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PROJETO NURC-RJ

AMOSTRA COMPLEMENTAR:
Inquérito 03 (feminino / 27 anos)
Tema: Família, ciclo de vida, saúde
Local/Data: Rio de Janeiro, 08 de maio de 1992
Tipo de Inquérito: Diálogo entre informante e Documentador
Documentador: M A


Clique aqui e ouça a narração do texto 


DOC. - Então, você podia começar ... é ... falando, explicar da sua família, quer dizer, quem é, quem é a sua família.
LOC. - Bom, eu moro com meu pai e minha mãe. Marco meu pai, Dulce a minha mãe, Maria Dulce. Tenho três irmãos mas um já casou, não mora mais aqui com a gente, né. E a minha tia que sempre morou com a gente. Bom, fora a empregada que já tá aqui há mais de vinte anos, também já é quase, né. Aí ... como é que é minha família, minha família é ... mais ou menos como eu. Fala todo mundo ao mesmo tempo, fala tudo, todo mundo fala alto, todo mundo fala ao mesmo tempo. Aí aqui em casa é a maior gritaria: quando um quer falar, um, um tem que falar mais alto do que o outro senão não dá pra falar. Aí, uma maior bagunça, né a casa tá sempre cheia tem os amigos dos meus irmãos que tão sempre aqui, telefone tá ocupado o tempo todo, quando não sou eu é meu irmão, aí ... é assim.
DOC. - E vem cá é... , as pessoas têm funções dentro da família, quer dizer, o seu pai ou você tem funções definidas?
LOC. - Eu, eu tenho função de desarrumar de bagunçar (risos) e a minha mãe tem a função de encher o saco (risos), de ficar : Vai arrumar o seu quarto! Vai não sei o que, não sei que lá ... Não, não, não tem essa aqui, tem ... coi, coitada a Isaura que é a empregada, né, é o maior burro de carga, mesmo, faz quase tudo, não é de sair muito então ela tá sempre trabalhando. Aqui em casa cada um almoça uma hora, porque eu vou, eu tenho que sair meio-dia pra ir pro trabalho então eu tenho que almoçar tipo, vinte pra meio-dia, quinze pra meio-dia. Aí meu pai minha mãe são aposentados não têm muita hora, mas eles preferem almoçar mais tarde. A minha tia também, acaba almoçando na hora que eles almoçarem. Meu irmão depende da hora da da aula da faculdade se ele tem aula de manhã, às vezes ele almoça às três. Aí tem um, o Beto, o Beto trabalha o dia inteiro. Então ele almoça lá pela cidade. O Cláudio, é esse da faculdade, eu almoço sempre tipo vinte pra meio-dia. Não tem não tem muita ... não tem essa coisa de: Oh! Você faz isso você faz aquilo não, aqui é anarquia mesmo e acho que ninguém faz nada, no fundo.
DOC. - Mas não tem assim funções de por exemplo é, fazer compras, é....
LOC. - É ... a minha mãe ajuda nas compras ...
DOC. - Por exemplo, quando sua mãe trabalhava quem tomava conta de você?
LOC. - Pois é, sempre a minha tia morou com a gente, então, enquanto a a empregada ficava fazendo, arrumação, comida, etc. a minha tia tomava conta da gente. Aí já tem uns ... dois anos que minha mãe não trabalha, e também não precisa mais tomar conta de ninguém, né. Aí ...
DOC. - Mas, é ... você ajuda ...
LOC. - Minha mãe ajuda nas compras, né, ajuda a empregada nas compras, e minha tia, ajuda assim, ajuda a estender roupa, alguma coisa assim porque minha tia é velhinha também aí, não dá pra ajudar muita coisa.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - E eu faço as minhas coisas, desculpa, eu faço as minhas coisas assim, por exemplo: eu lavo meu prato, arrumo a minha cama, as minhas coisas, quer dizer, até onde eu puder fazer por exemplo, o quarto tá uma zona, eu tenho que arrumar mas até agora eu não tive paciência pra arrumar, mas aí eu, vou arrumar, um dia desses.
DOC. - E ... essa situação que você descreveu, [ ? ]: que ninguém, é ... não tem nada organizado assim. Você acha que, é ... essa falta de função, pra as pessoas é comum em todas as famílias? Ou você acha que é uma particularidade da sua família?
LOC. - Oh! Das famílias que eu vejo, das minhas amigas e tal, é comum, não tem ... Eu não conheço família que: Olha, hoje eu faço as compras, amanhã você lava os pratos, é ... ou se eu lavar os pratos do almoço, você lava os do jantar ... eu não conheço isso, quer dizer, eu só conheço, uma amiga minha que, ela me contando que ela faz mais ou menos isso com o namorado, mas quer dizer, ele não mora com ela, entendeu, ele é namorado só, ela diz: Se ele tiver lá em casa, e eu lavar os pratos do almoço, os do jantar eu não quero nem saber, eu levanto da mesa e ele que se vire, e tipo assim, mas, ela falou que é uma coisa mais ou menos imposta, né, que o dia que ela tiver de bom-humor e tiver a fim de fazer tudo, ela faz, ela não se importa não, mas quando ela não tá, ela faz isso, ela, sai de fininho, aí ele vai ver a mesa toda lá, bagunçada vai ver que tem prato pra lavar, e que ela não vai fazer, aí ele vai fazer.
DOC. - E ... bem, você falou que o, você tem um irmão casado. Ele tem filhos?
LOC. - Não. Ele tá casado há dois anos, é mais novo do que eu até, tem vinte ... vinte e cinco, é, tem vinte e cinco. Mas a garota é novinha, ela ainda faz faculdade, ela tem vinte e dois eu acho, então, por enquanto eles não têm. Não tão nem pensando em filho.
DOC. - E ... Bem, tirando a sua família aqui, da aqui da casa, né, que mora com você, você tem outros parentes?
LOC. - Tenho, tenho parente pra caramba, mas ... assim de ter muita ligação, só uma tia mesmo que mora aqui perto, que tá sempre aqui em casa.
DOC. - E os outros, você não tem ligação por quê? Moram longe...
LOC. - Não ... Sei lá, eu já até tive, já tive, ... já teve, parente por parte por parte do meu pai por exemplo, uma prima que aí, porque o meu pai casou muito tarde, entendeu, meu pai casou com trinta e nove anos. Então os meus primos por parte de pai, são todos muito mais velhos do que eu, eles têm idade, assim, de, eu chamo até de tio, alguns, porque, eu conheço, desde de pequenininha eu, né, pequena e eles já ... uma diferença de sei lá, mais de vinte anos ... Mas, era mais de vinte anos, é, meus primos têm por aí, quarenta e, seis, entendeu, quarenta e poucos, então, não dava pra eu ficar andando com eles e tal, porque a diferença de idade era muito grande, por parte da minha mãe não, eu até que tenho bastante prima de minha idade, e tem até uma Mônica que mora na Ilha também, mas, sei lá ... eu já andei muito com umas primas e tal, mas ... a gente foi se desligando, acho que ... a cabeça era diferente e tal, não sei o que, aí, hoje em dia só quando eu encontro assim, pela rua, não tem a menor ligação.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É, porque tem umas que moram, aqui em Ipanema, Leblon, aí de vez em quando eu encontro assim ...
DOC. - E não tem nenhum, é ... nenhuma época do ano que tenha alguma festividade, sei lá, aniversário, ou qualquer tipo de festividade onde a família se reúne. Acontece isso?
LOC. - Não, antigamente tinha, antigamente o Natal, a gente sempre se encontrava, um dia era a família da minha mãe, outro dia a família do meu pai ... Mas hoje em dia não, porque... é, porque também tem umas complicações de de, o meu pai não se dá com os irmãos da minha mãe, entendeu, ela tem cinco irmãos, aí o meu pai não se dá muito bem com eles, então, acho que eu também acabei me desligando um pouco por causa disso, porque ...
DOC. - É ... acaba se afastando.
LOC. - É ... e fica, essa briguinha e tal aí eu, não tinha muito saco. E ... deixa eu ver que mais ... É, família, realmente família eu não tenho lá muito contato não.
DOC. - E ... Vem cá, é ... mudando um pouquinho. Vamos falar então, como é que foi a sua infância?
LOC. - Infância de playground.
DOC. - De playground!?
LOC. - Não, eu fui ... eu fui moleque de rua, mesmo se ... Oh! Copacabana, é perigoso, tem tem gente, o meu namorado é um que, ele é do interior, aí ele que diz, que eu tive infância de playground, que eu não subi em árvore. Realmente, eu não subi em árvore, eu subi em poste, aqui na rua, pô ... eu andava de bicicleta na praia, é diferente né, mas ... sei lá, eu acho que eu aproveitei, eu tinha uma turma aqui na rua, a gente saía pra andar de bicicleta, pra tomar sorvete na padaria, era tudo em turma, né, é, praia também, no verão, pô, eu vinha em casa, almoçava e voltava pra praia, era o dia inteiro praia, aí começava a época de, matinê de discoteca, né, quando você tem uns treze anos, doze, mais ou menos, aí também, tinha turminha, era tudo com turminha ... Brinquei muito de pular elástico, pique ... Mas tudo aqui na rua mesmo, né, na rua, na praia, não tinha muito pra onde correr, né ... Aqui em Copacabana é meio ...
DOC. - Corria na praia!
LOC. - É ... É mas, correr na praia, eu brincava assim, de pique, né, mas correr na praia eu nunca, tive hábito não.
DOC. - E depois que você foi crescendo, como é que ... Você mudou as suas atividades?
LOC. - Não, aí ...
DOC. - Continuou o mesmo grupo?
LOC. - Não. Por exemplo, hoje eu não tenho mais uma turma, como eu tinha até porque as pessoas vão crescendo, umas se mudam, é ... Aí começa a época de trabalhar, cada um vai trabalhar num canto, casa, etc. Então, agora, as melhores amigas que eu tenho e tal ... tipo a Paula, não sei o quê, foi dessa época de molecagem ... aqui na rua, de ir à praia o dia inteiro, quando tinha uns doze anos. Aí, essas pessoas, tem uma que mora nos Estados Unidos, Letícia, é ... duas aliás moram nos EUA, duas assim muito amigas, foram morar, uma mora, uma mora deve ter uns três anos e meio e a outra vai fazer dois anos que ela foi pros Estados Unidos. E ... uma casou, a outra não ... E a Paula ... Quer dizer, a Paula é, minha super-amiga e tal, a gente tá sempre, a gente sempre sai juntas e tal, não sei o quê, uma sempre chora no ombro da outra.
DOC. - E ... Mas, depois assim na sua adolescência, não tinha grupinho?
LOC. - Não... Tinha
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - Não até tinha mas, não era muito constante entendeu, era aquela coisa de, quem tava sem namorado, se juntava pra sair, entendeu, porque era época que tava todo mundo começando a namorar, aí tipo assim: Ah briguei com meu namorado, vou sair com você hoje e tal, e eu era uma das menos namoradeiras, então, geralmente, eu tava sempre no grupo, né, aí a gente ia, ia pra ... Boate, Baixo Leblon ... Eu saía pra caramba, né, o pai sempre.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - Não, hoje em dia ... Depende, entendeu, porque eu tô namorando há quatro anos e meio, e aí fica meio dependente de namorado, meu namorado, é super caseiro, não é de sair muito. Então, eu continuo saindo, mas eu saio assim dia de semana. Eu saio com as minhas amigas, com o pessoal do trabalho, mas, dia de de semana. Aí fim de semana, eu deixo assim .. Eu abro mão, faço uma exceção pra ficar vendo vídeo, sair só pra comer e tal, porque, não adianta forçar a barra porque meu namorado não gosta, aí ...
DOC. - [ ? ] de um namoro de quatro anos e meio, vocês tem planos pro futuro?
LOC. - não. A gente tem e não tem, né, quer dizer, a gente tinha, aí de uns tempos pra cá ... Sei lá, acho que isso é comum, né. Ele antes queria casar, eu não queria. Agora eu quero, ele não quer, entendeu.
DOC. - Por que que você não queria?
LOC. - Ah, eu nunca ... Até hoje, eu não me vejo muito casada não, eu sou muito geniosa ... Eu tenho ... Pô, eu sou brava, eu discuto muito, eu brigo muito, é, eu cobro muito, quer dizer, se eu achar que ele tem que fazer uma coisa, eu não vou sossegar enquanto ele não fizer ... Aí, não sei, eu não me via casada, achava que, pô, muito melhor você, e continuo achando, é muito melhor você morar separada entendeu, porque, brigou não tem que olhar, vai cada um pra sua casa. Agora a gente tá brigado, tem duas semanas que a gente nem se fala, aí, mas aí, até passar a raiva, pensar se, vale a pena voltar, não vale a pena voltar e tal, não sei o que, aí pelo menos fica cada um na sua casa, ele sai com os amigos dele, eu saio com os meus, entendeu. Não é, oh, relação aberta, não é isso, mas ...
DOC. - Mas você falou que agora, você queria casar e ele não quer mais.
LOC. - É ...
DOC. - Mudou?
LOC. - Sei lá ... Eu quero e n ..., eu quero achando que não vai dar certo, entendeu?
DOC. - E ele não quer mais por quê?
LOC. - Eu continuo achando que ... aí, tudo ... todos os argumentos que eu usava pra convencer ele que não era uma boa a gente se casar, ele, se convenceu.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É, entendeu, ele se convenceu. Eu nunca fiz tão bem a cabeça de uma pessoa. Ele se convenceu. Aí hoje em dia ele acha que realmente, a gente não tem condição de se casar, porque, porque eu sempre falei: E se amanhã não dá certo? Eu vou ter que voltar pra casa dos meus pais? O que eu ganho não dá pra alugar um apartamento nem nada, entendeu, aí, é muito difícil, sabe, eu acho que, de repente, quer dizer, tem amiga minha que fala que, eu sou do contra, que de repente agora eu quero só porque ele não quer mais, entendeu. Ah, não sei, não sei, até que ponto.
DOC. - ( ininteligível)
LOC. - Porque, eu era muito assim, quando eu era, quando eu era adolescente, eu sempre fui uma pessoa meio difícil, e eu era muito assim de, todo mundo: Eu quero ir ao cinema, e eu: Não, eu quero ir ao teatro, e, lá, ia convencer, fazer de tudo pra convencer as pessoas a irem ao teatro. Eu sempre fui do contra. Acho que até porque a minha mãe, tinha mania de dizer que, quando eu era criança, eu era a maior “Maria vai com as outras”, aí na adolescência, eu resolvi mudar, eu não fazia nada do que queriam, eu só fazia o que eu queria e ainda tinha que convencer as pessoas a fazerem o que eu queria, aí, eu, quer dizer, eu acabei ficando meio com fama de do contra: Ah, Gipsy não vai querer, ah, Gipsy, é isso, tipo assim: todo mundo ia ao cinema, não, não, “vou ficar em casa”, aí ... Não sei.
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É ...
DOC. - E ... vem cá, eu ouço muito, é, isso as pessoas me falam, colegas de: Ah, mas casar é uma coisa natural. Você acha que isso, é, que existe isso, é, uma fase natural, é ... Uma função natural na vida das pessoas; casar, ter filhos.
LOC. - Pois é ... Não sei ...
DOC. - Como você vê isso?
LOC. - Eu acho que, eu acho que na vida não entendeu, essa coisa de, que todo mundo tem que casar, ter filhos, não. Por exemplo, eu tenho muito mais vontade de ter filhos do que de casar, mesmo, hoje em dia, que, eu quero casar e o meu namorado não quer, mas, eu ainda, eu quero, mas eu, eu sei que se ele chegar pra mim: Então, vamos casar? Eu sei que eu ainda vou ficar assim: Ai! Meu Deus! Será que eu devo? Será que vai dar certo? Eu não sei entendeu, se ele chegar pra mim: Vamos casar amanhã? Eu não sei se eu caso entendeu, agora, por exemplo, adoro criança. Tenho a maior vontade de ter filho, assim e tal, e isso é uma coisa até de uns tempos pra cá, porque, por exemplo, na adolescência mesmo, eu odiava criança, eu: Ai que saco! Tipo assim, odiava, pô, Herodes tinha razão! Eu vivia, eu e a Paula, a gente ficava: Herodes tinha razão! tem que matar as crianças. Não sei o que, não sei que lá, a gente odiava criança. Mas acho que, até porque, quando você é menor, quando você é criança, você não dá muito valor. Você acha que criança é só pra encher o saco, né, você, quer dizer...
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - Tem gente que gosta desde pequena e tal, não sei o quê, mas, na fase que você tá na adolescência, você tá na praia, vem criança, te joga areia, você não vai entender que, pô, isso é da criança.
DOC. - Você vai achar um saco, né, que você tá lá, ainda mais de adolescência, que você tá lá, fazendo mil poses, e a criança vem, e te tira da pose e tal, aí, mas eu não acho que seja eu acho, eu não achava até, né, eu acho tal, que que é uma coisa natural, é um, não é um processo natural, mas é um ... Eu acho que acaba sendo uma conseqüência de namoros muito longos, entendeu. Você pode até não casar, mas, você começa a pensar, né, que, pô, como seria bom você morar com aquela pessoa, que, não tem que, dá tal hora, ela te levar pra casa, e no dia seguinte você pegar um ônibus e ir pra casa da pessoa, e, pô, você pensar que queria ficar mais tempo com ela e tal. Não sei o quê. Mas isso é o lado bom, né, mas você pensa, eu, por exemplo, penso nos dois, né. Penso também que, pô, imagina você brigar e ter que dormir junto com a pessoa, olhando pra cara da pessoa, aí acordar no dia seguintes, um não tá a fim de falar com o outro e, tá na mesma casa, sabe, tomando café juntos, não sei, mas eu acho que é uma coisa não , eu não acho que casar e ter filhos seja uma coisa natural, da vida. É uma coisa assim, quer dizer. É natural porque é comum né, as pessoas se casam, têm filhos, mas eu não acho que você tenha obrigação: Oh! Vou ficar pra titia, vou ficar solteirona, não, pô, eu conheço, essa minha tia que mora aqui, ela é solteirona, e eu acho que ela é super feliz, sabe, eu não acho que ela seria, feliz assim, ela é uma pessoa que pô, ajuda os outros pra caramba. Ela, isso é até um pouco de defeito, ela pensa muito mais nos outros no que nela, né, mas eu acho que ela é uma pessoa feliz e tal, que não tem nada...
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - É que, a vida não ficou a dever, entendeu, nada, foi uma opção dela ficar solteira. Ela não ficou solteira porque, não apareceu pretendente. Ela ficou solteira porque ela quis, porque, talvez ninguém tenha interessado, a ponto de ela se casar, entendeu, mas, de qualquer maneira foi porque ela quis, porque tem gente que morre de medo de ficar sozinha e casa com...
DOC. - Tem gente que vive em função disso, né, [ ? ]
LOC. - É, quer casar, entendeu, então, pô, eu conheço gente assim que quer casar: “Não, porque eu já tô na idade, eu tenho que casar; não sei o quê, aí eu fico assim: Pô, mas você gosta dele a ponto de casar? Ah, não sei, mas sabe, também não arrumei ninguém melhor até agora, e casa, sabe? E eu não sou assim. Aí eu acho, mas eu acho isso, que você namorando muito tempo e tal, você acaba, pensando, né, mesmo que de repente você....
DOC. - ( ininteligível)
LOC. - É, mesmo que de repente, você: Ah, não sei se vai dar certo, tipo assim, como eu penso, ah não, eu acho que em um ano a gente se separa, se a gente se casar, mas, de repente não, né, até dá certo, não sei, é muito difícil né?
DOC. - Você acredita, é ... Não só em relação ao casamento, mas em tudo, né, você acredita em ... é ...
LOC. - Compromisso? Não!
DOC. - Não! Não é compromisso, é ... As coisas que estão estabelecidas, tipo, por exemplo: Ah, porque adolescente tem que ser rebelde; porque adulto tem que casar; porque gente que é casada tem que ter filho, entende, o que eu quero dizer. Essas ... essas coisas estabelecidas que as pessoas costumam esperar das pessoas. Como é que você vê isso? Você acha que existem coisas que são realmente, é inerentes a determinada idade, a determinadas fases da vida?
LOC. - É ... Eu acho que, eu acho que existe, cobrança, por exemplo, cobram, se você tá namorando há muito tempo, cobram, que você tem que casar, aí depois que você casa, cobram os filhos, isso eu vejo pelo meu irmão, é ... Se um adolescente dá um ataque, ah, isso é coisa de adolescente. É como você falou, tem essas coisas pré-estabelecidas, né, mas acho até que, varia muito de geração pra geração, né, quer dizer, eu acho que o básico não muda, né, essas coisas de, é na adolescência que você começa a se perguntar um monte de coisa. De repente é na adolescência porque, você, enquanto é criança, você não pensa muito, você obedece os pais, ou não obedece se você for um capeta e tal, não sei o quê, mas, você não questiona muito as coisas, eu acho que é justamente na adolescência, talvez, por isso seja a fama de adolescente ser rebelde, não, porque na adolescência é que você começa a tomar consciência das coisas, e querer saber mais, porque que acontece isso, porque que eu não posso ir a tal lugar, se o seu pai: Não, você não pode ir! Mas, não posso por quê? Porque é perigoso! É perigoso por quê? Entendeu, aí, mas eu acho que, por exemplo, isso de de de fazer isso, fazer aquilo, adolescente rebelde, eu acho que muda muito de geração, por exemplo, tem umas coisas que eu fico vendo que ... Que por mais que eu não fosse uma, não fosse assim super livre, não pudesse fazer tudo o que eu quis e tal, pô, eu moro em Copacabana, que há muito tempo é considerado, um lugar violento, né, favelas, muito assalto, etc etc, e, e sempre, saía sozinha, quer dizer, tinha hora pra voltar, tinha pra almoço, tinha hora pra isso, hora pra aquilo, mas eu, saía, minha mãe nem sabia de mim, era assim, quer dizer, “tô pra praia”, mas da praia, eu ia , quer dizer, na praia mesmo, eu resolvia andar até o Leblon, quer dizer, eu já não tava mais aqui na praia, quer dizer, eu tava, andando. Mas, eu acho que é muito de geração; por exemplo, eu conheço umas meninas agora, primas do meu namorado, uma tem quinze anos, a outra tem treze, pô, a mãe vai levar elas no colégio. O colégio é a uma quadra da casa delas, porque tem medo que elas sejam atropeladas, tem medo de seqüestro, nem sei por quê, porque não é rica nem nada, mas tem medo de seqüestro, é ... Assalto, que cortem o cabelo delas, tudo aqui é motivo de pavor, né, então, por exemplo eu vejo que, eu na minha geração e tal, fui muito mais livre do que essas meninas, o que não quer dizer, que isso seja uma regra, porque tem umas meninas aqui, aqui na rua mesmo que, com treze anos, pô, tão de namoradinho firme, sabe, pô, fumam maconha, fazem o diabo, entendeu, e as garotas são pequenas, eu olho e fico assim: Meu Deus! Elas ... tipo assim, até o corpo, eu fico assim: Pô, elas são muito mais desenvolvidas, do que eu, né, mesmo que elas façam muita besteira, mas, elas fazem coisas que eu talvez com dezoito não fizesse, entendeu? Talvez não, não fazia mesmo. Aí, eu acho que tem muita diferença de geração, entendeu? (e) tem muita, é ... De geração, acho que você, eu tava falando isso com uma amiga minha, eu acho que tem umas coisas que você, ou você se espelha nos seus pais ou você, quer fazer o contrário, por exemplo, os meus pais não falam, nem m ..., sabe, m... pra eles é, horrível, eles não falam. Acho que pra eles falarem m... eles têm que tá com uma raiva, assim, horrível e: Ai Meu Deus, que, m... e ainda fala assim, baixo, sabe? E eu não, eu falo palavrão pra caramba, eu sou desbocada. Se eu tiver um pouquinho nervosa, eu já desando, falo, os palavrões que eu conheço, acho que eu até invento palavrão, e, e eu conheço gente que os pais... Eu tenho um primo que a mãe dele, é super desbocada, a mãe dele fala palavrão pra caramba, e ele não, ele acha horrível mulher que fala palavrão. Quando eu falo ele me dá altas broncas, assim: Você não devia falar isso, não sei o quê, aí, acho que tem muita coisa ...
DOC. - [ ? ] É um pouco de educação, um pouco, é ... , da ..., quer dizer, um pouco de geração, esse problema de geração que você tava falando, de cada tempo, quer dizer, eu acho que hoje em dia as pessoas tão mais liberadas, mas ainda existem pessoas, que receberam uma educação mais segura, quanto a isso, não? [ ? ]
LOC. - E tem lugar também, porque, por exemplo, essa meninas que são super presas e tal, a mãe delas é ..., é da onde? É de Fortaleza, eu acho, então, ela não diz isso com todas as letras, mas ela deve achar que o Rio de Janeiro é uma barbaridade, por mais que ela more aqui há trinta anos e tal, mas de repente ela, é como ela diz, entendeu.
DOC. - ( ininteligível)
LOC. - Não ela, eu falo pra ela: Pô, é um absurdo você não deixar as suas filhas atravessarem a rua pra ir no colégio! Aí ela fala: Ah, enquanto eu puder, enquanto eu for viva, eu vou levar! Aí, eu falo: Pô, até o dia que elas tiverem vergonha, que elas não vão querer, entendeu, e aí vocês vão entrar em atrito, porque vocês vão começar a brigar, como eu briguei, que a minha tia me levava no ponto de ônibus, eu tinha uns treze anos, eu morria de vergonha! Até o dia que eu falei: Não! Se você for me levar no ponto de ônibus, eu não vou ao colégio! Eu não vou sair de casa! Aí eles começaram aos poucos a deixar, né, mas, eu sempre cobrava né, e essas meninas por exemplo, elas já são mais, quietas, mais na delas e tal.
DOC. - Então elas vão demorar mais a cobrar, mas um dia vão cobrar.
LOC. - É ... Aí, quer dizer, eu nem sei se isso tem muito a ver com a geração, de repente, tem mais a ver com educação talvez, né.
DOC. - É um pouco dos dois, né, quer dizer cada época tem a sua liberdade.
LOC. - É ... É e tem que ver, até coisa de casar em igreja, essas coisas, né, pô, eu li uma vez no jornal e é verdade, se você reparar, é sim, tem uma, vamos supor, o pessoal que tá na, as minhas amigas que, achavam ridículo igreja, véu e grinalda, hoje em dia, elas tão casando de véu e grinalda, bonitinhas e tal, e de repente, de repente pessoas que achavam legal, hoje em dia não acham, entendeu, porque, e eu tava lendo justamente isso no jornal, que, é sempre ... Sempre se segue assim, é ...
DOC. - O inverso
LOC. - O inverso, é, uma geração vai casar bonitinha, na igreja, quer tudo nos conformes, aí a próxima, não, vai querer romper com todos os padrões, entendeu, vai fazer um monte de doideira, vai juntar, vai separar, vai juntar dez vezes, separar, não sei o quê. Aí eu tava lendo...
DOC. - ( ininteligível )
LOC. - E é verdade, porque, dizem que a geração dos nossos pais, a geração dos nossos pais por exemplo, foi, a dos meus pais talvez nem tanto, porque o meu pai casou com trinta e nove e a minha mãe casou com trinta e quatro, então, eles já são um pouco mais velhos, mas da mãe das minhas amigas, pô! Eu acho que eu tenho uma amiga que os pais não são separados, o resto todos os pais são separados, sabe, que é a geração que hoje em dia, hoje em dia deve tá com, cinqüenta e poucos anos, na faixa dos cinqüenta, né. E quase todas as minhas amigas, sabe, os pais se separaram quando elas tinham assim, dez anos, oito anos, que foi justamente na época da Revolução, sessenta e tal, né, setenta e poucos mais ou menos que eles se separaram.
DOC. - Então você acha que isso é, influi na, você vê diferenças entre essas colegas, por exemplo, que tinham os pais separados e você que não tinha, e de outros colegas que não tinham os pais separados?
LOC. - Ah ... Elas eram muito mais livres do que eu, menores eram, porque, por mais que a mãe tivesse uma responsabilidade maior, pela falta do pai, ao mesmo tempo, por exemplo, eu tinha que pedir permissão pra minha mãe e pro meu pai, os dois tinham que deixar, e elas não, se elas conseguissem convencer a mãe... (som de campainha)
[Pode deixar que atendem lá, esse barulho é ridículo]
LOC. - Aí, se elas convencessem só a mãe, bastava. Elas não tinham que convencer mais ninguém, porque o pai não morava com elas, né, então...
DOC. - E ... Só esse tipo de diferença que você via?
LOC. - Não, eu acho que elas têm um relacionamento mais aberto com a mãe, conversam mais, não sei, talvez porque, talvez porque essas mães, né, como a maioria mora com, eu não conheço nenhuma que mora com o pai, todas moram com a mãe, de repente essas mães, por terem passado por coisas que eram consideradas tabu na geração delas, de se desquitar e morar sozinha, criar suas filhas sozinhas e tal não sei o quê, elas têm uma cabeça mais aberta e talvez elas vissem mais quando a filha tava com algum problema e puxassem papo, entendeu, e perguntassem, tal, não sei o quê. Agora eu não sei se é só isso, se tem diferença de idade, por exemplo. Não é que eu não tenha diálogo com os meus pais, eu tenho, mas por exemplo, eu não tenho a ponto de contar coisas íntimas, quer dizer, coisas que eu converso com as minhas amigas e tal, né, eu não converso com os meus pais. Agora, tem várias amigas minhas que, pô, primeira pessoa que elas vão falar é a mãe, entendeu. Elas vão, ah! mãe, tô triste, aconteceu isso, sabe, meu namorado fez isso, fez aquilo, não sei o que lá. E isso é o tipo de coisa que, mas talvez até por idade né, porque a minha diferença pro meu pai são exatamente 40 anos, é muita coisa né? Eu tenho 26 e meu pai tem 66.
DOC. - E o inverso, quer dizer, você falou no lado positivo né, o fato de os pais serem separados. E ... você acha que tem algum lado negativo nisso, você vê alguma coisa ...
LOC. - Ah, eu acho que o lado negativo, comum pelo menos na maioria é carência assim de uma figura, de um homem, entendeu, quer dizer com algumas isso até se projetou, é, tipo assim, tem uma, eu conheço duas que elas não sabem ficar sozinhas entendeu, sozinhas assim sem namorado. Elas não conseguem, sabe, não conseguem. Elas podem namorar o pior cara do mundo, sabe, o mais idiota do mundo, mas elas têm que ter um namorado. E de repente, pode ser coisa de psicologia e tal, mas de repente é a falta que elas têm, né, da figura paterna, do pai, de um homem ali, por exemplo, essas duas que eu tô falando, por um acaso, elas não têm nenhum irmão, homem, sabe, é só irmã, então, acho que, eu acho que a parte negativa é essa, entendeu, hoje em dia, tem uma que tá casada e ela atura coisas do marido dela que eu não aturaria de um inimigo meu, sabe, de não poder fazer isso, não quero você conversando com vizinho porque eu não gosto, não quero isso, quer dizer, elas aturam muita coisa, ah, entre outras coisas, saber que, de repente, o marido tem uma amante, coisas assim, e eu fico, Meu deus, por quê, entendeu, pô, a garota às vezes é nova, sabe, pô, inteligente, abandonou profissão, abandonou isso, abandonou aquilo, abandonou tudo, pra se dedicar ao marido, engravidou, teve filho, tem duas filhas, até, não sei o que lá, e é medo de ficar sozinha, entendeu, é medo de largar o marido e não encontrar um homem que queira ficar com ela, entendeu, ainda mais ela tendo filho e tal, não sei o quê ...
DOC. - ... reproduzir a situação que ela viu na mãe.
LOC. - É, de repente, é até isso, de repente ela sabe que ela quando criança né ficava meio triste, né, esperando o pai, o pai não vinha, o pai não visita não sei quanto tempo e tal, não sei quê, talvez até pelas filhas ela ature coisas assim que ela, por exemplo, uma delas ela até cobra, ela cobra, ela cobra da mãe pelas atitudes dela, entendeu.