gostam...
L2: olham... olham... podem olhar... podem gostar... podem achar boa... porque está tudo de fora... tal... mas...
L1: não... mas o homem brasileiro --a gente sabe-- que maioria tem aquela idéia pra família dele eh... eles sentem... são... são...
L2: [
mulheres de vida fora da família dele... é justamente... ah... mas pois é pra casar não serve...
L1: não... acontece na minha família particularmente... que meus irmãos são assim sabe? várias vezes... eu sinto... eu acho... eu não acho minha família um fenômeno... e... e... eu... estou falando é a pura verdade... já tiveram muito problema... porque eu cansei de ir à boate... qual o irmão que vai à boate com a irmã... com a garota... com caso... não é com casinho lá... com casinho mesmo só de uma noite... pra hotel depois... eles vão tranqüilamente com a gente e diz assim... brigas assim ó "não precisava ter medo hein?" sabe... a maior gozação... eh... eu... ele... ele disse... meu irmão cansou de dizer na mesa várias vezes... minha mãe meu pai "olha... o que eu quero na minha irmã... é a mesma que eu quero com aquela menina que está passando ali... ela é um ser humano e ela também é... então pelo fato de biologicamente ter nascido de vocês e eu também... ( ) coisa diferente pra ela não... sem essa... isso é um puritanismo incrivelmente nojento"... então a gente tem essa mentalidade... sabe... mas... esse negócio da gente ser... de família bem estruturada... às vezes eu disse pra você... esqueci pequena parte ( ) de problema às vezes... meu irmão... o outro... o melhor amigo dele... meu irmão tem dezenove anos... mentalmente tem trinta... garoto avançadinho... sabe? então ele é muito inteligente... uma intuição incrível... o melhor amigo dele tem vinte e sete anos... que anda assim juntos sempre... e esse garoto é irmão de um... diretor da Odeon... né etc e tal ( ) aqui é uma pessoa muito conhecida... é artista também... então ( ) muito cedo... e então ele: ficou inquieto ( ) fase de artista... os dois moram juntos... o outro é... é... desquitado... mil artistas sempre lá... então: eh... ele é muito meu amigo... ah... eles têm uma outra amiga também que é desquitada... muito amiga... é também amiga amicíssima deles... ficou sendo muito minha amiga... atualmente é namorada do meu outro irmão... essa moça que é desquitada tem vinte e sete anos... tem uma filha... atualmente é namorada do meu irmão mais velho... então a gente sai muito junto e tal... mas EU senti... que eles não me tra/ eles me tratam assim maravilhosamente bem sabe... mas eles me tratam... eles me põem... sem sentir talvez... independente deles... num pedestal... sabe... é que... ( ) eles falam palavrão na minha frente mas não falam TODOS os que eles falariam normalmente... então GRIlam terrivelmente com isso... sabe... eu já cheguei pra ela não pra eles né ( ) eu já cheguei pra ela... falei... "ô V. eu não enTENdo porque vocês gostam de mim mas me marginalizam... porque eu não tiro... ( ) de vocês... não quer dizer NADA... porque eu tenho a... a men/... a mentalidade própria de vocês... se eu não tive esse... esse mesmo tipo... de experiência não quer dizer que eu seja... a puritana
L2: é claro né...
L1: só porque eu tenho uma família? vocês estão me bo/ vocês me marginalizam por quê? porque eu sou de... tenho uma família... porque eu me dou bem com meus pais? e quando eu falo marginalizam eu não quero... não é no sentido de que eles me afastam não... eles me afastam no sentido de me respeitarem demais... não quero respeito demais... eu quero... o tratamento igual sabe? parece uma coisa assim e tal... de respeito eu estava te falando... por excesso também... porque eh... como a maioria das pessoas não é integrada quando... quando... quando encontram uma pessoa assim que vive em família assim penso assim "ah... ih... coitadinha é quadrada... então mil coisas... está entendendo...
L2: [
( )
L1: não aceita a pessoa ter determinados valores... antes seja uma pessoa bacana pura aberta contemporânea... não gosto da palavra moderna... prefiro falar contemporânea... contemporânea e... poxa ela... olha aí ( ) estou te sentindo... eu estou te transformando na minha platéia né?
L2: não... eu hein...
L1: mas eu estou acostumada a ( ) estou acostumada... eu gosto de falar... ( ) na faculdade --eu estudava na Faculdade Nacional-- a maioria das pessoas morava no subúrbio --então eu tenho esse jeito mesmo de falar-- eu me expresso muito com as mãos... com o corpo né? de um modo geral... e tenho essa mania... falo gíria e tal... esse meu modo de falar depressa...
L2: [
( ) achei diferente ( )
L1: então esse pessoal do subúrbio... não está acostumado... é uma ave rara gente... uma ave rara... meio louquete... as pessoas me tratavam meio louquete lá...
L2: e estão pensando "puxa só porque... eh... está em Ipanema... já ( ) "...
L1: é claro... minha filha esse... só é a minha desgraça muitas vezes morar em Ipanema... vou pro Paraná... vou pra São Paulo... vou pra acolá "você é do Rio?" ah... já é do Rio ( )...
L2: [
já é do Rio... é...
L1: já se sente nos meus olhos ( ) conversando com um homem qualquer "ah... você é do Rio?" "ah sim?" novo brilho acende nos seus olhos... eu não sou baixinha... você sabe... eu uso cabelo bem... meu cabelo bem comprido... eu não uso ( ) então eu aparento muito menos idade sabe... então as pessoas ( ) tudo bobocas né... porque continuam vamos dizer assim ( )
L2: [
( )
L1: fácil... deve ser fácil... então eu digo que moro em Ipanema... PIORA completamente né? PIORA transcendentalmente... aí minha filha
L2: [
é fogo...
L1: eles dizem assim "ah mas que incrível a fama de Ipanema"... a gente tinha ido no Paraná uns três meses atrás... o que eu me dei mal o que eu me aborreci... não está no gibi... o que eu me aborreci... não está no gibi... sabe essa aparência da gente ser... esse modo de vestir? você nem me pergunte quantos convites que eu recebi nem me pergunte quantos...
L2: assim é?
L1: eu... tem uma malícia inCRÍvel... mora em Ipanema "ah então deve ser aquela menina... sem preconceitos ( ) opa...
L2: [
é está... dá adoidado...
L1: deve levar até cama nas costas"... eu tenho impressão que eles me viam levar a cama nas costas entende?
L2: [
é...
L1: tal é a fama... realmente eu acho que existem... muitas moças livres... não só em Ipanema... como em Copacabana... como no subúrbio...
L2: [
é claro né...
L1: ( ) existe muita gente livre está entendendo? ( )...
L2: [
mas é o... claro... isso é mito...
L1: discutir quanto as liberdades... que eles pensam...
L2: é e depois isso aí... azar o nosso né? já virou mito... isso é mito...
L1: é o mito... incrível... e é o mito negativo...
L2: [
é mito não adianta... olha e vou te contar... e isso a gente... é no Brasil todo viu... eu tive em Salvador mas o negócio foi louco lá... as garotas elas querem saber tudo... como é que é... que que faz... como é que é a vida e: ... os rapazes... coitado se aparece um lá de carro e chapa Rio de Janeiro... já era
L1: [
ah... eu sei...
L2: avançam... avançam "ah da onde você é? Rio? ótimo entra"... de graça...
L1: é um avanço... é literalmente um avanço né? literalmente falando e mais alguma coisa...
L2: é... as moças de lá... elas... são moderninhas você não faz muita diferença uma garota de lá e garotas daqui da zona sul... não faz agora não... não sei se é porque talvez... sei lá claro...
L1: [
é... realmente... eu acho que a vida sabe eu acho...
L2: não... mas sabe o que é... também isso que eu ia te falar... não sei se porque tem muita carioca lá e a gente pensa que é baiana... então já tem muita baiana se misturando... mas o negócio é:... fogo na roupa...
L1: então elas já estão cheias de malícia ( )
L2: [
é...
L1: tudo que eu falei sei lá... eu acho que ( ) a coisa que eu mais detesto é de malícia sabe?
L2: é... esse negócio de ( )
L1: hoje minha mãe tinha saído do banho... eu estava no banheiro... então nosso banheiro tem um espelho muito grande... e dentro tem toalete lá e tudo e meu irmão tinha acabado de a... que ela estava dormindo no quarto dela... abriu a porta assim... sabe né... a minha mãe... é a minha né... não é a I.... minha mãe é minha mãe... não é I.... não é I.... simplesmente ela foi uma pessoa maravilhosa ( ) me respeito... então ela abriu assim a porta do banheiro e ele... abriram na mesma hora... ele abriu ela abriu também... ( ) eu tenho impressão que ele não deve ter visto... então ela saiu e... "FECHA ESSA PORTA" ( ) e ela deu e eu me assustei... sabe quase cheguei a ( ) "não faça uma coisa dessa ( ) da escola cansada... pelo amor de Deus né?" eu digo "ô mamãe... é isso aí que a tua geração fez... e o que é que... você acha que ele nunca viu um corpo de mulher mamãe... o teu é mais feio é mais bonito?... não é simplesmente um corpo de gente... mamãe eh... você está pensando o que mamãe... que você tem de mais ou de menos? só pelo fato de ser mãe dele não pode ver teu corpo?... está errado"... sabe eu... mas eu... eu me grilo tão terrivelmente com malícia...
L2: é fogo... e ela mas ela não ficou sem... ela não ficou sem graça depois? não né... aceitou né?
L1: sabe o que eu sinto eu sinto... eu sou uma pessoa que ainda estou... ela... não ela... ela sabe que no fundo eu sei ( ) tem continuar ( )
L2: é... e isso é engraçado olha por exemplo... hoje estava na casa dos meus pais... meu pai saiu do banho de manhã cedo e ele entrou no quarto... eu estava também no quarto da minha mãe... mas eu estava sentada na cama assim de costas e... e eu me virei falando não sei o quê... eu me virei...
L1: você estava sem roupa?
L2: não... eu estava vestida e meu pai entrou com uma toalha enrolada aqui curtinha... quando ele entrou eu "hã?"... assim ele "não fica preocupada que eu estou de cueca por baixo"... ele falou assim tranqüilo...
L1: mas você já começou mal... você já deu aquele "hã"...
L2: é mas o eh... olha eu fiquei espantada assim que ele... mas eu fiz... assim mas não foi tão assim... susto não mas é que ele vinha entrando e não sei... eu fiquei com medo dele ficar chateado porque eu o vi né?... mas ele estava com a toalha assim... falando não fica... ele ficou tão tranqüilo... "não fica assustada não... eu estou de cueca por baixo"...
L1: mas aí não... não demorou a olhar com atenção... não está conseguindo nem pensar né?...
L2: [
hã hã... não é o que... é...
L1: lá em casa é gozadíssimo... que um dos... um dos meus irmãos sai do banheiro antes de vestir ( ) "homem nu no corredor homem nu no corredor"... é engraçadíssimo ( )
L2: [
já vai avisando...
L1: meu irmão não aparenta mas ( ) muito espirituosa sabe... outro dia na sala... meu irmão estava com a toalha amarrada assim... ele saiu do banheiro pra arrumar não sei o quê na sala e a toalha dele estava quase caindo sabe... ele estava assim em frente a mim então tinha uma mesa entre a gente... aí meu pai... "ô S. a toalha está quase caindo... está vendo não?" mas me dá uma... me dá uma raiva quando alguém fala um troço desse... eu falei pra ele... "escuta aqui meu pai... você acha que eu nunca vi corpo de homem?... vi e achei bonito... vi e achei bonito"... ((risos)) no fim ele ficou desbundado e ficou olhando pra mim...
L2: puxa vida hein?
L1: olha... ele ficou tão assim tão sabe coitado... e ele foi... ele não teve resposta ( ) ele ficou literalmente desbundado... eu falei "vi... meu filho... e achei lindo se queres saber"...
L2: que que ele escondia tanto...
L1: [
aí ( ) a minha outra irmã "não não é que é tão bonito assim" né I.?... eu falei assim "ué... gosto estético filha... eu gostei ( ) eu gosto... não gosto de mulher minha filha"...
L2: antes assim...
L1: olha ( ) mesmo né? ( ) já chega naquela ginástica lá ( ) quatrocentos milhões de mulheres tomando banho lá... nem gosto... meu gosto... já estou até com ( )
L2: alergia... mulher não... ai... mas foi ótimo...
L1: mas voltando um pouquinho a... a negócio de comércio de... e essa... essa... como é que se diz... não é tanta... como é que se diz a palavra meu Deus não é tanta... exploração...
L2: quer dizer o disparate...
L1: é... eu tive na Smuggler na ( ) Costa do Sol... essas butiques de Ipanema essas butiques mais caras... fui comprar uma blusinha de malha assim uma... um negocinho assim... olha eu vou dizer... eu paguei por essa bermuda uns setenta cruzeiros...
L2: então ela foi pintada a mão... então...
L1: dizem que é pintada à mão ((ruídos)) ( ) meus alunos pintam igual né? ( )
L2: sei lá... até você talvez pintasse assim...
L1: bom... mas eu não prefiro nada de mais não... eu fiquei realmente maravilhada e comprei... eu... adorei sei lá mil coisas... achei lindo né?...
L2: ( ) sei lá... não tem preço claro... linda mesmo...
L1: aí então você sabe que essa camiseta eles compram sabe ( ) sabe Rua da Alfândega e Senhor dos Passos tem uma loja ( ) que é Depósito Hering?
L2: hum... compra por cinco cruzeiros...
L1: [
é do meu tio entende... ah... até que meu tio está bilionário só né coitado... mas ele vende as... as...
L2: as camisetas...
L1: as camisetas dele a preço de banana pra essas lojas... e elas CObram uma coisa incrível está me entendendo? mas é também bobagem não é ( ) desde o momento que você se disponha a entrar numa loja dessa e pagar... então você tem o que você quer... você sabe que outras lojas que vendem coisas barato... talvez não tão bacana tão bonitinhas... sei lá porque as coisas caem melhor realmente... uma calça ( ) você paga cento e quarenta... duzentos e pouco... mas numa calça que você tem anos... com um caimento maravilhoso...
L2: é verdade...
L1: às vezes você não quer pagar um preço maior sabe... então não... não exige tanto assim... não explora bem esses preços...
L2: é... eu acho claro... também acho assim... porque você entra numa loja dessas... você pede uma roupa usa... puxa está certinha... não precisa fazer nada... não precisa apertar nada... o teu número está ótimo... outras o mesmo número ficou apertado ficou largo... ficou aquela ( ) assim caindo... despencando... horroroso... então você paga mais mas em compensação você tem aquele negócio eh... é botou e vai... eu não gosto de roupa assim... ficar apertando a maior danação... gosto de entrar ou sair carregando... mas já vou usando... entendeu que esse
L1: [
ah... imagina né?
L2: negócio de mandar apertar... aperta aqui... não ficou bom pôxa é um saco né? então a gente paga mais mas sem problemas... entrou legal... é então é assim... agora no começo é uma... é uma badalação aqui... e é tudo em cima viu...
L1: vai dá um dinheiro... dá um dinheiro ( )
L2: ah dão... dá... dá... em compen/... se você tem... se você tem condição eh... você pode comprar... fazer uma extravagância... então você está na última né?... pode chegar aquela Odile Rubrosa diretamente da França com aquele tamancão... você está vestida igualzinho a ela... ela pagou não sei quantos dólares e você...
L1: [
ah... mas consumo... necessidade de consumo "biscuit"... é a massificação minha filha enfim... é massificação... eu estou sentindo tão mal com isso agora... quero até registrar ali que eu estou rouca... que eu não tenho essa voz horrorosa... registrar aqui né?...
L2: está bom e todo mundo já sabe...