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PROJETO NURC-RJ

AMOSTRA COMPLEMENTAR:
Inquérito 12 (feminino / 27 anos)
Tema: Cidade e comércio
Local/Data: Rio de Janeiro, 12 de janeiro de 1993
Tipo de Inquérito: Diálogo entre informante e Documentador
Documentador: M A


DOC. - Bem, então como eu falei pra você né, o tema vai ser cidade e comércio. Então, é ... você podia começar, por exemplo falando do lugar onde você mora. se já mora lá há bastante tempo, por exemplo, é, se você vê diferença de antigamente quando você era menor, como é hoje em dia.
LOC. - Bom, eu moro na Tijuca, já há bastante tempo, bastante tempo, desde que eu nasci, né e, fica meio difícil de eu falar se eu noto alguma diferença, porque, tudo bem até época de colégio, eu, freqüentava o bairro da Tijuca e depois fui eu comecei a fazer, a, cursar faculdade, e eu já nadava aqui no Flamengo, quer dizer, ficou meio, altamente zona sul, quer dizer, quando eu, vou, às vezes, até até fazer compra, praça Saens Pena assim, né, você pega, o local na Tijuca que você mais faz compras, é, sábado, que por acaso eu tô em casa, mas geralmente, tô, ou venho treinar de manhã, ou então às vezes vai pra shopping, mais tarde. Então quer dizer fica meio difícil comparar o comércio. Eu sou uma tijucana meio, não muito praticante né. (risos) quer dizer, eu até [ ? ] mas geralmente zona sul. Agora, eu gosto da Tijuca tem tem pontos bons, tem tem pontos que são, meio perigosos como em qualquer lugar do mundo, eu acho que isso não, muda muito pra lá. O pessoal fala que o, Rio de Janeiro é uma cidade violenta mas, a diferença é que a gente fala o que acontece aqui, e em outros lugares por exemplo, Nova York, em determinados pontos é tão, violento quanto o Rio ou, de repente, até mais, e neguinho aí nem comenta isso né.
DOC. - [ ininteligível ] E, bem, e pra morar como é que você descreve o Rio?
LOC. - Morar no Rio de Janeiro, na Tijuca, em outro lugar?
DOC. - Na Tijuca, bom, praticamente eu só, freqüento mesmo pra dormir, né. Agora é um bairro que tem um comércio legal, tipo assim, até parte do dia a dia, banca de jornal, padaria, supermercado, você não precisa, como em determinados bairros pegar um carro pra ir até a padaria comprar pão. Se depender do serviço de entrega! E, deixa eu ver, vizinhança legal, não tenho nada contra, apesar dos tijucanos de repente, ter um, às vezes o pessoal da zona sul: E, ah, aquele cara é tijucano! não sei o quê ( risos ). Não sei, não sei, aí olha assim: Não! Você já é zona sul! ( risos ). Aí querem corrigir o erro mas não sei como é que... Não vejo nenhuma diferença marcante assim um biotipo de tijucano, não consigo ver isso, e, deixa eu ver... pra morar, eu acho um bairro legal, tem determinadas ruas, agradáveis, apesar de eu morar em plena Conde de Bonfim, a, três metros do chão, de frente, quer dizer, uma barulheira desgraçada, mas, me acostumei, como qualquer um na cidade também, me acostumei, e não tenho muitos problemas não.
DOC. - Você falou ... é do comércio assim, essencial, né, banca de jornal, padaria. E, em relação a outro tipo de comércio você acha que existe um comércio especializado ou você pode comprar de tudo na Tijuca ou seja, por exemplo existem determinadas coisas que você precisa sair pra encontrar.
LOC. - Eu acho, de repente, acho acho que não, acho que não. Talvez alguns itens mais, determinados itens sofisticados, que que necessitam de uma loja especializada, tipo, uma bicicleta importada, tá? Se você, aí tudo bem, você vai ter que ir, mas aí, sei lá, eu acho que hoje em dia já tá bem diversificado, você, quando você tem shoppings, até inclusive na, que a gente considerava zona norte, né, tipo Madureira, Méier, quer dizer, a Tijuca era uma extensão da zona sul que eu acho né, o pessoal considerava, além Tijuca, subúrbio. É a imagem que eu tenho e, só que hoje em dia não, você tem o Norteshopping, amigas minhas trabalham às vezes em lojas assim. Aí tem aquela competição né, de loja: Ah essa loja tá vendendo mais do que a gente, essa outra tá vendendo mais, e uma amiga minha trabalhava numa loja, acho que do Rio Sul, ou no shopping, sei lá, um shopping da Barra, ou do Barrashopping sei lá, e ... : Pôxa, se a gente não tomasse cuidado, o Norteshopping passava a gente. E realmente tem um... tá tá bem diversificado. Acho que é, ah com o nível de renda, também, tem muita gente nesse que a gente chama de subúrbio, Nova Iguaçu, tal, tem gente que, conseguiu acumular dinheiro nesses determinados pontos e, diversificar um pouco. Zona Sul não é mais tão zona sul, tá, e os shoppings, tipo, Plazashopping, Ilha Shopping, esses troços levaram as grifes, né, lojas de grifes, pra outros lugares que, a princípio as pessoas achavam que não ia vender. Então acho que, o comércio, não tem muito o que sair da Tijuca pra, pra, e de repente, eu saio da Tijuca até sem saber, porque de repente eu: Ah, não, eu tenho que ir nessa loja que é na zona sul; Não, mas tem na Tijuca, às vezes até, nem sei : Ah, tem? Às vezes, nem sei, é...
DOC. - E, vem cá, é, se você descrever assim, por exemplo, a arquitetura da Tijuca. Você acha que a Tijuca tem uma arquitetura diferente de outros, ou até comparando com, mesmo comparando com outros bairros. Você poderia dividir a cidade em arquiteturas próprias de determinado lugar?
LOC. - Não sei, não sou muito, não é muito o meu forte isso não, mas, não sei, de repente a Tijuca é, a Tijuca é mais antiga, não sei, talvez, algumas vilas, casas de vila, assim, mas não vejo, também nunca re ... sinceramente nunca reparei muito. Meu irmão daria de repente até uma resposta melhor, mas, não sei, não sei definir a arquitetura da Tijuca, que aí confunde um pouco com o Rio Comprido. Rio Comprido de repente cê tinha, Catumbi e, aí você tinha de repente uns sobrados, umas casas mais antigas né. A Tijuca já tem bastante prédio, e assim a parte de altos, não sei, não consigo, diferenciar uma arquitetura, específica. Aliás, eu não vejo, com exceção da Barra, né, que você tem aqueles, em geral, prédios baixinhos, né, é, mas, não consigo. Cê olha assim pra um lugar: Não! Esse aqui tem cara de Barra.
DOC. - Ah, é. Como é que é uma cara de Barra?
LOC. - Cara de Barra, é uma rua barrenta, ( risos ) sem a rede de esgoto, mas com prédios, assim de luxo mas, não mais do que quatro andares, três, quatro andares que é bem típico, né. Ou então aqueles condomínios de beira de praia com prédios monstruosos, mas aquelas ruazinhas, todas de terra batida, levanta poeira e alaga quando chove mas, mas sempre prédios luxuosos mas baixos, ou então aqueles condomínios mesmo.
DOC. - Não tem, assim, nenhum bairro da cidade que você acha, é, tipo, assim, se você visse uma fotografia e visse: Ah, esse aqui tem cara desse lugar!
LOC. - Poderia até falar, assim, uma casa mais antiga: Ah tem cara de Catete, Cosme Velho, sei lá, mas ia ser muito chute ( risos ): tem cara de ... esse, aquele e aí [ chutava] mesmo.
DOC. - Ih, vem cá, é, você que já viajou né, com outra idade muito tempo faz que você saiu, e, tem algum lugar assim que você achou ótimo? Ah, esse lugar é um lugar legal de se morar.
LOC. - Tem, eu, hoje em dia eu consegui conhecer os três países que eu gostaria de conhecer, tá, é, Japão, Austrália e Canadá. É, o Japão é outro mundo. É uma cultura completamente diferente, principalmente aqui no Rio de Janeiro, né, lá é, todo mundo muito ligado a trabalho, é, pontualidade impera, entendeu, você vai numa fila de metrô o pessoal tá numa fila realmente, não tá naquele amontoado, que nem aqui no Rio, e o cara fica parado e o Metrô pára exatamente onde você tá parado. Tem os locais marcados, é tudo por, cronometrado, entendeu, o fluxo de de carros não tem, não é essa zona que é aqui no Rio, entendeu, é tudo, é é engarrafado, tem bastante, que eu só visitei um a cidade [ nome da cidade ] , no Japão. Não cheguei nem, e Kioto, não fui até Tókio, mas a impressão que você tem, é isso, que é uma cidade, é um país assim super-avançado mas que por exemplo em Kioto você tem aquela confusão da rua, trânsito carro pra caramba, mas você tem aqueles castelos de imperadores antigos, não sei o quê.
DOC. - Dentro da cidade?
LOC. - Dentro da cidade, nossa! tem muitos castelos, templos, antigos e você entra assim aquela aquela calma de jardim japonês, que você só vê assim pássaro, água caindo, escuta vento, então isso eu acho, eu acho demais, eu acho a cultura japonesa... Não gostaria de ser japonesa, que eu acho que eles são muito rígidos. Eu prefiro ser uma brasileira que vai ao Japão, (risos) e você tem opção de sair de lá quando encher o saco, mas, agora, é um país assim incrível. E, deixa eu ver, Austrália, uma vez me definiram Austrália como a Inglaterra de bermudas, e, é um país assim, também um barato. Também não fui até Sidney, só conheci uma cidade [ nome da cidade ] que é do lado oeste tá, é a única cidade grande do oeste, e, é uma das cidades que tem o melhor, melhor é, padrão de vida, ou seja uma das melhores cidades do mundo pra se morar. Eu fiquei apaixonada pela cidade, sabe, tudo certinho. É uma cidade nova, tem mais ou menos 1.200 mil, de habitantes, e, e, eu fui pra participar de uma prova, tá, e, a prova era num rio. O rio cortava a cidade ao meio. Então a impressão era, mais ou menos como se você pudesse nadar na Lagoa Rodrigo de Freitas, tá, então o rio cortava a cidade e você tava nadando ali, entendeu, quer dizer é, a prova, eu achei o máximo, tá, o pessoal de lá, o povo muito simpático, super acessível, quer dizer, quando você vai num esquema desse de competição, você não tá vendo exatamente o dia-a-dia da cidade, você, realmente tá em contato com pessoas que são, voltadas pro esporte ou tão ali já pra te ajudar, quer dizer, disfarça um pouco a cidade. De repente você pega, a nata das pessoas, né, quer dizer, o lado mais, dia-a-dia, cotidiano, de repente, você perde um pouco, mas eu só tive boas impressões sobre a Austrália. Achei, um país, fora parte de zoológico, entendeu, tinha a ver, animais que você nunca tinha visto: canguru, coala. Um barato! Entendeu ... E Canadá, realmente, era um país que não sei por que me atraía, assim, achava legal porque era um país, é um país desenvolvido mas que não é um país que, por exemplo, você é americano, tá, é um país super-desenvolvido mas se você, quiser ser atleta, os caras [ ? ] tá ... eu não sei explicar direito, você, no Canadá, você pode ser o que você quiser mas os caras não vão te exigir nada, é essa a impressão que eu tenho. se você quiser ser um campeão do mundo, eles vão te ajudar a ser um campeão do mundo, mas se você quiser praticar natação porque você gosta, tudo bem, você praticar porque você gosta. Já nos EUA, acho que eles são competitivos demais. Eles já, qualquer coisa o americano faz pra ser melhor, entendeu. O canadense não, é, eles dão, mas, ou mesmo que não cobrassem, gostariam que você fosse um campeão, entendeu. É tudo voltado pra uma competição e no Canadá não, você já tem o lado mais mais pelo social, mais relaxado, pelo menos, é a impressão que eu tenho. E, achei as cidades, assim, legais. Conheci o lado francês, né, de Montreal, ali, algumas cidadezinhas, por ali, e o lado inglês, também. Eu acho engraçado que é um país que, de um lado você fala francês, de outro você fala inglês e, quer dizer, o pessoal que fala francês tem que falar inglês mas eu conheci gente que falava inglês que: Não sei falar uma palavra de francês! Quer dizer, não sei se eles vão se separar, Quebec ou não, tem um movimento lá pra separar, até justifica mas é problema deles (risos) eles que se, que se entendam lá.
DOC. - No caso, por exemplo tá, do Canadá, é, você visitou mais de uma cidade?
LOC. - Tive, porque eu passei praticamente um mês, e, eu passei algumas alguns dias em Montreal mas tudo assim, tipo, no meio da viagem. Eu cheguei a Montreal, aí fomos pra uma cidade seis horas ao Norte, [ ? ]l que é uma cidade pequenininha , só é, só fui parar nessa cidade porque tive uma prova famosa (risos) que não me pergunte porque que tem essa prova famosa lá. Aí, depois fui pra, [ nome da cidade ] que é uma cidade próxima a [ nome da cidade ], que é mais ou menos uma hora e meia ao sul de Montreal, aí quer dizer, passei uma semana lá, aí depois voltei pra aquela cidade de [ Roberval?] lá em cima mais uns cinco dias lá, aí voltei pra Montreal, aí fui pros Estados Unidos, Atlantic City, aí depois fui pra [ nome da cidade] que é uma cidade em Atlanta, entre [ ? ] e [ ? ], que é próximo às montanhas, e tem assim, tipo um parque, maravilhoso lá, quer dizer, principalmente pra gente que a gente vê neve fica babando né ( risos ) aqui no Rio, não tá acostumado, né?
DOC. - Deslumbrado né ( risos )
LOC. - Oh! Neve! Aí é tanto que você sai tirando foto assim dos altos dos montes, assim das das montanhas, né, tudo com neve lá, aí virou uma húngara que tava num, o pessoal da de prova né, virou uma húngara: Pôxa, você nunca viu neve? ( risos ) Aí eu falei: Não, já até vi, mas é que a paisagem, assim, é diferente da paisagem que a gente tem no Brasil. Aí eu falei assim: Não, é porque a paisagem tá bonita. ( risos ).
DOC. - Eles devem achar um barato né?
LOC. - É.
DOC. - Mas assim, é, na cidade, por exemplo, o que que você viu, na cidade na organização da cidade que te atraiu, que você achou que deve ser um lugar legal pra se morar?
LOC. - Primeiro, o respeito com as pessoas, tá. Aqui no Rio, de repente a gente já tem um um preconceito contra isso, é tipo, assim: Ah não, aqui no Rio nada funciona! Ou neguinho já vai na base da malandragem, já quer te passar pra trás, de repente alguns lugares até funciona porque você, muitas vezes encontra boas pessoas por aí, tá. Agora, cê já tá com o pé atrás, né, e lá, até de repente porque por você não conhecer, de repente lá tem tem tanta malandragem, quanto aqui, até que acho que não mas, tem bastante, ou seja, muito mais malandragem do que você imagina, não é, você, ou os caras ficam com cerimônia com você ou ou você não percebe, não sei. Eu sei que por exemplo, respeito a leis, nem que seja lei de trânsito, respeito com pessoas mais velhas sabe isso tem muito no Japão, muito, é. Aqui no Brasil, neguinho, muitas vezes na família o cara vai ficando mais velho e, a família não quer saber, larga, você você não... Às vezes tem o velhinho que senta na praça e você já... E, o velho vai encostar! Não sei o quê, de repente o velho tem uma cabeça super aberta, super jovem. Deixa eu ver, o que mais. Ah, não posso falar muito de horários, porque eu sou super ... ( risos ) Pontualidade não é comigo.
DOC. - Ah, é?
LOC. - Que mais? O que que chama atenção? À vezes, um pouco de ... respeito pela própria, pelo próprio país, sabe, você vê, às vezes, numa olimpíada, o orgulho que, os caras carregam a bandeira americana, não sei o quê. Os atletas brasileiros também têm esse orgulho, mas o povo mas, entendeu, o povo, só em época de Copa do Mundo que neguinho se junta mesmo, porque se não.
DOC. - [ ? ]
LOC. - É, e que mais. E, ou então agora, eu tenho que reconhecer, o brasileiro tá se politizando bem mais.
DOC. - [ ? ]
LOC. - Muito pela televisão, muito pela TV, com relação a a ao processo de impedimento do Collor, o que eu posso dizer, é o seguinte: Passou essa série Anos Rebeldes na televisão né, e, coincidiu justamente com o horário, com a época que eu tava viajando. Então eu não assisti essa série. E eu soube, pelo, lendo os jornais na Itália, eu: Que confusão é essa que tá no Brasil? Aí, uma amiga minha que tava na Itália: Não, o Collor tá, vai rodar! Aí eu falei: Assim? Vão tirar!? O impeachment no presidente! Nunca vi isso! Nunca vi isso na minha ... Porque eu não tava sabendo, você não tá convivendo o dia-a-dia do país, então, você olhava aquela notícia, você fica um pouco chocado. Então, acompanhava muito de longe as notícias, e quando eu cheguei, eu falei assim, vi uma multidão de caras-pintadas, pirralhada, né, na rua, molecada de quatorze, quinze anos, eu falei assim: Que isso, isso nunca aconteceu no Brasil, não tô entendendo isso. Aí, o pessoal: Não! Mas é a moda agora! ( ? ) Eu falei. E realmente dessa vez eu consegui, notar bem claro com, a influência da televisão, tá. Eu acho que essa série teve uma participação muito grande no, em todo processo político e tal. Tem o lado bom, tá. Eu acho que o brasileiro, a gente tem aquela fama de acomodado, de, de não participar, você chega, por exemplo, na Argentina, o pessoal já é bem mais politizado, sabe, desde a época do estudante até ... cê vê a própria conversa com as pessoas você já nota que o pessoal tem ... Muitos países da América do Sul, de repente até por causa da da ditadura mais forte, aqui no Brasil o pessoal era mais, não sei, não sei explicar porque o povo é diferente.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É, é meio acomodado. Pô tá tudo bem, não tô nem aí, mas, tá mudando! E eu acho que, acho que é isso é ... é muito bom, é, vamos ver como é que fica eu espero que não saia com quebra-pau.
DOC. - (ininteligível )
LOC. - Exatamente e que não, daqui a pouco vem uma série ou que não não tem nada a ver com, sei lá, moda japonesa aí o pessoal só vai, esquece a política e vai ver, vai se fantasiar de roupa japonesa pela rua, não sei.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É.
DOC. - Mas, bem.
LOC. - Que mais?
DOC. - Eu queria que você falasse mais assim, se você idealizar né, a cidade que você gostaria de morar, como é que seria essa cidade, como seria organização, serviço...
LOC. - Idealizar? Bom, primeiro, tipo assim, eu monto a cidade que eu gostaria de morar, né.
DOC. - É.
LOC. - Com praia, tá, limpa, lógico, ah ... sendo cortada, engraçado, sendo cortada por um rio, acho que aqui no Rio de Janeiro a gente não tem um rio assim que cê possa...
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É, não tem assim, um rio que, eu lembro que a primeira vez que eu nadei num rio, eu achei, quer dizer, vi aquela quantidade imensa de água, cai n’água aí senti: Pô, cadê o sol? ( risos) Não tinha sol, entendeu, aí depois, hoje em dia eu já me acostumei, mas, lago, também acho bonito, toda essa parte natural assim, ah ... que mais? Hum ... uma cidade limpa, tá, que o cidadão, que as pessoas que ( que) moram nessa cidade teriam, tipo assim, um cuidado todo especial em manter a cidade limpa, tá, não é você, tomar um picolé e jogar papel no chão, tá, é um péssimo hábito que a gente tem aqui e ... que mais, uma uma cidade, basicamente casas, não gosto muito de prédios, prédio pra mim tem cara de, que, aqui no Rio a maioria das pessoas mora em prédios né, São Paulo, geralmente o pessoal mora em casa, ah, tá mudando um pouco, mas, é, São Paulo é uma cidade mais, esparramada, assim, o Rio de Janeiro, o Rio de Janeiro tem mar de um lado e morro do outro, então, as gente teve que crescer pra cima, São Paulo é uma cidade, pelo menos a impressão que eu tenho né, mais esparramada, então, você, eu conheço bastante gente que mora em casa, aqui no Rio não, geralmente o pessoal mora em apartamento. Lá em São Paulo, a maioria dos meus amigos mora em casa. E, deixa eu ver que mais que teria na cidade.
DOC. - E por que é, a casa é melhor que apartamento?
LOC. - Não sei, eu acho que, primeiro pelo, lance de espaço. Imagina uma casa com gramadinho, na frente e tal. Gostaria de ter gramado sem muro, que nem aqueles subúrbios americanos de cidades pequenas né, porque grande não dá, ah, tudo bem, na hora de sonhar, a gente sonha alto. É, deixa eu ver, sem grandes problemas de violência. Eu acho que é um problema, muito sério e você, hoje em dia, dirigindo um carro, você, eu, pelo menos, sou assim, paro no sinal, você não tá, passeando pela cidade, você não consegue passear. Cê pára no sinal, você presta atenção se tem pivete, se tem alguém olhando meio suspeito, se você tá sendo seguido por algum carro, entendeu, então...
DOC. - Neurose, né.
LOC. - É, bem neurose e, eu gosto quando eu viajo por causa disso. Você relaxa um pouco, tá. Eu vou lá fora, aí você entende porque que que o turista age, da maneira que ele age aqui no Brasil. Você, quando você viaja, você passa a ser turista. Então você começa a fazer coisas que você nunca faria no Brasil.
DOC. - Você imagina que lá não tem perigo nenhum!
LOC. - É, e tem. É pode até ter de repente tem, você vai pra Nova York tem.
DOC. - [ ? ]
LOC. - Pô entra entra num bairro, por exemplo num bairro negro nos EUA, por exemplo, pô, então, tá ( risos ) é brabo, aí, então tipo assim andar com máquina fotográfica, ou com uma roupa, de verão, assim que você olha: Pô, aquele cara é turista, cara! ( risos ) Aí, você quando viaja, você entende porque, o cara age daquela maneira. Você tá de férias, não tem, não deve satisfação a ninguém. Ah, deixa eu ver, que mais, o que que cê tava perguntando? Como seria a cidade ...
DOC. - Como seria a cidade, em termos, assim, de serviços, né.
LOC. - Serviços.
DOC. - O que que tem que ter pra cidade funcionar, o que que você acha que é essencial?
LOC. - Bem, limpeza, tá, ah, pelo trauma, pela neurose que a gente tem de, de segurança, serviço, assim, de policiamento, segurança, e, até serviço hospitalar também, né, segurança com relação à saúde. No caso de um acidente, você ter, tipo, anjos do asfalto, esse negócio assim. É, se você tiver numa situação de emergência, você vai ser, você vai ter um atendimento de emergência, tá, não é que nem aqui.
DOC. - Realmente, emergência né.
LOC. - Que tem que ficar na fila, tá todo quebrado, você tem que ficar na fila do hospital que tá em greve e o cara não vai te atender é, quer dizer, essa essa parte de assistência médica também. Deixa eu ver, opções de estudo, assim, escolas, basicamente escolas porque, aí depende do contexto que que a cidade tá. Se você tiver uma cidade, próxima a uma cidade grande, você de repente nem precisa se preocupar muito em ter uma, um grande centro universitário, sabe, cê, sei lá, por por exemplo na na cidade que eu tive, na parte, inglesa do Canadá, era uma cidade muito pequena, a cidade tinha o que, uns cinco mil habitantes, sei lá, um negócio desse, entendeu? Quando eu falei: Gente no cadastro do do Flamengo tem cinqüenta mil sócios ( risos) entendeu, os caras ficaram assim, não tinham, condições de pensar.
DOC. - Não têm referência, né.
LOC. - É, não tem referência, mínima referência, você coloca as cinco mil pessoas aqui na arquibancada do Flamengo, a cidade inteira, cê anda a pé e conhece todo mundo. E realmente, lá só tinha, duas cidades. Ah é, por exemplo, o pessoal no Canadá reclama muito da parte de impostos, tá, eles pagam muito imposto, tipo até os estrangeiros mesmo, tudo que você compra, ou consome, você paga, acho que quinze por cento de desconto, de de imposto.
DOC. - Nossa!
LOC. - Quinze por cento. Sendo que pros pras pessoas que moram, de repente, esse imposto chega a vinte, sei lá. Só que tem o seguinte, você tem, você vê esse dinheiro do teu imposto sendo aplicado, é, em restauração de rua, você não tem as ruas esburacadas que tem no Rio, você tem, se você passa mal, você tem o serviço hospitalar, é, público que você pode freqüentar, não é que nem aqui no Brasil, que você, praticamente tem que ter um convênio médico, alguma coisa, tá, que, se realmente, se você, se acontece um acidente de carro, que você, coisas que podem acontecer e você não tiver um, ou uma família rica ou um convênio, tá morto! Só de operação, de anestesia, você vai, morrer numa dessas, e se ficar dependendo de Miguel Couto, de outras coisas, você tá realmente perdido. Então, gosto de cuidar da.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É, e, que mais, por exemplo é, as crianças tinham, tinham basicamente duas escolas, uma a nível de, matr ... duas a nível de maternal [ ? ], uma mais próxima da outra e tal, e uma, acho que até, primeiro grau, não sei, agora, realmente, a Universidade que, mas aí era uma cidade entre [ nome da cidade] e [nome da cidade], quer dizer, duas cidades grandes, e você tem as universidades, lá, então você pode...
DOC. - era perto mesmo.
LOC. - Era perto, era, mais ou menos, a uma hora e meia, duas horas das, quer dizer, até, até, poderia morar na cidade e.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É, ou então ficar fim-de-semana só. Deixa eu ver, que mais, que mais que eu gostaria de ter numa cidade, sei lá, não me lembro mais.
DOC. - E, vem cá é [ ? ] teve alguma cidade que você visitou [ ? ]
LOC. - Bom, Japão é completamente diferente, lá, é, e é engraçado porque você tem esses, que eu te falei, principalmente em Kioto, que era a antiga capital do Japão, você tem esses templos, lado a lado em prédios e ruas de comércio, ruas de pedestres, só de comércio, com, aqueles letreiros luminosos, aquelas, bem cara assim de, se, de [ ? ], aquele bairro que tem, deixa eu ver.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - Oh, por exemplo, o maior que tinha, lá, era um que era a antiga residência do Shogún, Shógun, eu não sei como é que se pronuncia lá, é um lugar enorme, você entra, tem aqueles portões, assim, grandes. Outro dia eu peguei aquela fita daquele filme, Ran, de Akira Kurosau, Akira Kurosawa né.
DOC. - É.
LOC. - E, é impressionante, você, você, ... você se sente mínimo diante dos negócios, os negócios são imensos, né, e lá você tem o castelo do cara , por exemplo, tem jardim, tá, com lago em volta e tem o castelo, e um detalhe que eu achei interessantíssimo, que, ele é basicamente madeira, tá, usam muita madeira, aí, você vai visitar lá dentro, você tem que ficar de meia né, não pode entrar de sapato, fica de meia, aí você começa a andar, e engraçado que, o, as próprias residência, principalmente antigas, né, do Japão, você não têm mobília né. Aqueles são espaços vazios, a cama é uma, um colchão que você abre assim, um pano que você abre, até naquele filme, o Japão bem antigo né, e, engraçado que, por exemplo, nesse castelo você andava, aí você como ele era todo de madeira, você ia andando e o, aquele barulho de madeira rangendo né: Pô, porque é velho não sei o quê, aí de repente, tem, que tem um, a gente passava, assim, e iam falando: Essa aqui era sala de reuniões, sala de cerimônia do chá, não sei o quê, então tinha uma que falava assim, que, os ruídos do chão dos corredores não era de, de, sem querer, é, tinha um propósito, era um propósito, era por motivos de segurança porque ninguém ia entrar no castelo sem ser notado à noite, e depois cê caminhar, quer dizer, eu achei, interessante pra caramba, é...
DOC. - [ ? ] A madeira tá velha!
LOC. - Você: Pô, tá velho, o cara não tá cuidando! (risos) quer dizer, os caras pensam em tudo, e, e é engraçado que você entra, você, sente uma paz assim, muito tranqüilo assim, só japonês também pra conseguir fazer de pedra, um jardim bonito né. E realmente o negócio ficou bonito, aquela água correndo num canto, plantinha, paciência que eles têm pra, cuidar da planta, fazer aqueles, é, banzai né, aquelas árvores miniaturas, e têm anos. No Canadá tinha uma, um Jardim Botânico em Montreal, fui visitar, e tinha o, o Jardim Japonês e tinha o Jardim Chinês. Aliás, o Jardim Japonês, eles, podia ser bem melhor , mas o Jardim Chinês eles capricharam, tá muito bonito, tinha essas banzai né.
DOC. - Era diferente, o chinês do japonês?
LOC. - Oh! Eu nunca tinha entrado num chinês, o japonês já tinha entrado, por isso, por isso que eu achei o japonês meio fraco. O chinês tava, o chinês tinha mais o quê, tinha, tinha uma, tipo queda d’água, inclusive tinha um prospecto que, falava.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É, até a Casa da Dinda fica, fica bem pior! Melhor do que a Casa da Dinda [ ? ] Acho que os caras gastaram, dez milhões de dólares, sei lá, um negócio desse, pra construir o, com o material, vindo da China mesmo, mas é maravilhoso o lugar, e, preocupação que eles têm também com planta, esse negócio todo. Aliás, de repente é preocupação até, a gente de repente acha que é demais, mas.
DOC. - É?
LOC. - Sei lá.
DOC. - Em todo lugar tem um ...
LOC. - Não, todo lugar tem, eu lembro que, é quando eu fui pra essa competição no Japão, foi em 85, e, o lugar que a gente tava era ...